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terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Resenha Cinema: Lincoln


É engraçado parar pra pensar que no ano passado, dois filmes completamente distintos fossem centrados na mesma personalidade histórica. O quase bobo de tão despretensioso Abraham Lincoln - Caçador de Vampiros, e seu completo oposto, este Lincoln, dirigido por Steven Spielberg que desembarcou aqui no fim de janeiro foi lançado nos EUA entre novembro e dezembro, focando claramente o Oscar 2013.
Perfeitamente compreensível. O longa sério de Spielberg, que vinha sendo cozinhado pelo diretor de E.T. já a alguns anos, e que por muito tempo teve o papel central ligado a Liam Neeson é desses filmes feitos para o Oscar muito mais do que para as bilheterias.
O filme mostra Abraham Lincoln (Daniel Day-Lewis, caso para ser estudado) em janeiro de 1865, já no começo de seu segundo mandado como presidente dos EUA, e no quarto ano da Guerra Civil que os estados confederados do sul dos EUA travam para se separar dos estados da união.
Enquanto vê o conflito caminhar rumo a seu inevitável final, o presidente dos EUA percebe que com a ausência da bancada sulista do congresso, e o temor popular pela continuidade do conflito armado, pode estar diante de uma janela única para banir a escravidão do país de uma vez por todas.
Todavia, a tarefa de obter as assinaturas de membros democratas do congresso, árdua por si só, ganha ares de corrida contra o tempo conforme os estados confederados, antevendo a derrota na guerra e a movimentação dos Republicanos de Lincoln, começam a movimentar comissões de paz para devolver seus representantes ao congresso a tempo de barrar a emenda constitucional que libertará os negros dos EUA.
O décimo-sexto presidente americano precisa, então, decidir-se entre o fim antecipado da guerra, que poupará milhares de vidas, e o fim da escravidão, a mais abjeta mancha na história da humanidade enquanto é pressionado pelo congresso, pelo povo, por sua família e até por membros do seu gabinete.
Há um grande elenco contando a história que Spielberg filma com a costumeira maestria. David Strathairn, como o chefe de gabinete William Seward, Hal Holbroock, no papel do articulador Preston Blair, John Hawkes, James Spader e Tim Blake Nelson como os "caçadores de votos" Latham, Bilbo e Schell, Bruce McGill como Edwin Stanton, além dos indicados ao Oscar Tommy Lee Jones como Taddheus Stevens e Sally Field como Mary Todd Lincoln. Além deles há ainda Jackie Earle Haley, Lee Pace, Jared Harris, Joseph Gordon-Levitt, David Oyelowo, Lukas Haas, Dane DeHaan, Julie White, Gloria Reuben, a maioria em papéis que são pontas ou pouco mais do que isso.
Nomear todo o elenco possível é tarefa necessária para que se saiba que a despeito da bela cinematografia de Janusz Kaminski, da contida música de John Willians, e da sensibilidade de Spielberg ao mostrar uma faceta talvez ignorada da persona política do presidente mais endeusado da história dos Estados Unidos, o show de Lincoln tem dono, e ele se chama Daniel Day Lewis.
O ator britânica que havia dado uma bela escorregada com a equivocada atuação no também equivocado musical Nine, mostra que ainda é um mutante com poderes de atuação que beiram o sobrenatural.
Seu Abraham Lincoln é um homem visivelmente fragilizado pela extensão do conflito que carrega atrás de si e com o peso da decisão que tem por tomar, mas ainda é um advogado e um estrategista político de mão cheia. Quando ele se senta, movimentando-se devagar e com andor, como um homem que está a beira da exaustão, e começa, com sua voz falseteada e fina, a contar uma pequena história que pode ser um conto edificante ou apenas uma anedota análoga atraindo a atenção de qualquer ambiente pra si, Abe não está dando ponto sem nó.
Spielberg inclusive deixa claro como manja de seu negócio, quando mantém a câmera afastada de Lewis, e deixa que o ator domine o cenário com seus gestos, expressão corporal, voz e expressão. É um espetáculo pra ser apreciado a alguma distância, pois há nele a solenidade de um homem que, com mil diabos, acabou com a escravidão, tem um memorial na capital de seu país e suas feições esculpidas no monte Rushmore, mas, ao mesmo tempo, graças a atuação do melhor ator em atividade no cinema, carrega uma qualidade intimista e um carisma tão grande, que é difícil não vibrar perante as pequenas maquinações e desonestidades cometidas pelo honesto Abe em nome de um bem maior.
Ótimo filme, enfeitado documento histórico, e atuação de gala do maior de sua geração. Palmas para todos os envolvidos.

"Você acha que escolhemos o tempo em que nascemos? Ou nos ajustamos ao tempo no qual nascemos?"

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