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sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Top 10 - Cinema 2016

Sabe qual foi a sorte de 2016 no que tange ao cinema?
Aqui no Brasil, diversos filmes de 2015 estrearam só em janeiro. Empurrando ótimos filmes do ano passado pra lista desse ano, algo que não aconteceu em 2015...
Isso facilitou minha vida na hora de juntar as melhores experiências cinematográficas de 2016 em uma lista com dez longas onde nenhum parece deslocado.
Vamos então, ao que mais aqueceu o coração desse nerd que vos escreve nesse ano maldito que está se encerrando:

10: Deadpool


Muito do mérito do sucesso de público e crítica de Deadpool recai sobre Ryan Reynolds.
O canadense aceitou fazer parte daquela bazófia que foi X-Men Origens: Wolverine apenas para poder fazer o papel do personagem.
Oito anos e muito chororô na internet depois, ele retorna, dessa vez usando o colante vermelho para reprisar o papel de maneira muito mais acertada do que no filme solo de Wolverine.
Com a parceria dos roteiristas Rhett Reese e Paul Wernick, dupla de Zumbilândia, e o diretor Tim Miller, Reynolds conseguiu criar um divertidíssimo filme para desconstruir o gênero dos super-heróis, brincando com todos os clichês do gênero e tirando onda de Deus e todo mundo em um longa feito a toque de caixa e olhado com certo desdém pela Fox, que acertou em cheio na alma do personagem e se tornou o maior sucesso financeiro do gênero de super-heróis, e uma das mais divertidas sessões de cinema de 2016.

9: Dois Caras Legais


Dois Caras Legais ganha sua vaga na lista por ser a melhor comédia do ano.
O longa setentista de Shane Black sobre um detetive particular e um brucutu de aluguel unindo forças para tentar desvendar uma trama de assassinatos envolvendo a indústria pornográfica e automotiva tem uma trama por vezes rocambolesca, ainda assim, o elenco principal, encabeçado por Russell Crowe, Ryan Gosling e Angourie Rice seguram a peteca mantendo o filme interessante e engraçado mesmo quando o plot se alonga excessivamente e se enrola feito um carretel.
Destaque especial para Gosling, que abre mão da aura de ator sério em nome de uma performance cômica de arrancar gargalhadas, e para Rice, um achado com um futuro brilhante pela frente.

8: Ave, César!


Após trinta anos e dezessete filmes é impressionante como os irmãos Coen ainda conseguem operar dentro de seu próprio sistema de regras e fazer filmes que ninguém mais faria.
Ave, César! tem todos os elementos da filmografia Coeniana, do senso de humor negro feito petróleo às ótimas atuações, passando pela trama entrecortada por explosões de violência, George Clooney interpretando um completo idiota e uma ambientação de época repleta de maquinações políticas, no que poderia ser resumido à história do caubói enfrentando os comunistas pra salvar a alma de Hollywood.
Com sequências de chorar de rir, Ave, César! nem é o melhor filme da carreira de Joel e Ethan, mas um representante robusto da capacidade dos dois de fazer cinema de qualidade ano após ano.

7: Mogli: O Menino Lobo


Nenhum ator em cena exceto o novato Neel Sethi, contracenando com um monte de nada que, mais tarde, seria substituído por ursos, panteras, lobos, orangotangos, cobras e tigres de puro CGI.
Não parece a melhor das ideias, mas nas mãos do diretor Jon Favreau essa mescla se tornou uma das mais belas histórias infantis que o cinema viu nesse ano.
O longa sobre o menino Mogli, criado por lobos sob a proteção da pantera Bagheera (voz Ben Kingsley) sendo forçado a se exilar por causa do desejo de vingança do tigre Shere Khan (voz de Idris Elba) enquanto tenta descobrir seu lugar no mundo é um deleite técnico embalado em uma tocante mensagem de coexistência entre a humanidade e a natureza sem jamais esquecer da aventura, da comédia e da emoção.
A melhor fábula de 2016.

6: Spotlight: Segredos Revelados


Se não fosse um longa de 2015 (inclusive agraciado com um merecido Oscar de melhor filme), Spotlight talvez estivesse até melhor colocado nessa lista.
O longa de Tom McCarthy sobre a equipe de jornalismo do Boston Globe e sua investigação sobre os escândalos de pedofilia ocultados pela igreja católica é de uma diligência e seriedade ímpares, que remontam ao cinema norte-americano dos anos setenta ao se apoiar inteiramente em sua história e no trabalho de seus atores.
Não há pirotecnia, discursos inflamados ou lágrimas pujantes, apenas esforço coletivo temperado com senso de justiça e uma pitada de raiva para fazer um trabalho e entregar uma história.
Exatamente como os jornalistas verdadeiros fizeram.

5: Rogue One: Uma História Star Wars


A Disney comprou a Lucas Film com a óbvia intenção de transformar Star Wars em um programa anual para os fãs.
A segunda cartada após Episódio VII: O Despertar da Força, foi Rogue One.
E não é que foi bom?
O longa de Gareth Edwards é uma inspirada fita de guerra no estilo homens (e mulheres, e robôs) com uma missão situada em uma galáxia bem, bem distante, que trafega por espaço não mapeado entre os episódios III e IV, rastejando na lama de maneira mais suja, corajosa e sombria do que seus co-irmãos, lançando uma nova luz sobre Uma Nova Esperança e relembrando à audiência que vilão ameaçador Darth Vader pode ser enquanto tritura bilheterias ao redor do Mundo.

4: Capitão América: Guerra Civil


O mais ambicioso passo da Marvel desde Os Vingadores em 2012, Capitão América: Guerra Civil pegou os heróis apresentados ao longo dos outros longas do estúdio da Casa das Ideias e os colocou em lados opostos de uma questão ideológica.
Quem conhece quadrinhos sabe que, inevitavelmente, discussões ideológicas entre heróis acabam em troca de bordoadas.
E os irmãos Russo sucederam na tarefa ao reduzir sensivelmente a quantidade de piadinhas do longa, oferecendo um pouco da gravidade que havia feito maravilhas por O Soldado Invernal, mas sem descaracterizar a fórmula que transformou os filmes da Marvel em sucessos bilionários.
Ver o conflito entre Tony Stark e Steve Rogers alcançar seu pico e ainda apresentar Pantera Negra e Homem-Aranha no processo não tem preço.
E a luta do aeroporto, sozinha, já vale dois ingressos, fácil.

3: Star Trek: Sem Fronteiras


Quem diria que, em algum momento, Star Trek ia ser melhor do que Star Wars?
E quem diria que seria justamente quando J. J. Abrams virou a casaca e deixou Justin Lin na cadeira de diretor?
Certamente eu não diria.
Ainda assim, Sem Fronteiras tem toda a aventura que eu espero de um filme de Star Trek, além de ação, comédia e Sabotage dos Beastie Boys.
Pois é... Eu sei.
Mas funciona.
A trama sobre como, em meio à sua missão de cinco anos em espaço profundo, a Enterprise se vê envolvida nos planos do vilão Kraal (Idris Elba) para se vingar da Federação é divertidíssima, ágil, esperta e ainda se dá tempo para escrever uma carta de amor à franquia em seu cinquentenário.
O primeiro filme de 2016 a me deixar com um sorriso idiota na cara ao final da projeção ganha lugar no pódio.

2: Capitão Fantástico


O road movie de Matt Ross, baseado parcialmente na sua própria vida sendo criado em comunidades na Califórnia dos anos setenta é especial...
O longa que mostra como Ben Cash (um soberbo Viggo Mortensen) cria seus filhos à margem do modo de vida capitalista ao qual ele despreza até ser arrancado de suas ideologias pelo suicídio da esposa bipolar abre mão das soluções fáceis.
Seria uma barbada demonizar o sogro vivido pelo ótimo Frank Langella, ou santificar o papai-sabe-tudo de Mortensen, mas o longa não o faz.
Ao invés disso, o filme apenas nos leva numa viagem com essa família, nos oferecendo a chance de interpretar o que nos é mostrado, e tentar decidir se Ben é o melhor pai do mundo, o pior, ou apenas um homem de convicções seguindo suas crenças e fazendo o melhor que pode para que seus filhos tenham uma vida melhor do que a do resto do mundo.
Com momentos de riso e lágrimas, ótimas interpretações e uma trilha sonora excelente, Capitão Fantástico ganha um mais que merecido lugar no pódio dos melhores do ano.

1: A Chegada


Nos últimos anos vêm sendo pródigos com um dos meus gêneros favoritos quando se trata da sétima arte:
A ficção científica.
De 2013 pra cá, sempre tivemos uma grande sci-fi entre os melhores do ano, Perdido em Marte, Interestelar e Gravidade, todos foram grandes filmes e mereceram seu espaço na lista de dez melhores do ano.
Em 2016 que ganhou lugar na lista foi o canadense Dennis Villeneuve e seu A Chegada, um filme de ficção científica do diretor de Incêndios, Os Suspeitos e Sicário: Terra de Ninguém só podia dar em coisa boa, e em A Chegada, Villeneuve fez mais do que isso, fez uma das mais humanas histórias da ficção em anos recentes embrulhada em um filme de alienígena.
E o fez sem abrir mão de espetáculo, CGI, efeitos visuais, tensão, ritmo...
Está tudo está lá, mas não para ser a alma do filme e sim uma muleta.
Porque o essencial em A Chegada é a história de como esse primeiro contato da humanidade com vida inteligente de fora da Terra mexe com a vida de Louise Banks, a linguista escalada pelo exército dos EUA para tentar se comunicar com os visitantes.
Um sensacional quebra-cabeça narrativo que brinca com as convenções do cinema, o longa é amparado por boas atuações de Jeremy Renner e Forrest Whitaker, mas se apóia inteiramente nos ombros de Amy Adams, que devora com gosto seu papel, sem jamais perder de vista seu ponto central:
As relações humanas.
O melhor filme de 2016, com folgas.

Top 10 Negativo - Cinema 2016

Ano passado eu me queixei do fato de que estava difícil encontrar dez filmes que valessem a posição na lista de melhores do ano, e ainda mais difícil reduzir a lista de piores a apenas dez títulos.
2016 talvez tenha sido o pior ano da história recente da humanidade. Entre a crise migratória do oriente médio ceifando milhares de vidas, e eleição de Donald Trump acenando com um apocalipse atômico, a guerra civil na Síria, a tensão racial nos EUA a crise econômica brasileira, os estados e municípios sucateados, as mortes de personalidades e o rebaixamento do Internacional, só quem tem motivos pra comemorar esse ano são a associação nacional do rifle e os executivos da Disney e seus bilhões de dólares de lucro em bilheterias.
Nem ir ao cinema melhorou a desgraceira em 2016, haja vista que, a exemplo de 2015, encontrar dez filmes para a lista de melhores do ano foi uma tarefa complexa, e reduzir a lista de piores a apenas dez, foi ainda mais difícil do que trezentos e sessenta e quatro dias atrás.
Ainda assim, com um pouco de esforço, e estabelecendo critérios como expectativa x desapontamento, deu pra fechar um top-10 negativo justo.
Como de hábito, apenas filmes lançados no Brasil de janeiro pra cá em qualquer plataforma, e que eu tenha assistido, óbvio.

