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sexta-feira, 31 de maio de 2013

Top 10 - Casa do Capita - Quadrinhos: Histórias do Homem-Aranha

"O que seriam as histórias definitivas do Homem-Aranha na tua opinião?", me perguntou um amigo meu, muito fã de Todd McFarlane enquanto conversávamos sobre o meu post a respeito de Tormento, que, de fato, está longe de ser das minhas histórias preferidas.
Bueno... Respondi que, naquele momento, era capaz de elencar três. Justamente as três que encabeçam a lista a seguir.
Mas continuei matutando e cheguei então à dez histórias que considero indispensáveis na biblioteca aracnídea. Formou-se então, mais um infame top-10 Casa do Capita com as dez histórias mais importantes (definitiva é um termo muito forte) do herói aracnídeo.
Confesso que flertei com pelo menos trinta outras histórias pra essa décima posição. Especialmente Guerra de Gangues, uma história bem ao estilo que eu curto, com o Aranha fazendo o papel de vigilante urbano e enfrentando o crime organizado, A Saga da Tabuleta, com o vilão Cabelo de Prata e os confrontos do Aranha e da Gata Negra com o Dr. Octopus e o Coruja.
Talvez tenha sido por Volta ao Lar marcar meu retorno aos quadrinhos após um hiato de cinco anos sem ler gibis, mas essa história pra qual eu inicialmente torcia o nariz, o primeiro arco de J. Michael Straczynski nos roteiros de Homem-Aranha tinha uma quantidade violenta de qualidades que eu sempre considerei importantíssimas no microverso aracnídeo.
À lista:

10 - Volta ao Lar
J. Michael Straczynski, John Romita Jr., Scott Hanna.



Morlun, uma espécie de vampiro energético que se alimenta de heróis com poderes totêmicos chega a Nova York com o Homem-Aranha na alça de mira de sua fome.
Morlun sempre é capaz de encontrar o Homem-Aranha, uniformizado, ou não, e quando o herói foge, ele simplesmente começa a atacar inocentes até que o Aranha volte.
As sequências de luta brutais do Aranha contra Morlun, um adversário terrivelmente forte e praticamente indestrutível são espetaculares, a perseguição empreendida pelo vilão é tensa, e o momento em que o Homem-Aranha percebe que aquela é uma luta que não pode vencer à moda antiga e liga pra tia May para se despedir, é sensacional.
O roteiro bem escrito de Straczynski e a arte ultra dinâmica de John Romita Jr. dão o recado.
Pode-se falar mal de tudo na fase Straczynski, mas essa história, e o fato de Peter Parker voltar à escola Midtown pra ensinar ciências, são ótimas ideias.

9 - Homem-Aranha, Nunca Mais
Stan Lee, John Romita, Mike Esposito.



A mídia negativa, liderada por J. Jonah Jameson e o Clarim Diário, levam Peter Parker ao limite. Não bastasse tudo isso, tia May está doente (pois é, de novo...). A soma dos problemas pessoais de Peter à aversão da opinião pública pelo Homem-Aranha levam Peter Parker à abandonar a máscara, dizendo a histórica frase "Homem-Aranha, nunca mais...".
Peter eventualmente volta atrás após a onda de crimes liderada pelo Rei do Crime deixar claro para o sobrinho favorito do tio Ben que ele tem responsabilidades demais para simplesmente desistir da máscara de das teias.
Clássico absoluto pelas mãos sempre competentes de Stan (the man) Lee e John Romita.

8 - O Duende Macabro
Roger Stern, John Romita, John Romita Jr.



A morte de Norman Osborn deixou um vácuo de vilania na galeria do Homem-Aranha. Levou algum tempo para esse vácuo ser preenchido, e quando isso aconteceu, não foi com o mesmo conteúdo, embora a embalagem fosse muito semelhante.
Alguém encontrou um dos velhos esconderijos de Norman Osborn cheio de tralhas do Duende Verde.
Esse sujeito teve abrilhante ideia de usar o aparato e a aparência (levemente modificada) da antiga nêmese de Peter Parker para se tornar, ele próprio, um super vilão.
O grande barato do Duende Macabro, era que, ao contrário dos outros duendes, ele não era maluco. Era um sujeito calculista que sabia que, se usasse de maneira correta as habilidades e aparato do Duende, poderia ascender no submundo e ficar muito rico.
Roger Stern, artífice dessa beleza ao lado de John Romita, ainda foi especialmente feliz ao criar, em torno da identidade do vilão, um mistério tão sólido quanto o que houve em torno do Duende Verde, e ainda mais intrincado.

7 - O Último Desafio
Brian Azzarello e Scott Levy, Giuseppe Caluncoli.



Eu curtia bastante essa série chamada Tangled Web, um quadrinho que foi brevemente publicado no Brasil e mostrava histórias curtas de criadores sem relação costumeira com o Homem-Aranha.
Houveram belas histórias como Flores para o Rino, histórias hilárias como uma cujo título me foge, mas era estrelada pelo Lápide e pelo Canguru, e histórias ruinzinhas, como O Milhar.
A minha favorita dessa série era justamente essa O Último Desafio, que mostrava o Esmagador Hogan, lutador de Luta-Livre que via o esporte que amava ser ameaçado pelas grandes ligas, mais interessadas no espetáculo do que na lealdade e no respeito do verdadeiro wrestling.
Hogan, então tem um plano para fazer a companhia da qual faz parte voltar a ser um sucesso:
Fazer seu próprio espetáculo.
Para isso, ele cria um personagem, um Esmagador Hogan cruel, maléfico, gozador, desrespeitoso. Alguém a quem os fãs odeiem, alguém contra quem todos queiram lutar. Alguém que todos queiram derrubar, e um prêmio de dez mil dólares pra quem conseguir fazê-lo.
No fim da história, Hogan pensa:
"Os fãs me odeiam. Eu sou seu pior pesadelo. (...) Essa era a beleza da estratégia. Porque se os fãs realmente me odiassem...? O homem que me derrotasse...? Seria um herói...".
E aparecia o magrelo Peter Parker, de cara coberta com uma máscara improvisada subindo ao ringue. De arrepiar.

6 - O Menino que Colecionava Homem-Aranha
Roger Stern, Ron Frenz, Terry Austin.



Na calada da noite, o Homem-Aranha se esgueira para dentro e um hospital. Lá, ele entra no quarto de um menino que se diz seu maior fã.
O garoto mostra ao Homem-Aranha uma grande coleção com todas as aparições do herói na imprensa.
Intercala-se à história em si, trechos de uma edição do Clarim Diário de alguns dias antes, com uma extensa reportagem à respeito do garoto, Timothy Harrison que começa assim.
"Timothy Harrison é um desses jovens especiais. Ele é esperto, brilhante, adorável e tem nove anos de idade... Passando por 35. Você conhece o tipo a que me refiro. Você fala com ele por cinco minutos e tem a estranha sensação de que ele já passou por poucas e boas à respeito da aparência jovem.
Tim (Ele prefere ser chamado Timmy), é como muitos dos garotos da sua idade. Ele viu todos os filmes de Star Wars uma dúzia de vezes, cada. É um grande torcedor dos Mets, e curte qualquer ruído que se passe por música hoje em dia. O que torna Tim diferente da maioria dos seus colegas de classe, é um hobby que J. Jonah Jameson, o estimado editor desse jornal, certamente não aprovaria.
Tim coleciona Homem-Aranha".
O herói passa horas com Tim, vendo sua coleção, conversando com ele, contando sua história e finalmente, partilhando seu maior segredo.
Ao fim do conto, e do artigo, é revelado que Tim está doente. Em estado terminal.
De trazer lágrimas aos olhos.

5 - Homem-Aranha: Azul
Jeph Loeb, Tim Sale.



Menos uma história de super-herói, mais uma carta de amor, o tocante conto de Loeb e Sale mostra um Peter Parker melancólico relembrando a história de como Peter Parker e Gwen Stacy se apaixonaram. Ou melhor, de quase como não se apaixonaram.
Mistura-se na história a declaração de amor de Peter à Gwen com a declaração de amor de Loeb à época em que Stan Lee e John Romita, egresso de quadrinhos românticos, transformaram o Homem-Aranha em um gibi que era quase uma novelinha, com tramas românticas entrecortadas por pancadarias super-heroicas.
O trabalho de Loeb, transpirando coração, e a arte esquisita e magnética de Sale, transportam o leitor de volta a um tempo em que o mundo era mais simples, bonito e colorido, mesmo pra quem nasceu com o azar dos Parker.
Obrigatória.

4 - A Morte de Jean DeWolff
Peter David, Rich Buckler, Joe Rubinstein(E outros).



É engraçado pensar que a capitã DeWolff, apenas uma coadjuvante despretensiosa nas histórias, cuja principal característica parecia ser o figurino anos cinquenta e o fato de ela ser a única policial que não odiava o herói, se tornaria uma personagem tão importante na cronologia e na mitologia aracnídea ao ser brutalmente assassinada pelo maníaco Devorador de Pecados.
A morte da policial, apenas a primeira da série de homicídios engendrada pelo vilão, foi o catalisador de uma trama crua e urbana, que mostrava o Aranha enfrentando um tipo de maluco bem diferente do que estávamos acostumados a ver mensalmente nas revistas.
O somatório de episódios que se acumularam sobre o herói do início dos atentados até a descoberta da identidade do assassino quase levaram o Homem-Aranha a cruzar a linha e dar cabo do assassino com as próprias mãos numa história que entra fácil no ranking das melhores estreladas pelo sobrinho preferido da tia May.
O Devorador ainda voltaria, anos mais tarde, para um desfecho igualmente luminoso de sua passagem pela vida de Peter Parker.
O melhor? Recentemente foi republicada pela Panini.

3 - A Noite em que Gwen Stacy Morreu
Gerry Conway, John Romita, Gil Kane.



Sim. Foi em um quadrinho do Homem-Aranha que o impossível aconteceu. A mocinha da história, a namorada do herói, a namorada de todos os fãs do cabeça de teia, morria. Uma morte estúpida e gratuita, como todas as mortes de alguém jovem, bonita e cheia de vida são. Pelas mãos de um psicopata vingativo que alcançou um nível de perversidade e torpeza tão elevados que não podia continuar vivendo.
Era um soco na boca do estômago de cada fã de quadrinhos. Ninguém estava a salvo. Não havia limites para a vingança do Duende Verde, o vilão que tornou a rixa herói x vilão pessoal ao resolver que enfrentar apenas o Homem-Aranha não era o bastante, e que Peter Parker e seus entes queridos também deviam sofrer sua ira.
Conway, Romita e Kane entregaram uma história poderosa, que mostrava a fragilidade da vida ante a maldade, mas também o poder da humanidade e da misericórdia de Peter Parker, o homem sob a máscara do Homem-Aranha.

2- A Última Caçada de Kraven
J. M. DeMatteis, Mike Zeck, Bob McLeod.



