E, novamente chegamos ao dia dos namorados. É hora de sentar no sofá, no escuro, segurar o rosto entre as mãos e passar a noite se lamuriando por não ter ninguém ao seu lado, ou furar a quarentena, ir jantar fora com a pessoa amada e vocês dois pegarem Covid-19 e morrerem, ou, quem sabe, ficar em casa, pedir pizza e trocar presentes comprados pela internet enquanto assistem a um filminho romântico...
Para auxiliar os optantes por essa última alternativa, nesse ano, vamos elencar dez dos melhores representantes do sub-gênero mais popular dos filmes de amor: As comédias românticas, em mais um infame top-10 Casa do Capita.
À lista:
10 - Ressaca de Amor (Nicholas Stoller, 2008)
O longa mais recente da minha lista é mais velho que a minha sobrinha, o que faz com que eu me sinta irremediavelmente um ancião. De toda a sorte, ainda que Ressaca de Amor (tenebrosa tradução do título original, Esquecendo Sarah Marshall) seja provavelmente o filme mais engraçado da lista, não é difícil imaginar pessoas torcendo o nariz para sua presença aqui.
Ainda assim, o longa de Nicholas Stroller, co-roteirizado pelo protagonista Jason Segel, é um dos mais honestos retratos de como uma situação ruim, mas familiar, pode impedir uma pessoa de tentar encontrar felicidade verdadeira.
Na trama, Peter Bretter (Segel) é dispensado pela namorada, a estrela de TV Sarah Marshall (Kristen Bell). Na tentativa de esquecer o pé na bunda, Peter resolve passar férias no Havaí apenas para descobrir que Sarah e seu novo namorado, o roqueiro inglês Aldous Snow (Russel Brand, praticamente interpretando a si próprio, e ótimo no papel), estão hospedados no mesmo resort que ele.
Se inicialmente a situação parece um pesadelo de proporções bíblicas, logo Peter se vê partindo pra outra e flertando com a adorável recepcionista do hotel (uma Mila Kunis transbordando doçura e beleza).
À primeira vista parece bastante convencional, mas além de ser uma comédia romântica para um determinado estado de espírito, Ressaca de Amor ainda tem um inspirado elenco de apoio que conta com Jonah Hill, Paul Rudd e Bill Hader, cada fala do filme é repleta de propósito cômico, e o jantar no terceiro ato do filme é um daqueles festivais de desconforto alheio dos quais a gente ri, nem que seja de nervoso. Adicione-se a isso a trágica balada a respeito do coração partido do Conde Drácula, e eu tenho certeza de que a presença de Ressaca de Amor nesse top-10 se torna mais do que merecida.
9 - Procura-se Amy (Kevin Smith, 1997)
Existia uma sensibilidade nos trabalhos iniciais de Kevin Smith que, certa vez, fez a revista Set considerá-lo um dos jovens diretores de cinema mais promissores em atividade, e chegar a citá-lo como o sujeito que melhor falava de relacionamentos desde Woody Allen.
Claro, todos nós sabemos que, eventualmente, Smith resolveu que queria ganhar a vida como nerd profissional ao invés de cineasta, e, que bom pra ele. O nativo de Nova Jersey continua fazendo filmes aqui e ali, ele recentemente lançou um Jay & Silent Bob Reboot, mais uma visita ao mundo de suas comédias mais rasgadas, e flertou com estilos variados, fazendo filmes de terror e suspense, como Red State e The Walrus, mas provavelmente o ponto mais alto de carreira de Smith, junto com Barrados no Shopping, seja Procura-se Amy, onde o autor de quadrinhos underground Holden (Ben Affleck) se apaixona pela colega Alyssa (Joey Lauren Adams), apenas para ficar arrasado ao descobrir que ela é lésbica.
Isso, no entanto, não o impede de começar uma amizade com ela, e, à revelia das advertências de seu amigo Banky (Jason Lee) eventualmente, um relacionamento romântico que parece fadado à tragédia.
