Bem vindos a casa do Capita. O pequeno lar virtual de um nerd à moda antiga onde se fala de cinema, de quadrinhos, literatura, videogames, RPG (E não me refiro a reeducação postural geral.) e até de coisas que não importam nem um pouco. Aproveite o passeio.
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segunda-feira, 30 de julho de 2012
Rapidinhas do Capita
-Sabe quando é que tu percebe que se fodeu, Pê Erre? - Perguntou Everaldo, sentado na mesma mesa do mesmo bar diante do amigo Paulo Roberto, que pensou em não responder, mas estava com o coração leve demais pra picuinhas.
-Quando, Everaldo?
-Tu percebe que se fodeu, e que se fodeu bonito, sem lubrificante - Salientou Everaldo, limpando um desenho abstrato que fizera com a água que suara dos copos de chope que sorvera até ali - Quando tudo, toda a proposta, toda a promessa, toda a menção, todo o sussurro, por ínfimo que seja, quando tudo, tudo, tudo te arranca um sorriso.
Paulo Roberto sorriu:
-Sério?
-Sério. - Respondeu Everaldo, fazendo sinal pro garçom. -É quando, mesmo apreensivo pra caralho, mesmo nervoso pra cacete, mesmo ansioso, tudo faz sentido.
E após ser notado pelo garçom, e mostrar seu copo tulipa vazio, perguntou ao Paulo Roberto:
-Tu não concorda?
Paulo Roberto pensou um pouco, sorriu ao fazer isso. E bebendo um gole de Coca-Cola respondeu:
-Em parte, sim... Concordo contigo. Mas tem mais coisas. Uma delas é quando tu tem certeza de que, mesmo o mais inconveniente dos adiamentos, vale a pena.
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Ele se agachou pra erguer uma caixa pra ela, era uma caixa grande, bem pesada, recheada de revistas e livros. Ele agarrou o volume com firmeza, joelhos flexionados, mas com as costas curvadas. Ao perceber, ela se aproximou e pousando a mão delicada nas costas dele disse:
-Cuidado. Tu está fazendo tudo errado!
-Não. - Ele sorriu, olhando pra ela de esguelha e vendo a pessoa que, sabia, era aquela que ele amaria até o fim dos seus dias - Quando tu tá comigo, eu sempre sei que estou fazendo tudo certo.
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E, no fim das contas, eu acho que em 2012 eu finalmente vou conseguir ter três filmes de quadrinhos na lista dos dez melhores do ano... Só pode ser o fim do mundo...
sábado, 28 de julho de 2012
Resenha Cinema: Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge
Christopher Nolan é um gênio. Eu desafio alguém a me apontar um filme ruim do sujeito. Entre Amnésia e A Origem, Nolan jamais errou a mão por onde passou. Fez Insônia, o excepcional O Grande Truque e dois Batman que são provavelmente os melhores filmes já feitos baseados em quadrinhos.
Aliás, fãs de quadrinhos estão habituados com algo chamado "A Maldição do Terceiro Filme". É um conceito surgido após ficar constatado que, terceiras partes de séries cinematográficas baseadas em gibis, simplesmente não prestam. Se tu não acredita, experimente assistir a trilogia Blade, a trilogia X-Men, a trilogia Homem-Aranha, os três primeiros filmes do Superman da década de 70/80 e a série do Batman pré-Nolan. O decréscimo de qualidade nas respectivas terceiras partes de todas as séries citadas é flagrante. Tão flagrante que a maior parte delas culminou no fim da série ou no seu reinício.
Parece inevitável que a terceira parte seja sempre o elo mais fraco, aliás, a única coisa pior que uma terceira parte é uma quarta parte sem noção (Que o digam Batman & Robin e Superman IV - Em Busca da Paz).
O que se desenhava, então, era um paradoxo. De um lado Christopher Nolan, gênio cinematográfico. De outro a maldição da terceira parte. E entre o objeto inamovível e a força irresistível, Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge:
O filme se desenvolve oito anos após os eventos de Batman - O Cavaleiro das Trevas, quando Batman e o comissário Gordon resolveram salvar a reputação de Harvey Dent escondendo do público que o galante promotor público morrera como o Duas Caras, um psicopata desfigurado e fixado com dualidade.
Na esteira da morte do "Cavaleiro Branco" de Gotham, a cidade foi abençoada com uma lei que acabou com o crime organizado e tornou o Batman um pária que se lançou ao auto-exílio, assim como sua persona pública, Bruce Wayne.
Entretanto, um novo mal chega à cidade do cruzado encapuzado na forma de Bane.
O violento mercenário oriundo da mesma liga das sombras que treinou o Batman vai à Gotham City com o intuito de concluir o plano iniciado por seu mentor, Rha'a Al Ghul anos antes:
A destruição da cidade.
Para impedir que Bane suceda em seu intento, cabe à Bruce Wayne voltar a envergar o capuz do morcego, mas estará o defensor de Gotham à altura de um homem à frente de um exército de fanáticos? Um homem cujo treinamento e método são iguais aos seus, e cuja força e selvageria podem ser ainda maiores?
Para contar a conclusão épica de sua lenda do Cavaleiro das Trevas Christopher Nolan volta a contar com todo o elenco do primeiro e do segundo filme.
Lá estão Christian Bale fazendo o melhor Bruce Wayne/Batman que o cinema já viu, Gary Oldman na pele do comissário Gordon, Michael Caine, arrancando lágrimas da platéia como Alfred e Morgan Freeman como o espirituoso Lucius Fox.
Não bastasse o retorno de toda a trupe, são adicionados à equação Marion Cotillard, como a empresária Miranda Tate, Tom Hardy como Bane, Joseph Gordon-Levitt como o policial Blake, e Anne Hathaway como Selina Kyle, a Mulher-Gato.
Marion Cotillard é elegante e estilosa, Hardy é um animal na sua interpretação de Bane, e Gordon-Levitt segue seguro como em seus outros trabalhos recentes, mas Anne Hathaway rouba a cena como Selina Kyle. Ela não é a Michelle Pfeiffer com a roupa de vinil de Batman - O Retorno, mas não fica muito atrás em termos de visual, e sua interpretação da ladra mais sexy dos quadrinhos é tremendamente inspirada e inspiradora, uma das mais fiéis versões que a gatuna felina dos quadrinhos já teve, todas essas peças sob a batuta segura de Christopher Nolan, um cara que manja demais do seu ofício e é capaz de nos fazer admirar coisas como enquadramentos e efeitos sonoros, ou a segurança das atuações sem esquecer que filme de super-herói tem que ter pirotecnia e ação de qualidade, tudo embalado pela trilha sonora de Hans Zimmer, um dos melhores compositores de trilhas sonoras do cinema atual.
Mas e então? Christopher Nolan venceu a maldição da terceira parte?
Não... E sim.
Batman - O Cavaleiro das Trevas é desses filmes que a gente tem vontade de aplaudir quando termina, que deixa a gente de queixo no chão e satisfeito por ter estado no cinema. Mas é, provavelmente, o pior filme da trilogia. Carece do impacto e da fidelidade de Batman Begins e é inferior a Batman - O Cavaleiro das Trevas em diversos aspectos. Ainda assim, é uma das grandes adaptações de quadrinhos ao cinema, e acredito que seja meu bat-filme preferido. Bebendo da fonte de gibis clássicos como O Cavaleiro das Trevas de Frank Miller, Terra de Ninguém e A Queda do Morcego, O Cavaleiro das Trevas Ressurge é um fecho excelente, sem pontas soltas ou arestas à visão do Batman engendrada por Nolan.
O que se tira disso?
Christopher Nolan é tão genial, que mesmo na hora de sucumbir ante a maldição da terceira parte faz isso com estilo, com maestria, e entregando um filmaço.
Boa sorte pro pobre infeliz que for tentar recomeçar o Batman Pós-Nolan.
"Eu não estou com medo. Estou com raiva."
quarta-feira, 25 de julho de 2012
Teaser d'O Homem de Aço
Andei rindo do Superman que o Zack Snyder, diretor de 300, Watchmen e Sucker Punch, está realizando pra DC sob a produção de Christopher Nolan, da trilogia mais recente do Batman (Tá chegando a hora do terceiro!).
