Quando eu assisti ao trailer de Love and Monsters (um título perfeitamente bem encaixado na proposta do filme, por sinal, que é sobre amor e monstros), eu fiquei com a sensação de que era quase uma versão de Zumbilândia que trocava zumbis por monstros gigantes e, considerando o quanto Zumbilândia 2 foi ruim, eu não tinha certeza se estava disposto a ver mais uma imitação do longa.
Ainda assim, ontem à noite me deparei com o Problemas Monstruosos em um serviço de aluguel digital, e resolvi esvaziar a carteira digital e dar uma chance ao filme.
O mundo de Problemas Monstruosos nos é apresentado por seu narrador, Joel Dawson (Dylan O'Brien, encontrando um sensível equilíbrio entre neurótico irritante e neurótico gostável). Joel é um dos sobreviventes de um apocalipse que começou sete anos antes, quando um asteroide se aproximava da Terra. Os poderes do planeta se uniram e lançaram mísseis que detonaram a rocha em pleno voo, entretanto, os detritos da detonação, ao retornarem à atmosfera da Terra, causaram mutações em todas as criaturas de sangue frio de nossa fauna, que aumentaram de tamanho a ponto de termos crianças sendo comidas por peixes dourados e tanques de guerra sendo insuficientes para matar baratas.
A humanidade foi quase extinta, 95% da espécie humana foi perdida enfrentando as criaturas, e os cinco por cento restantes se recolheram em colônias subterrâneas onde subsistem de eventuais caçadas e coletas, sempre à sombra de criaturas que também estão famintas e caçando.
Joel não é um grande caçador ou coletor. Ele sofre de um problema de congelamento que o paralisa de medo em momentos de tensão, e faz sua parte no bunker onde vive operando o rádio e cozinhando. Nos últimos anos, Joel se tornou o mascote de um grupo de pessoas que se juntaram em casais enquanto ele perdeu o amor de sua vida, Aimee (Jessica Henwick, de Punho de Ferro) quando a humanidade foi chutada do topo da cadeia alimentar.
A questão é que, ao contrário dos pais de Joel, Aimee não morreu. Ela e ele apenas se separaram quando o apocalipse monstro começou, e, após sete anos de busca, ele finalmente descobriu onde ela está, e, sentindo-se sozinho no mundo, resolve encarar uma jornada de mais de cento e trinta quilômetros pela superfície hostil do planeta para encontrá-la.
Sem ser nada como um exímio sobrevivente, Joel começa sua jornada solitária de maneira atabalhoada, cometendo todo o tipo de erro, e contando com a sorte e a ajuda de desconhecidos que se tornam seus companheiros e aliados de maneira mais duradoura, como o cachorro Boy, ou brevemente, como os sobreviventes Clyde (Michael Rooker) e Minnow (Ariana Greenblatt) para não ser comido vivo logo em seus primeiros dias fora da colônia e tentar sobreviver por tempo o suficiente para reencontrar o amor de sua vida.
Problemas Monstruosos é muito melhor do que deveria ser.
Sério, quando eu comecei a assistir o filme, que se inicia com uma enxurrada de exposição, eu estava me preparando para procurar a duração do filme e descobrir por quanto tempo eu seria obrigado a suportá-lo, mas aí, em poucos minutos, o roteiro Brian Duffield e Matthew Robinson encontra os trilhos de uma maneira muito surpreendente, e muito, muito satisfatória ao dar algumas bolas dentro que me pegaram no contrapé.
Pra começar, a construção de mundo do longa é muito esperta. Nós rapidamente somos levados a temer esse mundo, e esperar qualquer coisa dele. Um trabalho ainda mais competente é feito com os personagens que o habitam, que não são apenas estereótipos peculiares para atrair o olhar da audiência por alguns minutos, mas a soma do que aconteceu com o mundo nesses últimos anos. Em nome de Stan Lee, o cachorro do filme tem mais personalidade, história de vida e profundidade emocional do que os personagens de Tenet todos juntos!
Pra tornar a coisa toda ainda mais inexplicavelmente bem sacada, Joel passa por uma jornada de verdade, seus confrontos e encontros têm peso baseado não apenas em sua inaptidão presente, mas ancorados em seu passado, e seu crescimento não é apenas tentar aprender a matar monstros, mas encontrar seu lugar em um mundo que, inicialmente, parecia não ter mais nada para lhe oferecer...
O diretor Michael Matthews ainda acerta a mão ao conseguir a proeza de tornar cada encontro monstruoso do longa diferente do anterior, mexendo não apenas no grau de perigo envolvido, mas encontrando sempre um novo propósito dramático ou emocional, e em um filme chamado Amor e Monstros (ou, vá lá, Problemas Monstruosos), isso não é um feito pequeno.
Com uma história redondinha, sem nenhum tipo de arbitrariedade narrativa, um elenco carismático e talentoso atuando de maneira honesta, e efeitos visuais competentes, Problemas Monstruosos foi uma das sessões de "cinema" mais prazerosas que eu tive nesse estranho ano de 2020, onde, na mesma semana eu assisti o blockbuster da temporada, dirigido pelo genial Christopher Nolan, e um filme de monstros lançado direto em formato digital, e fui mais cativado pelo segundo do que pelo primeiro.
Abra sua carteira digital e dê uma chance ao filme. Ele certamente vale uma hora e quarenta e nove minutos do teu tempo.
"-Eu vou te encontrar.
-Acho bom."
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