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sexta-feira, 30 de janeiro de 2015
Resenha Cinema: A Teoria de Tudo
Já disse antes, neste mesmo espaço, que as cinebiografias são searas difíceis de se trilhar. Os envolvidos em levar à telona a história de vida de uma pessoa real que muitas vezes é um ícone ou um ídolo é caminhar em terreno perigoso, especialmente se o biografado for uma personalidade que continua viva, e se a biografia em questão tiver momentos que possam ser, digamos, constrangedores, para o biografado e seus entes queridos.
Com tudo isso em consideração, podemos dizer que A Teoria de Tudo, filme de James Marsh (O Equilibrista), escrito por Anthony McCarten (A Morte do Super-Herói) a partir do livro de Jane Hawking Viagem ao Infinito - Minha Vida com Stephen, era uma passeio por um terreno pedregoso.
A missão de contar a vida do mais aclamado astrofísico do mundo a partir do ponto de vista de sua primeira esposa poderia, então, ser bastante complexa à medida em que um diretor e um roteirista podem se ver melindrados e colocar o biografado em um pedestal, até por que provavelmente ninguém quer partir pra ignorância e arrasar uma pessoa que está viva pra ver o filme e até ajudou na produção... Talvez isso explique a maneira convencional, quase chapa branca, com que a história é contada.
A história, claro, conta como o jovem Stephen Hawking (Eddie Redmayne), então com 21 anos graduando-se em Cambridge, conhece Jane (Felicity Jones), estudante de arte procurando um PhD em poesia medieval ibérica.
A doce "boy meets girl" que se desenha enquanto os dois estão se conhecendo é estremecida quando Stephen, após uma sequência de pequenos acidentes que culmina com um tombo feio no pátio da universidade, recebe o diagnóstico da Doença do Neurônio Motor, também chamada de Doença de Lou Gherig, uma condição que mina a coordenação motora da vítima, eventualmente acabando com todos os movimentos controlados do corpo.
Ao receber a notícia de que sua expectativa de vida é de apenas dois anos, Hawking tenta se afastar, mas Jane não permite.
Eventualmente os dois se casam e formam uma família enquanto a doença de Stephen avança e ele segue reescrevendo tudo o que se sabia a respeito de astrofísica até então.
Entretanto, enquanto o corpo de Stephen Hawking se atrofia cada vez mais, e sua mente avança rumo às profundezas do universo em seus estudos e teoremas, Jane, que também tinha aspirações acadêmicas e profissionais, tem que lidar com a carga de cuidar de uma família que, a despeito da vontade de seu marido, não era normal.
É quando surge Jonathan (Charlie Cox), jovem viúvo que comanda o coral da igreja local, e, aos poucos, adentra o seio familiar dos Hawking, tocando o coração de Jane, que, a despeito de sua obrigação para com Stephen, tem seus desejos e anseios.
A sugestão de triângulo amoroso (o filme sugere mas não confirma que haveria um consentimento tácito de Stephen em relação ao afeto de Jane para com Jonathan) é estremecida quando Hawking contrai pneumonia durante uma viagem à França, necessita de uma traqueostomia, e perde a capacidade de fala, ganhando, à seguir, o sintetizador de voz eletrônica que, eventualmente, se tornaria sua marca-registrada.
O filme aborda com tato e bom-gosto os percalços da vida do casal, que culminaria com um divórcio em 1995, mas talvez o faça com tanta deferência que, se não fosse pelo trabalho do casal protagonista, seria quase estéril em termos de emoção.
Felicity Jones se esforça para dar conteúdo e carga emocional à uma Jane que aparece muito mais como uma contrita e religiosa mãe de família sofrida do que como uma pessoa de verdade, com anseios e aspirações próprias, ainda assim, quando ela lida com a doença de Stephen, e quando Jonathan entra, e depois sai de sua vida, ela tem ferramentas com que trabalhar, e trabalha muito bem.
Eddie Redmayne está ótimo. O ator habituado a papéis secundários e filmes menores abocanha com vontade o papel de sua vida, e em nenhum momento parece que mordeu mais do que pode mastigar.
Seu Stephen Hawking, jovem e em perfeitas condições físicas é um gênio crível e atraente à seu modo. Conforme a doença avança, ele gradativamente vai abrindo mão das suas expressões faciais e movimentos normais, e mesmo retratando de maneira dolorosamente perfeita as limitações impostas pela doença, jamais deixa de exibir um espectro de emoções amplo e tocante.
A cena em que ele e Jane percebem que seu casamento chegou ao fim, onde as lágrimas escorrem por seu rosto paralisado, é lindíssima, e atuada à perfeição.
Ainda que o respeito e o bom gosto tenham levado o roteirista e o diretor a seguir a cartilha, e olhar sua história de maneira algo distante, Jones, e especialmente Redmayne sucederam em emprestar alma e coração à notável jornada dos personagens reais. E se por vezes o filme falha em fazer e responder algumas perguntas que inevitavelmente ficam na cabeça da plateia, a verdadeira história de superação de Stephen e Jane dão o lastro de que o filme precisa para ser realmente emocionante.
Assista no cinema.
"Não deveria haver limites à capacidade humana. Nós somos todos diferentes. Mesmo que a vida pareça má, sempre há algo que você pode fazer, e ser bem sucedido. Enquanto há vida, há esperança.""
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