Falei abertamente o quanto achei esquisito aquele uniforme agarrado como uma malha de bailarina com as botas de paquita e sem o calção vermelho, achei algumas escolhas do elenco equivocadas à primeira vista (Diane Lane não é meio jovem pra ser a Martha Kent? Amy Adams não é ruiva demais pra ser a Lois Lane? E Lawrence Fishburne no papel de Perry Whyte pra quê? Sistema de cotas? E Kevin Costner... Sério?).
Mesmo sendo fã de muita coisa do Superman (As Quatro Estações, que é genial, All Star - Superman, que é de chorar) eu não consigo deixar de implicar com várias coisas já que sou um fanboy dos mais chatos, então, minha implicância com o novo filme era pública e notória por inúmeras razões que passam pelo Zack Snyder, diretor cuja mão pesa doze toneladas, o enfoque "mais sombrio" que vem sendo alardeado desde o início da produção e que, por ter funcionado pro Batman, parece ter virado solução pra todos os heróis do Lanterna-Verde ao Flash.
Então, eu estava bastante reticente com relação a O Homem de Aço, que a Warner lança no verão americano de 2013.
Até ver o teaser colocado na internet na semana passada.
Meus parabéns ao sujeito que editou isso. Minha posição com relação ao filme não mudou diametralmente. Eu ainda acho que Snyder é muito limitado, que a escolha de elenco não foi das mais inspiradas, mas velho... Tô babando pra ver o filme.
sábado, 21 de julho de 2012
601 Vezes
Já escrevi seiscentas vezes nesse blog. Já escrevi com raiva. Já escrevi com fome. Com sono, com dor, e com o coração partido. Já escrevi de coração leve, também. Já escrevi pra pessoas que conheci. Pra pessoas que conheço, e acho que teve momentos em que sofri lampejos de precognição e até escrevi pra gente que eu ainda não havia conhecido.
Seiscentas vezes.
E eu, que não tenho medo de nada, já escrevi com medo.
Como escrevo agora.
Com medo de que todo o meu pessimismo tenha se materializado, e que tu tenha percebido que eu não tenho nenhum atrativo pra ti. Que tu tenha percebido que eu não sou bonito. Nem gentil. Nem atencioso... Que tu tenha notado que eu sou mais niilista, lacônico, desajeitado e enfadonho do que tu imaginou. Que tu tenha parado de me ver como tu me viu uma vez. Que tu já não queira mais estar perto de mim como tu já quis.
A pior parte, é que o tempo todo eu espero por isso. Por esse momento de sensatez de tua parte, em que tu perceberá que é demais pra mim. Mais que demais pra mim. E pense "Cara... Onde é que eu tava com a cabeça...?".
E eu não vou ter alternativa a não ser balançar a cabeça e concordar "Arram... Onde é que tu tava com a cabeça...".
Uma parte de mim, a parte que toma as decisões e que me manteve inteiro esse tempo todo, ela tá preparada. Ela tá sabendo. Esperando que esse dia chegue.
E já escrevi com alguma esperança. Como tento escrever agora...
Escrever umas linhas com essa outra parte... Uma parte que era insignificante até tu me dirigir a palavra pela primeira vez... Essa parte que ainda sonha com a possibilidade, com a chance, a promessa e a esperança de que tu continue sendo um pouquinho insensata, e me querendo por perto, e achando músicas para serem as nossas músicas, e continue tendo esse espaço pra mim no teu coração...
Steal my heart... and hold my tongue
I feel my time... my time has come
Let me in... unlock the door
I never felt this way before
And the wheels just keep on turning
The drummer begins to drum
I don't know which way I'm going
I don't know which way I've come
Hold my head... inside your hands
I need someone... who understands
I need someone... someone who hears
For you I've waited all these years
For you I'd wait... 'Til Kingdom Come
Until my day... my day is done
and say you'll come... and set me free
just say you'll wait... you'll wait for me
In your tears... and in your blood
In your fire... and in your flood
I hear you laugh... I heard you sing
I wouldn't change a single thing
And the wheels just keep on turning
The drummers begin to drum
I don't know which way I'm going
I don't know what I've become
For you I'd wait... 'Til kingdom come
Until my days... my days are done
Say you'll come... and set me free
Just say you'll wait... you'll wait for me
Just say you'll wait... you'll wait for me
Just say you'll wait... you'll wait for me
Resenha Filme: Batman - O Cavaleiro das Trevas
Batman Begins terminava com Jim Gordon, recém promovido a tenente, conversando com Batman sobre como a presença do Homem-Morcego mudara as coisas. O policial comentava com o vigilante que que tudo estava muito bom, tudo estava muito bem, mas queria saber a respeito da escalada.
"-Escalada?
-Nós usamos semi-automáticas, eles arrumam automáticas. Nós usamos colete à prova de balas, eles arrumam munição perfurante. E você usa uma máscara..."
O diálogo terminava com Gordon entregando ao Batman o cartão de visitas de uma nova ameaça à segurança da cidade. Uma carta de baralho. Um curinga.
Demorou três anos e um filme brilhante (O Grande Truque) para que o defensor de Gotham começasse a investigar o novo vilão.
A maior parte do tabuleiro de Chritopher Nolan estava montado. Ele tinha seu Gordon (Gary Oldman), seu Alfred (Michael Caine), e o melhor Batman/Bruce Wayne já interpretado na telona (Christian Bale). Houve a troca de Rachel Dawes, saiu a sem graça Katie Holmes e entrou Maggie Gyllenhaal (Quase bonita de tão esquisita), e a adição esperta de Aaron Eckhart como Harvey Dent, que deixou todo mundo coçando a cabeça se seria possível que o filme tivesse dois vilões. Mas ficava a pergunta:
Quem daria vida ao Coringa?
Muita gente ainda guardava na memória a imagem de Jack Nicholson no papel do príncipe palhaço do crime, os fãs de quadrinhos, porém, em sua maioria acreditavam que dava pra fazer melhor. Aventaram-se na imprensa os nomes de Paul Bettany, Robin Williams e até Vincent Cassel para o papel do vilão, mas, para surpresa de todos, um jovem galã habituado a papéis de mocinho é quem usaria a maquiagem.
Heath Ledger, o caubói gay de Brockeback Mountain, pra quem muitos, muitos, muuuuitos fãs torceram o nariz.
O lance, porém, era confiar em Nolan, que ainda não havia desapontado a audiência.
E não seria dessa vez. Em julho de 2008 chegava aos cinemas o que viria a ser considerado o "O Poderoso Chefão" dos filmes de super herói: Batman - O Cavaleiro das Trevas.
A trama mostrava Bruce Wayne cada vez mais imerso em sua cruzada contra o crime em uma cidade de Gotham City que lutava para se erguer da sombra da corrupção e do medo.
Inspirados pelo cruzado encapuzado, cidadãos tentam lutar contra o mal, seja como vigilantes amadores usando o símbolo do morcego, seja como pessoas de bem trabalhando dentro da lei, como Jim Gordon, Rachel Dawes e o novo promotor público, Harvey Dent (Aaron Eckhart, muito bem), um homem tão obstinado e apaixonado em sua luta contra o crime quanto Bruce Wayne.
Entretanto, conforme a esperança crescia do lado dos virtuosos de Gotham, no submundo da cidade, onde os gangsteres e mafiosos começavam a se encolher por conta da ação do morcego, uma nova e tenebrosa sombra tomou a forma do Coringa (Ledger, ótimo, e agraciado com um Oscar póstumo por sua interpretação assustadora do Coringa).
O palhaço auto-intitulado agente do caos se apresenta aos criminosos de Gotham como a solução dos seus problemas, e promete destruir o Batman por um preço...
É enquanto Bruce Wayne, impressionado com o carisma e obstinação de Dent, reavalia seu futuro como vigilante mascarado e ousa sonhar com uma vida normal ao lado de Rachel Dawes que ele se vê face a face com uma nêmese que pode não ter como vencer a partir do momento em que o Coringa faz toda Gotham City sua refém, com um plano para destruir a virtude da cidade.
Incrível. Batman - Cavaleiro das Trevas não é nada menos do que incrível.
O elenco excelente do primeiro filme com os ótimos adendos de Gyllenhaal, que deu mais carisma e profundidade à Rachel Dawes, Eckhart, que achou o tom na medida para seu Harvey Dent e o óbvio destaque de Ledger, quase irreconhecível sob a maquiagem, voz e trejeitos do Coringa mais aterrador que o cinema já viu contam uma história sombria e poderosa sobre o peso de se fazer uma escolha e arcar com suas consequências.