Rodado a toque de caixa por Smith com seus amigos e namorada nos papéis principais, Procura-se Amy é um longa verborrágico, todo galgado nos diálogos de seus personagens que gentilmente revela a hipocrisia que cerca relações amorosas, ultrapassando os clichês tradicionais do gênero e se concentrando nas inseguranças que todos os seres humanos, sejam gay ou hétero, inevitavelmente compartilham.
8 - Um Lugar Chamado Notting Hill (Roger Michell, 1999)
Um Lugar Chamado Notting Hill provavelmente nem é a minha comédia romântica favorita com Hugh Grant, meio que o garoto-propaganda do gênero (Eu, francamente, prefiro Um Grande Garoto...). Ainda assim, a simplicidade da trama do longa escrito por Richard Curtis, que faz com que Anna Scott (Julia Roberts) a estrela de cinema mais famosa do mundo, se apaixone pelo sujeito comum que tem uma loja de livros de viagem no bairro de Notting Hill, em Londres e, mais do que isso, o faça sendo apenas uma garota, em frente a um garoto, pedindo que ele a ame, elevam o filme muito além do básico.
A auto-piedade quase patológica de Grant e a estridência por vezes excessiva de Roberts os tornam opostos que a audiência acredita que possam se atrair graças ao trabalho do diretor Roger Michell e de Curtis, que calibram a história de Anna e Will de maneira quase imaculada, fazendo com que o longa seja um campeão de reprises na TV a cabo que eu quase sempre acabo revendo, seja pelo exercício de nonsense da sequência com as entrevistas para a revista Cavalos & Cães de Caça, seja pela maneira como Rhys Ifans eleva a tendência do "amigo excêntrico" a níveis estratosféricos ou pelo restante do encantador elenco de apoio que ajudam a carregar o longa até a obrigatória corrida no clímax que se tornou uma das epítomes do gênero.
7 - Uma Linda Mulher (Gary Marshall, 1990)
Olha a Julia Roberts aí, de novo... E no filme que colocou a ruiva e seu enorme sorriso, no mapa das estrelas Hollywoodianas com o tipo da história a respeito de uma puta com coração de ouro que só a Disney poderia financiar.
A variação de Minha Bela Dama que troca a florista de Londres por uma prostituta de Los Angeles é turbinada, em grande parte, pela presença de Roberts, então uma novata metendo o pé na porta de Hollywood, e de Richard Gere, então um dos galãs fundamentais do cinemão norte-americano contando a história da prostituta Vivian, que aceita três mil dólares para ser a acompanhante do homem de negócios milionário Edward durante uma semana.
A despeito de sua história mais do que previsível, o diretor Gary Marshall conseguiu tirar uns coelhos da cartola para turbinar o charme do filme, a começar pela inegável química do casal protagonista, uma série de atores competentes interpretando coadjuvantes gostáveis (como Laura San Giácomo e Hector Elizondo) ou detestáveis (o George Costanza Jason Alexander dando aula de como ser asqueroso), tudo embrulhado em romance com R maiúsculo pra nenhuma tia velha botar defeito, em um dos longas que ajudou a consolidar a fórmula das comédias românticas dos anos 90, que se tornaria a regra a partir de então.
6 - O Diário de Bridget Jones (Sharon Maguire, 2001)
Eu já devo ter dito antes, aqui mesmo nesse espaço, que Bridget Jones é uma das personagens femininas fundamentais da sétima arte. A personagem que é apresentada à audiência de pijama, comendo bolo e tomando vinho ao som de "All by Myself" é uma hipérbole com a qual quase todas as mulheres parecem ser capazes de se relacionar em algum nível.
Por isso, apenas, o primeiro dos três filmes estrelados pela loira já mereceria uma menção honrosa em qualquer lista de comédias românticas, mas há mais do que a heroína vivida por Renée Zellweger e sua busca por melhorar como pessoa e encontrar o amor antes dos quarenta nesses filmes.
