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quarta-feira, 18 de maio de 2016

Resenha Game: Uncharted 4: A Thief's End


Foi por causa de dois jogos que eu corri para comprar um playstation 4 gastando os tubos ainda no ano de 2014. Curiosamente, ambos foram adiados após eu ter comprado o console, e me forçaram a jogar games não tão bons, ou games repetidos em versão remasterizada, para suprir as lacunas até o lançamento.
Se eu estava curioso para jogar o correto misto de RPG e jogo de tiro de The Division, e adorei o futebol cadenciado e cerebral de FIFA 16, eu comprei meu PS4 ansiando por Batman - Arkham Knight e por Uncharted 4.
Eu me tornei um fã de Uncharted quase ao acaso. Ganhei o Uncharted 2: Among Thieves de presente de uma morena muito cheirosa, e joguei muito mais por consideração à ela do que por curiosidade ou interesse no "joguinho de aventura", conforme meu irmão o definiu.
Que sorte.
Among Thieves era um jogo tão bom que me fez correr atrás de Uncharted - Drake's Fortune, primeiro game da série, e esperar ansioso (e comprar na estréia) o terceiro game, Uncharted 3: Drake's Deception.
Não é difícil se afeiçoar a Nate Drake, Victor Sullivan e Elena Fischer. Os personagens são adoráveis, bem escritos e interpretados por uma equipe de atores/dubladores que os enchem de personalidade e tornam o jogo uma ótima mistura de matiné aventuresca com um viciante game de tiro, luta, puzzle e exploração entrecortado por gloriosas sequências de ação de povoar os sonhos de Michael Bay.
Uncharted 4: A Thief's End se passa três anos após os eventos do game anterior. Nate e Elena estão casados, e tentam deixar para trás suas vidas de aventura em nome de uma existência normal.
Elena escreve artigos para revistas de viagens enquanto Nate trabalha em uma empresa de resgate de cargas onde, na maior parte do tempo, faz trabalho burocrático.
A vida mundana onde o caçador de tesouros tenta se encaixar desesperadamente é sacudida quando seu passado volta na forma de Sam, seu irmão mais velho dado como morto quinze anos antes.
Sam esteve, na verdade, preso após ser ferido enquanto procurava pelo tesouro do notório pirata James Avery com o caçula. Sua libertação está diretamente ligada a retomar essa caçada e encontrar os quatrocentos milhões de dólares em ouro do pirata, algo que Sam não pode fazer sozinho.
Com a vida do irmão pendendo na balança, Nate não tem alternativa senão abandonar a aposentadoria e sair com Samuel em busca do ouro dos bucaneiros, uma caçada que os coloca em rota de colisão com o antigo sócio da dupla, Rafe Adler, e seu exército privado, a empresa de segurança particular Shoreline de Nadine Ross, uma incansável mercenária com recursos suficientes para lutar uma guerra numa corrida onde os Drake terão que usar toda a sua experiência, habilidade e esperteza para se manter um passo à frente da feroz competição, uma missão que se torna mais complicada conforme os exploradores descobrem que o ouro de Avery é apenas a ponta do iceberg, e que podem estar atrás de algo muito maior.
Uncharted 4 foi um game que sofreu bastante durante sua produção.
Além dos sucessivos adiamentos e trocas no elenco de atores/dubladores, talvez a grande perda do título tenha sido a de Amy Henning, a escritora dos games anteriores. Sua saída para a Visceral Games deixou a Naughty Dog em uma posição delicada com sua maior franquia, e a desenvolvedora não tardou para substituir a roteirista pelo que, no momento, era seu dream team:
Neil Druckmann e Bruce Straley, responsáveis pelo sensacional The Last of Us.
A mão dos dois se faz notar nas maiores qualidades e nos piores defeitos de A Thief's End, um game onde o herói juvenil que Nathan Drake tem sido desde o primeiro contato que tivemos com ele, se vê obrigado a crescer como fizeram seus fãs.
Talvez a grande qualidade à qual me referi ali em cima seja justamente essa. Druckmann e Straley transformam as sequências cinemáticas do game em um autêntico filme. Os flashbacks que apresentam Sam e mostram a dinâmica da relação entre ele e Nate são sensacionais, assim como é sensacional o interlúdio que mostra Nate e Elena vivendo uma vida mundana e comum após anos de aventuras potencialmente mortais.
A preocupação do game e de seus desenvolvedores em oferecer uma voz e uma psicologia críveis aos personagens e torná-los irremediavelmente vivos é flagrante. Não há diálogo desperdiçado, as relações são todas táteis, calorosas, todas elas importam pois todos os personagens importam em uma característica que sempre esteve presente em Uncharted (quem não se lembra do laço mudo que se formava entre Nate e Tenzin, seu guia nepalês em Among Thieves?), mas foi aprofundada ao nível de fossa oceânica de The Last of Us.
É divertidíssimo explorar Uncharted apenas com Nathan, mas é muito mais interessante fazê-lo junto com um de seus companheiros.
A dinâmica da jogabilidade não é afetada pelo amigo digital, já que os personagens são hábeis e sabem se cuidar de uma maneira que, ao invés de precisarem de ajuda o tempo todo, por vezes a oferecem, seja durante escaladas, saltos, brigas ou tiroteios.