No segundo filme de Christopher Nolan à frente da franquia do homem-morcego o diretor teve a voz e o tom que pareceu não ter encontrado em Batman Begins, entregando uma trama equilibrada, cheia de questionamentos e drama, mas também repleta da dose de ação e das sequências espetaculares que um filme de super-herói precisa, e deixando toda a plateia salivando de antecipação pelo terceiro filme.
"-Por que você quer me matar?
-Te matar? Por que eu te mataria? Você me completa!"
quinta-feira, 19 de julho de 2012
Rapidinhas do Capita
Taylor Kitsch, de John Carter - Entre Dois Mundos e Battleship foi cotado para estrelar a adaptação do game Need For Speed aos cinemas.
Baseado no histórico do rapaz podemos esperar mais um fracasso de bilheteria.
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O colunista da RBS David Coimbra julga que a demissão de Dorival Júnior, técnico do Internacional, não resolve os problemas do Inter. E contemporiza os maus resultados colorados, justificados, segundo o jornalista que considera o ex-jogador Tcheco "um ser superior", pela falta de material humano do plantel Colorado.
Bueno, se isso não é uma prova irrefutável de que o Internacional precisa despedir Dorival Júnior imediatamente, então eu não sei mais o que é.
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Eu tinha um tio que me levou pra pescar várias vezes em muitos verões.
Eu tinha um tio que contava ótimas piadas e fazia um peixe ao leite de coco delicioso.
Eu tinha um tio que uma vez, com uma piada contada durante um almoço na praia, me fez expelir peixe ao leite de coco pelo nariz de tanto rir.
Eu tinha um tio que tocava violão fazendo paródias impublicáveis de músicas consagradas.
Eu tinha um tio que manjava de muito de computadores, que nos cumprimentava com beijos estalados nas bochechas e que não se furtava de nos dar uns bofetões hilários e acusações de conversão ao judaísmo se nos recusássemos a comer carne de porco.
Eu não tenho mais.
Paz, tio Zé.
terça-feira, 17 de julho de 2012
"Inha", Não...
Ela entrou na sala, vestia uma camisola bem comprida, até porque quase tudo nela ficava bem comprido, esticou a perna pelo qual ele se apaixonara antes mesmo de conhecê-la e mostrou a pantufa divertidíssima que usava:
-Não fiquei bonitinha com a pantufa?
Ele, sentado no sofá, lendo um livro sobre a trajetória de Winston Churchill, baixou o livro e ergueu os óculos até a testa, como se avaliasse a resposta a dar. Concordava, ou não?
Pigarreou e disse com voz firme e uma expressão muito séria:
-Não achei.
Ela ficou, também séria, e desfez a pose, o olhando com os cabelos caídos sobre os ombros:
-Não?
-Não. - Sustentou ele.
Ela deu de ombros, ainda séria, e se virou para andar de volta até o quarto, quando ele falou, detendo-a:
-Eu nunca te acho bonitinha. Eu nunca te achei bonitinha, e nunca vou te achar bonitinha.
Ela virou de volta, olhando pra ele, que marcava o livro e se livrava dos óculos:
-Porque "bonitinho", pra mim, é um feio alinhado. Filhotes de cachorro são bonitinhos, desenhos feitos por crianças de oito anos são bonitinhos, comédias românticas adolescentes são bonitinhas. Tu não tem nada de bonitinha. Nem "bonita"... Tu é, e sempre foi, linda. Arrasadora. Espetaculosa. - Ele disse pausadamente enquanto andava até ela e a enlaçava com os braços na altura da lombar e a erguia do chão até estarem cara a cara, e então continuou:
-Tu sempre é linda. Arrasadora. Espetaculosa. Desejável e muito, muito, muito atraente. Não importa o que tu vista... - Ele disse antes de beijá-la. E então, colocando a mão nas suas costas nuas sob a camisola completar:
-... Ou, de preferência, o que tu não vista.
sábado, 14 de julho de 2012
Resenha Filme: Batman Begins
Na sexta-feira, dia 27 de julho, estréia no Brasil Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge, título meio sem-vergonha que vai receber, no Brasil, o Filme Dark Knight Rises, terceiro capítulo da trilogia do Batman de Christopher Nolan. Como foi feito aqui na casa do Capita com a série do Homem-Aranha, vamos relembrar os filmes do diretor que antecederam o que promete ser a conclusão épica de uma das melhores séries de super-heróis na telona.
Foi em 2005 que a Warner lançou o seu reboot da lenda do cavaleiro das Trevas no cinemas. A última incursão do Batman nas telonas havia sido em 1997 quando Joel Schumacher cometeu Batman & Robin e deu o tiro de misericórdia na série iniciada de maneira decente com o Batman de Tim Burton em 1989 e que alcançara seu pico com Batman - O Retorno em 92, antes de cambalear, já nas mãos de Schumacher com Batman Forever.
Se o mundo do cinema estranhou o reinício "prematuro" da série em celuloide, pros fãs dos quadrinhos era uma ótima oportunidade de ver o Batman ganhar uma cara melhor nas telonas. Se há que se admitir que os filmes de Burton eram interessantes e tinham lá suas qualidades, não é menos verdade que eles estavam longe de ser unanimidade entre os fãs do Morcegão.
Chegou a se especular um recomeço nas mãos do próprio Schumacher, ideia que foi escanteada junto com a versão que Darren Aronofskiy queria dirigir do filme (Com um Alfred negro, e um Batmóvel em forma de locomotiva), e foi Christopher Nolan, dos ótimos Amnésia e Insônia que ganhou a cadeira do diretor.
Ele não demorou a anunciar que Christian Bale, o menino de O Império do Sol, e Patrick Bateman de Psicopata Americano, seria o quarto ator a vestir o capuz após Michael Keaton, Val Kilmer e George Clooney.
Bale era uma escolha interessante. Ator obviamente talentoso e claramente capaz de retratar os aspectos da persona atormentada do herói que haviam sido solenemente ignoradas no filme anterior e pouco exploradas nos três primeiros longas.
Os demais nomes envolvidos no filme eram igualmente promissores. O veterano ator britânico Michael Caine seria a nova cara do Alfred, substituindo Michael Gough, único ator que fora titular nas quatro produções anteriores do Batman junto com Pat Hingle, que interpretara o comissário Gordon, e foi substituído no reinício por Gary Oldman, outra escolha inspirada.
Liam Neeson ganhou o papel de Henry Ducard, e Ken Watanabe seria Rha's Al Ghul. Ainda surgiram os nomes de Morgan Freeman, como Lucius Fox, Tom Wilkinson como Carmine Falcone, Cillian Murphy no papel de Jonathan Crane, o Espantalho e da insossa Katie Holmes como Rachel Dawes.
O tabuleiro montado, história de origem a ser contada, era só engraxar as engrenagens e fazer o negócio andar. E andou.
Batman Begins recontava a história de Bruce Wayne, intercalando o presente do jovem bilionário, então prisioneiro de uma penitenciária no Butão, com seu passado, a infância na mansão Wayne, lar de seus pais, o doutor Thomas e a senhora Martha Wayne (Linus Roache, maneiro e Sarah Stewart), prósperos herdeiros da fortuna da mais tradicional família de Gotham City que usam sua influência e fortuna em nome da filantropia até serem brutalmente assassinados durante um assalto na saída de uma peça de teatro (E não na saída do filme Zorro, como nos quadrinhos) e como esse episódio traumatizou o jovem Bruce a ponto de gerar sua obsessão com a vingança.
Contatado por Ducard na prisão, Bruce se une à Liga das Sombras, um formidável grupo de justiceiros que combate ao mal em todas as suas formas. Lá, Wayne relembra os anos que passou viajando pelo mundo após abdicar da fortuna de sua família enquanto tentava compreender o funcionamento das mentes criminosas. Após concluir seu treinamento, Bruce Wayne retorna a Gotham City, retomando a fortuna Wayne, e com a ideia de se tornar um símbolo na luta da justiça contra o crime.
Sob o capuz e a capa do Batman, Wayne inicia uma cruzada contra o crime organizado, mas acaba esbarrando em um esquema de corrupção que se estende dos mais altos escalões do judiciário até os porões do asilo Arkham, e que envolve um plano que pode destruir toda a cidade que Wayne jurou proteger.