Apesar de muita gente detonar as sequências, eu, pessoalmente, gosto igualmente de todas as partes da trilogia Jones, ainda que seja inegável que o longa inaugural é a grande primeira impressão da série, com o estabelecimento do divertido triângulo amoroso de Bridget, Daniel Cleaver (Hugh Grant, de novo...) e Mark Darcy (Colin Firth), e repleto de momentos memoráveis como a sopa azul, blusões de natal feios, uma das melhores cenas de luta mal coreografadas da história do cinema, além de um clímax de de comédia romântica tão satisfatório quanto absurdo, com a rechonchudinha Bridget perseguindo o amado pelas ruas nevadas de Londres usando apenas uma jaqueta, tênis e calcinhas de zebra.
5 - Simplesmente Amor (Richard Curtis, 2003)
É bem provável que "a comédia romântica definitiva" esteja em um posto mais alto da lista de muitos leitores. Eu mesmo adoro Simplesmente Amor, tenho o filme na estante e sempre que ele está passando na TV, eu acabo vendo ao menos por algum tempo.
A grande força do longa do papa do gênero Richard Curtis, sua enorme quantidade de personagens (praticamente todos os atores britânicos vagamente relevantes aparecem no filme, geralmente usando um grande blusão de gola rolê) e linhas narrativas paralelas que confluem para a apoteótica véspera de natal, também é, em parte, sua fraqueza.
Por vezes parece que nós não estamos vendo um filme, mas uma coleção de trechos de filmes. Há um claro desequilíbrio entre essas pequenas histórias, com algumas excelentes, como a do roqueiro decadente Billy Mac, de Bill Nighy, ou o terno romance ininteligível de Colin Firth e Lúcia Moniz, e outras, como a do jovem garçom Colin viajando para os EUA para comer americanas encantadas com seu sotaque, nem tanto... Ainda assim, é bem provável que apenas os muito azedos se incomodem com isso o suficiente para deixar o longa de 2003 de fora de uma lista desse tipo.
4 - Jerry Maguire: A Grande Virada (Cameron Crowe, 1996)
Jerry Maguire, talvez não se encaixe, propriamente, nos parâmetros mais restritivos de uma comédia romântica prototípica porque há muita coisa acontecendo no longa de Cameron Crowe o tempo todo, de modo que o romance, por vezes, fica relegado ao segundo ou terceiro plano.
Essa impressão, porém, só dura até o momento em que o roteiro reconduz os personagens e a audiência de volta até a preocupação com o papel que nós permitimos que o amor desempenhe em nossas vidas, por mais competitiva, cínica, egoísta e incompleta que essa vida possa ser.
Interpretado com um desespero implosivo por um Tom Cruise em um dos melhores momentos de sua carreira, Jerry Maguire é um agente esportivo que se descobre tendo uma crise de consciência com a falta de coração de sua profissão que lhe custa o emprego. A única pessoa que o segue é a secretária Dorothy Boyd (Renée Zellweger exibindo uma apaixonante mistura de fragilidade e pés cravados no chão). As histórias dos dois se entrelaçam e, se separam e se atam novamente enquanto os dois são puxados pra longe um do outro seja pelas circunstâncias profissionais, seja pelas inseguranças de um ou do outro, até o desfecho que poucas comédias românticas convencionais teriam colhão pra entregar, com o glorioso momento de auto-afirmação definitivo em que Jerry percebe que a única coisa que faz essa vida de merda valer a pena é o amor. "Eu estou procurando a minha esposa.", e, claro, o clássico "você me ganhou no olá".
3 - Embriagado de Amor (Paul Thomas Anderson, 2002)
O frenético quase musical a respeito de pessoas violentas e isoladas que descobrem que não precisam se condenar à própria tristeza e solidão é Paul Thomas Anderson destilando emoção em quantidades industriais e engarrafando em um terno azul.