John Mark DeMatteis é, ao lado de Stan Lee, Gerry Conway e Roger Stern, um dos melhores escritores do Aranha em todos os tempos, e essa história faz jus à colocação.
Seu conto sombrio do herói, sobre como anos de derrotas humilhantes levaram Sergei Kravinoff, o Caçador, a chegar ao seu limite em busca da limpeza de sua honra é hipnotizante, catártico, grandioso e terrível.
Em um mau momento de sua vida, assombrado pela morte do jornalista Ned Leeds, e de um informante barato, Joe Face, preocupado com a sua tia e com sua esposa Mary Jane, o Aranha é pego desprevenido quando Kraven leva sua luta a um nível totalmente novo.
Derrotado pelo Caçador, enterrado vivo, e superado em seu papel de vigilante por Kraven (ao menos na mente doentia do vilão), Peter encontra em seu amor por Mary Jane a força para "voltar à vida", e tudo isso, lá pela metade da história, que continuaria numa crescente até o confronto do Aranha com Kraven, sua missão de recapturar a criatura conhecida como Ratus e a forma como Kraven, com a honra restaurada, se despede da caçada.

1 - Ninguém Pode Deter o Fanático
Roger Stern, John Romita Jr., Jim Mooney.



Era apenas uma história. Uma história simples em duas partes numa edição qualquer de Homem-Aranha. Mas ali estava tudo o que se devia saber a respeito do personagem:
Um azarão que não media esforços para deter quem quer que fosse, mesmo que o inimigo a ser detido fosse a força inexorável conhecida como Fanático.
O maior duelo de David contra Golias da história da Marvel se concentra numa das mais fantásticas lutas da história dos quadrinhos, brilhantemente arquitetada por Stern e contando com os desenhos sempre inspirados de John Romita Jr., extraindo o máximo de drama e dinamismo de cada quadro.
Lutando como uma fera pra proteger a Madame Teia do ataque iminente do vilão, o Aranha é espancado, esfolado, esmagado através de paredes e espancado de novo por um adversário que não pode ser suplantado através da força nem da agilidade do herói, fazendo o leitor roer as unhas enquanto se pergunta, se nada pode deter o Fanático, o que o Homem-Aranha vai fazer para detê-lo?
Es-Pe-Ta-Cu-Lar.

0 - A Saga do Planejador Mestre
Stan Lee, Steve Ditko.



Uma pequena trapaça, já que essa história não pode ficar de fora de nenhuma lista.
O desfecho da aventura é tão fantastico que pouca gente lembra que nessa história foram apresentados ninguém mais ninguém menos que Harry Osborn e Gwendolyne Stacy.
Na sequência, após derrotar o Planejador Mestre, que revelou-se o bom e velho Octopus, o Homem-Aranha está preso sob toneladas de escombros em uma base sub-marina que está se inundando, a apenas alguns metros de distância do isótopo que pode salvar a vida da tia May, em risco devido à uma transfusão de sangue que ela recebeu de Peter!
No desfecho, três páginas espetaculares onde Steve Ditko mostra tudo o que sabe de composição e drama numa das mais icônicas imagens da história dos quadrinhos.
Não é a toa que os dois criaram o Homem-Aranha. Vão manjar do riscado assim lá na Casa do Capita...

Resenha Blu-Ray: João & Maria : Caçadores de Bruxas



É uma modinha que se estabeleceu no cinema após o sucesso do ótimo Sherlock Holmes, com Robert Downey Jr., pegue um personagem ou conto clássico, e dê-lhe uma roupagem divertida, um enfoque mais contemporâneo, enfim, torne-o mais cool pra geração Y.
Aconteceu com a criação máxima de Conan Doyle, aconteceu com a Chapeuzinho Vermelho, com Leonardo da Vinci, e até com Edgar Alan Poe.
E aconteceu, no início desse ano, com João e Maria.
Pois é. João e Maria.
Os irmãos da fábula dos Grimm, que são abandonados na floresta por seu pai, um lenhador pobre sem condições de sustentá-los. Esperto, João deixa uma trilha de migalhas de pão para poder voltar, mas a trilha é comida por pássaros, o que faz com que os dois se percam.
Famintos e sozinhos, eles encontram uma casa feita de doce, mas assim que começam a comer a deliciosa moradia, são aprisionados pela bruxa perversa que lá vive e, após passarem maus bocados sendo engordados pela vaca maléfica para serem comidos, a enganam e conseguem escapar após jogá-la no forno onde ela pretendia assá-los.
Essa história é mostrada brevemente na introdução do filme. Que já deixa bem óbvia sua nova roupagem quando, após prenderem a bruxa no forno, Maria pergunta "Está quente o bastante agora, vadia?".
Os anos correm, e João e Maria crescem, fazendo carreira como caçadores de bruxas.
Os irmãos vagam pela Europa perseguindo e exterminando essas feiticeiras medonhas, salvando crianças, fazendo fortuna e fama como os melhores em seu ofício.
Esse caminho os leva até a cidade de Augsburg, na Alemanha, onde o desaparecimento de onze crianças está deixando os moradores em polvorosa e apavorados com a ideia de que bruxas estejam por trás dos sequestros.
De cara, João e Maria, já crescidos, famosos e fodões (com as caras do gavião-arqueiro Jeremy Renner e o rostinho lindo e o corpaço gostoso de Gemma Arterton) impedem que uma jovem, Mina (Pihla Vitala), seja queimada em praça pública como bruxa. Eles são contratados pelo prefeito para desvendar o mistério e resolver o caso, a tarefa, porém, pode ser mais complicada do que eles imaginam, conforme suas investigações revelam que um importante evento se aproxima para as bruxas na forma de um eclipse lunar, e que uma grande bruxa negra (Famke Janssen, bonitona) pode ter mais interesse na presença deles do que eles imaginam.
Conforme tu deve estar se perguntando após ler essa breve sinopse, Não.
Não é bom, mesmo.
João & Maria: Caçadores de Bruxas está muito mais pra Van Helsing de Stephen Sommers do que pra Sherlock Holmes de Guy Ritchie.
O filme, apesar de contar com um elenco interessante, com atores talentosos e ter bons efeitos visuais e não abrir precedente pra sangreira (Tem muito sangue no filme. Desmembramentos, decapitações, gente sendo apunhalada, fatiada e tendo ossos quebrados), não empolga.
O roteiro escrito por Tommy Wirkola, também diretor do longa, é rasinho, rapidinho, e pobre pra explorar mesmo as boas ideias que apresenta, como a diabetes desenvolvida por João, enquanto era forçado a comer doces pela bruxa da infância, que é apresentada, deixada de lado, e então volta no desfecho, só pra adicionar um pouquinho mais de drama à coisa toda.
Personagens como o delegado Berringer vivido pelo bom Peter Stormare são subaproveitados, os irmãos têm um fã chato na cidade, amores surgem e acabam sem que tenhamos chance ou tempo de nos importarmos e, pra piorar, aparece até um troll chamado Edward com uma cabeçorra animatrônica que não convence ninguém.
Não se pode nem dizer que de boas intenções o inferno está cheio, pois a intenção do filme é bem óbvia: Se aproveitar de uma audiência que não é capaz de prestar atenção em duas horas de filme.
Não é horrível, mas é honestamente ruim. Assista se estiver muito curioso, se não for o caso, espere chegar à TV a cabo.

"Eu e minha irmã... Nós temos um passado. Quase morremos nas mãos de uma bruxa. Mas esse passado nos tornou mais fortes. Nós tomamos gosto por sangue. Sangue de bruxa. E não paramos desde então."

quarta-feira, 29 de maio de 2013

Dança Folclórica Polonesa



Haviam acabado de apanhar os ingressos para o evento que ela queria assistir. Ela alinhada, de blazer de couro marrom, camiseta branca, jeans de grife bem cortado e botas de salto alto, ele desleixado, de agasalho do Capitão-América, camiseta preta, jeans largo e tênis branco.
Sentaram-se nos banquinhos de pedra do pátio em frente ao teatro. Ele olhou o ingresso que tinha na mão e resmungou coçando a barba:
-Não acredito que eu vou deixar de ver Velozes & Furiosos 6 pra isso...
-Ai, criatura, eu te disse que vou ver Velozes 6 contigo, depois... Esse filme vai ficar meses em cartaz o espetáculo é só hoje. - Ela retrucou, alisando a calça. -Além do mais tu não te cansa, não? Toda a semana é cinema, cinema, cinema... Varia um pouco. Hoje vai ao teatro, amanhã vai a um show... Muda, experimenta.
-E nem sequer é uma peça. É um espetáculo de dança... Eu tô indo ver um espetáculo de dança... Com entrada franca, claro, porque ninguém paga pra ver espetáculo de dança. Não tem explicação um lance desses... Eu pago teu ingresso no cinema, vamos lá, ainda dá tempo. O shopping é pertinho...
-Quer ir pro cinema, vai. Eu vou ver meu espetáculo sozinha. Show de dança folclórica polonesa. Quantas vezes se tem chance de ver isso aqui em Porto Alegre? - Ela perguntou, esticando as pernas intermináveis pra frente.
-É... É uma oportunidade única... - Ele replicou, desanimado demais até pra expressar sarcasmo.
Ela suspirou:
-Sério, Ned... Se tu vai resmungar e ficar emburrado a noite inteira, então eu realmente prefiro que tu vá ver Velozes & Furiosos 6.
-Eu paro de resmungar ou paro de ficar emburrado, as duas coisas, não rola.
Ela chegou a ensaiar um sermão, mas ele riu e se endireitou no banco. Viram as pessoas passando em direção à bilheteria. Ele pensou em dizer que estava se armando uma festa estranha com gente esquisita, mas evitou. Quando olhou pra ela, viu que ela estava olhando pra ele, mas desviou o olhar assim que ele virou. Ele franziu o cenho:
-Que foi, alemoa?
-Nada. - Ela respondeu, rápido.
Ele insistiu:
-Quê é que foi...
-Nada, já disse...
-Olha... Eu já tô com minhoca que chegue na cabeça, Didi. Me fala.
Ela olhou pra ele de soslaio, esfregou as mãos e disse num meio sorriso:
-Faz a barba, pelo amor de Deus?
Ele riu.
-Por que? Minha barba tá te incomodando?
-Ai, Ned... Não tá incomodando... Mas... Sei lá.
-Ah, bom. Agora faz sentido...
-Não, tá... Tu parece um sem-teto. Pronto, falei.
Ele riu de novo, agora bastante, até quase chegarem-lhe lágrimas aos olhos:
-Um sem-teto?
Ela não respondeu. Ele continuou rindo.
-Mas como assim, um sem-teto?
-Ai, não sei. Parece um mendigo. Essa barba cheia de falha... - Ela desenvolveu, sem olhar direto pra ele.
Ele recuperou o fôlego:
-Pôxa... Minha barba do Keanu Reeves...
-Tem um motivo pro Keanu Reeves não usar barba em praticamente nenhum filme, queridinho...
-Ele usa barba em O Homem Duplo!
-Nesse filme ele é viciado em drogas.
Os dois riram. Começaram a aparecer mais pessoas do lado de fora do teatro esperando a abertura da sala. Ele suspirava, limpando os olhos após cessar o ataque de riso.
Ela tomou fôlego, limpando embaixo do olho enquanto abria a boca pra esticar o rosto sob os olhos pra não borrar o rímel. Perguntou:
-Isso tem a ver com ela?
-O quê? A barba? - Ele inquiriu, sem certeza de ter entendido.
-É. É alguma coisa relacionada com ela?
-Não... Não acho que seja... Porque seria?
-Sei lá...
-Pra quando eu me olhar no espelho ver uma cara diferente da que eu tinha quando perdi o amor da minha vida?
-Tu não perdeu o amor da tua vida. Dispensou... É diferente. - Ela recriminou.
-Não... Não dispensei... - Ele afirmou.
-Como se categoriza o que tu fez, então? - Ela perguntou, se endireitando.
-É... É uma... É o melhor pra ela. Ele e eu não tínhamos mais futuro. Ela não era mais capaz de confiar em mim. Eu fiquei magoado. Quando isso acontece eu guardo rancor... Nossa relação tava condenada. Ela vai estar melhor com outra pessoa. Alguém em quem ela possa confiar. Que não omita coisas importantes dela pra tê-la por perto. Que não tenha sido sinônimo de perrengue na vida dela. Que não cause repulsa na mãe dela... Em cada esquina tem um sujeito melhor que eu pra ela. E todos querem ficar com ela porque nenhum deles é burro.
-Ai, Rodrigo... Olha...
Ele a encarou surpreso. Ela nunca o chamava pelo nome. Ela continuou:
-Tu... Eu não sei onde isso começa. Um dia vou querer analisar uma lista completa dos teus namoros e ver onde a coisa começa a degringolar...
-Vai ser uma lista curta...
-É... Ao menos vão ser menos dados pra analisar... Sério. Não sei o que tu tem na cabeça... Vocês... Tu e ela, vocês tinham que ficar juntos. Tinham, não. Têm. Vocês têm a obrigação moral de ficarem juntos.
Ele riu, mas ela continuou, muito séria:
-Tô dizendo. Sabe... A gente vê essas comédias românticas... Esses filmes tipo Simplesmente Amor, Sintonia de Amor, Mensagem pra Você... E tá, a gente vê, acha bonitinho, dá risada, e quando termina a gente fica com raiva e pensa: "Nah... Não existe isso." Imagina que esse mundo de desencontro ia acabar num casal ficando junto? Ninguém ia ter paciência pra esperar pelo outro, e se um tivesse o outro não teria.".
Ela botou a mão no braço dele.
-E aí, vocês têm isso. Vocês conseguiram um roteiro de comédia romântica que terminou com o casal junto. Feliz. Esperando um pelo outro e... Sabe? Me indigna vocês, vocês, não, tu, me indigna tu deixar isso acabar.
Ele suspirou, apanhou a mão dela e deu um beijo, então, enquanto a acariciava disse:
-Tem coisas dessa história que tu não sabe... Que eu não posso te contar. Mas que mostram que eu não sou uma presença positiva na vida dela. Confia em mim... Ela tá melhor sem mim.
Ela recolheu a mão e perguntou:
-E tu? Tu tá melhor sem ela?
Ele sorriu, olhou o movimento e disse:
-O teu espetáculo de dança folclórica vai começar.
E eles entraram pra ver uma hora e meia de gente feia participando de um espetáculo de dança chato pra caramba. E não se falou mais no assunto de modo que ele não teve que responder:
"Eu não existo mais sem ela."

