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terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

De saber e contar...


-Tu me ama? - Ela perguntou, subitamente enquanto tirava o rosto do meio da edição encadernada de Camelot 3000 eu tinha apoiada sobre os joelhos.
-Quê? - Ele perguntou sem tirar a cabeça do meio das páginas da versão romanceada do roteiro de Star Wars - Episódio I: A Ameaça Fantasma.
Ela, sentada em posição de lótus no chão, tirou o pesado volume de cima das pernas e o fechou colocando-o com cuidado sobre o chão de parquê. Engatinhou até ele, que estava todo torto sobre uma poltrona e perguntou de novo:
-Eu perguntei se tu me ama.
Ele riu sem dizer nada, nem mover os olhos das páginas do livro. Ela continuou parada do lado dele. Fulminando-o com o olhar castanho.
Ele terminou de ler a página e a marcou com o dedo. Endireitou-se e a encarou, também:
-Por quê isso, agora? - Estava claramente desconfortável.
-Eu quero saber. - Ela respondeu. E continuou a encará-lo, muito séria.
-... - Ele chegou a abrir a boca, mas se segurou. Jamais dissera aquilo a alguém. Dizer "eu te amo" pra ele era uma coisa importante. Ele não saia dizendo isso pra todo mundo em qualquer situação. Não que estar com ela fosse uma situação "qualquer", não era. Ela era especial, muito especial. Talvez ela fosse "A" pessoa para se dizer "eu te amo".
Ela certamente tinha todas as ferramentas. Era linda, inteligente, divertida, corajosa, tinha ótimo gosto pra música, pra cinema, pra literatura. Era alguém a quem ele amaria sem pestanejar. Mas ele tinha medo. E se ele falasse e depois de algum tempo ela e ele se separassem? O que aconteceria com o "eu te amo" que ele dissera? Se tornaria só mais um "eu te amo" vazio, jogado no vento como tantos outros que vemos em toda a parte o tempo todo?
Ele não queria que fosse assim. Queria que tivesse peso, significado, estofo, som e fúria... Queria que, ao dizer, desse à ela a certeza de que ouvira uma verdade incontestável, chamejante, coruscante, indesmentível... Mas para que sua declaração tivesse tal alicerce, ele precisava ter a mais completa e inabalável certeza do que sentia, e a melhor maneira de saber disso, era perguntando-se porque ele a amava.
E ele subitamente soube porque. Não era apenas porque ele era linda inteligente e tudo mais... Não. Também não era porque ela, por alguma razão, encontrou dentro de si espaço para acolhê-lo com todos os seus defeitos. Tampouco por ela e ele dividirem tantos gostos e desgostos em comum. Claro, tudo isso ajudava.
Mas ele soube ali, naquela fração de segundo que levou pra pensar em tudo aquilo, que a amava por sua delicadeza inata. Por ela, mesmo desencantada com a humanidade, ainda desejar ajudar aos outros. Por ela sempre ter uma palavra gentil, ainda que pessimista ou realista ou silente a quem a procurava em busca de consolo.
Sim. Ele a amava. Abriu a boca pra falar, mas ela se mexeu e apanhou, de novo, a revista, abrindo-a e fixando os olhos novamente nas páginas:
-Porque, olha... O Tristão reencarnou como uma mulher, e ainda assim, a Isolda quis ficar com ele. E tu? Se a gente reencarnasse e eu voltasse um bigodudo? Tu ia me amar o suficiente pra querer continuar comigo?
Ele ficou em silêncio, e então irrompeu em risadas.
-Não, menina. Nem com toda a reza brava do mundo. Se tu voltasse como um bigodudo eu ia ao estádio contigo, te levava pra jogar bola com os guris, mas ficar contigo, sem chance. Presta atenção em como tu vai reencarnar, senão, não rola.
Ela riu e bateu nele com a revista.
-Como tu é mau! Se tu morresse e voltasse como uma mulher eu ia querer ficar contigo!
Ele, a segurando e se protegendo dos golpes a agarrou com força, se beijaram.
Sim, ele pensou enquanto seus lábios e os dele se colavam. Ele estava bastante certo de que a amava. Por enquanto, bastava que ele soubesse.

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