10: Vizinhos 2


O primeiro Vizinhos era uma comédia divertida.
Não ficava na mente por muito tempo, mas garantia risadas honestas e até uma eventual gargalhada durante a projeção usando o carisma de Seth Rogen e sua boa química com Rose Byrne para construir uma tradicional comédia de opostos unindo o casal contra a fraternidade liderada pelos impossivelmente idiotas Zack Efron e Dave Franco.
O segundo filme tenta repetir a fórmula de maneira descarada e, ao tentar ser simultaneamente ofensivo e politicamente correto, não consegue ser nenhuma das duas coisas, e pior, nem consegue ser engraçado.
Rogen e Byrne fazem força para que sua boa química renda alguma coisa enquanto Zack Efron abraça o ridículo do saradão burro e Chlöe Grace-Moretz apenas está lá, mas não adianta.
O roteiro porcaria não decola, nada funciona e o longa abusa da escatologia por noventa e dois longos minutos sem nenhuma risada.
E poucas coisas são tão ruins quanto uma comédia sem risadas.

9: Caçadores de Emoção: Além do Limite


Sejamos francos...
O Caçadores de Emoção original estava longe de ser um grande filme.
Até hoje eu não sei porque ele virou motivo de culto, mas a verdade é que o filme de Katherine Biggelow era uma fita de ação bem executada com um protagonista carismático e belas sequências de esportes radicais, e meio que era isso.
Ele precisava de um remake tanto quanto Tom Hanks precisa de outro Oscar.
Ainda mais quando o que o diretor desse remake, Ericson Core fez, foi mostrar a mesmíssima história do longa de Biggelow, tirar todo o carisma do protagonista, aumentar a quantidade de sequências de esportes radicais, remover toda a qualidade da ação e chamar uma abominação com cara de comercial de Gatorade de filme.
O longa escrito por Kurt Wimmer é tão ruim, que a única razão para não estar mais perto do topo dessa lista é o fato de que ninguém em sã consciência poderia esperar muito de um projeto que tinha "bomba" escrito por todos os lados.

8: Zerando a Vida


Adam Sandler está precisando de uma doença terminal.
Não me entenda errado.
Não desejo mal pro sujeito.
Se ele tiver alguma doença terminal eu torceria pra que ele se recuperasse totalmente dela.
A única razão para eu ter dito isso, é que em Tá Rindo do Quê, última comédia engraçada estrelada por Sandler, seu personagem se recupera de uma doença grave, mas durante o tratamento, ele vislumbra sua vida e percebe como suas escolhas foram equivocadas.
Equivocadas como esse Zerando a Vida, longa que mostra Sandler e David Spade como amigos da escola que se reúnem para uma grande aventura enfrentando mafiosos e executivos corruptos e que, pasmem, nem é o pior filme de Sandler nos últimos tempos, e isso diz muito sobre a qualidade de seus projetos recentes.

7: Truque de Mestre: O Segundo Ato


O primeiro Truque de Mestre era uma porcaria tão detestável, pretensiosa e idiota que eu coloquei o filme no topo da lista de piores em (eu acho) 2013.
O segundo filme é igualmente detestável e idiota, mas ao menos não é tão pretensioso e antipático quanto o original, de modo que eu peguei mais leve com a sequência.
O longa sobre o grupo de mágicos justiceiros que punem os gananciosos e os poderosos sendo exposto por um inimigo misterioso é um prepóstero do início ao fim, e cada vez que tira um óbvio coelho da cartola faz uma pausa esperando um aplauso injustificado.
Filme de mistério categoria sorvete na testa desperdiçando o talento de um bom elenco em duas horas de pirotecnia com zero conteúdo.
O pior de tudo?
Provavelmente haverá um terceiro ato em algum momento...

6: Alice Através do Espelho


James Bobin herdou a batuta de Tim Burton para dar sequência às aventuras de Alice no Submundo, o longa que, em 2010, faturou mais de um bilhão de dólares em bilheteria ao recontar a história da menina que seguiu um coelho branco até um buraco que a levou a um mundo repleto de magia e seres fantásticos.
O grande mistério aqui é, porque o longa original faturou tanto, e essa sequência, que é basicamente o mesmo filme, faturou tão pouco?
Meu palpite para o fracasso é o escândalo de Johnny Depp, um dos protagonistas do longa, que à época do lançamento foi acusado de agressão pela esposa Amber Heard.
É a única explicação que eu encontro já que os dois longas partilham absolutamente os mesmos defeitos.
CGI em profusão, 3-D gratuito e atuações em piloto automático de todo mundo exceto Helena Bohan-Carter e Sacha Baron-Cohen.


5: Esquadrão Suicida


A DC tinha dado um passo acertado na construção de seu universo cinematográfico com competente O Homem de Aço, deu uma escorregada com Batman vs Superman: A Origem da Justiça, que pecou pelo excesso de trama e pelos equivocados Lex Luthor e Apocalypse, e levou um tombão violento com Esquadrão Suicida.
O pior de tudo é que o longa tinha muita promessa, um bom elenco, visual bacana, e uma premissa com um potencial do caralho, tudo posto a perder por um roteiro absolutamente imbecil com uma trama sem sentido.
Uma executiva do governo resolve escalar supervilões pra proteger os interesses dos EUA. Um dos dois supervilões com superpoderes que ela tem, se revolta contra sua autoridade e manda uma cidade inteira pro inferno.
A solução?
Juntar um ótimo atirador, uma psicopata de 52 quilos com um revolver e um bastão, um bebum com um bumerangue, um escalador de paredes, um homem crocodilo e um pirocinético para enfrentar essa ameaça mística... Junto com um grupo de atiradores treinados do exército... Sério... Tente vender essa ideia pra alguém sem o selo da DC Comics e veja a reação.
Apesar dos esforços de Viola Davis e Margot Robbie, o filme naufraga feio, conseguindo até a proeza de tornar o Coringa uma bosta.

4: Caça-Fantasmas


A internet tentou condenar Caça-Fantasmas à morte por ostracismo antes mesmo do lançamento do filme.
O longa dirigido por Paul Feig, e estrelado por Kristen Wiig, Melissa McCarthy (trio egresso de Missão Madrinha de Casamento), Kate McKinnon e Leslie Jones foi campeão de rejeição no Youtube assim que o primeiro trailer do remake caiu na rede em fevereiro, fato que o roteiro chega a abordar à certa altura...
E se é verdade é que o filme nem chega a ser tão ruim quanto o trailer sugeria, ainda assim, ele é muito ruim.
Pra piorar, parece que o filme joga o tempo todo na defensiva por conta da rejeição prévia, e, não bastasse isso, não consegue preencher os sapatos do filme original, que está no imaginário coletivo de toda uma geração.
Com uma trama morna, piadas medíocres, excesso de CGI e um terceiro ato absolutamente excessivo, chega a dar uma ponta de vergonha alheia quando, na cena pós-créditos, o filme acena com uma sequência.

3: Zoolander Nº 2


O primeiro Zoolander era uma comédia muito engraçada onde Ben Stiller tirava onda sem dó nem piedade do mundo da moda.
O longa era cheio de momentos hilários e certamente elevou as vendas de mocha frapuuccino de laranja no Starbucks, sua tardia sequência parecia uma boa ideia, no papel.
Ben Stiller mais maduros após os bons A Vida Secreta de Walter Mitty e Trovão Tropical poderia voltar ao seu personagem definitivo e arrancar mais duas horas de risadas enquanto tirava sarro de pessoas bonitas e burras.
Mas o inferno está repleto de boas intenções, e a sequência é absolutamente insonsa, sem nenhuma gargalhada além de um risinho pro lado aqui ou ali, e uma repetição da fórmula do primeiro longa elevada à enésima potência sem nenhum resultado.
Se fosse esquecível, seria menos incômodo.

2: Deuses do Egito


Alex Proyas é um bom diretor.
O cineasta tem no cartel longas como O Corvo com Brandon Lee, Eu, Robô com Will Smith, Presságio, talvez o último filme de grande circuito estrelado por Nicolas Cage que valia a ida ao cinema...
Ás vezes eu me perguntava por que Proyas tinha intervalos tão grandes entre um filme e outro. Assistindo, no cinema, a esse Deuses do Egito, e cheguei à conclusão de que, talvez, Proyas pudesse ter pensado um pouco mais antes de levar adiante esse infernal amálgama de Fúria de Titãs com Transformers estrelado pelo elenco com menos cara de egípcio da história recente.
Na trama onde o deus Set (Gerard Butler), comandante do quadrante escocês do Egito surge para matar Osiris (Bryan Brown, comandante do quadrante australiano do Egito), e usurpar o trono de Hórus (Nicolaj Coster-Waldau, senhor do setor dinamarquês do Egito), que só pode retornar ao poder com a ajuda do jovem ladrão Bek (Brenton Thwaites) não existe coerência apenas pirotecnia.
Volta e meia os deuses de mais de três metros de altura se transformam em um tipo de construto dourado e lustroso que parece um fugitivo dos clipes do Linkin Park conforme a trama tropeça de um confronto ao próximo até o desfecho num espetáculo de excesso visual vazio.

1: Independence Day: O Ressurgimento


Em julho de 1995 alienígenas invadiram a Terra e destruíram cidades inteiras até serem derrotados pelas forças armadas dos EUA após uma arriscada missão onde Will Smith voou com Jeff Goldblum até dentro da nave mãe alien e, com um vírus de computador criado em um Macbook, desabilitou as defesas dos invasores possibilitando o ataque das forças terráqueas.
Vinte e um anos se passaram e esses alienígenas voltaram com o firewall ativado para obter sua vingança.
A humanidade teve mais de duas décadas para se preparar para o ataque. Utilizando engenharia reversa na tecnologia alienígena, preparou inacreditáveis defesas e... Não adianta nada.
Nossos protetores sequer conseguem perceber quando uma espaçonave do tamanho da lua surge devastando tudo o que existia entre nós e mais uma invasão extremamente destrutiva em que cidades inteiras são varridas do mapa e ninguém liga porque de 1995 pra cá isso deixou de ser um evento.
Elenco no piloto automático, efeitos visuais de ponta, e um samba do alienígena doido que eu nem me lembro direito como acaba mas que jura que vai ter uma sequência onde a humanidade vai "chutar alguns traseiros alienígenas".
Sério.
Essa fala encerra o filme.