terça-feira, 28 de maio de 2013

Resenha Game - Max Payne 3



Eu não joguei, ao menos não profundamente, os games anteriores da série Max Payne. Em meados de 2004, ou 2005, um grande amigo meu, ao instalar o sistema operacional do meu primeiro computador pessoal, deixou no meu HD o primeiro Max Payne.
Dei uma olhada por cima no game, joguei brevemente, mas a verdade é que não tive paciência tanto para o game, com gráficos muito feios pra quem se acostumara à beleza dos games publicados para o Game Cube, meu videogame na época, quanto para a tarefa de jogar no teclado, algo além da imaginação para alguém com uma coordenação motora tão ruim quanto a minha.
Não joguei Max Payne 2. Nem sequer sei como o game se parece.
Então foi estranho pra mim, jogar esse Max Payne 3. Uma sequência, óbvio, dos dois games anteriores.
Acabei comprando o jogo numa promoção, baratinho, e encarei o desafio de fazer um pouco de pesquisa antes de começar a jogar.
Max Payne, o personagem título, é um ex-policial de Nova York que se envolve em uma série de problemas e caçadas humanas após o assassinato de sua esposa e filha.
Max é viciado em analgésicos e alcoólatra, é um tipo durão, com senso de humor rascante como sua voz, muito cínico e um dedo de gatilho nervoso.
Isso é o básico.
Saber que ele teve problemas em Nova York e mexeu com os tipos errados, o que custou uma série de atentados contra a sua vida, no entanto, em nada ajuda a entender o começo desse Max Payne 3, que se inicia com um Max careca e todo arrebentado apontando uma arma para um sujeito que agoniza no chão em frente a um armazém em chamas.
Mas aí o game volta no tempo alguns dias e nos mostra Max vivendo em São Paulo.
Isso mesmo, São Paulo, Brazil.
Na capital paulista Max trabalha como segurança particular do rico empresário Rodrigo Branco ao lado de seu amigo Raul Passos.
Parece um trabalho tranquilo, tomar uns drinques enquanto afasta os pobres dos ricaços, mas só parece. Max percebe que há mais em sua nova função do que apenas isso quando o grupo criminoso Comando Sombra invade um coquetel beneficente de Rodrigo e tenta sequestrar o empresário e sua esposa, Fabiana.
Max impede os sequestros, mas isso não impede os bandidos de tentarem novamente.
Alguns dias mais tardes o Comando Sombra ataca de novo, e desta vez, sucede em seu intento, levando Fabiana.
O sequestro segue a cartilha tradicional, carta com recortes de revistas e pedido de resgate de três milhões de dólares. Data e local de entrega do dinheiro marcados, Max e Raul vão fazer a entrega.
Durante o pagamento do resgate, no entanto, algo dá errado, e é quando Max se vê em meio à uma conspiração que se estende por todos os âmbitos da sociedade paulistana, numa teia sinistra que parece capaz de engolir todos a seu redor.
Max Payne 3 é um bom jogo. Não é o espetáculo narrativo e técnico de Red Dead Redemption nem a história sensacional no mundo inacreditável de Grand Theft Auto IV, ainda assim, trata-se de um policial noir em pixels bem interessante, além de um third person shooter competente.
A ambientação, uma São Paulo genérica, essencialmente uma metrópole terceiro-mundista que deve ofender os paulistanos mas que serve pra quem não conhece a cidade ou não liga pra ela, funciona. Os arranha-céus com coberturas, as danceterias com heli-ponto e os sushi-bares sofisticados contrastando com o cinza morto dos subúrbios, periferias e as favelas quilométricas e sombrias que criam o cenário perfeito pros gringos se esbaldarem com o exotismo perigoso de uma "Bagdá de fio-dental".
O trabalho de dublagem dos personagens americanos é bem competente, especialmente o do protagonista, os personagens brasileiros(Que estranhamente conversam entre si em inglês a maior parte do tempo), no entanto deixam um pouco a desejar nos diálogos, cheios de dubladores americanos falando um português meio sem-vergonha. Até o locutor das inserções do canal Fox está no game. Melhores são as vozes da bandidagem rasteira, falando palavrão e xingando (Sempre causa risos ouvir "Quié isso, caralho?" e "Vou te matar, seu arrombado" enquanto o tiroteio come), alguns até com aquele sotaque de automobilista típico dos paulistanos.
Os gráficos são muito bons, mas não ótimos. No mesmo nível de Red Dead Redemption, mas num mundo menos vivo que o do faroeste de dois anos atrás.
A despeito das boas qualidades, Max Payne não me convenceu como a propaganda da crítica especializada alardeava. É um bom game, mas apenas isso.
Bom.
A Rockstar ainda é melhor fazendo sandboxes do que em games mais lineares. Ainda assim, deve distrair até a chegada de GTA V.

"Meu juízo é uma porcaria, mas minha mão é firme."

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Rapidinhas do Capita



E veja só... Homem de Ferro 3, turbinado pelo preço mais alto dos ingressos do (desnecessário) 3-D, entrou no rol dos filmes mais rentáveis da história do cinema (sem correção inflacionária). Robert Downey Jr., Shane Black e Gwyneth Paltrow fizeram jus à fortuna de Tony Stark e alçaram o longa estrelado pelo vingador dourado à quinta colocação do ranking, superando filmes como Transformers 3, Piratas do Caribe 2, 007 - Skyfall, O Cavaleiro das Trevas Ressurge e O Senhor dos Anéis - O Retorno do Rei e a menos de duzentos milhões de distância de Harry Potter e as Relíquias da Morte - Parte 2.
Com o filme fazendo dinheiro em diversas partes do mundo, não será surpresa se os jatos plantares do ferroso o alçarem à quarta colocação nas próximas semanas.
Nada mau pra um filme que causou tanta celeuma entre os fãs hardcore.

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Paul Giamatti, que vai interpretar o Rhino em O Espetacular Homem-Aranha 2 já havia aparecido em fotos das gravações com pinta de mafioso russo, cheio de tatuagens, cabeça raspada e agasalho esportivo, além de uma cuequinha de rinocerontes.
Ontem surgiram na internet imagens do Rhino após a sua transformação!



Meio sem graça, né? Pois é. O Rhino será gerado por computação gráfica, então não tem muito o que ver antes da pós-produção colocar o vilão em cima disso aí.
Fica a dúvida:
Rhino será uma criatura híbrida, como o Lagarto do primeiro filme, um sujeito dentro de um traje mecânico tecnológico como a versão Ultimate do vilão, ou seguirá o visual clássico dos quadrinhos tradicionais e será um sujeito grandalhão dentro de uma couraça?
Vamos esperar.
Ah, um Rhino híbrido deu as caras no game do filme O Espetacular Homem-Aranha. Lá era um rinoceronte que recebia genes humanos, ao contrário do Lagarto, um humano com genes reptilianos...

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Ah, mais uma que caiu na web ontem. Andrew Garfield, envergando o aracnotraje mais sensacional já visto fora dos quadrinhos fez a alegria de um fã mirim.
Esse moleque deve ser o piá mais faceiro do mundo por uns bons meses.
Na idade dele, eu teria sido.