O longa de Christopher Nolan é muito bom. Pela primeira vez o vigilante de Gotham aparecia em uma cidade que parecia real (Chicago e Los Angeles serviram de dublês de Gotham City), uma metrópole opressiva e cheia de cantos obscuros ao invés das estátuas gigantes sustentando viadutos e néon por todos os lados.
Os coadjuvantes eram muito bons, especialmente o sargento Gordon de Gary Oldman e o Alfred Pennyworth de Michael Caine, os vilões eram frios e calculistas e Bruce Wayne/Batman ganhou em Christian Bale o primeiro ator a realmente explorar a múltipla persona do herói, mostrando três personalidades diferentes no filme, o afetado playboy bilionário que a sociedade conhece, o tenebroso vigilante que o crime teme e o verdadeiro Bruce Wayne, visto apenas por Rachel Dawes e especialmente pelo Alfred, um homem atormentado e obstinado, sim, mas também uma pessoa de verdade, com emoções de verdade.
Muitas das sequências de ação do filme eram praticamente arrancadas das páginas de Batman - Ano Um de Frank Miller e David Mazzuchelli e fizeram a alegria dos fãs do morcego em quadrinhos, entretanto, podia-se notar algum desconforto na direção do filme, um fenômeno parecido com o visto em X-Men de Bryan Singer, onde o diretor parecia algo tímido no comando do longa, como se ainda não tivesse encontrado o tom de sua voz pra contar aquela determinada história.
Mas da mesma forma que esse "deslocamente" não prejudicou o filme de mutantes de Singer, também não fez mal algum ao Batman Begins de Nolan, na verdade, como havia acontecido ao diretor de Os Suspeitos cinco anos antes, o filme de estréia satisfez, e serviria como ensaio para um voo muito mais alto no segundo capítulo da franquia.
"Por que nós caímos, mestre Bruce? Para aprendermos a levantar."
sexta-feira, 13 de julho de 2012
Pra Cultivar
Existem coisas que não se criam sozinhas. Se forem abandonadas elas minguam, diminuem, se desfazem e desaparecem. São coisas que não podem ser abandonadas à própria sorte, que precisam ser protegidas, nutridas, em última instância até um pouco aduladas, por que não?
Era no que acreditava o Sidney. O Sidney gostava demais da Lourdes, demais, mesmo. Era apaixonado por ela, perdidamente, loucamente, incoercivelmente.
E sentia necessidade de demonstrar isso sempre. Embora fosse um sujeito simples, tosco, até, sentia necessidade de florir o que sentia por Lourdes nas ocasiões em que a coragem e a necessidade de declarar o quanto ela lhe era cara venciam sua timidez.
Nessas ocasiões ele escrevia poemas, ele comprava presentes, fazia citações... Tudo o que estava a seu alcance para deixar claro o quanto a Lourdes era importante pra ele. O quanto ele prezava a presença dela em sua vida, e o quanto ele queria que aquela presença durasse.
E mesmo sabendo que nem sempre seus poemas tocariam o coração de Lourdes, mesmo sabendo que os presentes que ele dava não seriam o que ela queria, mesmo sabendo que suas citações eventualmente soariam vazias ou tolas, ele seguia, na esperança de acertar mais do que errar.
Pois mesmo sendo incauto, simples, tosco, até, ele sabia, que aquele amor que ele sentia, para vingar e alcançar seu inteiro potencial, precisava ser acalentado, protegido, alimentado, cultivado...
Como uma "aRvrinha".
Rapidinhas do Capita
Bons ventos sopraram da San Diego Comic-Con, o mega evento nerd que acontece anualmente nos EUA e que eu juro de pés juntos que um dia vou assistir.
Lá, na Meca da cultura pop, onde editoras, produtoras e fábricas de brinquedos anunciam seus projetos e procuram por investidores entre fanboys de toda a estirpe duas notícias em particular valem um sorriso matutino:
A primeira, a editora Dark Horse que a mais de vinte anos mantém os direitos de criação e publicação de quadrinhos baseados no universo Star Wars (Que é publicado por aqui, e tem histórias muito boas) anunciou uma nova série a se passar entre os episódios IV e VI da série cinematográfica original, prometendo manter-se fiel ao espíritos dos filmes e de seus personagens. O roteirista será Brian Wood e os desenhos ficarão a cargo de Carlos D'Anda. Pra melhorar?
As capas terão arte de Alex Ross.
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Outra boa(Boa nada, ótima, espetaculosa, sensacional) que veio de San Diego:
Pra quem me perguntar qual a melhor série de quadrinhos de todos os tempos, eu respondo sem pensar duas vezes que é Sandman.
Sempre.
A obra prima de Neil Gaiman é tudo o que uma boa história tem que ser. Com o advento de Before Watchmen, o prelúdio da obra-prima de Alan Moore que a DC resolveu conspurcar como um ladrão de túmulos, confesso que fiquei receoso que a Diabólica Companhia resolvesse fazer coisa semelhante com a trajétória de Morpheus e dos Perpétuos, e não é que a editora, de fato, teve essa ideia?
Por sorte, Neil Gaiman é um sujeito mais sensato e cordato do que Moore, e disse sim.
Isso mesmo.
Neil Gaiman escreverá um prelúdio de Sandman pra DC Comics em 2013, em parceria com o desenhista J. H. Williams, a ser lançada em novembro do ano que vem.
Bueno... Depois da escorregada no tomate que foi Before Watchmen, a DC tava devendo uma bola dentro que em essa.
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Sexta-feira pra deixar nerd que nem eu de sorriso no rosto e suando de antecipação mesmo com o frio de Porto Alegre.
Ainda bem que eu estou equipado com a minha linda e maneiríssima toalha do Homem-de-Ferro.
terça-feira, 10 de julho de 2012
Teorias
A Beatriz, bonita, altona, magra, cabelos loiros escorridos por cima dos ombros, olhos castanho-claros sorriso bonito, boca bonita, toda bonita, andava sempre alinhada, com roupas cuidadosamente escolhidas, cheirosíssima com seus perfumes da Dior e da Nina Ricci, aos trinta anos achava que não tinha problema se embonecar pois já passara da idade de ser taxada de patricinha, mas, como ninguém lhe dava seus trinta anos, ainda convivia com esse rótulo.
A Beatriz, vestindo um casaco longo de couro caramelo, botas e bolsa combinando, calças jeans e uma camisa branca de seda entrou tão aos solavancos na casa da Valquíria que parecia o Cosmo Krammer entrando no apartamento do Jerry Seinfeld. Nem deu tempo de a Val dar "oi", foi logo espichando o braço com a mão direita virada pra baixo e mostrando pra amiga enquanto dizia:
-Ai, Valquíria. Valquíria do céu, o Benito me deu um anel...
A Valquíria, muito branquinha, cabelo preto curto, óculos de grau, usando um short de algodão e uma camiseta larga estampada com o Mickey, maior pinta de geek, e considerada geek por todo mundo, sorriu enquanto examinava o anel e perguntava sorrindo:
-O quê? Aquele lesado do Benito te pediu em noivado?
-Não! - Bradou, fazendo voz de choro a Beatriz - Ele não me pediu em noivado, nem em casamento nem em nada! O desgraçado me deu esse anel de presente de aniversário de namoro...
-Que bonitinho. - Interrompeu a Val.
-Bonitinho é o cacete, Valquíria. Bonitinho é o cacete. - Ralhou a Beatriz.
-Bom... Dependendo... -Riu, maliciosa a Val.
-Ah, calaboca. - Suspirou a Beatriz caindo sentada em cima de um pufe cor de rosa.
-Mas por que esse drama todo, guria? E daí que o Benito te deu um anel de presente de aniversário? O anel é bonito, a tua cara, na verdade. - Perguntou Valquíria, sentando do lado da amiga com os joelhos juntos e pousando a mão sobre o joelho de Beatriz enquanto observava atenta ao anel na mão da amiga.
-E daí? E daí? Ai, Valquíria, não me admira que tu continue solteira com esses teus filmes esquisitos e livros doidos, viu? O que um homem faz quando pede uma mulher em casamento, criatura?
A Valquíria pensou brevemente e então disse como quem pergunta:
-Se ajoelha, pergunta se ela aceita e coisa e tal?
A Beatriz suspirou:
-Não, guria, ele oferece um anel.