Resenha Cinema: Capitão Fantástico


Um cervo anda pela floresta se alimentando alheio ao fato de que, escondido nas sombras, coberto de lama, um jovem o espreita.
Basta um segundo de distração do animal para que o jovem emerja dos arbustos e, faca em punho, apunhale o pobre animal até a morte.
O último suspiro do cervo é a deixa para que, das margens de um lago próximo surjam cinco crianças e um homem mais velho.
"Hoje o menino morreu", diz o homem barbado enquanto, com o sangue do cervo, batiza o jovem enlameado diante dele. "Em seu lugar, há um homem", decreta.
Essa é a cena de abertura de Capitão Fantástico, escrito e dirigido por Matt Ross (de Silicon Valley), onde Ben Cash (Viggo Mortensen) faz seu filho mais velho, Bodevan (George MacKay) passar por um ritual de iniciação em estilo indígena.
Ben, vive com seus seis filhos, Bodevan, Kielyr (Samantha Isler), Vespyr (Annalise Basso), Rellian (Nicholas Hamilton), Zaja (Shree Croocks) e Nai (Charlie Shotwell) em meio à floresta.
Anos antes, Ben e sua esposa Leslie (Trin Miller) resolveram se afastar da sociedade e criar seus filhos junto à natureza, com disciplina militar, educação de PHD e com pouco dos confortos da vida moderna.
Mas Leslie não está presente.
Diagnosticada com transtorno bipolar, ela está internada há alguns meses, e em sua ausência, Ben se transformou no capitão solitário do barco.
Quando não estão caçando para comer, os filhos de Ben fazem exercícios, escalada na rocha, longas corridas pela mata, e praticam luta.
Eles leem Dostoievski, George Elliot e Jared Diamond, discutem Mao, Trotsky, Marx e Noam Chomsky, cantam e tocam instrumentos.
Os Cash têm uma utopia "retirada d'A República de Platão" nas matas do noroeste do Pacífico, até que a notícia de que Leslie cometeu suicídio chega a Ben e ele é ameaçado por seu sogro (Frank Langella), que o culpa pela morte da filha, de que será preso se for ao funeral.
Ben é um homem que, acima de tudo, preza a liberdade, mas as crianças querem se despedir da mãe, e essa é uma família que prega poder ao povo, e mostrar o dedo médio ao Homem.
Então os Cash entram em seu ônibus, chamado Steve, e partem rumo ao Novo México para o funeral de Leslie. Uma jornada que confrontará a criação que Ben ofereceu a seus filhos com tudo aquilo do qual ele tentava afastá-los, ameaçando a harmonia da família e fazendo com que Ben questione se a criação que ele tem dado às crianças é, de fato, o melhor para elas.
É um lindo filme.
Cativante e divertido, e, mais importante, que não toma partido do protagonista como seria de se esperar.
Desde as sequências iniciais a audiência tem ferramentas para questionar os métodos de criação das crianças e ponderar se Ben é o melhor ou o pior pai do mundo.
Ele cria seus filhos para serem pensadores livres, mas como isso é possível se o único parâmetro disponível é ele próprio? Como saber se eles estão pensando livremente ou sendo apenas programados para regurgitar o discurso que ele profere?
Eles são educados para serem questionadores, mas a autoridade do pai é inquestionável e sua palavra é a lei.
Ele se preocupa com a segurança deles a ponto de fazê-los treinar para matar e terem tônus muscular de atleta profissional, mas os expõe ao risco de escaladas na rocha e intempéries na mata...
Quando o sogro ameaça tirar a guarda dos filhos de Ben, nós entendemos porque ele quer fazer isso. Não existe como julgá-lo errado ou pintá-lo como um vilão.
O que faz com que a balança desequilibre é o carisma e o talento de Viggo Mortensen.
O ator, que é capaz de passar mais emoção com um olhar do que muitos atores são capazes com vinte e sete páginas de monólogo está destruidor no longa. Seu Ben Cash é um homem cheio de certezas quando isolado com os filhos em seu idílio, mas que, ao ser confrontado com a realidade do mundo que tentou deixar pra trás, se enche de dúvidas e temores.
Ele só quer ser o melhor pai para crianças inteligentes e preparadas, mas é capaz de perceber que, talvez, não tenha sido perfeito na execução de suas intenções.
Os filhos são todos ótimos, com destaque para George MacKay e Nicholas Hamilton, enquanto Frank Langella e Ann Dowd dão profundidade aos pais de Leslie de maneira cândida e crível, e ainda há participações bacanas de Kathryn Hahn, Steve Zahn, Missi Pyle e Erin Moriarty.
Fotografia honesta de Stéphane Fontaine, figurinos espertos de Courtney Hoffman e uma trilha sonora de encher os ouvidos e o coração (a versão de Sweet Child O' Mine do final do filme é de fazer os olhos transbordarem), trabalho de Alex Somer, completam o espetáculo.
Facilmente um dos melhores filmes de 2016, assista no cinema.
Leve um lenço.

"Nós não podemos ir ao funeral da mamãe. Nós temos que fazer o que mandaram. Algumas lutas, você não pode vencer. Os poderosos controlam a vida dos que não têm poder. É assim que o mundo funciona. É injusto e desmedido. Mas é uma droga. Nós temos que nos calar e aceitar... Bom, que se foda."

quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Resenha Filme: Mãos de Pedra


Eu talvez já tenha dito isso antes... Tenho o mau hábito de me repetir indefinidamente, desculpem, mas o boxe provavelmente é o esporte que mais e melhores filmes rende.
É até difícil pensar em um drama esportivo que use outro esporte como pano de fundo, dos plenamente ficcionais Rocky, ou Nocaute às biografias como O Vencedor e Touro Indomável, a nobre arte oferece, em mesma medida, a contrição quase religiosa do treino e da preparação e a catarse sangrenta da violência, talvez, por isso, e por ser um esporte que encontrou seus maiores representantes entre os mais pobres, seja tão frequentemente usado como parábola para contar histórias de superação.
Uma história de superação biográfica é esse Mãos de Pedra, baseado na vida do pugilista panamenho Roberto Manos de Piedra Durán, um dos maiores lutadores da história do boxe, mais um filme recente que a Netflix disponibilizou em seu catálogo nas últimas semanas para meu deleite quase sexual.
O longa do diretor e roteirista Jonathan Jakubowicz, acompanhamos a vida de Roberto Durán (Edgar Ramírez) desde a infância miserável no Panamá, até a sua ascensão ao estrelato.
Durán cresceu nas favelas de El Chorrillo, uma vizinhança pobre na capital panamenha originalmente populada pelas famílias dos operários que trabalharam na construção do Canal do Panamá. Na infância, Roberto Durán cresceu sob a sombra das bases norte-americanas instaladas na região para garantir a posse da área, de suma importância estratégica.
Um menino pobre e temperamental, Roberto não tardou a tentar ganhar a vida com os punhos, o que conseguiu ao ser acolhido pelo treinador Plomo (Pedro Pérez) e pelo empresário panamenho Carlos Eleta (Rubén Blades).
A grande virada na vida de Durán, porém, veio quando o legendário Ray Arcel (Robert de Niro) o viu lutando no Madison Square Garden, e resolveu treiná-lo.
Sob a tutela de Arcel, um treinador que colocou cinturões em vinte campeões mundiais, Roberto Durán escalou rapidamente o ranking dos pesos leves para ser campeão ao enfrentar Sugar Ray Leonard (Usher Raymond), o cinturão, porém, é apenas um passo na atribulada vida de um homem que cresceu sem privilégios e carregando toda a espécie de ressentimento.
Cinebiografias, eu também já disse, são caminhos complicados de trilhar, e há diversos problemas no caminho com Mãos de Pedra.
É interessante como biografias que se concentram em um episódio específico da vida do biografado como modo de compreendê-lo, são superiores a biografias excessivamente abrangentes, do tipo berço ao túmulo.
Tome por exemplo os dois filmes a respeito de Steve Jobs.
Jobs, com Ashton Kutcher é um filme, na melhor das hipóteses, mediocremente arrastado, enquanto o Steve Jobs estrelado por Michael Fassbender é um filmaço ágil e instigante.
Mãos de Pedra não é ruim como Jobs, mas certamente comete um erro ao abranger demais em sua metragem de menos de duas horas.
Pegar a vida de Durán de quando ele era um molequinho roubando mangas de dentro da zona militarizada do Canal do Panamá, aprendendo com o amigo Chaflan (Óscar Jaenada) a se virar nas ruas até sua volta aos ringues após a famosa luta "No Más", passando pelo início de sua relação com a esposa Felicidad (a deliciosa Ana de Armas), o nascimento de seus cinco filhos, a mágoa com o pai norte-americano que o abandonou ainda pequeno, o orgulho que tinha de seu país, e a relação paternal que formou com seu treinador, seus momentos de depressão e de euforia... É simplesmente terreno demais pra cobrir em muito pouco tempo, sem contar que ainda é necessário encontrar tempo para mostrar a vida de outras duas lendas do boxe, Sugar Ray Leonard e Ray Arcel.
Diluir o tempo de projeção entre esses três personagens é roubar da audiência uma história completa.
Especialmente no tocante a Arcel, que passou cinquenta anos promovendo o boxe, tinha laços complexos com a máfia e uma história de vida pessoal problemática que é mal e mal arranhada no longa.
E é uma pena.
É uma pena porque a história de vida de Durán, um dos atletas fundamentais do pugilismo e membro do The Fabulous Four, os quatro boxeadores que mantiveram o esporte relevante após os anos de Ali, Foreman e outros gigantes dos pesados, merecia um olhar mais esmerado.
Ainda assim, há muita qualidade em Mãos de Pedra.
O elenco é ótimo, Edgar Ramírez está ótimo no papel principal. Ele entrega uma interpretação energética e visceral, absolutamente convincente como alguém que luta para poder comer, para experimentar o que nunca teve, e para ser o orgulho de uma nação, mas que ainda é apenas um homem.
Robert De Niro, por sua vez, faz o que é provavelmente seu melhor trabalho desde O Lado Bom da Vida, e é uma pena que muito de seu talento seja desperdiçado em uma inoportuna narração em off que, por vezes, parece intrusiva. Outra, subaproveitada é Ana de Armas, a atriz que tem uma presença carismática e sensual, por vezes está em cena apenas para servir de colírio com seu rostinho lindo e corpinho escultural, ainda assim, nota-se o esforço da atriz para entregar uma atuação respeitável.
Há ainda participações de John Turturro, Reg E. Cathey e Ellen Barkin, todos em papéis menores.
Mãos de Pedra não é mau filme, ele prende a atenção e é tocante em diversos momentos (este chorão que vos escreve ficou de olhos marejados na sequência antes da última luta do filme) mas se torna desconfortável perceber, quando o filme terminou, que ele poderia ser tão melhor.
Imagine uma cinebiografia enxuta, centrada nas três lutas entre Durán e Ray Leonard durante os anos 80 e 90, nos moldes de Steve Jobs de Danny Boyle?
Contar a vida desses dois gigantes através de sua rivalidade, aproveitando o talento de Ramírez e Usher, que abocanharam seus personagens com gosto em botes certeiros (Aliás, quer saber que está ficando velho? Veja um filme onde um astro que tu não conhece interpreta um boxeador que tu viu lutar. Bang, cabelos brancos e chinelas nos pés instantaneamente).
Boa pedida para os fãs de boxe sem nada de fazer às vésperas do ano novo, e uma coleção de boas atuações impedindo que um filme se torne descartável.