A ótima jogabilidade da série foi aperfeiçoada tornando as escaladas de Nathan ainda mais fluidas e contínuas, existe a possibilidade de dirigir possantes veículos 4x4 e um gancho com corda foi adicionado ao equipamento de Nate, tornando possível fazer rapel, escorregar pela corda ou se balançar feito Tarzan, aumentando a gama de possibilidades nas paredes rochosas, enquanto os terrenos ganharam rampas de pedra escorregadias por onde Nate desliza para penhascos despenhadeiros oferecendo uma divertida refrescada em uma das mais características facetas da série, mas sem a tornar particularmente desafiadora.
Muito mais desafiadores se tornaram os combates.
Se na hora do mano a mano Uncharted não oferece muita coisa além de bater e rolar, os tiroteios podem ser uma dor de cabeça para o jogador. A inteligência artificial dos inimigos somada a ambientes consideravelmente amplos torna alguns cenários bastante complicados. Os inimigos se mantém em movimento, atacam de maneira coordenada, flanqueiam Nate e seus aliados tornando o antigo expediente de se abaixar atrás de um pilar indestrutível e recuperar o fôlego praticamente inviável. É necessário correr o tempo todo, procurando ângulos e proteções de maneira dinâmica de modo a superar uma variedade bacana de inimigos com ou sem armadura, com lança-foguetes, rifles de precisão e que não tem vergonha de desentocar o jogador enchendo ele de granadas.
Essa adição à dificuldade torna cada tiro na cabeça um deleite (eu sinto algum orgulho dos meus 196 headshots na primeira vez jogando a campanha), e cada vitória em um cenário apinhado de inimigos mais satisfatória.
Os cenários de inimigos, por sinal, agora oferecem alguma possibilidade de adaptação ao estilo do gamer, podendo ser vencidos de acordo com a preferência de quem segura o DualShock 4. Seja um vida louca que gosta de chegar atirando granadas e deitando a porrada geral ou um discípulo de Solid Snake pronto para se esgueirar por detrás dos inimigos na grama alta e colocá-los para dormir com um nocaute silencioso, ou puxando-lhes os tornozelos de uma beirada, Uncharted 4 te deixa escolher como abordar certos confrontos, um respiro interessante para uma série com os dois pés cravados na linearidade.
A beleza gráfica do game é testemunho da necessidade dos adiamentos. Uncharted jamais foi tão belo. Nate e seus amigos têm expressões faciais de fazer Kristen Stewart corar de inveja, se os cenários amplos, as enormes catacumbas e as vistas do alto de uma torre em meio à floresta sempre foram uma marca registrada da série, Uncharted 4 volta a mostrar todas essas belezas, mas também encanta pelo detalhe da neve se acomodando em uma estátua num cemitério escocês, no detalhamento de um galeão afundado na costa do oceano índico, ou na forma como a ferida no nariz de Sam brilha com o sangue fresco.
Além de tudo isso, há ainda um modo multiplayer onde cenários do jogo são reimaginados como arenas para confrontos de 4 contra 4 ou 5 contra cinco jogadores, muito bem renderizados e explorando de maneira divertida a jogabilidade clássica da série.
A despeito da larga lista de predicados, nem tudo são flores, porém.
Uncharted 4 tem alguns problemas. Um dos grandes é a baixa dificuldade dos puzzles. Não existe nenhum quebra-cabeça desafiador no game, uma tremenda escorregada para um jogo que sempre se notabilizou pelo bom equilíbrio entre ação e enigmas. O combate mano a mano, é outro ponto. Estamos em 2016, e após os combates de Assassin's Creed III e de todos os games da série Arkham, algo mais bacana poderia ter sido imaginado para Uncharted. Os cenários de confrontos contra inimigos múltiplos são um pouco sacanas, pois em um mundo onde os inimigos se colocam de prontidão ao menor sinal de problemas deveria existir um mecanismo para permitir que o jogador arrastasse inimigos nocauteados ou mortos pra fora das vistas de seus colegas.
Além disso, a ambientação em Libertalia, por bela que seja, é repetitiva, e à certa altura, o jogador se vê em um espiral de escala, salta, desliza, atira que se estende além do necessário em uma floresta belíssima mas sem nada de novo a oferecer, um segmento excessivamente longo que trava uma história que fluía de maneira prazerosa até ali, e, por fim, a ausência do elemento sobrenatural que havia sido regra nos demais títulos da franquia.
Ainda assim, o trabalho de produção, da atuação e dublagem de um elenco que aprendemos a amar (Nolan North, Emily Rose, Richard McGonagle e Troy Baker), a boa jogabilidade mais as tradicionais sequências de ação (em particular a perseguição em Madagascar) e o toque especial de Drunkmann e Straley para o lado humano dos personagens faz Uncharted 4 ser uma experiência particularmente agradável, e seu grande senão talvez seja justamente o fato de ser o último capítulo da série.
Apesar das declarações dos desenvolvedores, não seria difícil retomar Uncharted após os eventos de A Thief's End, e qualquer fã consegue imaginar ao menos dez maneiras bastante clichê (mas tão sólidas quanto o resto da franquia) de meter Drake, Elena, Sully, Sam, Cassie e Vic em novas enrascadas.
Eu espero, francamente, que, ainda que o quarto game seja o fim de um ladrão, não seja o fim do explorador mais maneiro dos games.
Nós sempre podemos escalar, correr, esmurrar e atirar um pouco mais ao lado de Nate e companhia.

"-Destruí meu casamento, afastei meu melhor amigo, e agora perdi meu irmão. Ao menos não tem ninguém aqui pra me chamar de idiota."

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