Bem vindos a casa do Capita. O pequeno lar virtual de um nerd à moda antiga onde se fala de cinema, de quadrinhos, literatura, videogames, RPG (E não me refiro a reeducação postural geral.) e até de coisas que não importam nem um pouco. Aproveite o passeio.
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sábado, 15 de outubro de 2011
Chimarreando e proseando
O Álvaro e o Mathias sentados no pátio da casa do Mathias enquanto tomavam chimarrão num final de tarde. O Álvaro nem era tão fã de chimarrão, mas vivera a vida toda no Rio Grande do Sul, então sabia do valor dado por todos à partilha do mate amargo, logo, dispunha-se a tomar uma cuia até a bomba roncar de quando em quando, mais pelo social do que pela efusão em si.
Estavam ali, sentados, sem falar nada, com a garrafa térmica entre os dois enquanto de dentro da casa vinha o som de Wander Wildner. Mathias passou a cuia pro Álvaro, que, antes de levar a bomba à boca, parou um segundo e começou:
-Me diz uma coisa, tchê... Tu acha que eu sou uma pessoa fria?
O Mathias ergueu as sombrancelhas olhando pro amigo, brevemente, como se o medisse pra ter certeza de alguma coisa, e sentenciou:
-Sim.
Álvaro bebendo o chimarrão através de bomba, começou a rir e quase engasgou:
-Não, tchê... Sério.
-Eu tô falando sério, vivente. - Respondeu o Mathias erguendo uma das sombrancelhas.
-Ah, vai se ferrar... - Devolveu o Álvaro, olhando pro outro lado e amarrando a cara.
-Eu não vou me ferrar, não, velho. Tu que vai. E olha... Pelo que tu me disse talvez não demore. - Deixou no ar o Mathias, enigmático.
O Álvaro o encarou entre o surpreso e o irritado:
-Como assim? O que tu quer dizer com isso?
O Mathias deu de ombros:
-Nada.
-Não, não, fala. - Exigiu o Álvaro extendendo a cuia ao amigo.
-Olha... - Começou o Mathias, apanhando a cuia e a enchendo de água quente de novo. - Vou te propôr um cenário. Aí, tu me diz se tem alguma coisa de anormal com esse cenário, pode ser?
O Álvaro encarou o Mathias quase bufando por um instante.
-Não pode, então deixa. - Disse o Mathias, sorvendo o chimarrão.
-Tá... Tá, pode ser. - Aquiesceu a contra-gosto o Álvaro, juntando as mãos apoiadas sobre os joelhos.
-Bueno. Um xirú encontra a mulher mais divertida da face da terra. Bonita, inteligente, engraçada... Ela gosta das mesmas coisas que ele. Vê os mesmos filmes, completam as frases um do outro, se entendem em tudo. O sexo é uma experiência tântrica, cósmica. Por alguma razão, essa mulher perfeita gosta desse traste. Gosta mesmo, inclusive fazendo coisas doidas pra estar com ele. E quando ela faz, esse sujeito, essa imundície em forma de homem, se sente como se pudesse ser mais. Como se pudesse ser melhor. Como se, talvez, ele pudesse começar a acreditar que, entre tanta bosta na vida, alguma coisa boa fosse aparecer...
-Dentre tantos pensamentos sombrios, um vislumbre de esperança e luz... - Interrompeu o Álvaro.
-Te aquieta, seu merda. Deixa eu terminar. Então... Essa fagulha de esperança tá ali. Ele se joga. De cabeça. De corpo e alma. Ele não é burro, nem ingênuo. Sabe que pode dar errado. Sabe que as coisas talvez não acabem como ele espera, mas, puta merda, depois de tudo isso, ele precisa tentar. Então ele vai. Vai fundo. Diz como se sente e o que espera.
Mathias bebeu o chimarrão até ouvir o ronco da bomba. Encheu novamente a cuia com água, e ofereceu ao Álvaro, que a pegou. Então perguntou:
-E então, tchê? Que tal te parece esse cenário? É plausível?
O Álvaro, tomando o primeiro gole do chimarrão, suspirou:
-Parece perfeitamente plausível.
O Mathias sorriu.
-Mais que plausível, né? É absolutamente lógico. Não tem nada de errado com a porra da figura que eu propus. Agora, se eu tivesse proposto um cenário em que o xirú fica se ensebando, em que a guria tá lá, perfeita, sorrindo um sorriso, como era? Do tamanho do sol, e tão lindo quanto, e de braços abertos e esperando, e o vivente não soubesse ou não quisesse demonstrar como se sentia a respeito-
-Ou não soubesse. Ou não pudesse. - Interrompeu novamente o Álvaro.
-Bueno... - Começou o Mathias. - Então talvez esse animal deva aprender, nem que tenha que ler na porra dum livro da Martha Medeiros.
O Álvaro tomou mais um gole do chimarrão. Então devolveu a cuia ao Mathias.
-Essa porra já tá lavada. Fui lá. Se falemo amanhã.
Levantou-se e saiu, sabendo que, talvez, o Mathias estivesse certo.
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