"-Você foi o melhor lutador do mundo. Eu quero ver isso de volta no ringue."

Resenha Filme: Dois Caras Legais


Los Angeles, 1977.
São tempos difíceis nos EUA.
A criminalidade e a pobreza aumentam. O presidente é Jimmy Carter, mas a sombra de Richard Nixon ainda paira sobre o país como um augúrio sinistro da corrupção sempre presente, o sinal de Hollywood está caindo aos pedaços e a única indústria tão forte quanto a automotiva é a pornográfica.
É um cenário calamitoso, cinzento, cheio de nuances e vilões, e não há mocinhos.
No máximo, caras legais.
Essa é a ambientação onde Shane Black, o sujeito que meio que recriou o gênero "buddy cop" com seu roteiro para o Máquina Mortífera original coloca sua história.
Uma trama de investigação envolvendo o detetive particular Holland March (um Ryan Gosling esbanjando timming cômico e uma insuspeita veia para o ridículo), um viúvo com problemas de alcoolismo que suga até a última gota de dinheiro de seus clientes, geralmente velhinhas recomendadas a ele por uma casa de repouso, e Jackson Healy (Russel Crowe, competente como sempre e gordo como nunca), um capanga de aluguel que, por alguns trocados, vai até um endereço e quebra os braços de algum imbecil que esteja precisando de uma lição.
Quando March começa a investigar o paradeiro de uma atriz pornográfica já morta, que teria sido vista por sua tia, o detetive logo começa a crer que a velhinha que o contratou, "cega feito um morcego", fez confusão, e tomou a sobrinha morta por uma moça de compleição física semelhante, a jovem hippye e ativista ambiental Amelia (Margareth Qualley), que, ao se ver perseguida por March, contrata Healy para se livrar do xereta.
Após surrar Holland, porém, Haley se vê na mira de dois assassinos (Beau Knapp e Keith David), e percebe que pode haver mais por trás do caso todo do que ele inicialmente supunha.
Assim, Healy procura ajuda profissional para investigar o mistério. No caso, March.
E os dois unem forças para tentar descobrir qual é a verdade por trás de tantas pessoas perseguindo a jovem, uma trama intrincada que ainda envolve assassinatos, a indústria da pornografia, grupos ambientais e os fabricantes de automóveis de Detroit, um caso tão obscuro e cheio de reviravoltas que Healy e March talvez não consigam resolver sem a ajuda de Holly (Angourie Rice), a adorável filha de treze anos de Holland.
Eu queria muito ter visto Dois Caras Legais no cinema quando o filme estreou por aqui em julho. Infelizmente, os horários e a minha crescente impaciência com o público do cinema e as sessões dubladas não me permitiram fazer tal incursão à sala escura.
Imaginem meu prazer ao descobrir que o longa estava disponível na Netflix essa semana?
Assisti ao filme com gosto, e posso dizer, sem medo de errar, que Dois Caras Legais é a melhor comédia de 2016, fácil.
O longa de Black carrega muito do clima do subestimado Beijos e Tiros, debute do diretor atrás das câmeras.
É uma comédia de humor negro, de época, que traça paralelos e tira sarro da situação socioeconômica atual dos EUA e do Mundo. À certa altura uma personagem diz que o que é bom para Detroit é bom para a América, enquanto Holland faz pouco da indústria automobilística e afirma que "em cinco anos estaremos dirigindo carros elétricos do Japão. Marque as minhas palavras", e o faz através de personagens divertidíssimos, contando a história de dois sujeitos que sabem que não são boas pessoas, mas se esforçam para manter um mínimo de dignidade.
A escolha de elenco não podia ser mais acertada.
Ryan Gosling está sensacional como o histérico e covarde detetive particular que aceita casos como procurar o marido de uma velhinha, mesmo tendo visto as cinzas do falecido sobre a lareira.
Seus gritos agudos quando se machuca ou se assusta e suas caretas de pavor estão entre os melhores momentos de comédia física que eu vejo desde que Leonardo DiCaprio entrou rastejando pra dentro de sua Lamborghini em O Lobo de Wall Street.
Russel Crowe, por sua vez, interpreta um brucutu de bom coração, que está tentando fazer o que é certo apenas para se sentir bem já que sua vida profissional nem sempre oferece esse tipo de recompensa, e também relembra sua veia cômica (já demonstrada em Um Bom Ano, um filme que a crítica, no geral, pichou, e eu gostei bastante), de maneira mais comedida do que o colega de cena, mas ainda assim, muito bem.
Com dois protagonistas de peso em cena, ainda mais méritos para a jovem Angourie Rice, que não desaparece por completo e ainda consegue ser a parte mais inteligente desse improvável tripé de investigadores roubando a cena com sua carinha de anjo.
Mesmo toda essa qualidade não esconde o fato de que Shane Black, co-roteirista do filme com Anthony Bagarozzi, não soube o que deixar de fora do longa, que podia ter uma edição mais ágil e contar sua historia de maneira menos rocambolesca e cheia de idas e vindas na investigação.
Por sorte, o bom elenco, que conta ainda com Kim Basinger, Lois Smith, Matt Bomer e Yaya daCosta torna essa uma questão menor.
Uma hora e cinquenta e seis minutos de boas risadas com show de dois atores de primeiríssima linha na melhor comédia do ano.
Não há nem o que discutir: Super mega ultra recomendado.

"-Munique.
-O quê?
-Um cara sem as bolas. É um Munique.
-Munique é uma cidade na Alemanha. Munique. München.
-Tem certeza?
-Meu pai foi embasado lá.
-Hm. Certo. ...Hitler só tinha uma bola."

quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Adeus, Sua Alteza


Ontem deu-se a passagem de Carrie Frances Fisher, que além de uma reconhecida escritora, roteirista, e uma das poucas pessoas públicas a tratar abertamente questões relacionadas a vícios e problemas mentais, foi uma atriz com mais de noventa trabalhos entre cinema e TV, e, de maneira mais marcante, a eterna princesa Leia Organa de Star Wars.
Foi com a personagem de vestido impecavelmente branco e estranhos coques laterais estilo fone de ouvido que Carrie Fisher entrou para o panteão dos personas fundamentais da cultura pop.
Fundamental porque a Leia de Carrie Fisher era tão essencial a Star Wars quanto o Luke Skywalker de Mark Hammil, o Han Solo de Harrison Ford ou o Darth Vader de James Earl Jones (desculpe-me David Prowse), é inevitavelmente um dos primeiros rostos e vozes que nos vêm à mente quando pensamos na mais proeminente ópera espacial do nosso tempo, e o símbolo mais maneiro do bom feminismo na cultura pop (e que me desculpe a Mulher-Maravilha), ao representar de maneira orgânica e natural uma paridade de gênero até então inédita no cinemão de aventura/ficção.
Leia rompeu o modelo tradicional de princesa.
Era tão central à ação quanto Luke e Han, os outros co-protagonistas da história, e por vezes melhor resolvida no que queria fazer.
Sua interpretação e o roteiro de George Lucas (e depois de Lawrence Kasdan) transformaram Leia num ícone.
A partir dela, uma menina podia ser uma princesa e rolar na sujeira, trocar tiros com malfeitores, saltar se pendurando em cordas feito o Tarzan, resgatar a si própria se achasse que os outros heróis estavam demorando demais, pilotar um speeder em alta velocidade pela floresta de Endor, usar um longo vestido branco, um biquíni dourado ou um traje camuflado de selva, dizer que amava um salafrário, fazer amizade com pequenos ursinhos/macacos ou estrangular um abusado sapo/verme gigante até a morte.
A princesa Leia podia fazer o que quisesse, até deixar de ser uma princesa pra se tornar uma general, e nenhum de nós duvidava ou questionava.
Muito do poder de Leia emanava de Carrie Fisher, que aos dezenove anos e medindo um metro e meio de altura se impunha e fazia pouco de Darth Vader e Wilhuff Tarkin de maneira convincente mesmo com uma estranha ponta de sotaque inglês em suas primeira falas, e que mesmo não tendo a mais convencional das belezas, galgou degrau a degrau um lugar muito especial no coração de toda uma geração.
Aos sessenta anos de idade, um ano após retornar àquela galáxia bem, bem distante, enquanto divulgava seu mais recente livro, Carrie Fisher se foi.
Seria mais uma perda a se lamentar em um ano repleto de perdas lamentáveis.
Mas mestre Yoda me ensinou que devemos nos regozijar por aqueles que se juntam à Força ao nosso redor. Não lamentá-los.
Então eu, que sou um aplicado padawan, farei isso:
Vou ficar feliz por Carrie Fisher, que se tornou um ser iluminado, longe da nossa rude matéria.
Adeus, sua alteza.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

Resenha Filme: Perfeita é a Mãe!