-Para a todos governar... - Sussurrou Valquíria, olhando pra longe.
-Ah, fala sério, Val... - Protestou Beatriz.
-Tá, desculpa. Bom, ele te ofereceu o anel, só não foi o de noivado, ainda.
-Não, Valquíria, tu não sabe como é que os homens funcionam, criaturinha... O Benito não vai me oferecer anel de noivado.
-Não? - Inquiriu a Val, surpresa.
-Não. Homem que vai dar anel de noivado não fica ensaiando antes. Não com outros anéis comuns. Homem que quer dar anel de noivado esconde o jogo até o último instante e aí: PIMBA! - Explicou Beatriz, ilustrando o "pimba" com as costas da mão esquerda batendo bem forte na palma da mão direita.
-Pimba? - Perguntou, insegura, a Valquíria.
-É... Mas depois dessa tô vendo que com o Benito, "pimba" nunca vai acontecer. Isso mesmo, amiga, tô condenada à uma vida sem pimba se continuar com o Benito. - Lamentou Beatriz.
-Tá, mas... O que tu vai fazer? Terminar com ele? Vocês se são tão bem... - Replicou Val.
-Mas o que eu vou fazer, Val? Eu quero me casar, ter filhos, ser uma feliz dona de casa... Tu não ia entender... De qualquer jeito, é assim que as coisas são. Vou ter que terminar com o Benito. Mas... Sei lá. Tipo, semana que vem, pra não terminar em cima do presente, né? Ai, tô indo lá, amiga, me liga, viu? - A Beatriz se despediu saindo dramaticamente como havia entrado.
-Tá bem, tchau, e juízo, viu? - Despediu-se Val, usando a despedida padrão de seu avô.
Ao fechar a porta pra amiga se perguntou como duas pessoas tão diferentes podiam ser amigas, e concatenou que provavelmente era justamente pra uma poder vivenciar, ainda que a uma distância segura, experiências que jamais vivenciaria em primeira-pessoa. Não pode deixar de pensar no tamanho da bobagem que achava todo aquele drama que a amiga havia engendrado, e a iniciativa de romper a relação com o Benito, que era um tremendo mala, mas havia sido feito sob medida pra Beatriz.
Sentou-se no seu sofá com suas pantufas do Tom e Jerry e riu da teoria doida e sem fundamento que a amiga havia bolado pra o lance dos anéis, mas mesmo achando a teoria doida e sem fundamento, sorriu com certo alívio ao lembrar que, em termos de jóias, semi-jóias e adornos, do amor de sua vida, ganhara um par de brincos, mas nenhum anel.
segunda-feira, 9 de julho de 2012
O Espetacular Homem-Aranha: A Segunda Vez É Ainda Melhor
Havia assistido a'O Espetacular Home-Aranha na quinta-feira. O filme funcionou pra mim, entretanto, por diversas razões que vão de distrações enquanto via o filme ao inevitável reflexo de assisti-lo comparando aos longas da trilogia dirigida por Sam Raimi, acho que posso não ter sido inteiramente justo com a visão de Mark Webb do cabeça de teia.
No sábado à noite fui rever o filme, e, prestando a devida atenção, e já sem o impacto da novidade, adivinhem?
O filme melhora, e muito!
Não que os defeitos desapareçam, não, de forma alguma, eles ainda existem, e ainda são visíveis, mas se tornam mais palatáveis, compreensíveis e até inofensivos.
Eu evito ler as críticas antes de ver o filme e antes de escrever as resenhas da Casa do Capita, abro precedentes justamente aos filmes que me deixam mais ansioso, como Vingadores, Homem-Aranha e o Batman, mas ainda assim, evito os reviews completos, prefiro ficar na zona das primeiras impressões e outros textos mais sucintos. Quando vi as críticas de O Espetacular Homem-Aranha na sexta-feira percebi que a maioria dos especialistas gostaram, Ana Maria Bahiana, Luiz Carlos Mertem e Roberto Sadovski curtiram o filme do teioso, mas alguns nerds ressentidos, tanto fãs quanto críticos, picharam bonito o longa. Mas será que todas as queixas procedem?
O texto a seguir não é recomendado a quem ainda não assistiu o filme ou não gosta de spoilers, então, siga por sua conta e risco.
Ainda aqui? Beleza, então:
Origem.
O peso dado aos pais de Peter no roteiro de James Vanderbilt não incomoda, não removeu nada da importância de tio Ben e tia May na criação de Peter e criou um ótimo conflito familiar entre os Parker remanescentes, além de ser um catalisador bastante sólido pra o fato de Peter se enfiar em um laboratório de última geração.
A ideia de a origem de Peter como o Homem-Aranha estar ligada de maneira mais direta aos experimentos de Richard Parker não apareceram no filme (Ainda bem), de modo que a única queixa pode ser o fato de Peter ser picado na nuca e não na mão pela aranha fatídica.
Não existe o deslumbramento do filme de 2002 nas cenas em que Peter descobre seus super-poderes, mas isso não é um defeito, as cenas mostradas pra esse fim são muito boas e servem bem à trama.
Confesso que senti falta da clássica frase que diz que grandes poderes trazem grandes responsabilidades, mas o conceito está lá, embutido na fala de tio Ben de que Richard Parker acreditava que se uma pessoa tem alguma habilidade ela tem a obrigação moral de usá-la em prol de todos.
Senti falta, também como fã de quadrinhos, da sequência da Luta Livre, aliás, fica aqui minha grande queixa com relação à origem do personagem n'O Espetacular Homem-Aranha, pra mim era parte intrínseca da origem do personagem o fato de Peter, como qualquer jovem pobre normal, querer lucrar com seus poderes recém descobertos.
Gwen Stacy.
O fato de Gwen ser apresentada como uma "rival intelectual" a Peter não me causou nenhuma estranheza, aliás, a senhorita Stacy ser mostrada como uma loura burra sim, seria estranho. Nos quadrinhos a loirinha era uma menina muito inteligente e colega de Peter na faculdade. A crítica do Omelete a classifica como "Uma super-estagiária", ora, como assim, super-estagiária? Ao que parece a função da guria era guiar visitas pela Oscorp, e ela tinha um crachá que dava acesso ao laboratório do Connors, isso lá é ser "super"?
Se alguma coisa na encarnação dela do filme pode causar estranhamento é o fato de ela ter aquele mundaréu de irmãos e sua mãe ainda estar viva. Quanto à sua posição nas indústrias Oscorp, como estagiária do doutor Connors, isso não é nenhum absurdo, e inclusive foi uma ideia retirada do (ótimo) desenho animado Spectacular Spider-Man, e funciona.
Confesso que não me agradou o fato de ela conhecer a identidade secreta de Peter, mas isso pode trazer desdobramentos interessantes no futuro, além do mais, ajuda a estabelecer que Peter é o Homem-Aranha, sua namorada é namorada do Aranha, ao contrário de Lois Lane ou Rachel Dawes, que podem ser interesse romântico apenas de um dos lados da persona de seus heróis. E ainda rendeu umas cenas bem maneiras dos dois juntos no plano dramático sem ser melado como o romance Mary Jane/Peter Parker da trilogia anterior.
Capitão George Stacy
O capitão Stacy de um inspirado Dennis Leary não é o velhinho de cabelos brancos e personalidade camarada que acreditava na inocência do Homem-Aranha como víamos nos quadrinhos.
O capitão Stacy de O Espetacular Homem-Aranha é um policial linha-dura, ainda na ativa, e disposto a tirar das ruas tanto o monstruoso Lagarto quanto o vigilante mascarado conhecido como Homem-Aranha. Entretanto, ao descobrir a identidade secreta do escalador de paredes ele percebe a importância que o herói terá no futuro, e torna-se, ainda que brevemente, seu aliado.
A cena de sua morte, pedindo que Peter fique longe de Gwen, é outra com a maior cara dos gibis, reinterpretando o pedido que o personagem faz ao herói no quadrinho.
O Lagarto.
Mesmo com a ótima caracterização de Rhis Ifans ouvi reclamações de que a família Connors não aparece ou é mencionada no filme. Não é inteiramente verdade.
Curt usa sua aliança de casamento na mão esquerda, então, ele é ou foi casado, apenas não fazia diferença pra trama do filme mostrar sua esposa e filho, conteúdo que pode ser explorado no futuro, já que, diferente de Sam Raimi, Mark Webb não matou seu vilão no fim do longa.
