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quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

A única que havia.


Se havia nesse mundo alguém gente boa, esse alguém era o Oberon. O Oberon era muito gente boa. Na verdade, havia amigos do Oberon que achavam que, se procurasse pelo verbete "gente boa" na enciclopédia Basca, encontraria, ao lado da definição, a foto do Oberon.
As definições que as pessoas davam de Oberon variavam sempre dentro de "Muito gente boa.", "Gente finíssima", "Cara legal", "ótima pessoa", nunca menos do que isso, embora, entre as pesoas de seu convívio mais próximo houvessem arroubos como "Melhor pessoa do mundo", "A terra seria um lugar melhor se houvessem mais Oberons", "Meu melhor amigo.".
Nem era uma coisa que Oberon fizesse questão de cultivar, era uma característica inata, Oberon era gente boa por que era a sua personalidade, e nada além disso. Era seu estado natural. Quando conhecia novas pessoas Oberon era algo tímido, mas depois que se soltava, as pessoas passavam á gostar muito dele. Oberon poderia, inclusive, ter muito mais amigos se cultivasse todas as amizades que surgiam em seu caminho de vida. Mas Oberon gostava de se dedicar com mais afinco á uns poucos amigos que considerava especiais do que de puverizar sua dedicação entre inúmeras pequenas amizades. De modo que os conhecidos de Oberon o consideravam muito gente boa, e seus amigos íntimos o amavam de forma fraternal.
Oberon era igualmente bem quisto no trabalho, era professor de literatura, sabia controlar sua turma, seus alunos o adoravam, os outros professores o admiravam por saber ser amigo dos estudantes sem jamais perder o respeito dos discentes, por sua dedicação ao trabalho, e por seus vastos conhecimentos.
Oberon gostava de esportes, corria de segunda á quinta-feira, jogava futebol com os amigos toda sexta-feira, depois fazia um churrasquinho com os camaradas, por volta de meia-noite estava de volta em casa, e na manhã de sábado fazia trabalho voluntário em uma cooperativa de educação de jovens e adultos em um bairro carente da cidade, onde lecionava aulas de reforço de Português e História.
Todos gostavam de Oberon, ele não era exatamente bonito, mas era agradável, simpático, inteligente, e até, com boa vontade, algo charmoso. O que ninguém entendia é como Oberon, com todo seu vasto arsenal de qualidades, permanecia solteiro.
Alguém arriscou que ele poderia ser celibatário. Talvez Oberon guardasse todas as suas energias para seus estudos e seu trabalho, e o tempo que passava com os amigos. Não haveria nada de religioso no celibato de Oberon, era uma filosofia totalmente agnóstica de vida, desprovida de qualquer fé, apenas voltada para a lógica de que ele estaria mais apto á vida de modo geral se abdicasse do sexo e o ignorasse totalmente.
Mas o comportamento de Oberon entre os amigos, suas viradas de pescoço ao ver uma mulher com um belo corpo passando na rua, ou os sons que fazia ao ver Juliana Paes, Carol Castro e Jessica Biel com pouca roupa na TV não eram características de alguém que ignorasse o sexo.
Houve quem aventasse a possibilidade de o bom Oberon ser gay. Mas logo perceberam que não, dadas as suas já citadas opiniões á respeito de Juliana Paes, Carol Castro e Jessica Biel, ele não parecia alguém que gostasse de homem. Talvez fosse um tremendo enrustido, mas será que não seria perceptível? Todos descartaram uma eventual homossexualidade de Oberon, dizendo para si mesmos que, se fosse o caso, não haveria nada de errado (mentira, claro que haveria.), mas ainda assim, decartaram essa possibilidade quando um amigo mais antigo mencionou que Oberon quando ia á clubes noturnos e danceterias alguns anos atrás, sempre acabava "ficando" com alguma menina. Também namorara firme na faculdade com uma estudante de História. Logo, Oberon não era gay.
Mas o mistério permanecia, se Oberon não era gay, se Oberon não era celibatário, uma vez que já ficara com mulheres e já namorara firme, por que alguém que era visto como um cara tão legal, tão cheio de predicados permanecia solteiro sem sequer namorar?
A teoria vigente que ganhou vulto ente os conhecidos de Oberon foi a de que ele era um sujeito de padrões de beleza excessivamente altos. Irrealmente altos. De que, pra ele se envolver com uma mulher ela teria que ter medidas ainda mais exigentes do que as da candidatas á Miss Universo. Se a moça em questão tivesse um milímetro á mais de quadril do que rezava a cartilha de Oberon, ele sequer lhe dirigiria o olhar. Se ela tivesse um resquício de celulite, Oberon atravessaria a rua para não passar ao lado dela.
Se ela tivesse um fio de cabelo arrebentado, se o tom de pele dela fosse mais claro ou escuro do que ele considerava perfeito, se ela usasse maquiagem demais ou de menos, se ela tivese espinhas ou qualquer imperfeição, Oberon a lançaria á imensa galeria de mulheres que não se enquadravam no perfil demandado pela Cartilha de Oberon.
Aliás, essa teoria ganhou tanto peso que entre os amigos de Oberon, surgiu até uma expresão: A Cartilha de Oberon. Que eles usavam quando queriam espressar o quanto uma mulher era espetacular. Aí eles diziam:
"Vi uma loira hoje que entrava, certo, na Cartilha do Oberon."
E os outros duvidavam, mas ainda assim imaginavam com olhar perdido uma loira esplendorosa que pudesse almejar um posto nas páginas da cartilha do Oberon.
O que ninguém jamais soube é que Oberon não tinha idealizações surreais de beleza, ele tampouco era gay, ou celibatário. Oberon gostava de mulheres bonitas, claro, ele não gostava de homens, e era, como quase qualquer homem saudável, interessado em sexo.
O que poucas pessoas entenderiam é que Oberon gostava de uma mulher e uma mulher apenas. Ela estava, naquele momento, longe de Oberon, e, embora ele tivesse sempre a perspectiva de que, em algum momento ela voltasse, ele não tinha certeza de como seriam as coisas se eles se aproximassem novamente. Mas ele preferia viver com aquela perspectiva, com aquela possibilidade, pois ela, naquele momento, o bastava.
Oberon gostava do sexo oposto, mas para ele, o sexo oposto tinha uma única representante.

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