Eu vou confessar que, quando vejo um filme ser disponibilizado na Netflix com timming de lançamento de home-video, eu (desculpe o palavreado) quase gozo.
Não precisa ser um super blockbuster, não precisa ser um grande filme, por Odin, não precisa nem ser um filme que eu estivesse com vontade de assistir.
Apenas saber que, eventualmente, um longa de cinema pode ser disponibilizado no catálogo do serviço poucos meses após passar pelas salas de exibição me deixa contente.
Foi por isso que assisti a esse Perfeita é a Mãe!, um longa sobre a qual li brevemente pouco antes do lançamento e que, pra ser bem honesto, não tinha dado muita bola apesar da presença de Mila Kunis, por quem tenho uma queda desde Cisne Negro.
Não tenho nada contra comédias com elenco todo feminino, mas também não sou exatamente um entusiasta do filão, especialmente após a tragédia que foi o remake de Caça-Fantasmas no meio do ano, mas como disse, eu adoro um bom lançamento na Netflix.
O longa é narrado por Amy Mitchell (Kunis).
Amy se casou com seu namoradinho do ensino médio aos vinte anos de idade, engravidou logo em seguida, e após doze anos, é mãe de duas crianças, a diligente, quase neurótica Jane (Oona Laurence) e o preguiçoso Dylan (Emjay Anthony).
Amy precisa equilibrar suas tarefas de mãe em tempo integral, que incluem fazer compras, levar as crianças de uma atividade extra-curricular pra outra, ajudar com estudos, preparar trabalhos escolares, participar das reuniões de pais e mestres, e as tarefas domésticas com um trabalho de meio período em uma firma de café descolado e academia ao menos uma vez por semana tudo praticamente sozinha já que seu marido, Mike (David Walton) é um completo idiota que acredita que o mundo gira ao redor do seu umbigo.
Amy está sempre correndo atrás da máquina, e ela própria reconhece que está perdendo a corrida já que seu maior talento em tempos recentes é se atrasar pra tudo.
Ainda assim, ela vai levando as coisas da melhor forma possível pela sua família até o dia em que literalmente tudo dá errado ao mesmo tempo e Amy explode.
Ela decide parar de tentar carregar o mundo nas costas, de mimar seus filhos e de se preocupar com o que todos os outros pensam, chegando a comprar briga com Gwendolyne (Christina Applegate), a autoritária presidente da Associação de Pais e Mestres.
A ousadia da recém rebelada Amy logo ganha a simpatia da podrona mãe solteira Carla (Kathryn Hahn), que não tem amigas por causa de sua promiscuidade assumida e decantada e seus modos de estivador, e da pobre Kiki (Kristen Bell), uma tímida e carente mãe que sofre nas mãos dos quatro filhos e do marido controlador.
Juntas, as três amigas resolvem despirocar de vez, se rebelarem contra o mundo, e declarar a quem quiser ouvir, que, adivinhe... Perfeita é a Mãe!
A despeito da premissa nível sessão da tarde, há dois trunfos no longa. O primeiro são os diretores/roteiristas Jon Lucas e Scott Moore, responsáveis pelo script de Se Beber Não Case, o que já advoga em favor do humor do filme que, a despeito de um excesso de montagens musicais com câmera lenta e música pop, tem seus momentos.
O segundo, é o elenco principal.
Mila Kunis está longe de ser uma atriz ruim, e além de muito bonita, tem ótimo tempo de comédia. Kathryn Hahn é uma atriz subestimada, e que, longe de ser uma Meryl Streep, segura a peteca além de, condição sine-qua-non para comediantes, não ter medo do ridículo. Menos sorte tem Kristen Bell, relegada à "coadjuvância" quase absoluta e sem nem mesmo material bom o bastante para tentar roubar umas cenas, ainda assim, ela se dá melhor do que os homens do elenco, que, como reza a cartilha das comédias de elenco feminino atuais, são divididos entre rasos e idiotas completos.
Apesar de algumas piadas simplesmente não funcionarem, e os momentos que deveriam ser emocionantes nem sempre engrenarem, Perfeita é a Mãe! ainda é uma boa comédia, considerando-se a média do gênero, especialmente num ano carente de filmes capazes de fazer rir, de fato (Sem pensar muito, acho que a única boa comédia de 2016 foi A Grande Aposta).
A despeito de uma virada de chave saindo da acidez rumo à doçura no final do filme, o longa se aguenta, e garante a diversão.
Com outros nomes conhecidos no elenco de apoio (Jadda Pinkett-Smith, Annie Mumolo, Jay Hernandez, além de pontas de Wanda Sikes e Martha Stewart) o longa se segura, e se diverte especialmente às mães norte-americanas em situações semelhantes à de Amy, não é menos verdade que tem munição pra divertir qualquer audiência que não esteja de mal com a vida.
Duas horas de diversão descompromissada na Netflix?
Claro que vale a pena.

"-Ás vezes, quando estou dirigindo sozinha eu tenho essa fantasia de que eu me envolvo em um acidente de carro. Não um desses grandes com fogo e explosões, só um pequenininho, mas eu me machuco e tenho que ser internada no hospital por duas semanas e eu durmo o dia todo, e eu como gelatina, e eu vejo tanta TV e é tudo coberto pelo meu seguro. Meus filhos me trazem balões e as enfermeiras passam creme nos meus pés, e, oh, meu Deus, é tão incrível. Isso é algo com que vocês fantasiam, também?
-Não.
-Você é louca-de-pedra.
-É.
-E eu nunca vou entrar num carro contigo."

quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

Resenha Cinema: Sully: O Herói do Rio Hudson


Clint Eastwood chegou aos 86 anos de idade esbanjando disposição.
O eterno Dirty Harry se tornou um diretor prolífico que chega a lançar dois filmes no mesmo ano, e ainda que se possa questionar algumas de suas escolhas recentes, não se pode negar que o caubói de faroeste espaguete se transformou em um cineasta com recursos e assinatura visual consistentes.
O Clint diretor pode não ter o carisma do Clint ator, mas talvez tenha mais talento e seja mais versátil, navegando pelo romance de As Pontes de Madison até o drama sobrenatural de Além da Vida passando pelo western de Os Imperdoáveis, a ficção científica de Cowboys do Espaço e o musical de Jersey Boys: Em Busca da Música, sempre em busca de conflitos que ilustrem suas histórias, seja o conflito físico entre jogadores de rugby, ou de um político contra a mentalidade instaurada em seu país, ou o de um velho com um mundo novo no qual não se encaixa ou de um pistoleiro contra outro... Os conflitos pautam a filmografia de Eastwood.
E esse Sully: O Herói do Rio Hudson, que adapta o livro Highest Duty: My Search for What Really Matters do ex-piloto comercial Chesley Sullenberger não é exceção, já que vemos no longa a luta de Sully para provar aos burocratas das agências de reguladoras de transporte de passageiros que seu miraculoso pouso forçado no rio Hudson em janeiro de 2009 não foi um ato de imprudência, ainda que todas as simulações computadorizadas e relatórios de equipamentos digam o contrário.
Os acontecimentos da ocasião foram amplamente divulgados, pouco depois de decolar do aeroporto de Laguardia em Nova York, o vôo 1549 da American Airways se chocou com um bando de gansos canadenses perdendo ambos os motores.
Incapaz de retornar ao aeroporto, Sully (Tom Hanks) decidiu-se por uma amaragem no rio Hudson.
A Junta Nacional de Segurança em Transportes (NTSB na sigla em inglês), porém, preferia que Sully tivesse tentado o retorno ao Laguardia, ou tentado chegar ao aeroporto de Teterboro, em Nova Jersey, o que, segundo os cálculos e simulações, seria possível.
Após o caso, enquanto aguarda os laudos finais das investigações da NTSB e lida com o assédio da imprensa e da opinião pública, Sully passa a se questionar se, de fato, o rumo que escolheu era o mais acertado, ou se seus quarenta anos de experiência o cegaram para algo óbvio e ele cometeu um erro que colocou em risco a vida de 155 pessoas.
Há que se tirar o chapéu para Eastwood e o roteirista Todd Komarnicki. Não é tarefa fácil pegar uma história da qual o desfecho todos conhecem e cujo evento principal durou 208 segundos e transformar isso em um filme de cento e trinta e seis minutos capaz de causar tensão.
Ainda assim, o feito é alcançado por Sully: O Herói do Rio Hudson.
É difícil abstrair o fato de que todos sobreviveram sem nenhum arranhão quando o airbus A-380 de Sully bate de barriga nas águas gélidas do Hudson. Aliás, palmas para o octogenário Clint Eastwood, que mostra que, não só não tem medo de CGI, como também que se pode usar o recurso para mais do que um raio caindo do céu com um cinturão de detritos ao redor.
Toda a reprodução do acidente é perfeita a ponto de a audiência sentir nos dentes o impacto da aeronave com a água.
Claro, todo o talento de Clint e de Komarnicki não seriam capazes de segurar o filme sem um grande trabalho de elenco, felizmente, isso fica muito mais fácil com a presença de Tom Hanks.
O ator já tira de letra o papel do sujeito comum capaz de fazer o impossível quando necessário. Em Ponte dos Espiões, Apollo 13, À Espera de Um Milagre e em Capitão Phillips Hanks já deixou em claro que, quando não está sendo preguiçoso, ele tira esse tipo de papel de letra.
Hanks é um camarada de aparência mediana com um talento acima da média. E transferir isso para o piloto veterano de fala pausada é sopa pra um intérprete de seu calibre e carisma.
Também é bom ver Aaron Eckhart em um bom papel de destaque após as escorregadas de Frankenstein: Entre Anjos e Demônios e Invasão a Londres.
Sua interpretação do co-piloto Jeff Skiles é natural, relacionável e oferece um contraponto caloroso e relaxado ao jeitão rígido de Sully.
O elenco ainda conta com uma subaproveitada Laura Linney no papel da esposa de Sully, além de participações de Mike O'Malley, Jamey Sheridan, Michael Rapaport, Anna Gunn, Sam Huntington, Holt McCallany entre outros.
Com a orquestra afinadinha e um maestro que, a exemplo do personagem principal, sabe o valor da experiência em seu ofício, Sully: O Herói do Rio Hudson é um bom filme com picos de excelência.
Tem seus defeitos, mas é, no geral, um bom programa para amantes de cinema, de Tom Hanks, e de Clint Eastwood, o último macho de Hollywood.
Vale a ida ao cinema.

"-Tudo é sem precedentes até que aconteça pela primeira vez."

segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

O Trailer de Blade Runner 2049

Blade Runner precisa de uma continuação tanto quanto eu preciso de mais um braço. É sabido, já diriam os dothraki. Ainda assim, não pude deixar de ficar algo empolgado com o teaser do longa que dará sequência ao universo apresentado no filme original de Ridley Scott. A prévia, de menos de dois minutos, mostra aquela Los Angeles futurista tenebrosa que já conhecemos, e o encontro entre Deckard (Harrison Ford) e K, o personagem de Ryan Gosling. Confira:



Dirigido pelo ótimo Dennis Villeneuve, o longa tem estréia agendada para outubro do ano que vem. Além de Golsing e Ford, o elenco ainda conta com Jared Leto, Carla Juri, Mackenzie Davis, Barkhad Abdi, David Dastmalchian, Hiam Abbass, Robin Wright, Dave Bautista e Lennie James. A produção é de Ridley Scott, diretor do longa original.