Martha e Billy Connors não foram descartados pela produção, apenas não deram as caras, talvez estivessem em férias, talvez a obsessão de Curt com suas experiências pra Oscorp o tivessem afastado da família, vai saber.
O visual do personagem quando transformado em monstro ficou ótimo, emulando de maneira bruta o visual do personagem nos quadrinhos desenhados por Steve Ditko e John Romita Sr.
Vou me esforçar pra não chamar de imbecil quem se queixou do fato de o Lagarto, alter ego escamoso de Connors, falar e tramar. O personagem É assim nos quadrinhos. Uma monstruosidade reptiliana imbuída de todo o conhecimento científico de Connors. O plano dele de transformar a população de Nova York em lagartos é a cara dos gibis de Stan Lee, Roy Thomas e outros dos roteiristas dos anos sessenta. O Lagarto só se transformou em uma besta selvagem nos anos noventa, na mini-série Tormento, onde, aliás, o Homem-Aranha estranha o fato de o Lagarto não falar.
Peter Parker, jovem descolado.
Porque Peter consegue se equilibrar em cima de um skate e usa lentes de contato ao invés de óculos. Isso faz dele descolado? Que bobagem.
O Peter Parker interpretado com maestria de cavaleiro jedi por Andrew Garfield continua sendo um nerd azarado e sem jeito com as meninas. Ele é genial, inseguro e introspectivo, apenas não é um completo imbecil como Tobey Maguire o interpretou no longa de 2002. É algo vingativo como era o personagem dos quadrinhos, apenas tem mais presença de espírito, mais espinha e é menos desajeitado.
Mas descolado?
Não, definitivamente ele não é "descolado".
Máscara, uniforme, equipamento...
A máscara surge no filme inspirada pela luta livre, sim, mas de maneira bem mais discreta e em um contexto diferente. Além do mais, responde à uma função prática: O anonimato de que o personagem necessita para caçar o assassino de Ben Parker sem colocar sua identidade civil em risco.
O uniforme também tem uma função específica, otimizar os saltos do personagem com as teias ao reduzir a resistência do ar como acontece com atletas de diversos esportes.
As teias são um capítulo a parte. Aparentemente James Cameron e Sam Raimi convenceram o mundo de que era impossível um jovem estudante do secundário elaborar o fluído de teia porque a 3M ainda não havia pensado em nada semelhante (Pra mim sempre pareceu que o fluído de teia poderia ser um sucesso comercial se não se dissolvesse após uma hora, não entendo como ninguém nunca explorou a ideia de que Peter estava pensando no fluido como um adesivo permanente que não funcionava direito.).
De qualquer forma, no longa de Mark Webb Peter compra seu fluído de teia da Oscorp, um produto chamado biocabo, mas desenvolve o sistema de lançamento de teias por conta própria, o que já é um avanço.
A Trama.
Vi muita gente criticar a quantidade de coincidências fortuitas presentes no longa, a principal é Gwen, colega de Peter, trabalhar na Oscorp, onde também trabalha Curtis Connors, ex-colega de Richard Parker.
De fato, tremenda coincidência, mas é tão improvável? Se Gwen é uma cientista em potencial, não seria natural que ela tentasse uma vaga de estágio na grande empresa do ramo de Nova York? Eu não vejo isso como um problema ou uma forçação de barra maior do que Peter ser melhor amigo de Harry Osborn, filho de Norman Osborn, dono das indústrias Oscorp e futuro Duende Verde.
Outra recriminação ao roteiro diz respeito ao fato de não haver um desfecho à linha narrativa de Peter procurando pelo assassino do tio Ben. Ora, essa linha narrativa não precisa de desfecho. Peter simplesmente percebe, após a conversa com George Stacy e o incidente da ponte, que tem responsabilidades muito maiores do que vingança. Não existe necessidade de um desfecho àquela linha narrativa pro desenvolvimento do personagem, o abandono dela, na verdade, é que mostra o amadurecimento de Peter.
O sumiço do doutor Ratha (Irffan Khan, que eu estava esperando perguntar pro Peter se ele sabia quem estava na nota de mil rupias), sim, pode ser um evento que cause algum desconforto, mas se o personagem desapareceu pra sumir com a bazófia da predisposição genética (A possibilidade de que Peter se tornou o Homem-Aranha por causa de experimentos de seu pai.), seu sumiço é bem vindo.
A cena pós-créditos.
Não gostei da cena pós créditos. Achei ela extremamente genérica, apenas como um aviso de "Ei, vai ter outro, OK?", entretanto, o fato de a tal cena não revelar muita coisa exceto que existe uma "verdade" sobre seus pais que Peter ainda não descobriu dá aos produtores e roteiristas carta branca pra pesar o que funcionou e o que não funcionou nesse primeiro longa e saber o que se pode limar e o que deve permanecer pra futuras sequências.
E que elas não demorem.
sábado, 7 de julho de 2012
Tô Dentro
O Lisandro chegou todo pimpão com o video game embaixo do braço na casa do Maurício, ligou os cabos, colocou pra rodar o jogo do Capitão-América e disse sorrindo que nem guri de kichute novo:
-Te liga aqui, esse jogo é do caralho. Maior cópia da jogabilidade do game do Bátima, mas ficou maneiro.
O Maurício pegou o controle e jogou um pouco, constatou que a descrição do Lisandro fazia justiça:
-Pior, parece mesmo com o Arkham Asylum. O que tu tem naquela sacola? - Perguntou apontando com o queixo pra uma sacola plástica branca que Lisandro largara no chão próximo à sua mochila.
-Dois cachorros quentes e duas Fanta Maracujá. - Respondeu o Lisandro. - Vou meter no freezer e a gente come depois, pode ser?
-Arram - Respondeu Maurício, ainda jogando, mas olhando pro Lisandro de rabo de olho.
Lisandro voltou da cozinha do amigo sorrindo.
-Que horas a Clarisse chega? - Perguntou.
-Tá de plantão, hoje, não chega até às dez horas.
-Bom, não vai dar tempo de terminar o Capitão-América, mas tem mais coisa... ó, Marvel Vs. Capcom 3, Incrível Hulk, as expansões do GTA, Thor... Fiz um pacote de jogo de super-herói, eheheheh.
Maurício pausou o jogo e encarou Lisandro:
-Que alegria toda é essa?
-Que alegria, rapaz, tá me estranhando? Alegria é coisa de boiola. - Retrucou Lisandro, antes de cair na gargalhada.
Maurício fechou um olho encarando o amigo e disse:
-É com ela, né? Esses teus acessos de faceirice e de tristeza sempre têm a ver com ela.
Lisandro não disse nada. Sorriu de maneira enigmática e falou:
-Pode ser...
-E aí? O que vocês dois tão fazendo? Foram "à público"? - Perguntou Maurício.
-Não... Ainda não. - Respondeu Lisandro, sério. -Não dá.
-Então?
-Estamos tramando um golpe perfeito.
-Que golpe?
-Estamos fingindo que eu não sou louca, perdida e inapelavelmente apaixonado por ela.
-E vai dar certo?
-Como é que eu vou saber? Provavelmente não... A gente sabe que golpes perfeitos são complicados e têm tudo pra dar errado, que pessoas podem se ferir, e tudo mais, mas... - Lisandro hesitou.
-Mas o quê? - Quis saber Maurício.
-Tentando eu fico perto dela. E proximidade com ela faz qualquer risco valer mais que a alternativa.
-Que é?
-Estar longe dela, cabeça... Então, se me der a chance de estar por perto, o que ela sugerir, eu tô dentro. Vai, sai do jogo aí que eu vou te mostrar como é que se faz pro Homem-Aranha limpar o chão com o Magneto.
-Te liga aqui, esse jogo é do caralho. Maior cópia da jogabilidade do game do Bátima, mas ficou maneiro.
O Maurício pegou o controle e jogou um pouco, constatou que a descrição do Lisandro fazia justiça:
-Pior, parece mesmo com o Arkham Asylum. O que tu tem naquela sacola? - Perguntou apontando com o queixo pra uma sacola plástica branca que Lisandro largara no chão próximo à sua mochila.
-Dois cachorros quentes e duas Fanta Maracujá. - Respondeu o Lisandro. - Vou meter no freezer e a gente come depois, pode ser?