O Choque Pelo Choque



Ontem, em Porto Alegre, aconteceu mais uma edição da Marcha das Vadias.
Pra quem não sabe o que é, e não quer cometer o mesmo erro de um amigo meu que, no ano passado, achou que se tratava de um evento das sobrinhas da tia Carmem, a Marcha das Vadias é, na verdade, um protesto contra a violência a que as mulheres são submetidas no Mundo.
Sim, no Mundo, já que a Marcha se iniciou no Canadá, em abril de 2011, quando, após uma série de estupros na Universidade de Toronto, um policial afirmou que as mulheres poderiam evitar crimes semelhantes se não se vestissem como vadias. A declaração, no mínimo infeliz do policial, gerou um protesto com mais de 3 mil pessoas na cidade, e foi o embrião da marcha que se espalhou mundo afora.
Como se pode ver, é claro que o protesto era justificado. Ainda que, pra qualquer ser humano com mais neurônios do que gônadas, deva ser bastante óbvio que uma mulher não deve ser molestada não importa como ela se vista, os números da violência contra a mulher são alarmantes, e o fato de ainda vivermos em uma sociedade machista e patriarcal não ajuda, então, a marcha tem sua razão de ser.
Nas edições seguintes do protesto, em 2012 e nesse ano, juntaram-se à causa original protestos em nome da igualdade entre homens e mulheres, pró-aborto e contra a homofobia.
OK, todas causas igualmente válidas.
As mulheres ganham consideravelmente menos que os homens mesmo desempenhando funções iguais em várias partes do Mundo. As pessoas têm direito de escolher o que acontece em seus corpos, e homofobia é um lance ridículo. Simples assim. Joia.
Agora... Têm coisas dentro desse protesto com ideias muito válidas, que simplesmente não me entram na cabeça.
A principal delas?
A necessidade de chocar que a maioria destes grupos citados têm. Francamente... A causa é válida, o protesto legítimo, a passeata legal, então pra quê realizá-la seminu?
Por que homens crescidos, de barba na cara passam batom para participar do evento? Porque há adultos com frases de ordem escritas na barriga envergando shortinhos jeans? Porque mulheres mostram os seios e escrevem neles que "não é um convite"?
Essa vontade incontrolável de "causar" (que aliás é um termo que eu abomino...) é tão besta. Tão rebeldia de almanaque...
Buscar seus direitos, buscar aceitação, reclamar do que está errado, tudo isso é importante, é uma maneira concreta de firmar identidade e encontrar seu espaço no mundo, mas o modo como se faz isso, é tão importante quanto o objetivo, pois dois errados não fazem um certo.
Confesso que sem me considerar homofóbico nem sexista, acho que o lance todo, que surgiu como uma boa ideia, descamba pra uma tremenda palhaçada.
Aliás, acho um desserviço.
Mostrar os seios a roupa de baixo enquanto esconde o rosto e grita palavras de ordem e mostra dizeres em favor de igualdade e contra a violência, intolerância e coisificação da mulher escritos no corpo seminu, pra mim pessoalmente, é dissonante.
Fazer barulho e reclamar é muito válido, chocar por chocar, é ridículo, ineficaz e, pior de tudo, apelação.

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Quadrinhos: Homem-Aranha - Tormento



Como eu falei no review da excelente Marvel Knights: Banner, a Panini entrou numas de relançamentos em edições encadernadas.
As edições, com papel de qualidade no miolo e capa em papel-cartão, todas por menos de vinte reais, trazem histórias interessantes em republicações caprichadas.
Minha última incursão à banca de jornal me rendeu a supracitada história do Hulk e essa de que vou falar na postagem de hoje:
Homem-Aranha - Tormento.
Na trama de Tormento, o Lagarto inicia uma onda de assassinatos em Nova York, o que o coloca na mira do Homem-Aranha. O herói acaba encontrando a criatura, e a esse encontro seguem-se lutas brutais e violentíssimas do sobrinho preferido da tia May contra o alter-ego reptiliano do doutor Curtis Connors, nessa trama, um mero peão nas mãos de Calypso, uma xamã africana com um passado em comum com Kraven, o Caçador, inimigo do Homem-Aranha que após anos de humilhantes derrotas acabou cometendo o suicídio.
Tormento, arco de histórias que foi publicada nas cinco primeiras edições da revista Spider-Man no ano de 1990, foi um marco na História dos quadrinhos.
O lançamento da primeira edição da revista, turbinada por uma série de estratégias de marketing, como capas variantes e papel de qualidade superior nas primeiras edições, alcançou estratosféricos dois milhões seiscentas e cinquenta mil cópias vendidas, um recorde.
A história também marcava a estréia de Todd McFarlane nos roteiros. O canadense era desenhista de longa data de Homem-Aranha no título The Amazing Spider-Man, onde colaborava com o escritor David Michelinie e, em suas próprias palavras, assumiu o papel de roteirista pra ter maior controle sobre o que desenhava.
Isso fica bastante claro em Tormento. O roteiro é, parafraseando "desastrado, pretensioso e carece de sofisticação".
O quadro inicial, com o Homem-Aranha se balançando estilo McFarlane, com as pernas em posições inumanas e as teias do uniforme microscópicas é até bonito, mas o texto nos recordatórios ao redor, chega a ser constrangedor. Também constrangedor é a repetição da frase "Estar Acima de Tudo" nos quadros que iniciam e encerram cada capítulo, no que parece um pastiche doloroso dos primeiros e últimos quadros de cada página de A Piada Mortal do Batman, publicada dois anos antes... Tudo seria perdoado se a arte de Todd McFarlane fosse grande coisa, mas a verdade é que, apesar do dinamismo dos quadros do artista, ele simplesmente não parece entender nada de anatomia. Os braços e pernas dos personagens são, respectivamente, muito curtos e muito compridos. Os narizes ocupam rostos inteiros, coxas ficam grossas como troncos de árvores quando pernas estão flexionadas... Pra piorar, o desenhista se perde na quantidade excessiva de hachuras e rebuscamentos, arte-finalizar e colorir seu trabalho deve ser um pesadelo. No primeiro ataque do Lagarto, num quadrinho ao pé da página, o vilão está sem cauda. Na página 112 existe uma imagem do Lagarto pendurado em correntes que é tão mal construída que arte-finalista e colorista se perdem no acabamento do quadro de uma forma que é difícil entender o que está havendo, isso pra ficar só em um par de quadros particularmente flagrantes.
Tormento deu início ao conceito de fazer quadrinhos que originou aberrações como a IMAGE, o grande trabalho de autor independente que invadiu o mainstream com layouts abusados, mulheres com pernas de três quilômetros e desenhos cheios de hachuras cruzadas sem nenhum roteiro que desse lastro àquele monte de rabiscos, talvez por isso eu tenha particular desprezo pela revista.
A Panini atrasou o lançamento da edição, teria feito sentido no ano passado, aproveitando o fato de que o Lagarto era o vilão do bom O Espetacular Homem-Aranha (embora a encarnação muda do monstro em Tormento tenha levado muito imbecil a reclamar do vilão falando e tramando no filme...), esse ano, além de A Morte de Jean DeWolffe, a Panini podia republicar A Guerra de Gangues, Homem-Aranha: Azul, A Última Caçada de Kraven, ou uma compilação de histórias seminais do cabeça de teia... Todas essas seriam pedidas mais interessantes que Tormento. O registro histórico do momento em que a forma suplantou o conteúdo.

"Seu nome... Homem-Aranha! Seus poderes... Extraordinários! Sua teia... Fabulosa!"

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Rapidinhas do Capita



-E ela me agradeceu. Me agradeceu por pensar nela com ternura... Que bobagem... De que outra forma eu poderia pensar nela? De que outra forma eu poderia pensar na pessoa que me mostrou, por A + B que sim, amor é um lance plausível? Que tudo o que eu escrevia em tom de utopia podia ser verdade? Que a verdade estava lá fora, conforme dizia Fox Mulder, e era boa pra caramba? ...Não. Não tinha nada além de ternura com que eu pudesse ligá-la a mim.
Ele disse tudo isso e continuou olhando pra frente. Com o livro na mão. Ela, a seu lado, com os DVDs no colo pigarreou:
-Bom... Tu deixou bem claro que ela tinha te magoado...
-E tinha, mesmo... Direta e indiretamente... Aquele lance da gente... Da desconfiança e tal... As mensagens da mãe dela, dizendo que eu não era bom o suficiente, que não era homem bastante pra ela... Aquilo me magoou. Mas eu também magoei ela e os sentimentos dela por mim não pareceram ter mudado... Que direito eu tenho de ficar com raiva dela por qualquer coisa exceto acabar com o meu amor perfeito?
Ela sorriu, passou a mão no ombro dele e perguntou:
-E agora?
-Agora nada... Acho que ela sentiu aquilo como um exorcismo. Libertou ela, sabe? Entender que eu não tenho nenhuma raiva dela. Que ela ainda é o Neo da minha Matrix e sempre vai ser...
-Tu sabe que eu não entendo essas referências...
-Herege... O Neo era O Escolhido.
-Ah.
-Enfim... Acho que ela precisava disso pra seguir adiante, sabe? Esse entendimento.
-E tu?
-Não... Eu não. Eu já tinha esse entendimento. Já vivi o amor da minha vida. Não tenho pra onde tocar o barco. Não tenho adiante pra seguir.
-E o que tu vai fazer, então?
-O de sempre. Vou ficar quietinho. Vou ficar na minha. E vou ser testemunha. Já fui mártir que chegue.

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Henry Cavill, o novo dono do colante e da capa vermelha do Superman, disse em entrevista sobre o que gostaria de ver em um encontro do seu Homem do Amanhã com o Cavaleiro das Trevas no cinema.
O ator britânico gostaria de mostrar as diferenças essenciais entre o último filho de Krypton e o Homem-Morcego:
"Penso que seria interessante esse conflito clássico entre o Batman e o Superman pois eles são faces diferentes da mesma moeda e seus métodos são completamente diferentes. Acho que seria bom explicar em primeiro lugar, o motivo pelo qual eles se encontram e como. Acho que seria uma ótima história."
A possibilidade do tal encontro acontecer, porém, ainda está apenas no plano das possibilidades remotas, e Cavill, embora esperançoso, sabe.
"Quem sabe. Tenho certeza que existem todos os tipos de ideias passando pela Warner Bros. agora".
Superman, que estréia dia 14 de junho nos EUA e quase um absurdo mês depois, em doze de julho, aqui no Brasil, pode decidir o destino da Liga da Justiça no cinema, já que a bilheteria do escoteiro azulão deve servir de termômetro para os planos da DC após o fiasco de Lanterna Verde.

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Power Ranger completou vinte anos!
Isso mesmo. O primeiro (que eu me lembre) super sentai binacional da história do entretenimento faz vinte invernos e eu posso dizer, sem medo de estar sendo injusto, que não dava pra largada com Changeman.
Ainda assim, Power Ranger fez uma legião de fãs, e mesmo eu, que achava a série uma porcaria sem tamanho, ainda hoje uso termos como "megazord".
Onde andam os rangers?
O ranger verde/branco, virou lutador de MMA.
O ranger preto foi preso dirigindo embriagado e agora é dançarino profissional.
A ranger rosa (pra mim uma beleza superestimada...) continuou na TV e atuou na série Flashpoint.
O ranger vermelho virou paramédico (imagina que legal, sofrer um atropelamento e ser salvo pelo ranger vermelho?).
A ranger amarela morreu em um acidente em 2001.
E o ranger azul... Bom, o ranger azul assumiu que era gay em 2010 e hoje em dia é ginasta...
Pois é, o azul. E depois dizem que eu faço perseguição...


