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quinta-feira, 10 de maio de 2012
Ofensa
A Fabíola viu o Venâncio no mercado. Ela e ele não se falavam havia algumas semanas, e ela estava insegura de como se dirigir a alguém que até pouco tempo atrás era potencialmente o amor de sua vida mas que, por uma série de fatores, não apenas parecia ter abdicado desse papel, mas também pedira a ela que desaparecesse de sua vida de maneira bastante específica e literal. Fabíola fez o que lhe foi pedido. Estava magoada, claro, terrivelmente magoada, ficou arrasada, demolida, inclusive porque aquela fora a segunda vez que o Venâncio lhe pediu que fosse embora.
Na primeira, Fabíola insistiu, tentou ficar por perto, mas deu no que deu... Desencontros, desenganos, e o Venâncio pedindo que ela se fosse de novo.
Não foi orgulho ferido que fez a Fabíola assentir na segunda vez em que Venâncio a mandou embora, nem tampouco falta de vontade de estar por perto. De certo modo foi perceber que, talvez, ficando por perto, ela fosse estar causando mais mal do que bem a ele. Pra ela, não. Pra ela, estar com o Venâncio era sempre bom, era sempre um ganho. Mas ela temia se transformar em um parasita emocional sugando o Venâncio sem oferecer nada em troca. Por mais que se esforçasse, ela percebeu que, como as coisas estavam, ela não tinha como oferecer, ao menos não em um futuro próximo, o que o Venâncio e um relacionamento com ele mereciam, de modo que, quando lhe foi pedido, pela segunda vez, que fosse embora, ela se viu quase na obrigação de ir, embora houvesse se negado a se despedir dele, tarefa que seria demais pra ela suportar.
Só de se imaginar dando adeus a Venâncio sabendo que estaria o vendo pela última vez, abraçando-o e beijando-o pela última vez... Não. Sair da vida dele de maneira definitiva já era demais. Acatar ao pedido por espaço dele já era demais pra ela suportar.
Ela engoliria seus sentimentos e iria embora.
E foi. Com o coração partido, a alma alquebrada, cheia de arrependimentos e mágoas e raiva dos enganos que cometera Fabíola seguiu sua vida. Ainda pensando em Venâncio de manhã à noite, ainda remoendo seus equívocos, ainda se lembrando com ternura de todos os momentos que haviam passado juntos... Ela seguiu, tentando se manter funcional embora fosse uma tarefa hercúlea, evitando sua vontade de entrar em contato com o Venâncio, e lidando com a saudade que sentia da melhor forma possível.
E agora ali estava o Venâncio... Pouco mais de trinta passos dela, comprando refrigerante no super mercado enquanto ela comprava um pacote de ração pra cachorro.
Lhe doeu lembrar que Venâncio, que adorava cachorro, jamais tivera oportunidade de afagar o pelo macio do seu cão.
O que ela devia fazer? Devia continuar na sua, comprar suas coisas e ir embora? Fingir que não o tinha visto? Não... Já havia feito isso antes e era uma das coisas de que mais se arrependia e se envergonhava na vida. Venâncio, fosse como fosse, era uma pessoa importante pra ela. Uma das mais importantes. Ela devia ser educada, agir direito, e cumprimentá-lo.
Ficou ali, apanhou a ração do cachorro, colocou no carrinho, e andou, a passos lentos, em direção ao Venâncio. Ele colocou a garrafa de Coca-Cola no cestinho que carregava junto à cintura e se virou com decisão, mas parou por um instante quando levantou os olhos e se deparou com a Fabíola olhando pra ele.
Ela sorriu, tanto porque era polido sorris ao cumprimentar, quanto porque ficou, francamente, honestamente, feliz em vê-lo. E disse:
-Oi, menino Venâncio. Tudo bem?
Ele se recompôs do desconcerto breve, e acenou de maneira firme com o queixo enquanto dizia "oi, tudo bem contigo?".
Ela disse que sim, que estava bem. Perguntou o que ele estava fazendo, ele mostrou as compras com um meio sorriso, mas ficou sério de novo.
Ela também perdeu o sorriso, então, tocou-lhe de leve no braço, e disse:
-Vai melhorar, sabe?
E procurou pelos olhos dele com os seus. Mas ele tirou o braço como se a mão dela estivesse em chamas, e dizendo um tchau quase mudo, andou a passos rápidos na direção oposta à de Fabíola.
Ela o observou sumir entre os corredores do mercado com seu passo ligeiro, perguntando-se se agira mal ao cumprimentá-lo. Se passara alguma impressão errada ou fizera algo que o ofendera ao falar com ele.
Talvez ela houvesse soado santimonial ao lhe dizer que as coisas iam melhorar. Talvez tivesse dado a impressão de que fazia pouco da dor dele. Que houvesse superado a sua ausência e que, se as coisas estavam bem pra ela ,iriam ficar bem pra ele, também...
Em um primeiro momento Fabíola se ofendeu com a reação de Venâncio. Chegou a pensar em ir atrás dele e lhe perguntar se ele era idiota o suficiente pra supôr que ela era capaz de esquecê-lo e superar sua ausência. Se ele achava, realmente que ela estava feliz, alegre e saltitante após ter sido mandada embora não uma, mas duas vezes pelo amor de sua vida. Se ele sabia o que era, pra uma pessoa adulta e resolvida, se ver ilhada dentro de casa pois todas as suas coisas, TO-DAS, a lembravam de uma pessoa que lhe pedira distância. Em pegá-lo pelo braço, dar-lhe um safanão e beijá-lo com fúria dando o adeus que ele pediu e ela não pôde dar por ainda amá-lo em demasia.
Mas refletiu brevemente e concluiu tanto que não tinha direito de se ofender com ele e suas reações, quanto que, independente do que ele fizesse, magoado que estava, ela ainda continuaria o amando, de maneira tão inapelável e incoercível quanto fizera desde que o conhecera.
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Queria entender , o porque que Fabíola e Venâncio não pode ficar juntos? porque dizer adeus, quando pode ser diferente?
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