Resenha Blu-Ray: O Bom Gigante Amigo


Roald Dahl é o escritor por trás de pérolas da literatura infantil tais como Matilda, James e o Pêssego Gigante e A Fantástica Fábrica de Chocolate.
Steven Spielberg é um dos cineastas fundamentais de nosso tempo, e o diretor de longas como E.T. - O Extraterrestre, Jurassic Park e Império do Sol.
Era de se esperar, portanto, que uma adaptação de Dahl por Spielberg, fosse ser um deleite infantil ímpar, algo diante do qual colocar os filhos na certeza de que eles irão se maravilhar, e, por que não, um produto capaz de fazer os adultos relembrarem como era bom ser criança.
E essa amálgama de talentos surgiu na forma de O Bom Gigante Amigo, uma história de Dahl que inclusive já tinha uma premiada adaptação animada datada de 1989 que ganhou uma versão (mais ou menos) em live action pelas mãos de Spielberg nesse ano.
Por mais que eu soubesse que O Bom Gigante Amigo poderia ser um ótimo filme, porém, eu não o assisti no cinema.
Como todo mundo já deve saber, filmes infantis são virtualmente impossíveis de se encontrar em versão legendada em Porto Alegre nesses dias, e o trailer do longa atestava a má qualidade da dublagem em português, de modo que resolvi esperar para conferir o longa no lançamento em home-video, o que aconteceu na semana passada.
Em O Bom Gigante Amigo conhecemos Sophie (Ruby Barnhill).
Sophie é uma órfã de dez anos de idade que mora em um abrigo para meninas em Londres.
Solitária e aventureira, Sophie vaga pelo orfanato nas horas altas da madrugada procurando livros para ler em sua cama driblando a cruel monitora do local.
É durante uma dessas incursões insones da madrugada que Sophie presencia da sacada da instituição uma grande figura que se move nas sombras do beco próximo.
Sophie percebe a criatura e a criatura a percebe de volta, e não tarda para que a menina seja abduzida de sua cama por uma mão gigante e levada em uma trouxa de cobertores por toda a Inglaterra e além, até uma caverna onde descobre que seu captor é um gigante de mais de oito metros de altura.
Todavia, contrariando seus temores iniciais, o tal gigante não é uma fera devoradora de gente, mas um ser gentil, solitário, algo triste e, embora um tanto atrapalhado com as palavras, inteligente e sábio.
Um Bom Gigante Amigo, conforme ele foi chamado durante algum tempo, e a quem Sophie passa a se referir como BGA (interpretado pelo vencedor do Oscar Mark Rylance através da melhor captura de performance que eu já vi sem o envolvimento de Andy Serkis).
Sophie também aprende que está no País dos Gigantes, onde o BGA vive com outros nove gigantes que têm nomes bem menos amistosos, como Comecarnecrua, Esmagamão e Estripapai, e, pra piorar, são bem maiores do que o BGA, e o atormentam com brincadeiras cruéis por ser menor e vegetariano, se alimentando exclusivamente de xuxubobrinhas, um vegetal de sabor indigesto, e da bebida que se faz a partir da fermentação das xuxubobrinhas, e não de carne humana como seus pares.
Enquanto os demais caçam crianças para comer durante as noites, o BGA caça e molda sonhos, e depois os leva à cidade onde os lança em crianças adormecidas.
E se inicialmente Sophie quer sair do País dos Gigantes o quanto antes, logo ela está junto com o BGA na Terra dos Sonhos caçando as pequenas luzes oníricas que voam entre árvores às margens de um lago, e as armazenando em potes de vidro para serem moldadas mais tarde.
A dupla não demora a formar uma poderosa amizade.
Tão poderosa que, quando os demais gigantes descobrem que o BGA está mantendo uma criança em sua casa e passam a ameaçar sua segurança, Sophie bola um audacioso plano para convencer a rainha da Inglaterra a ajudá-los.
Eu vi um bocado de críticas negativas a O Bom Gigante Amigo, e após assistir ao filme, devo supôr que os autores de tais críticas não entenderam que o longa é um filme infantil.
Quem acha que todo o filme infantil deve ser Pixar não vai conseguir aproveitar, mesmo o longa.
Ele é parado, contemplativo, com eventuais sequências de ação minimalista daqui, arroubos de inocente comicidade daqui, em uma trama vagamente episódica que, de fato, não prima pela agilidade.
O Bom Gigante Amigo se dá ao luxo de parar pra que os protagonistas troquem histórias ou para que um sonho seja contado através de sombras projetadas na parede, ou freia seu clímax para fazer piadas de peido com a rainha da Inglaterra e que, devo dizer, são as mais inocentes piadas de peido que eu já vi, e provavelmente as únicas que me fizeram rir desde Banzé no Oeste.
Aqueles que ainda são capazes de lembrar como era ter oito, nove ou dez anos de idade, irão se maravilhar com a história de Sophie e BGA, dois excluídos, cada um a seu modo, que encontram um no outro coragem para dar um passo adiante.
O Bom Gigante Amigo é um veículo para a relação entre os dois personagens centrais, e todo o resto é secundário, Spielberg e a roteirista Melissa Mathison estão mais interessados na interação dos dois do que em reviravoltas e subtramas.
Graças às performances de Rylance e Barnhill, por sinal, é justamente a relação entre esses dois amigos inesperados que permanece quando o filme termina.
A competência de Spielberg em escalar e dirigir crianças não é novidade, e a jovem atriz mirim é excelente retratando a órfã insone e teimosa que não tem medo da hora das bruxas ou de bicho papão, e que é introspectiva a ponto de preferir varar madrugadas lendo livros enquanto as outras crianças dormem, mas carece de um amor verdadeiro e confiável em sua vida.
Rylance também dá show como o BGA, e ainda que nós olhemos pra tela e vejamos um gigante de oito metros de altura com enormes orelhas de abano, também conseguimos ver a atuação do intérprete britânico em todos os gestos e expressões.
Esses dois são colocados em um mundo fabulesco criado com o que há de melhor na indústria cinematográfica, dos efeitos visuais da ILM à belíssima fotografia de Janusz Kaminzki carregada de cores vivas e brilhantes, e toda a parte técnica é um brinco, embora a trilha sonora de John Williams seja um pouco intrusiva.
No elenco, ainda há espaço para Jemaine Clement, Bill Hadder, Adam Godley, Ólafur Darri Ólaffson, Rafe Spall e Rebecca Hall além de uma inspirada participação de Penelope Wilton como a Rainha.
Repleto de magia e inocência, O Bom Gigante Amigo pode não ser um trabalho à altura dos melhores de Spielberg, mas é um filme tocante e carregado daquela qualidade lúdica que o cineasta sempre esbanjou em seu trabalho.
Parafraseando Marty McFly, talvez "você não esteja pronto pra isso. Mas seus filhos vão adorar.".
Certamente vale a locação.

"-Por que você me pegou?
-Porque eu ouvir seu coração solitário em meio a todos os sussurros secretos do mundo."

sábado, 17 de dezembro de 2016

Castigo


Há exatos dez anos atrás, em um domingo pela manhã, o Internacional batia o Barcelona, então melhor time do mundo, que tinha em seu elenco o melhor jogador do mundo, e galgava o mais alto degrau da glória esportiva possível a um clube de futebol:
A Copa do Mundo de Clubes da FIFA.
Foi com um gol do odiado Adriano Gabiru, que entrara sob os olhares aflitos de todos os colorados do Rio Grande no lugar de Fernandão, o capitão colorado, ídolo de 99 em cem peles-vermelhas, que o Internacional alcançou sua maior glória lá nas bandas de Yokohama.
Uma década depois de alçar seu voo mais alto, o Internacional de hoje é um clube em frangalhos.
Com uma direção de soberbos que se perpetuou no poder e monta times dizendo amém para empresários recheando a enxovalhada camisa escarlate com "jogadores de futebol" que, de tão pesadas as aspas ao redor do título, passaram os últimos dez meses se arrastando em campo, e arrastando à tira-colo a torcida colorada rumo ao abismo da série B.
Não se alimenta jumento com pão de ló, e infelizmente foi exatamente o que a direção do Internacional fez em anos recentes.
Fosse por segundas intenções ou incompetência, os alto gabinetes do Beira Rio se tornaram o matadouro das aspirações do clube. O tempo do jogador bom e barato foi-se pelas esteiras da história, sendo substituído pelo ruim e caríssimo que ocupa sete em onze posições da escalação a cada jogo.
A soberba que levou o Beira-Rio do pobre de chinela se descabelando de pé no concreto da arquibancada a se tornar o templo dos endinheirados bem vestidos sentados na cadeira de plástico vermelho enquanto faz autorretrato com smartphone pra postar na rede social cobrou seu preço.
O zé das couves que carregava tijolo em carrinho de mão pra erigir o estádio foi substituído pela loira maquiada com esmero às quatro da tarde de domingo ou o gurizão cheio de gel no cabelo com uma camiseta da Nike de 350 reais, porque estes tipinhos paga mais caro pra ir ao jogo e compartilhar no facebook.
É mais lucrativo.
E menos eficaz.
O Internacional tem a terceira melhor média de público do brasileirão, mas o estádio não pulsa.
Não vibra.
Não ruge.
Não joga.
A organizada composta por moleques de dezessete anos canta suas musiquinhas e saltita atrás das goleiras com efeito zero. São marionetes de alguém. O futebol é secundário. Estão lá pra apoiar.
Não importa o que acontece em campo. Nem olham o jogo.
Apoio incondicional dá nisso.
Os burros criados a pão de ló acham que estão agradando.
Esquecem como é ser criticado. Se ouvem apupo dos mais exigentes, que querem bom futebol, cérebro funcional ou um mínimo de empenho, se ofendem.
Chamam a imprensa e fazem declaração. Lançam nota oficial.
Nota oficial de jogador de futebol é o fim da várzea.
Jogador ofendido porque ouviu vaia, idem.
Foi o que o Internacional erigiu em anos recentes. Lá se vão seis anos desde a última conquista de peso.
O clube só se apequenou nesse tempo.
Enxotou o povo do clube do Clube do Povo porque vende melhor ser "Campeão de Tudo".
Mais status.
O grupo que vem gerindo o Internacional em anos recentes cometeu todos os equívocos que a soberba e a ganância permitem cometer, e o rebaixamento é castigo plenamente merecido pra eles, que venderam a alma Colorada à série B por doze moedas de prata.
É uma pena que a torcida tenha que ir junto.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Resenha Cinema: Rogue One: Uma História Star Wars