-Arram - Respondeu Maurício, ainda jogando, mas olhando pro Lisandro de rabo de olho.
Lisandro voltou da cozinha do amigo sorrindo.
-Que horas a Clarisse chega? - Perguntou.
-Tá de plantão, hoje, não chega até às dez horas.
-Bom, não vai dar tempo de terminar o Capitão-América, mas tem mais coisa... ó, Marvel Vs. Capcom 3, Incrível Hulk, as expansões do GTA, Thor... Fiz um pacote de jogo de super-herói, eheheheh.
Maurício pausou o jogo e encarou Lisandro:
-Que alegria toda é essa?
-Que alegria, rapaz, tá me estranhando? Alegria é coisa de boiola. - Retrucou Lisandro, antes de cair na gargalhada.
Maurício fechou um olho encarando o amigo e disse:
-É com ela, né? Esses teus acessos de faceirice e de tristeza sempre têm a ver com ela.
Lisandro não disse nada. Sorriu de maneira enigmática e falou:
-Pode ser...
-E aí? O que vocês dois tão fazendo? Foram "à público"? - Perguntou Maurício.
-Não... Ainda não. - Respondeu Lisandro, sério. -Não dá.
-Então?
-Estamos tramando um golpe perfeito.
-Que golpe?
-Estamos fingindo que eu não sou louca, perdida e inapelavelmente apaixonado por ela.
-E vai dar certo?
-Como é que eu vou saber? Provavelmente não... A gente sabe que golpes perfeitos são complicados e têm tudo pra dar errado, que pessoas podem se ferir, e tudo mais, mas... - Lisandro hesitou.
-Mas o quê? - Quis saber Maurício.
-Tentando eu fico perto dela. E proximidade com ela faz qualquer risco valer mais que a alternativa.
-Que é?
-Estar longe dela, cabeça... Então, se me der a chance de estar por perto, o que ela sugerir, eu tô dentro. Vai, sai do jogo aí que eu vou te mostrar como é que se faz pro Homem-Aranha limpar o chão com o Magneto.
sexta-feira, 6 de julho de 2012
Resenha Cinema: O Espetacular Homem-Aranha
Ontem enfrentei a chuva inclemente que castigava Porto Alegre e finalmente assisti a O Espetacular Homem-Aranha, filme dirigido por Mark Webb que reinicia a franquia do herói aracnídeo nos cinemas sob um novo enfoque, ignorando os três filmes concebidos por Sam Raimi em 2002, 2004 e 2007.
Com minha camiseta de Aranha, sentado na penúltima fileira do cinema, numa posição bem centralizada, escondi minha carranca sob os óculos 3-D e esperei que, mesmo com as expectativas lá na estratosfera, o filme funcionasse pra mim.
E voilá, ele funciona.
O Espetacular Homem-Aranha mostra Peter Parker (Andrew Garfield), jovem nerd, estudante do secundário que vive sob uma sombra. Treze anos antes, seu pai e sua mãe, o deixaram com seus tios e saíram para nunca mais voltar.
A despeito de ter sido criado em um lar de amor e compreensão, Peter jamais superou o desaparecimento de sua mãe Mary (Embeth Davidtz) e seu pai Richard (Campbell Scott) Parker, e é justamente essa inconformidade com o fato de não saber que faz com que o caminho de Peter se cruze com o do doutor Curtis Connors (Rhys Ifans), renomado cientista que trabalha nas indústrias Oscorp e busca de maneira incessante uma forma de misturar o genoma de espécies diferentes de modo a suprir as deficiências humanas, em especial a sua própria: A amputação do braço direito.
É na Oscorp, procurando por seu passado que Peter é exposto à aranha geneticamente alterada que o pica e altera seu corpo dando-lhe poderes aracnídeos. Preocupado com as possíveis consequências da exposição, Peter se aproxima gradativamente de Connors, e o trabalho conjunto dos dois somado às anotações de Richard pode ser a chave para o sucesso da empreitada de Connors.
A aproximação de Peter e Connors, porém, causa transtornos no lar dos Parker. Os recém adquiridos segredos de Peter o colocam em rota de colisão com os tios Ben e May (Martin Sheen e Sally Field), e é justamente após uma discussão com seu tio que Peter deixa um assaltante que poderia segurar facilmente escapar.
O mesmo assaltante que atira em Ben, matando-o.
É aí que começa, de fato, o filme. Peter Parker, inicialmente um vigilante vingativo, vai aprender que grandes poderes trazem grandes responsabilidades, ao mesmo tempo em que precisa aprender a conviver com suas novas habilidades, e lidar com a perda do tio Ben, Peter se aproxima de sua colega, Gwen Stacy (Emma Stone), e continua na busca por sua origem e sua identidade enquanto Connors toma uma decisão extrema com relação à sua experiência que pode acabar em desastre na forma do Lagarto.
É um ótimo filme.
O Espetacular Homem-Aranha é honesto, divertido e bem estruturado, nada acontece ao acaso na trama que pode, sim, desagradar a alguns puristas. Eu senti falta de elementos que considero seminais pro personagem dos quadrinhos, mas isso não tira o brilho do filme nem o prejudica em demasia pra plateia em geral. A despeito de ter um roteiro redondinho, o filme por vezes parece dar uma corrida, obviamente já que, em cerca de duas horas e dez minutos, precisa-se contar duas origens (Herói e vilão), apresentar personagens e situações e preparar o terreno para o alavancamento da história, ainda assim, não é nada que estrague a experiência.
Mark Webb tem mão firme, mas não pesada, e manda bem na condução do roteiro (iniciado por James Vanderbilt e mexido por Alvin Sargeant e Steve Kloves), a trilha sonora de James Horner é muito boa, e o elenco, ótimo. Martin Sheen interpreta o tio Ben que todo o fã do Aranha sempre imaginou, aquele amigão bonachão que sabe cobrar quando acha justo, Rhys Ifans é o doutor Connors dos gibis, um homem bom e brilhante que acaba vergando sob uma aura de tormento e necessidade de auto-afirmação, Sally Field, mesmo aparecendo pouco como a tia May, dá seu recado nas suas poucas participações, ás vezes sem precisar dizer nada. Emma Stone é um achado no papel de Gwen Stacy, além de parecer uma versão em carne e osso da personagem desenhada por John Romita Sr. ela convence como a tímida e brilhante aspirante a cientista que estagia na Oscorp, o que dá a personagem mais função na trama do que ser apenas o interesse romântico do herói ou a donzela em perigo. Ainda há Dennis Leary, ótimo no papel de George Stacy, pai da mocinha e policial obstinado, mas não tem outra:
O filme pertence a Andrew Garfield.
O ator É Peter Parker e É o Homem-Aranha. Ele é um moleque apaixonado, ele é um adolescente rebelde, ele se arrepende de suas más decisões, e se apavora com o modo como as coisas mudam a seu redor sempre parecendo crível, sempre honesto, sempre convincente. Quando enverga a fantasia de super-herói (Aliás, parabéns ao departamento de figurino do filme, o uniforme, em movimento, é excelente. Tem uma mobilidade que não era visível nas fotos do filme e com a luz correta funciona à perfeição) ele se transforma, soltando seu lado mais sarcástico sob o anonimato que a máscara oferece e o poder que o uniforme evoca, sem contar que é a efígie cuspida e escarrada do Peter Parker desenhado por Steve Ditko.
Não, O Espetacular Homem-Aranha não é um filme perfeito. Entrando na inevitável comparação com o longa de 2002, provavelmente, enquanto filme, O Espetacular Homem-Aranha é inferior a Homem-Aranha, inclusive porque carece do impacto do filme de Sam Raimi, afinal, Mark Webb reconta uma história que mal completou dez anos nas telonas. Porém, na caracterização dos personagens, especialmente do protagonista, a versão 2012 do herói dá uma surra de relho no filme estrelado por Tobey Maguire.
E eu tenho certeza de que, com o desenvolvimento da história no inevitável O Espetacular Homem-Aranha 2, esse filme vai ganhar um espaço no coração da audiência, talvez, tão grande quanto o espaço que têm os filmes de Sam Raimi.
"-Não faça promessas que não pode cumprir, senhor Parker.
-Mas são o melhor tipo..."