Barry Egan é uma genial criação de Adam Sandler, que pega seus tradicionais acessos de fúria lhes dá uma função ao não permitir que eles tenham pra onde explodir.
Nada de ganhar torneios de golfe, nada de lutar com tenores ou de perseguir valentões irlandeses. Ele precisa conduzir uma pequena empresa, lidar com trocentas irmãs e com um buraco do tamanho do Havaí em seu coração.
E então surge Lena Leonard (Emily Watson), que olha para Barry e ao invés de ver um desajustado qualquer, vê harmonia. O desejo dela dá início a uma história de amor que nubla os sentidos dando ao filme uma cara de sonho que jamais se desfaz, tornando totalmente aceitável que os personagens ajam da maneira que agem. As oportunidades abundam como milhas aéreas oferecidas com pudim no mercado, e todos têm o poder de entrar em um avião e perseguir seu amor antes que ele se vá, e tornar-se mais forte do que qualquer operador de tele sexo possa imaginar.
2 - Feitiço do Tempo (Harold Ramis, 1993)
Frequentemente imitado ou referenciado o clássico dirigido por Harold Ramis é, sem sombra de dúvida, um dos filmes mais reassistíveis dessa lista.
E, se o espectador assistir esse longa vezes o suficiente, ele inevitavelmente irá descobrir, ao menos, três coisas: Que Bill Murray é um dos maiores protagonistas cômicos do cinema, capaz de ancorar um longa inteiro apenas com seu talento, que o filme é carregado de uma pujante e casual lição de vida que fica no meio do caminho entre A Felicidade Não se Compra e filosofia budista que de alguma forma faz sentido na complexidade e simplicidade de suas ideias, com o protagonista sendo seu próprio pior obstáculo e a sua gentil produtora a motivação para que ele aprenda a viver além de si próprio, ou ainda que o roteiro que usa o poder narrativo do cinema de uma forma que nenhuma comédia mainstream jamais havia feito até então para nos mostrar o insuportável homem do tempo Phil (Murray) preso na cidade de Paunxotawney em um dia da Marmota que se repete aparentemente ad eternum, até ele perceber que está se apaixonando pela sua produtora, a doce Rita (Andy McDowell).
Seja como for, o verdadeiro segredo de O Feitiço do Tempo é que, não importa se tu está vendo pela primeira vez ou pela quadragésima, o filme sempre deixa um sorriso na nossa cara.
1 - Harry & Sally: Feitos Um para o Outro (Rob Reiner, 1989)
Os clássicos não morrem jamais.
O diretor Rob Reiner e a roteirista Nora Ephron não fizeram apenas uma comédia romântica. O gênero existe desde a época do cinema mudo, afinal de contas, mas eles certamente estabeleceram as regras que ainda hoje regem esse gênero.
Não basta a coleção de frases que permanecem na cabeça da audiência ainda hoje é capaz de recitar de cabeça, o longa ainda tem uma apaixonante Meg Ryan com seus cabelos que parecem plumas, suas ombreiras e seus jeans com cintura no pescoço, e um Billy Cristal surpreendentemente charmoso com sua misantropia inclemente e com quem Ryan partilha uma química tão neurótica quanto inegável e que, francamente, poucas vezes foi repetida em um filme.
Some-se a isso o humor seco que Carrie Fisher empresta à melhor amiga de Sally, Marie, que eventualmente começa a namorar o melhor amigo de Harry, Jess, vivido por Bruno Kirby e nós temos um esforço de ternura ímpar de Reiner e Cia., que jamais pesa a mão no sentimentalismo e nem tampouco sonega risadas.
Homens e mulheres podem ser amigos ou o sexo sempre estará entre eles?
Nós talvez jamais tenhamos uma resposta definitiva, mas ver Harry e Sally tentando responder a essa pergunta certamente é um bom programa.
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