Quadrinhos: Marvel Knights - Banner



A Panini colocou as manguinhas de fora, tomou tendência, e vendo que praticamente tudo o que é publicado pela Marvel e DC lá fora hoje em dia é lixo puro, resolveu republicar material de qualidade em edições encadernadas bonitinhas com preços acessíveis.
Recentemente saíram Homem-Aranha: A Morte de Jean DeWolffe, Homem-Aranha 2099, Dr. Destino & Dr. Estranho - Tormento e Triunfo (que eu ainda estou procurando...), e ontem passei pela banca e me deparei com Homem-Aranha: Tormento e esse Marvel Knights: Banner, mini-série em quatro edições com a espetacular história definitiva do Hulk pela pena de Brian Azzarello e o lápis de Richard Corben.
Em Banner nos deparamos com o Hulk sendo perseguido pelo exército após um ataque do gigante esmeralda à uma cidade do Novo México.
Pra variar, em meio ao caos, à destruição e à contagem de corpos, encontramos um físico nuclear nanico e magrelo pelado assistindo atônito à imagem da tragédia que passou pelas suas mãos.
É Robert Bruce Banner.
Atormentado pelo desejo de dar fim à maldição que o transforma na mais letal arma já construída pela humanidade, Banner também está no radar do exército, que com uma equipe idealizada pelo general Thunderbolt Ross e liderada por Leonard Samson, outra cria da radiação gama, planeja dar fim à trilha de destruição do monstro à sua própria maneira.
Seminal é o mínimo pra se dizer dessa história.
Em tempos de reinvenções malucas, sagas acapachantes que mudam tudo o que você pensava saber por dois meses e layouts abusados cheios de efeitos digitais, Banner vai na contramão, com um roteiro simples, redondinho, que não inventa nada, apenas lança um novo olhar sobre uma faceta bastante marcante do Hulk: A maldição de Bruce Banner.
Tudo o que uma pessoa precisa saber a respeito do Incrível Hulk está nas cem páginas dessa edição.
O tormento pelo qual Banner passa a cada transformação e reversão, o poder e a loucura do golias verde, a visão que o exército tem da criatura e a melhor interpretação que um autor já fez de Doc Samson... Está tudo lá.
O roteiro de Brian Azzarello (do genial 100 Balas) deposita sobre os ombros de um sujeito frágil o peso da destruição em massa causada pela criatura mais forte da Terra, levando Banner e o leitor à uma jornada sombria até os limites do desespero de um homem alquebrado física e emocionalmente.
A arte do gigante Richard Corben, por sua vez, é exatamente isso:
Arte.
Cada quadro transpira personalidade, expressão. Arte da boa, na acepção da palavra, dando cor e forma às palavras de Azzarello numa dobradinha que merecia ser mais repetida.
Papel de qualidade no miolo, capa de papel cartão, preço módico de dezessete mangos e cinquenta centavos e tá feita a alegria de um nerd que curte boas histórias e lombada bonitinha na estante.
Parabéns à Panini pela iniciativa. Essas reedições têm me mantido lendo gibis.

"E eu me lembro de acordar no chão... E a cidade havia desaparecido."

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Resenha Game: Tomb Raider



Pois é, criaturas... Não bastasse a crise criativa que anda transformando o cinemão mainstream num festival de franquias e remakes, agora parece que a tal da crise chegou aos consoles de videogames.
Lara Croft, personagem principal da série Tomb Raider vinha aparecendo regularmente no calendário de lançamentos de video games desde 1996, ano em que foi lançado o primeiro game Tomb Raider, se tornou ícone pop, personagem de filme com a cara da Angelina Jolie, mais rentáel e influente personagem feminina de videogames, e protagonista de algo em torno de dezesseis games entre consoles de mesa e portáteis de desenvolvedoras diversas.
Mas aparentemente até mesmo a condessa de Abbingdon encontrou limite pra onde sua popularidade poderia levá-la, e nesse ano de 2013, Lara ganhou, vejam só, um reboot.
Em Tomb Raider nós estamos no comando de uma Lara com dezessete aninhos, a bordo do navio Endurance que ruma para o Triângulo dos Dragões, na costa japonesa, em busca, claro, de uma civilização perdida.
Antes de chegarem a seu destino, porém, o Endurance de Lara segue os passos do Endurance de Ernest Shackleton, e naufraga durante uma violentíssima tempestade jogando a tripulação chefiada por Conrad Roth, seu mentor e amigo do falecido Richard Croft, pai de Lara, em uma ilha misteriosa na costa leste do Japão.
Separada da tripulação, Lara se vê sozinha em um ambiente hostil, repleto de armadilhas, e animais selvagens, e é posta a prova ao se ver cercada de fanáticos religiosos e mercenários russos enquanto, ferida e faminta, luta para sobreviver.
É bem bacana esse Tomb Raider.
Confesso que nunca fui um fã da série. Não sei se é machismo de minha parte, mas em geral, heroínas não funcionam muito bem pra mim, à exceção das Meninas Super Poderosas e da Samus de Metroid. Sempre achei a Lara Croft uma personagem bobinha. Aquela mina peituda com duas pistolas e habilidades acrobáticas de Cirque du Soleil e nenhum senso de perigo ou respeito pela vida jamais me cativou, de modo que, se joguei Tomb Raider alguma vez, foi na casa de amigos meus ainda na época do Playstation 1.
Teria passado batido por mais essa edição das aventuras de Lady Croft se não fosse ter encontrado o game por um preço muito convidativo numa promoção do submarino.com, e confesso, não me arrependi do investimento.
Nessa nova versão, somos apresentados à uma Lara Croft que ainda dá seus primeiros passos no mundo da exploração, ela titubeia, faz besteira e se dá mal, hesita antes de tirar vidas (Dá um nó no estômago matar o primeiro gremis- digo, veado, no segundo capítulo do game), e esbarra em todo o tipo de percalço que uma jovem perdida sem nenhum equipamento (Por melhor treinada que seja...) poderia encontrar num terreno estranho e feroz. A humanização faz maravilhas pelo carisma da personagem, que, por mais gostosa que fosse, estava anos-luz atrás de gente como Indiana Jones e Nathan Drake.
Tomb Raider mistura elementos de mundo aberto (meio aberto, vá lá...), RPG, plataforma e exploração, além de combate armado com uma pontaria livre (sem o sistema de lock-on) que ás vezes faz o player mais enferrujado, como eu, gastar dez balas pra matar um único mercenário inimigo, além de alguns puzzles pobrinhos e um sistema de evolução de habilidades eficiente e sem floreios, tudo isso com uma jogabilidade simples e intuitiva, que cai como uma luva pra qualquer ser vivente com cinco dedos em cada mão.
Os gráficos do jogo estão excepcionais, tanto na protagonista (uma Lara ninfeta, gostosérrima) quanto nos personagens secundários e nos belíssimos cenários. O som é ótimo, a dublagem competente, e a música, discreta, o que significa que não é espetacular, mas não é ruim a ponto de destoar do conjunto.
Em suma?
Tomb Raider é um jogo muito bom, que certamente vai ocupar o tempo do player por boas dez ou quinze horas entre campanha principal e objetivos secundários.
Vale muito a pena.

"Eu finalmente me preparei para deixar minha marca. Encontrar aventura. Mas ao invés disso, a aventura me encontrou."

terça-feira, 21 de maio de 2013

A Trunfo de Mina



-Mina Gambetti Stock.
Era assim que a Mina se apresentava. Mina, obviamente não era um nome. Era um apelido. Um diminutivo.
Infelizmente não era o diminutivo de nada maneiro como Wilhelmina, como em Drácula, nem de nada tradicional como a tradução, Guilhermina... Não... O "Mina" de Mina estava ali para ocultar Firmina.
Não parece um mau nome, eu sei. Especialmente se tu for uma avó da colônia com cabelos encanecidos, 73 anos de idade que ordenha vacas, cozinha bolos e bate manteiga com o próprio punho. Se tu é uma moça da cidade e experimentou as agruras do ensino público e um bullying que ainda nem tinha esse nome mas cujas vítimas já sabiam o que significava, então Firmina podia ser um pesadelo.
Por triste que pareça, a Firmina não tinha no R.G. o pior momento da sua existência.
A Mina era feia, tadinha. Há quem diga que nenhum jovem vivaz é feio. Mentira. Há centenas, milhares de jovens vivazes feios.
Mina, do auto de seus vinte e seis anos, era uma moça muito feia. Descendente de alemães e italianos, conseguira o pior de ambas as ascendências. Sim, porque se há moças muito bonitas na Alemanha e há moças lindíssimas na Itália (Dê uma olhada nas seleções nacionais de vôlei feminino desses dois países se não acredita em mim), não é menos verdade que há canhões e buchos em número igual ou até maior...
Mina tinha a porção pior de alemães e italianos. Lábios finos em uma boca estreita cujos cantos apontavam pra baixo. Maxilar quadrado e ligeiramente projetado. Nariz adunco, apontando direto pra boca, e olhos que, se tinham uma linda cor, um verde mar do caribe algo azulado, eram feios, com os cantos externos caídos. O cabelo, pouco e liso, totalmente sem graça, castanho bem claro, e um par de orelhas que poderiam ser usadas como chinelos por moças de pés normais.
Não bastasse isso, a Mina tinha uma mãe que, como toda a mãe, pegava no pé da filha, dona Edna. A Edna era dessas pessoas que não fazem de propósito, mas que parecem, a cada frase querer destruir a auto-estima da filha. Tudo o que a Mina fazia era errado, o emprego dela era ruim, o apartamento dela era bagunçado, o gato dela era antipático, ela não conseguia segurar um homem... Pra piorar sempre comparava a vida de Mina à vida dos irmãos, Miguel, que também era muito feio, mas era alto, forte e personal trainer, e Otávio, que era um pouco menos feio, e funcionário público concursado, ambos casados com moças de fundamento e com filhos à caminho enquanto financiavam casas próprias pela Caixa Federal. E volta e meia terminava suas críticas à mina com um "Porque tu não podia ser mais como teus irmãos?".
Não era fácil pra Mina.
E ela até queria, ser mais esperta, como eram os irmãos. Não que fosse burra, não era. Mas não tinha aquela fome de grana e estabilidade dos irmãos. Também queria encontrar o amor. Um amor de verdade, pra vida inteira. Casar, ter filhos, dedicar parte de sua vida a um lar e à uma família.
Queria mesmo. Mas era complicado. Era complicado porque ela não se sentia pronta, porque era feia e porque ela era constantemente lembrada que não tinha atrativos.
Mas a Mina tinha um trunfo:
Uma bunda linda.
Linda mesmo. Bunda de mulher, não essas bochechas de ferro que mulheres de pagodeiro e dançarinas de palco têm nos dias de hoje e acham muito bonito.
Era uma bunda redondinha, macia, suave aos olhos...
E a Mina, que não era tonta nem nada, não queria viver da bunda, que nem uma Carla Perez da vida, mas sempre que que seu ego fora demasiado enxovalhado, vestia uma calça bem justa com uma calcinha tipo tanga por baixo, e ia dar uma volta na rua.
Era um santo remédio.
Enquanto ouvia gracejos e baixarias à sua passagem, Mina tinha duas certezas:
Sua mãe estava errada quanto à sua ausência de atrativos.
E ela não precisava ter pressa.