Eu assisti Star Wars pela primeira vez, provavelmente com sete anos de idade, quiçá menos.
Acredito que o filme tenha passado numa Tela Quente da vida, ou algo que o valha, pois me lembro de que ele passou à noite, e não me lembro se eu já frequentava a escola porque me lembro de ter visto a chamada do filme na TV pela manhã. Mas eu não sei... Talvez eu estivesse de férias. Talvez fosse de tarde e eu não me lembre... As memórias colaterais da infância são nubladas depois de quase trinta anos.
Eu vou confessar que eu nem mesmo sei se terminei de assistir ao filme nessa primeira vez. Eu realmente não tenho memórias disso. Não consigo nem definir se o que assisti foi Guerra nas Estrelas, O Império Contra-Ataca ou O Retorno de Jedi, que eram os nomes dos filmes, então.
O que eu sou capaz de me lembrar, é de ter desenhado, com meu melhor traço à época, uma vilanesca figura negra com capacete de caveira e uma espada laser vermelha, e um herói de branco com uma espada laser verde...
Tenho quase certeza de que desenhei aquele Luke genérico de capa... Eu era criança e, na minha mente, capas eram parte importante da indumentária heroica, pergunte a qualquer kryptoniano.
O que também tenho quase certeza de ter feito é ter brincado de Guerra nas Estrelas. Tanto personificando algum personagem, quanto com brinquedos.
Os brinquedos de Guerra nas Estrelas eram anunciados pelo palhaço Bozo em seu programa matutino. Figuras de ação, que eu adorava, e os veículos que, vou confessar, não me despertavam grande interesse na tenra infância.
Que idiota eu era.
De toda a sorte, eu me lembro de ter ganho, ao menos um Chewbacca em um natal. Me lembro claramente de tê-lo mostrado à minha mãe antes de dormir. Era um boneco pequeno, pouco articulado, e, francamente bem sem-graça.
É engraçado porque, muito pequeno, e sem grande acesso à informação, eu não me apeguei tanto a Star Wars. Eu assisti o filme, brinquei um pouco, e meio que esqueci... Apenas anos mais tarde, já adolescente foi que eu reafirmei meu compromisso para com a saga.
Em 1997, quando George Lucas lançou as versões remasterizadas dos então Episódios IV, V e VI, eu fui ao cinema para revê-los,
E vou confessar, os filmes me pegaram de novo, se tornando parte indelével da minha memória afetiva e ganhando cadeira cativa nas minhas preferências.
Comprei livros, quadrinhos, memorabília, aluguei os filmes quando de seu lançamento em VHS e apresentei Star Wars ao meu irmão mais novo da maneira que eu gostaria que ele me tivesse sido apresentado.
Fui ao cinema assistir à trilogia prequel, à exceção de A Ameaça Fantasma, que vi direto em home-video, joguei os games, li os livros, ouvi os CDs, e joguei o RPG acrescentando meu próprio scroll de letras à saga espacial, me esforçando para tornar meus amigos jedi, senadores idealistas, pilotos ases, dróides e contrabandistas à sombra do Império.
Ano passado, na estréia de O Despertar da Força, eu estava no cinema trajando um garboso traje de Jedi misturando a roupa de Qui-Gon Jinn em Episódio I e a de Luke Skywalker em Episódio VI, faceiro feito guri de kichute novo para reencontrar, feliz da vida, uma das minhas mais longevas memórias infantis.
E ontem, de maneira muito mais sóbria, usando trajes civis, eu fui ver a estréia de Rogue One: Uma História Star Wars, o longa que conta a história de como a Aliança Rebelde obteve os planos da Estrela da Morte.
No longa acompanhamos Jyn Erso (Felicity Jones), filha de Galen Erso (Mads Mikkelsen), um cientista de quem foi separada ainda na infância, quando ele foi cooptado pelo diretor de desenvolvimento de armas do Império Galáctico, Orson Krennic (Ben Mendelsohn) para ajudar na criação de sua arma definitiva.
Criada pelo militante rebelde e veterano das Guerras Clônicas Saw Guerrera (Forrest Whitaker), Jyn cresceu para se tornar uma criminosa dura e arredia, lutando por sua sobrevivência e liberdade sem jamais ter-se dado o luxo de ideologias políticas.
Isso muda quando a Aliança Rebelde descobre que Guerrera foi procurado por Rook Bodhi (Riz Ahmed), um piloto imperial desertor que afirma possuir informações a respeito da última criação de Galen Erso.
O problema é que os métodos de Guerrera são extremos demais até para os rebeldes, que sabem que não serão recebidos pelo militante se não tiverem um trunfo.
Esse Trunfo é Jyn e seu passado em comum com o veterano.
Libertada da prisão pelo capitão Cassian Andor (Diego Luna), um frio assassino à serviço de Mon Mothma e Bail Organa (Jimmy Smits) e por K-2SO (Alan Tudyk), um dróide imperial reprogramado que é uma mistura de R2-D2 e C-3PO temperado com instinto assassino e uma sinceridade alarmante, Jyn é recrutada por Mothma (Genevieve O'Reilly) para intermediar um encontro com Guerrera e garantir que a Aliança possa partilhar as informações de Bodhi e saber o que é a tal arma imperial.
Não tarda para que Jyn descubra que seu pai ainda vive e é o principal engenheiro da arma chamada de Estrela da Morte, e para que sua missão logo se torne uma tentativa de resgatar seu pai e descobrir uma forma de neutralizar o abominável engenho de destruição em massa.
Juntam-se a Jyn, Cassian, Bodhi e K-2SO o monge jedaísta cego Chirrut Îmwe (Donnie Yen) e seu fiel companheiro e guardião, o especialista em armas Baze Malbus (Wen Jiang).
É a esse pequeno grupo de renegados que cabe enfrentar a máquina de guerra imperial, procurando desesperadamente por uma forma de impedir que a rebelião seja obliterada pelo invento de Galen Erso na mais fundamental missão da Aliança Rebelde até então.
É muito difícil, pra mim, avaliar um Star Wars apenas como filme, mas enquanto filme, Rogue One é muito bom.
Sob diversos aspectos o longa dirigido por Gareth Edwards, do último Godzilla é, de fato, muito superior a O Despertar da Força, e à trilogia Prequel.
Há um senso de urgência em toda a missão de Erso e companhia que é quase inédita em termos de Star Wars, o que é notável considerando que todo mundo sabe que, no final das contas é uma missão bem sucedida.
Ainda assim, é difícil não sentir uma pontada de aflição conforme os percalços se empilham no caminho do grupo, e muito do mérito disso está no trabalho de Edwards.
O diretor trabalha tão bem quanto possível o script de John Knoll, Gary Whitta e Chris Weitz que passou por diversas refilmagens e foi parcialmente reescrito por Tony Gilroy para chegar ao tom que a Disney queria para o longa metragem, tornando um filme cujo histórico por trás das cenas sugeria uma bagunça ao estilo Esquadrão Suicida em uma história coesa e uniforme apesar do desenvolvimento ligeiro ao estilo ponto A a ponto B, ponto B a ponto C...
Se as refilmagens e versões múltiplas do roteiro prestam algum desserviço de fato, é aos personagens.
Rook Bodhi, Chirrut Îmwe, Baze Malbus e o dróide K-2SO são personagens gostáveis e redondinhos em sua coadjuvância, Orson Krennick é um vilão entediado ao melhor estilo burocrata tentando ascender na cadeia de comando da "firma", e Saw Guerrera é uma interessante inversão dos vilões meio homem-meio máquina de Star Wars (com pernas biônicas e um respirador artificial é difícil não relacionar Guerrera a Vader e Grievous na tradição "mais máquina que homem" da saga, mas do lado do bem), mas não dá pra não pensar que Cassian Andor e Jyn Erso tinham mais a oferecer.
Andor especialmente por mostrar um lado pouco explorado da Aliança Rebelde: O das pessoas que aceitaram o pragmatismo de uma guerra suja e não estão exatamente em paz com suas consciências após anos de decisões difíceis e escolhas moralmente reprováveis.
Jyn Erso, por sua vez, foi apresentada nos trailers como uma tremenda casca-grossa com problemas de confiança e dificuldade em lidar com hierarquia, mas, no filme, se tornou uma mocinha com questões não resolvidas com o papai e que mesmo pesando uns 50 quilos ainda é capaz de derrubar stormtroopers a pancadas (e depois dos ewoks, quem sou eu pra duvidar?) e cuja história prévia com Krennic dá ao seu arco uma cara sonolenta de vingança.
Jyn e Cassian mereciam ser mais desenvolvidos, inclusive para que a sua relação fosse melhor desenvolvida, ainda assim, Diego Luna e Felicity Jones são bons atores, e certamente fazem o seu melhor com o que têm.
As batalhas aéreas são excelentes tanto no espaço quanto dentro da atmosfera dos planetas e não falta pancadaria pra todos os gostos. A produção de arte e o design de produção são caprichados, emulando com competência tudo o que já vimos naquela galáxia bem, bem distante, e oferecendo vislumbres de admiráveis mundos novos, mas a trilha sonora, pecado imperdoável para a franquia, é absolutamente esquecível.
O CGI é bastante competente, e apenas as recriações do Grão Moff Tarkin de Peter Cushing (interpretado digitalmente por Guy Henry) e da jovem Leia Organa (Ingvild Deila) destoam, parecendo personagens de vídeo-game no meio de um live action, mas isso é compensado pela presença de Darth Vader, em toda a sua glória malvada com direito até à voz de barítono do octogenário James Earl Jones, que é utilizado com parcimônia, aparecendo apenas um par de vezes com a pompa que o vilão mais maneiro do cinema merece.
Rogue One: Uma História Star Wars é um bom filme, um programa divertido e um raro caso de filme de Star Wars que provavelmente agradaria à uma audiência formada por não-fãs.
Enquanto admirador de cinema, Rogue One me agradou bastante, ainda assim, não pude deixar de sentir um certo vazio ao final do filme, quando me dei conta de que, no espaço de mais ou menos um ano, eu assisti a dois filmes inéditos de Star Wars...
Uma palpável sensação de que, o que antes seria um evento, se tornou algo banal.
Ainda assim, é Star Wars.
E certamente vale a ida ao cinema.

"Rebeliões são construídas com esperança."

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Resenha Cinema: Animais Fantásticos e Onde Habitam