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Tudo Dela



"Estávamos os dois no estrado sobre o qual ficava o teu colchão, na sala, posicionado estrategicamente enviesado em relação à TV. Eu estava atirado na transversal, com um travesseiro teu apoiando as minhas costas a cabeça encostada na parede e as pernas jogadas pro meio da sala. Tu estava deitada direito. Pés em direção à porta da rua, cabeça voltada pro lado do sofá-baú. Tua cabeça estava no meu colo, e eu estava acariciando o teu cabelo. Eu sempre gostei de acariciar o teu cabelo, pois quando eu fazia isso se soltava aquele aroma gostoso que eu me acostumei a chamar de cheiro de salão de beleza, e que era pra ser um elogio, mas eu nunca soube ao certo se te chateava por causa da indefinição da tua expressão facial quando eu dizia e da forma veemente como tu me explicava "É só xampu, só. Xampu caro... Mas só xampu.".
Enfim, eu estava acariciando o teu cabelo, e me sentindo particularmente chauvinista por estar te desejando muito além dos cabelos num momento de tanta meiguice inocente. Mas estávamos os dois sozinhos ali, com a TV desligada, nenhum de nós estava lendo, nem parecíamos, baseado na forma como estávamos confortáveis, estar nos preparando pra ir à parte alguma dali a pouco.
Ainda assim, eu refreei meus impulsos, e não tomei a iniciativa de te tocar com nenhuma lascívia nem nada do tipo...
Pra mim sempre foi muito importante que tu soubesse que, embora eu te desejasse inteira, cada milímetro cúbico da tua pele, eu não te via como um objeto sexual... Sexo, pra mim, sempre foi a consequência do resto todo. E por melhor que fosse, pra mim, era uma parte infinitesimal do que havia entre nós. Provavelmente a primeira coisa de que eu abriria mão, se fosse obrigado.
É estranho, eu sei... Mas o sexo, por melhor que fosse, não dava pra largada com as conversas... Com os passeios... Com as risadas, os beijos, e toda a afinidade que nós compartilhamos.
Então, eu continuei te acariciando os cabelos, embora sem conversa, beijos, passeio ou risadas, a ideia do sexo estivesse muito tentadora contigo ali, inteirinha do meu lado, de pernas de fora e toda aquela pele exposta com aquele cheiro doce de coisas que dá vontade de comer e talicoisa...
Eu estava te olhando... Devia estar fazendo uma expressão tipo a que o Willem Dafoe faz pra Kirsten Dunst antes do jantar de ação de graças no apartamento que o Harry e o Peter dividem no Homem-Aranha, porque tu me olhou erguendo bastante as sobrancelhas pra encontrar meus olhos e deu um sorriso bem grande enquanto se virava de lado e se aninhava nas cobertas sobre a cama... O edredom que eu te dei e o cobertor que espalhava as 'bolinhas vermelhas do amor'. Tu se ajeitou de lado, de modo a ficarmos olhando um para o outro. E tu me perguntou:
-Tu vai esquecer de mim, não vai?
E eu sorri com a boca, mas franzi o cenho enquanto virava a cabeça pra deixar bem claro o quanto aquela declaração me deixara confuso. E tu continuou:
-Tu vai esquecer de mim... Eu vou estar longe e tu nem sequer vai lembrar que eu existo.
E aí eu ri... Não uma gargalhada, mas ri, de verdade... Francamente. Eu ri e me endireitei, colocando as costas retas, e te virei de leve, pra poder continuar te olhando nos olhos. E eu disse:
-Tu tem noção de tudo o que tu arruinou na minha vida?
E tu fez uma expressão desconfortável com o rosto... Talvez achando que eu estivesse bravo, mas eu continuei:
-Tu arruinou tantas coisas que eu nem sei por onde começar... Mas eu não consigo mais ler meus quadrinhos favoritos sem pensar em ti. Eu não ouço as minhas músicas sem pensar em ti. Eu não consigo ver filmes de que eu gosto sem pensar em ti. Eu não consigo mais gostar de filmes com James McAvoy e Michael Fassbender porque tenho ciúmes deles, o que significa que tu arruinou X-Men - Dias de Um Futuro Esquecido, pra mim. Tu arruinou meus jogos porque eu ainda jogo como se tu fosse estar lá. Tu arruinou meu futebol porque eu penso se tu também está assistindo ao jogo e fingindo que manja muito de parte tática. Tu arruinou meu videogame porque eu queria que tu estivesse jogando comigo. Tu arruinou meu travesseiro duas semanas por mês, que é o tempo em que ele não está envolto nas tuas palavras, tu arruinou minhas cobertas porque elas não soltam 'bolinhas vermelhas do amor', tu arruinou até mesmo a pornografia porque eu não sei pensar em fazer sexo com mais ninguém, e, em suma, arruinou a minha vida, porque ela não existe se tu não fizer parte dela. Então me diz, minha pequena padawan... Como é que eu posso sequer pensar em tentar te esquecer?
E aí tu sorriu. E eu não precisei me preocupar em parecer chauvinista, pois tu é quem tinha tomado a iniciativa. E eu pude me dedicar a sentir teu gosto e teu cheiro e teu calor ao meu redor... E depois eu dormi sem roupa do teu lado, embora tu tenha ido tomar banho, e voltado cheirosa e limpa, usando um pijaminha de mulher. E eu juro que tentei te esperar acordado, mas não consegui, porque eu pego no sono tão rápido..."
E foi isso que ele disse, que ele escreveu após receber palavras dela após quatro dias sem notícias... Ele esqueceu de dizer que ela nunca o atazanava. Que receber notícias dela jamais seria um estorvo. E que ele tinha outro e-mail, ligado à sua conta do google, e que tinha um skype e que tinha um coração, atrofiado e demolido, mas que ainda era dela... Que sempre seria dela...

sábado, 18 de maio de 2013

Resenha Blu-Ray: Jack Reacher - O Último Tiro



Na madrugada de ontem assisti em um serviço de aluguel digital de filmes à esse Jack Reacher - O Último Tiro., filme que leva ao cinema Jack Reacher, longevo personagem literário criado por Lee Child, e que estrelou 14 livros (Dos quais apenas quatro foram lançados no Brasil), que é desses personagens estilo herói misterioso, durão, frio e imbatível. Ex policial do exército, investigador brilhante, e herói de múltiplas condecorações. A despeito de ser retratado na literatura como um gigante de 1,98 metro, que pesa mais de cem quilos, com cabelos loiros e olhos azuis, em celuloide Jack teve que se contentar com o modesto 1,72m de Tom Cruise, que se esforça pra tornar atraente ao público um personagem que é, na melhor das hipóteses, antipático.
Jack Reacher - O Último Tiro começa com os créditos mostrando a preparação de um franco-atirador. O sujeito fabrica suas próprias balas, alinha seu rifle, e entra em sua van para ir até um prédio de estacionamento.
De lá, ele alveja cinco pessoas a esmo, matando todos, e então foge.
A investigação da polícia, liderada pelo detetive Emerson (David Oyelowo) encontra diversas evidências que apontam para um suspeito óbvio:
James Barr (Joseph Sikora), ex-franco atirador do exército.
Após ser preso, Barr recusa-se a falar. Mas escreve um bilhete onde diz: "Tragam Jack Reacher".
Com a repercussão do caso na mídia, Reacher fica sabendo da prisão de Barr, e imediatamente vai até o suspeito. Ao encontrá-lo, porém, descobre que Barr está em coma após ser atacado por outros prisioneiros.
Inicialmente convencido da culpa do réu, Reacher, que investigou um atentado semelhante cometido por Barr enquanto este servia no Iraque, é convencido pela defensora do ex-militar, Helen Rodin (A gatíssima Rosamund Pike), a descobrir porque seu cliente clamaria pela presença do sujeito que o processou anos antes, no exército.
Começa aí a investigação que levará o caminho de Reacher a se cruzar com uma conspiração recheada de ex-militares, assassinos, policiais corruptos, traficantes e encabeçada por um chefão criminoso conhecido apenas como "O Zec" (O cineasta Werner Herzog).
Como eu disse, a grande missão de Tom Cruise na pele de Jack Reacher, é convencer a audiência a gostar de um personagem que, não só incorre em todos os clichês do anti-herói fodão (Andarilho sem documentos que não pode ser rastreado, briga bem, atira bem, dirige bem, antevê os movimentos dos adversários, não blefa e gera suspiros de todas as mulheres que cruzam seu caminho) como ainda se torna mais antipático porque sabe que é mais fodão que todo mundo. Cruise até sucede. É um intérprete talentoso e esperto, tem um carisma muito evidente, e boa mão pra ação, nesse sentido, a marra de Reacher acaba se tornando um acessório divertido para o personagem anacrônico (Reacher poderia ser o Dirty Harry de Clint Eastwood, ou o Marion Cobretti de Stallone, de tão típica que é a sua verve oitentista).
Christopher McQuarrie, diretor e roteirista do longa segura a peteca no quesito ação, e trabalha com um elenco competente que conta, além de Cruise, Pike (E as pernas de Pike, e os seios de Pike, e o narizinho de Pike, e as sobrancelhas de Pike...), Herzog e Oyelowo, com Richard Jenkins, Jai Courtney e Robert Duvall.
Jack Reacher - O Último Tiro, deve ter sido um bom programa no cinema, mas em casa, com uma Coca-Cola e um Chocolate embaixo das cobertas, fica ótimo. Certamente vale a locação.

"Tem esse cara. Ele é tipo um policial, ou costumava ser. Ele não liga pra provas, não liga pra lei. Só pro que é certo. Ele sabe o que eu fiz. Você não pode me proteger. Ninguém pode."

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Rapidinhas do Capita



Eram quase três da manhã... Ele estava com o celular na mão, sentado no sofá, terminou de escrever e então a leu.
A mensagem dizia:
"É o tipo de coisa que só acontece comigo... Vejo um tremendo filme de super-herói, mesmo usando moletom do um super-herói errado eu estava usando cuecas do personagem certo, ainda troco beijos com o amor da minha vida na cozinha da casa dela, mas, na primeira vez que entro lá, quebro as suas coisas.
Sou ridiculamente memorável, mesmo."
Apertou o botão de enviar, e colocou o celular na mesinha ao lado enquanto olhava a TV, um filme qualquer, não estava prestando atenção.
Após alguns minutos, apanhou o celular, olhou a tela. O aparelho afirmava em letras brancas sobre uma caixa vermelha:
Impossível enviar a mensagem.
Ele nunca acreditou que o universo conspirasse a favor das pessoas, mas certamente tinha uma maneira toda particular de conspirar contra algumas...