Conforme testemunha meu atraso de quase um mês para assistir Animais Fantásticos e Onde Habitam, eu não sou um grande fã de Harry Potter.
Eu não li os livros, e ainda que tenha assistido a todos os filmes, a maioria deles no cinema, a verdade é que jamais foi, pra mim, um programa obrigatório.
Não me lembro se foi A Pedra Filosofal ou A Câmara Secreta, mas um desses filmes eu vi no cinema apenas porque sabia que ele seria precedido pelo trailer de O Senhor dos Anéis: As Duas Torres.
E se assisti na estréia a todos os filmes de O Cálice de Fogo em diante, foi porque meu irmão, esse sim, um declarado fã da obra de J. K. Rowling, me obrigava a acompanhá-lo.
Ainda assim, confesso que os trailers de Animais Fantásticos me deixaram curioso com relação ao filme, e se não fui assisti-lo antes, foi mais por incompatibilidade de horários, já que a grade de exibição dividida entre dublados e legendados quebra as pernas de qualquer um.
Apenas ontem fui ver a aventura de Newt Scamander, que, conforme fui informado anos atrás, era um magizoologista respeitadíssimo por seu trabalho catalogando criaturas mágicas em seu famoso guia que empresta nome ao filme.
No longa acompanhamos a chegada de Scamander (Eddie Redmayne) a Nova York na década de 20. Ele chega à grande maçã trazendo consigo apenas uma mala.
Sua bagagem, porém, na melhor tradição da T.A.R.D.I.S. é bem maior do que aparenta por fora, e está repleta de animais fantásticos.
Bestas mágicas desconhecidas pela população em geral, e temidas pelos bruxos às quais Scamander dedica-se a proteger.
Esses seres, porém, não são os mais comportados, e estão esperando apenas uma oportunidade para sair da mala de Newt e explorar seus arredores.
É quando uma dessas criaturas, um pelúcio (um tipo de ornitorrinco extremamente ágil com predileção por coisas brilhantes), escapa da mala de Newt perto de um banco que o caminho dele se cruza com o do aspirante a confeiteiro Joseph Kowalski (Dan Fogler).
Após uma confusão dentro do banco, as malas de Newt e Joseph se trocam, e antes que o bruxo possa desfazer a confusão, ele é preso por Tina Goldstein (Katherine Waterston), uma ex-auror a serviço da MACUSA (Congresso Mágico dos Estados Unidos da América, na sigla em inglês) tentando recuperar seu posto em um momento onde o delicado equilíbrio entre os segredos do mundo dos feiticeiros e os não-majs (modo como os americanos chamam os Trouxas) é ameaçado por ataques de um bruxo anarquista chamado Grindenwald, que desencadeou as manifestações de pessoas chamadas de Nova Salemitas, que se dedicam a expôr e caçar os magos, pessoas como Mary Lou Barebone (Samantha Morton), que se dedica a adotar crianças e colocá-las na linha de frente de sua cruzada.
Não tarda para que Newt, Dan, Tina e sua irmã Queeni (a gatinha Alison Sudol) se vejam até o pescoço na tentativa de recuperar as bestas mágicas enquanto são caçados pelo auror Graves (Colin Farrell), um bruxo cheio de segredos que tenta usar o filho de Mary Lou, Credence (Ezra Miller), para encontrar uma criança que pode se tornar uma arma poderosíssima.
Eu sei, parece um bocado de trama pra cobrir em um filme de pouco mais de duas horas, e é mesmo.
Alguns personagens são subaproveitados, perguntas ficam sem resposta, e subtramas são mal-resolvidas, mas isso é o de menos.
Animais Fantásticos deve ser uma série de cinco longas, e esse é apenas o primeiro.
O importante é que o roteiro de J. K. Rowling, a idealizadora do universo de Harry Potter pela primeira vez escrevendo um script, está repleto de todos os ingredientes que tornaram o menino bruxo um fenômeno capaz de fazer uma geração de imbecis ler calhamaços de quinhentas páginas sem gravuras.
Animais Fantásticos e Onde Habitam não é um filme que vá mudar a vida da audiência, nem tampouco é uma obra cinematográfica singular, ainda que haja um trabalho esmerado do departamento de arte, um roteiro competente o bastante (inclusive traçando paralelos entre a tensão entre bruxos e não-majs e a Lei-Seca e a ascensão da Ku-Klux-Klan), uma direção bastante segura do veterano do universo Potter David Yates e um elenco cheio de talento em todos os papéis (Além de Redmayne, Waterston, Fogler e companhia ainda há John Voigt, Ron Perlman, Carmen Ejogo, Zöe Kravitz e Johnny Depp), o filme está fadado a viver na sombra da multi-bilionária franquia original, e não tem atributos que o façam se destacar entre outros bons blockbusters de verão, mas a verdade é:
Quem liga?
Os fãs de antigos têm uma oportunidade de revisitar o universo que amam, e velhos amargurados que não gostam de crianças protagonistas iguais a mim podem ver o mundo de Harry Potter por outro prisma. Um que, devo dizer, me pareceu até mais interessante.
Eu não vou mais ser um trouxa. Quando Animais Fantásticos 2 for lançado, eu não esperarei um mês para assistir ao filme.
Certamente vale a ida ao cinema.

"-Vamos recapturar minhas criaturas antes que se machuquem. Nesse momento elas estão em terreno estranho, cercada por milhões das mais cruéis criaturas do planeta: Humanos."

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Resenha DVD: A Lenda de Tarzan


Eu acho que a maioria das pessoas não tem a idade nem o background nerd necessários para lembrar dos tempos em que o SBT tornou a sua sessão de filmes vespertinos no sábado à tarde um festival Tarzan.
Entrava semana, saía semana e tu podia apostar dinheiro que passaria ao menos um filme sobre o rei das selvas no Cinema em Casa, ou qual fosse o nome daquela hora de filmes. Ás vezes era um Tarzan e alguma outra coisa, A Fantástica Fábrica de Chocolate, ou Cama Ardente, ou AIDS: Aconteceu Comigo, Z: o Ataque dos Dobermanns... Mas não era raro passarem dois filmes de Tarzan em sequência, geralmente sem nenhuma conexão um com o outro exceto o personagem central e a ambientação africana, estrelado por atores diferentes interpretando o rei dos macacos em aventuras que, obrigatoriamente envolviam nadar em um rio e lutar contra um crocodilo de borracha em algum momento.
Meu Tarzan favorito, porém, era o de Greystoke: A Lenda de Tarzan, interpretado por Christopher Lambert em um filme que, eu admito, era pretensioso pra danar, mas me agradava bastante.
Quando ouvi falar que haveria uma nova versão em live action de Tarzan, confesso que fiquei bastante surpreso.
Por mais que a forma de Hollywood fazer filmes hoje em dia seja basicamente requentar ideias que já foram usadas com sucesso no passado, ou adaptar histórias que estão no coração e mente das pessoas, o atual momento que vivemos em termos de sociedade e a sensibilidade politicamente correta que se instalou na mídia me pareciam olhar com cara de reprovação e balançando a cabeça para uma história onde um nobre inglês branco cresce na África para se tornar o defensor dos povos nativos e o rei dos animais.
Olhando as críticas a filmes de qualquer tipo nos dias de hoje, vê-se que muitos especialistas parecem mais dispostos a criticar um filme por ele ter um homem caucasiano no papel de protagonista do que por sua qualidade enquanto filme.
Pouco tempo após o lançamento de Doutor Estranho li uma resenha onde a jornalista falava que não aguentava mais histórias sobre "um homem branco destinado a salvar o mundo", imagine a reação dessa jornalista à história de um homem branco ganhando domínio sobre a natureza e sendo o salvador dos povos da África? Ela provavelmente rolaria os olhos e sofreria uma síncope.
Eu não sou tão politicamente correto.
Tentei ver A Lenda de Tarzan no cinema, e só não o fiz, de fato, porque não encontrei horários legendados que coubessem na minha agenda (a proliferação de filmes dublados e a falta de educação e civismo dos frequentadores eventuais vão me fazer parar de ir ao cinema de vez ou matar alguém durante um filme), mas esperei ansioso que o filme fosse lançado em DVD (é, eu ainda alugo DVD) e no sábado, finalmente consegui alugá-lo.
O longa dirigido por David Yates (dos últimos quatro filmes da franquia Harry Potter e Animais Fantásticos) abre com um breve recordatório sobre a colonização belga no Congo (para quem não está familiarizado com a História da África, a Bélgica, esse insuspeito país do qual lembramos apenas pelo chocolate e pelo cabelo do Marouane Fellaini, protagonizou um dos mais cruéis capítulos da colonização européia no continente).
O rei Leopoldo, ansioso por obter lucro com a exploração do país africano, rico em marfim e minério, se enterrou em dívidas, e precisa urgentemente de dinheiro para pagar seus débitos e manter sua máquina extrativista funcionando protegida por seu exército regular e seus mercenários.
Para isso, ele envia seu mais fiel agente ao Congo. Leon Rom (Christoph Waltz), que tem a missão de adentrar as partes mais sinistras da região em busca dos diamantes de Opar.
O líder tribal chefe Mbonga (Djimon Honsou) está disposto a fazer um trato com Rom. Ele oferece os diamantes Opar em troca de seu inimigo jurado:
Tarzan.
A questão é que Tarzan não existe mais.
Após ter sido criado por gorilas nas florestas congolesas depois de ter perdido seu pai e sua mãe, John Clayton III, lorde de Greystoke (Alexander Skarsgård) retornou à Londres, assumiu uma cadeira na câmara dos lordes e vive confortável e civilizadamente na propriedade Greystoke com sua esposa Jane Porter (Margot Robbie).
Quando outros nobres ingleses lhe transmitem o convite de Leopoldo para que Graystoke viaje ao Congo como emissário diplomático britânico e veja as benesses que os Belgas estão construindo para os nativos no país, o primeiro impulso de Clayton é negar o convite, entretanto, ele é persuadido a mudar de ideia por George Washington Williams (Samuel L. Jackson), um observador norte-americano que tem razões para crer que Leopoldo e os Belgas estão cometendo todo o tipo de atrocidades no Congo, incluindo escravidão, mas não tem provas e nem tampouco convite para viajar ao país africano, algo que pode conseguir se acompanhar Greystoke.
Se John Clayton estava reticente em voltar ao continente negro, Jane é toda entusiasmo em retornar ao convívio das pessoas com quem conviveu durante seu período como missionária, e se inicialmente ele planejava mantê-la sã e salva em Londres durante a viajem, logo fica claro que voltar à África sem Jane não é uma opção.
Logo John Clayton, Jane e George chegam ao Congo, reatando antigos laços sem saber que estão entrando em uma armadilha e que a única forma de livrar os nativos do jugo sanguinário de Leopoldo pode ser com o retorno de Tarzan.
Eu gostei do filme.
No geral, o longa tem alguns problemas de edição, mas nada que atrapalhe o desenvolvimento da trama. As atuações são OK, embora Waltz pareça estar reprisando Hans Landa toda a vez que faz um vilão, ele continua sendo extremamente carismático, e seu grande problema é não convencer como uma ameaça física ao bombado Tarzan de Skarsgård, que, por sinal, tem uma expressão facial tão dura quando seus abdominais, mas encontra guarida na abordagem de nobre inglês para sua impassividade fleumática, já Margot Robbie é tão convincente como uma dama de 1890 quanto eu sou.
A deliciosa australiana interpreta Jane em modo Século XXI, atrevida, respondona, inteligente e independente.
Por sinal, essa necessidade que o roteiro de Craig Brewer e Adam Cozard tem de, o tempo todo, se desculpar com um "veja bem", é um dos defeitos mais chatos do longa.
Volta e meia alguma coisa acontece para reforçar a posição dos nativos africanos como iguais de Tarzan, e não seus súditos, ou para mostrar que Jane não é uma donzela em perigo, e sim uma mulher independente e cheia de recursos, ou até para mostrar que Tarzan não é o rei dos macacos, mas apenas mais um na côrte de seus irmãos gorilas.
O roteiro se desculpa o tempo todo por ter um salvador branco e patriarcal, e isso é muito chato. Se o filme abraçasse de vez a obra de Edgar Rice Burroughs talvez o longa andasse a distância que separa uma boa matinê de um ótimo filme, mas o longa parece ter medinho de se assumir, e com isso, ele fica no meio termo.
Não me entenda errado, não há nada de intrinsecamente ruim em A Lenda de Tarzan, que, no geral, é um bom filme. A ação é competente, os efeitos especiais são bons, o elenco é bacana... O grande senão é que há um baita filme em A Lenda de Tarzan, mas por várias razões, ele nos é sonegado, e isso é uma pena.
Ainda assim, o longa se junta a Greystoke na minha lista de filmes de Tarzan favoritos, e certamente ele ainda vale a locação.

"Ele é Tarzan. Você é Jane. Ele virá."