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-Amor não dá trabalho. - Ela disse, muito franca, como se realmente acreditasse naquilo.
-Ah, não? - Ele perguntou, sarcástico.
-Não. É que nem... Sei lá... Uma plantinha...
-Peraí, peraí... Eu não sou nenhum gênio da botânica, mas planta, pra vingar, tu precisa semear, adubar, aguar, proteger... Tudo isso dá trabalho, alemoa.
-... - Ela parecia não ter resposta. Ele gostou daquilo. Ela sempre tinha resposta pra tudo. Ele saboreava o momento quando ela tomou fôlego e remendou:
-O amor é como hortelã. Cresce em qualquer condição, sem nenhum cuidado e pode se disseminar por um jardim inteiro se tu não aparar de vez em quando.
"Vaquinha", ele pensou. Pensou, mas não disse.

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Está rolando um daqueles abaixo assinados digitais com uma petição para que a Warner Bros. se comova e Homem de Aço, filme que reboota o Superman nos cinemas não chegue ao Brasil quase um mês após sua estréia nos EUA.

http://www.peticaopublica.com.br/PeticaoVer.aspx?pi=P2013N39462

Eu já assinei, meus irmãos, também, e quem estiver extremamente pilhado de ver o filme com um pouco menos de espaço com relação à estréia americana, pode assinar junto.

Rapidinhas do Capita



Minhas mais sinceras e pesarosas condolências à torcida do time do Humaitá, que ontem acabou eliminado da Taça Libertadores da América.
Todos viram os esforços hercúleos feitos por dirigentes, que adiantaram receitas, pediram empréstimos e se atolaram em dívidas na esperança de, com investimento pesado, sair da seca de títulos de expressão que já dura doze anos, pela comissão técnica capitaneada com paixão por Vanderlei Luxemburgo, que contatou jogadores à revelia da aprovação dos cartolas na esperança de qualificar o grupo e provar ao mundo que não é um treinador caro e ultrapassado, dos atletas, que correram o que puderam e não puderam na esperança de superar a falta de qualidade e vitalidade ou ambos dentro e campo, e especialmente do torcedor co-irmão, que viajou até os limites de Porto Alegre, pagou ingressos caríssimos em um estádio com infra-estrutura duvidosa e qualidade ainda mais, sendo feito de fantoche por uma mídia que se esforça em esconder os problemas na casa (alugada) azul e mantém os olhos desses pobres sofredores vendados para a realidade...
Mas há que se dizer que o time do Santa Fe usou de expedientes reprováveis para ganhar o jogo de ontem e eliminar o tricolor. Medina disse que o intuito do time Colombiano era comer o grêmio.
Golpe baixo, Medina...

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Minhas sinceras e pesarosas condolências também ao Sport Club Curintcha, mano. Descaradamente assaltado no confronto com o Boca Juniors no jogo de quarta-feira, o time da capital paulista que já meteu a mão grande em todo mundo também acabou eliminado da Taça Libertadores.
Uma pena, vinha jogando bem, mas serve pra que o Corinthians saiba qual é a sensação de ser assaltado vergonhosamente, e que aprenda como é ser taxado de "chorão" após ser aviltado por interesses escusos ou erros individuais.
Como dizia uma moça que eu conheci: "A boca fala e o cu paga.".

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Robinho pede salários de um milhão e cem mil reais pra jogar no Internacional.
Como colorado posso dizer a Robinho que vá praticar triatlo lá na casa do Capita.
Um milhão e cem mil reais mensais para um jogador de quase trinta anos que corre, pedala e nada, unicamente porque tem uma boa relação com o treinador do Inter?
Não, muito obrigado.
A mesma linha de raciocínio vale pra Júlio Baptista, que foi avaliado pelo clube colorado. Não, obrigado.
É outro Rafael Moura. Um jogador pesado, sem mobilidade, de idade avançada e que não deve ganhar salários menores do que várias centenas de milhares de reais, então não. Não serve.
A direção do Inter que preste atenção no que aconteceu com o outro clube de Porto Alegre. Torrar uma fortuna pra encher um time com bruxos do treinador não é, nem de longe, garantia de sucesso.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Beauty School Drop-Out



Andava pelo shopping com a sacola debaixo do braço. Deu-se conta que tinha consigo a sua mochila, então, tirou-a das costas, agachou-se e abriu o zíper duplo, jogando o saco plástico com as revistas lá dentro. Enquanto voltava a fechar a mochila, a alça pela qual segurava a peça escapou-lhe entre os dedos e caiu pesadamente no chão. Um bolso cheio de inúteis canetas estava mal fechado, e com o impacto no assoalho do shopping, algumas escapuliram do bolso. Não muitas. Três ou quatro, saltaram e rolaram. Ele as foi apanhando enquanto rolavam, não alheio ao ridículo de um homem adulto correndo encurvado atrás de canetas coloridas pelo shopping center, ou ao que pensariam os seguranças vendo um sujeito derrubando canetas avulsas dos bolsos da mochila após acabar de sair de uma livraria.
Uma das canetas, mais rebelde, rolou vertiginosamente pelo chão, detendo-se aos pés de uma moça que passava.
Moça, não. Mocinha.
Além de miudinha, ela era jovem. Não devia ter mais do que quinze, dezesseis anos. Ela agilmente pousou o pé dentro de um tênis surrado sobre a caneta, juntou-a e entregou na mão dele, que sorriu agradecendo.
A menina, que não era particularmente bonita, chamou-lhe a atenção por duas coisas:
O cheiro do perfume, dolorosamente familiar, doce, com cheiro de alguma coisa que dá vontade de comer, mas no bom sentido, e pelo cabelo.
Um tenebroso rosa brilhante, muito claro. Quase como uma peruca de algodão-doce. Outra coisa que queremos comer no bom sentido.
Enquanto a menina sorria de volta, e retomava seu caminho, ele ficou olhando pra ela e foi assaltado pela memória que aquele perfume lhe trazia. Então, esforçou-se para lembrar com quem aquele cabelo deixara a menina parecida... Uma personagem de filme...
A Frenchy! Lembrou-se.
A menina que larga a escola e tenta virar esteticista em Grease - Nos Tempos da Brilhantina. Ela adormecia na lanchonete onde os amigos tomavam milk shakes e comiam hambúrgueres e batatas fritas enquanto flertavam e planejavam vingança contra as gangues rivais e era interpelada por um anjo vivido por Frankie Avalon, que a aconselhava a voltar pra escola...
Ele lembrou-se de que, em praticamente todas as vezes em que assistira a Grease, entendia o refrão da canção do tal anjo como alguma coisa parecida com "plurisnodraba".
Inclusive cantarolava, embromando "Plurisnodraba, parã, no gradueichon dei fór iú..." logo após o número musical terminar.
E assim foi por anos, até que, numa madrugada assistindo ao filme com seu irmão, e rindo do fato de todos aqueles estudantes do secundário parecerem sujeitos na casa dos trinta e tantos anos, ouviu Frankie Avalon cantando para a Didi Conn, e quase de relance, entendeu que não era, obviamente, "plurisnoudraba", que o "teen angel" cantarolava para a "ex-teticista" Frenchy. Era "Beauty School Drop-out".
De repente toda a canção e o contexto começaram a fazer sentido, e ele passou a curtir mais a canção quando a cantarolava, por alguns minutos após ouvi-la no filme.
Era, pensou, um momento de iluminação rasteiro, uma epifania, se é que podia ser chamada assim, suburbana, se tanto, mas ainda assim, foi uma descoberta. Tardia, mas uma descoberta.
E pensando em descobertas, e com aquele perfume tão familiar ainda em suas narinas, e muito em seu coração e mente, lembrou-se de outro momento de iluminação... De outra epifania, que nada tinha de suburbana ou de rasteira:
Ele encontrara o amor de sua vida. E vivera o amor de sua vida.
Todo o resto, dali em diante, seria tão supérfluo quanto canetas coloridas, ou cabelos tingidos de cor de rosa.

terça-feira, 14 de maio de 2013

Rapidinhas do Capita



Coversavam os dois amigos, combinando o jogo de logo mais:
-Seis horas, então, não vai atrasar, hein?
-Cara, meu irmão tá enchendo o saco, acho que não vai querer ir...
-Ué, por que?
-Sei lá, ele reclama porque a galera pega no pé dele, porque ele não sabe jogar direito, e aí fica fazendo essas coisas, "Ah, não vou", "Ah, não tô a fim...", "Quem é que vai", fica enchendo o saco.
-Bom, paciência, se ele não for, não foi, e nós jogamos sem ele...
-Bah, meu... Não quer falar com ele?
-Eu não... O pessoal vai se arriar nele, mesmo. Ele de fato não sabe jogar. Quem tem que decidir se isso é suportável ou não, é ele. Se divertir com o jogo é essencial pra curtir o jogo. Se ele não se diverte, e acha insuportável que mexam com ele, é só não jogar...
-Bah, meu, que frieza, o cara tá triste...
-Tá, nada. Tá fazendo uma ceninha. Mas não vai funcionar, porque as pessoas fazem ceninhas na crença de que são insubstituíveis, mas ninguém é insubstituível. Essa qualidade as pessoas se atribuem artificialmente, então, via de regra, ceninha não funciona. E esse é um caso sujeito à via de regra.
O amigo fez uma cara resignada de quem absorvia. Deu de ombros e concordou.
-É, tem razão. Nos falamos seis horas.
Assim que desligou o telefone, porém, o que fizera o discurso soube que aquilo que dissera era uma meia verdade. Haviam pessoas que eram insubstituíveis.
Ele tinha o privilégio e a dor de ter conhecido uma delas.

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Grande perda para o cinema.Angelina Jolie declarou ontem ter passado por uma cirurgia preventiva que removeu seus seios.
Palhaçadas à parte, e mastectomia preventiva foi realizada porque Jolie descobriu que um defeito em um de seus genes aumentava exponencialmente a sua chance de desenvolver câncer de mama, e também de ovário, o mesmo tipo que matou sua mãe.
Força pra Angelina e especialmente pro Brad Pitt.

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Entre as muitas qualidades que ela tem, a sua preferida, é o fato de ela torná-lo mais sociável.
Ele é um sujeito seco, algo oco, de poucas palavras, olhares de esguelha e um pouco de má vontade para com todo mundo.
Ela, não. Ela é calorosa. Expansiva. Doce. Delicada...
Quando estavam juntos, essas qualidades dela, respingavam um pouco nele. E ele se tornava mais caloroso. Mais gentil. Mais aprazível.
Talvez seja uma das coisas de que ele sinta mais falta. Alguém que fosse doce o suficiente pra ver graça no seu sarcasmo rabugento. Alguém para o impelir a ser delicado.

segunda-feira, 13 de maio de 2013

A Melhor Versão



Foi no domingo de tarde...
Estavam sentados no banco em frente ao prédio em que os pais dele moram. Ela de short jeans e regata listrada de amarelo, laranja e rosa, all star vermelho no pé, cabelo preso mais ou menos por uma tiara de plástico preta deixando ela parecida com a Gwen Stacy desenhada pelo John Romita Sr., ele, ao lado dela, jeans, camiseta vermelha, tênis vermelho, cabelo preso num meio rabo de cavalo, meio coque improvisado cheio de mechas soltas.
Ela comia um Cornetto de Prestígio, ele comia as unhas. Ela falava:
-Eu nunca mais vi um filme... Não lembro o nome, mas era uma fantasia espaço/medieval... Tinha umas motos voadoras e tudo, mas era meio capa e espada, com aranhas gigantes e um ciclope... Acho que o ciclope era do bem, e não do mal, e tinha um príncipe de calça justa que eu acho que era o Patrick Swayze, querendo resgatar uma mocinha enjoadinha que tinha sido capturada por um monstrão lá que era só uns olhos vermelhos... Tu sabe que filme é esse?
-Sei, mas não era o Patrick Swayze... Não sei o nome daquele ator, o filme chama Krull, eu acho.
-Krull... Isso não era um com aquele gostosão que fazia o Hércules da Xena? - Ela inquiriu, passando o polegar na coxa e recolhendo um pedaço de sorvete que escapara da casquinha cônica e o levando a boca de uma maneira inadvertidamente sensual.
-Não, alemoa... Esse com o Kevin Sorbo, o Hércules da Xena, era Kull, o Conquistador, um personagem do Robert E. Howard, mesmo criador do Conan.
-Hmmm... Krull... Vou procurar no IMDB, depois...
-Arram...
-Fez alguma coisa ontem?
-Não... Fiquei em casa. Vi um filme, não lembro qual... Depois joguei video game até amanhecer, aí vi Um Grande Garoto na TNT, e fui dormir...
Ela fez uma careta:
-Video game... Eca.
-É por coisas como essa que tu nunca mais vai conseguir tirar as minhas calças.
Os dois riram. Ele ainda estava sorrindo com um olho fechado quando o sol escapuliu brevemente de entre as nuvens e iluminou-lhe o rosto. Ela falou:
-Eu fui ao cinema.
-Ver o quê?
-Em Transe.
-Bacana, né?
-Ai, não achei, não, viu? Achei meio chatão. Mas o Vincent Cassel sempre vale o ingresso...
-Só tu acha o Vincent Cassel bonito... Nem a Monica Belucci acha ele bonito...
-Tu não sabe de nada, Jon Snow. O Cassel é puro charme.
-O Cassel é francês até a medula com aquele cabelo enrolado e aquele narigão de furar tampa de iogurte.
-Gatão...
-Quem era o outro feioso que tu achava bonito?
-Ele não é feioso. É o Tim Roth.
Ele gargalhou:
-Mas que barbaridade... O Tim Roth... Aquele inglês esquálido... Até meio corcunda ele é, guria!
-Ai, que nada, o cara é outro gatão...
-Meu Deus... Cada vez faz mais sentido tu ter namorado comigo...
-Por falar nisso...
-Aí... Não... Por favor...
-Ned, eu preciso falar disso...
-Ah... Didi...
-Não... Olha... Eu te pedi desculpas por ter te mostrado o negócio que ela escreveu, tá?
-E eu aceitei!
-Não te exaspera comigo...
-Eu não tô "exasperado"... Não tô, mesmo... Eu te desculpei... Tá desculpada... Desculpadíssima. Não tô chateado contigo, não tô bravo, não tô nada. Deixa isso pra lá.
-Mas... Olha... Essa semana, eu li o resto... Eu li tudo.
Ele ergueu a sobrancelha olhando pra ela.
-Eu tinha te contado tudo...
-Não... Tá, tinha... Mas é que é diferente... O ponto de vista dela é diferente do teu.
Ele se endireitou no banco:
-Como diferente?
-Ned... É diferente... Pra mim, que sou mulher, é mais identificável...
-Como assim?
-É que tipo... Tu não vai ficar bravo comigo?
-Não posso prometer isso... - Ele riu.
-É... Tá, assim: O teu ponto de vista, muitas vezes, é... Hum... Contaminado... Contaminado é uma expressão muito forte? Enfim, ele é contaminado porque, afinal de contas, é a tua versão, então... Quer dizer, tu te coloca numa posição-
-Quando a gente conta uma história sempre nos colocamos no papel de protagonista? É isso? - Ele perguntou, interrompendo.
-É... - Ela concordou. Tomou fôlego pra continuar, mas ele continuou:
-E como a história que eu conto não termina bem, o papel no qual eu me coloco é de mártir e ela acaba virando a vilã?
Ela apertou os lábios, e ergueu as sobrancelhas, deixando claro que ele acertara. Ele suspirou:
-É... Eu devo fazer isso... Não é consciente, sabe? Não é mesmo...
-Eu sei que não. - Ela assegurou. -Acho que é um reflexo, baseado na situação toda e tudo mais... Mas sabe... O que eu queria falar, era que o ponto de vista dela é diferente. Ainda é um ponto de vista, mas sabe... O "personagem central", não é ela, ou tu... É o amor dela por ti... O amor de vocês. E isso, sabe... Ver isso por outra ótica que não a tua... É enriquecedor, sabe... Como se tu pudesse ouvir os dois lados de uma guerra, por exemplo, e não só a versão do vencedor.
-Eu não me sinto particularmente vencedor nesse momento...
-Tu entendeu o que eu quis dizer...
-Sim, entendi.
-E olha... Tu... Vocês... Não deviam deixar isso morrer, sabe... Porque é enriquecedor. É uma história enriquecedora... E não devia ficar assim... Em aberto.
Ele olhou pra ela, que, com fingido desinteresse, virou pra frente e terminou de comer o sorvete. Quando terminou, limpou os lábios com as costas da mão, e limpou a mão na barra das meias. O que era muito engraçado de ver uma menina bonita fazendo. Ela apoiou as costas no espaldar do banco, e juntou as mãos entre as coxas, balançando as pontas dos pés. Ele disse:
-Eu falei com ela, ontem.
Ela pareceu iluminar-se:
-Falou? O quê?
-Ah... Não importa... Falei como eu me sinto em relação a ela... Que me magoa ela duvidar do que eu sinto...
-Ai, criatura, larga mão de ser amargo!
-Eu não consigo... De qualquer forma, falei que amo ela... Que sempre vou amar.
-E...? - Ela perguntou, com as mãos erguidas e girando os pulsos.
-E nada... Ela foi muito gentil... Delicada como só ela sabe ser... Disse que não está com ninguém... Provavelmente pra me poupar da dor de ser substituído-
-Cala a boca.
Ele sorriu, mas ela estava séria. Continuou:
-Tu sempre faz isso. Tu assume as coisas e independente do que te digam tu não acredita e te agarra à pior versão possível não importa que seja falsa. Tu fez a mesma coisa comigo quando eu fui pra Argentina. E agora tá fazendo com ela. Se te magoou tanto quando ela fez isso contigo, tu devia saber que não se deve fazer isso com os outros.
Aquilo doeu. A boca dele ficou amarga. O estômago, leve. Ele baixou os olhos e assentiu:
-É... Tem razão...
Ficaram em silêncio. Ele sentado do lado dela. Jogado no banco. Ela, com as costas muitos retas, e as pernas largadas para a frente, os joelhos juntos, fazendo um "x". Ele disse:
-Acho que vou subir...
Ela o deteve:
-E aí... Tu não terminou.
Ele deu de ombros:
-Nada... Nada. Fizemos juras de amor... Eu amo ela... Acho que ela me ama, também... Enfim... Tu tinha razão... O avião decolou. Terminou.
-Não diz isso... Tu fez isso.
-É. Eu fiz. Não disse que foi tu, nem que foi ela. Fui eu. Não altera os fatos, porém, não é? Vou subir. Dormi pouco essa noite. Quer que eu te leve até a tua casa, ou pelo menos até depois do viaduto?
-Não... Obrigada. Me leva ali na esquina que eu vou pegar um táxi.
Andaram juntos. Quando pararam na esquina, ela disse:
-A tua versão não é ruim... A dela fala mais pra mim, já que eu sou mulher. Mas as duas são boas. O final é que não presta.
Ele sorriu. E nos minutos que um táxi livre levou pra aparecer, ela detalhou sua versão pro final da história. Na qual os dois cansavam de negar o inevitável, e aceitavam que eram feitos um para o outro, e após alguns desencontros, ele descobria o dia em que ela estava indo embora, e ia ao Salgado Filho impedi-la em embarcar, e os dois se beijavam diante de um painel amarelo do aeroporto, cujas únicas lágrimas que veriam, seriam de felicidade.
Quando o táxi apareceu, ele sinalizou e abriu a porta pra ela. Lá de dentro ela disse:
-Minha versão é melhor que a de vocês dois, e eu nem mesmo escrevo um blogue.
Ele sorriu, inclinando-se na janela do carro:
-Tem razão. A tua versão é disparado a melhor.
Ela o abraçou em volta do pescoço e beijou-lhe na bochecha barbada:
-Dá um beijo na tua mãe.
Então dirigiu-se ao motorista e deu seu endereço.
Enquanto via o carro sumir na esquina adiante, ele virou sobre os calcanhares e voltou pra casa.
"Ela tinha razão, meu amor... A versão dela é melhor. Vamos deixar essa valendo, OK? Quando nos perguntarem, vamos dizer que foi assim que aconteceu."

sábado, 11 de maio de 2013

Termostato



Siu do banho e vestiu-se, sem lá muito esmero... Roupas normais. Tênis, jeans, camisa preta... Prendeu o cabelo com atenção, não por vaidade, mas por necessidade, mesmo. Era um cabelo de ET. Que requeria atenção o tempo todo, pois como os velociraptores de Jurassic Park, precisava de um único momento de distração para atacar.
Uma vez ajeitado, saiu. Ia comprar presentes de dia das mães com sua melhor amiga.
A encontrou em frente ao prédio. Abriu um sorriso.
-Oi! Tudo bem?
Dois beijos. Um abraço.
-Tudo, e contigo?
-Tudo joia!
-Vamos lá, então?
-Bora lá!
Saíram. Conversavam amenidades. Como tinha sido a semana. Como é que estava o emprego novo. Salários, benefícios, rusgas com o chefe. Tudo bem normal, tudo bem OK. A certa altura ela fez uma expressão estranha olhando-o de cima abaixo, e perguntou com aquela nota de dúvida na voz:
-E tu? Porque essa felicidade toda?
Foi estranho ouvir aquilo. Era tudo, menos felicidade que experimentava já tinha algum tempo. Por que diabos alguém acharia que estava feliz quando sentia exatamente o oposto?
Deu-se conta... Era o mecanismo de camuflagem.
Ele tinha isso. Bem ativo. Esconder emoções era importante na sua família. Praticamente como um Predador, mas ao invés de se esconder tornando-se transparente numa selva tropical calorenta, guardava a sua tristeza onde ninguém pudesse vê-la.
Estava mal ajustado, pensou. Esfuziante demais... Animado demais. Não era ele. Era como o termostato da geladeira marcando vinte graus. Não era normal.
-Nada... Só acordei bem, eu acho... - Foi o que ele disse enquanto a cada passo ouvia cacos figurativos dançando dentro do peito.