Com minha camiseta de Aranha, sentado na penúltima fileira do cinema, numa posição bem centralizada, escondi minha carranca sob os óculos 3-D e esperei que, mesmo com as expectativas lá na estratosfera, o filme funcionasse pra mim.
E voilá, ele funciona.
O Espetacular Homem-Aranha mostra Peter Parker (Andrew Garfield), jovem nerd, estudante do secundário que vive sob uma sombra. Treze anos antes, seu pai e sua mãe, o deixaram com seus tios e saíram para nunca mais voltar.
A despeito de ter sido criado em um lar de amor e compreensão, Peter jamais superou o desaparecimento de sua mãe Mary (Embeth Davidtz) e seu pai Richard (Campbell Scott) Parker, e é justamente essa inconformidade com o fato de não saber que faz com que o caminho de Peter se cruze com o do doutor Curtis Connors (Rhys Ifans), renomado cientista que trabalha nas indústrias Oscorp e busca de maneira incessante uma forma de misturar o genoma de espécies diferentes de modo a suprir as deficiências humanas, em especial a sua própria: A amputação do braço direito.
É na Oscorp, procurando por seu passado que Peter é exposto à aranha geneticamente alterada que o pica e altera seu corpo dando-lhe poderes aracnídeos. Preocupado com as possíveis consequências da exposição, Peter se aproxima gradativamente de Connors, e o trabalho conjunto dos dois somado às anotações de Richard pode ser a chave para o sucesso da empreitada de Connors.
A aproximação de Peter e Connors, porém, causa transtornos no lar dos Parker. Os recém adquiridos segredos de Peter o colocam em rota de colisão com os tios Ben e May (Martin Sheen e Sally Field), e é justamente após uma discussão com seu tio que Peter deixa um assaltante que poderia segurar facilmente escapar.
O mesmo assaltante que atira em Ben, matando-o.
É aí que começa, de fato, o filme. Peter Parker, inicialmente um vigilante vingativo, vai aprender que grandes poderes trazem grandes responsabilidades, ao mesmo tempo em que precisa aprender a conviver com suas novas habilidades, e lidar com a perda do tio Ben, Peter se aproxima de sua colega, Gwen Stacy (Emma Stone), e continua na busca por sua origem e sua identidade enquanto Connors toma uma decisão extrema com relação à sua experiência que pode acabar em desastre na forma do Lagarto.
É um ótimo filme.
O Espetacular Homem-Aranha é honesto, divertido e bem estruturado, nada acontece ao acaso na trama que pode, sim, desagradar a alguns puristas. Eu senti falta de elementos que considero seminais pro personagem dos quadrinhos, mas isso não tira o brilho do filme nem o prejudica em demasia pra plateia em geral. A despeito de ter um roteiro redondinho, o filme por vezes parece dar uma corrida, obviamente já que, em cerca de duas horas e dez minutos, precisa-se contar duas origens (Herói e vilão), apresentar personagens e situações e preparar o terreno para o alavancamento da história, ainda assim, não é nada que estrague a experiência.
Mark Webb tem mão firme, mas não pesada, e manda bem na condução do roteiro (iniciado por James Vanderbilt e mexido por Alvin Sargeant e Steve Kloves), a trilha sonora de James Horner é muito boa, e o elenco, ótimo. Martin Sheen interpreta o tio Ben que todo o fã do Aranha sempre imaginou, aquele amigão bonachão que sabe cobrar quando acha justo, Rhys Ifans é o doutor Connors dos gibis, um homem bom e brilhante que acaba vergando sob uma aura de tormento e necessidade de auto-afirmação, Sally Field, mesmo aparecendo pouco como a tia May, dá seu recado nas suas poucas participações, ás vezes sem precisar dizer nada. Emma Stone é um achado no papel de Gwen Stacy, além de parecer uma versão em carne e osso da personagem desenhada por John Romita Sr. ela convence como a tímida e brilhante aspirante a cientista que estagia na Oscorp, o que dá a personagem mais função na trama do que ser apenas o interesse romântico do herói ou a donzela em perigo. Ainda há Dennis Leary, ótimo no papel de George Stacy, pai da mocinha e policial obstinado, mas não tem outra:
O filme pertence a Andrew Garfield.
O ator É Peter Parker e É o Homem-Aranha. Ele é um moleque apaixonado, ele é um adolescente rebelde, ele se arrepende de suas más decisões, e se apavora com o modo como as coisas mudam a seu redor sempre parecendo crível, sempre honesto, sempre convincente. Quando enverga a fantasia de super-herói (Aliás, parabéns ao departamento de figurino do filme, o uniforme, em movimento, é excelente. Tem uma mobilidade que não era visível nas fotos do filme e com a luz correta funciona à perfeição) ele se transforma, soltando seu lado mais sarcástico sob o anonimato que a máscara oferece e o poder que o uniforme evoca, sem contar que é a efígie cuspida e escarrada do Peter Parker desenhado por Steve Ditko.
Não, O Espetacular Homem-Aranha não é um filme perfeito. Entrando na inevitável comparação com o longa de 2002, provavelmente, enquanto filme, O Espetacular Homem-Aranha é inferior a Homem-Aranha, inclusive porque carece do impacto do filme de Sam Raimi, afinal, Mark Webb reconta uma história que mal completou dez anos nas telonas. Porém, na caracterização dos personagens, especialmente do protagonista, a versão 2012 do herói dá uma surra de relho no filme estrelado por Tobey Maguire.
E eu tenho certeza de que, com o desenvolvimento da história no inevitável O Espetacular Homem-Aranha 2, esse filme vai ganhar um espaço no coração da audiência, talvez, tão grande quanto o espaço que têm os filmes de Sam Raimi.
"-Não faça promessas que não pode cumprir, senhor Parker.
-Mas são o melhor tipo..."
quinta-feira, 5 de julho de 2012
Resenha Filme: Homem-Aranha 3
A verdade é que a expectativa de todo mundo estava nas alturas... Depois do excelente filmes de estréia em 2002 e da sequência espetacular em 2004, parecia óbvio pra todo mundo que o terceiro filme da série Homem-Aranha, novamente sob a batuta de Sam Raimi, iria arrasar o mundo do cinema em quadrinhos naquele ano de 2007.
Desde a primeira foto, mostrando um Homem-Aranha abatido vestindo uma versão negra do seu traje, os fãs do cabeça de teia pelo mundo afora só falavam da possibilidade de ver o Venom no filme (O que só seria confirmado bem depois do começo da produção do longa), antes disso, porém, muita coisa aconteceu.
Thomas Haden-Church, que havia estado muito bem em Sideways - Entre Umas e Outras, fora contratado para viver o Homem-Areia, um dos mais clássicos vilões da galeria do cabeça de teia, a primeira foto de Church usando a indefectível camisa listrada de verde e preto com a calça marrom era de levar lágrimas aos olhos dos fãs hardcore.
Outros bons nomes se juntaram ao elenco, James Cromwell foi escalado para viver o do capitão George Stacy, e a linda Bryce Dallas Howard foi a escolhida para estar sob a tiara de Gwen Stacy, talvez o grande amor da vida de Peter Parker nos quadrinhos, e, finalmente, Topher Grace, o Eric Foreman de That's 70s Show ganhou o papel de Eddie Brock, que nos quadrinhos, coberto de gosma preta, transforma-se no Venom, vilão favorito dos fãs sub-15 do herói aracnídeo.
Além desses, todo o elenco principal retornava, lá estava Tobey Maguire (Meio gorducho...), Kirsten Dunst, mais bonita do que estivera nos dois primeiros filmes, James Franco, novamente na pele de Harry Osborn, além de Rosemary Harris, J. K. Simmons, Elizabeth Banks e Bill Nunn (Respectivamente: Tia May, J. Jonah Jameson, Betty Brant e Joe Robertson).
Toda a equipe de criação dos primeiros longas de volta, à exceção de John Dykstra, o mago responsável pelo design dos efeitos visuais dos dois primeiros longas, e Danny Elfman, compositor da trilha, substituídos respectivamente por Scott Stokdyk e Christopher Young, e lá estava um filme que tinha tudo pra dar certo.
Mesmo que as terceiras partes das séries de Superman, Batman, Blade e X-Men tivessem sido muito ruins, parecia que, se havia um filme capaz de quebrar essa escrita, era Homem-Aranha.
Mas não foi o que aconteceu...
Homem-Aranha 3 mostrava Peter Parker finalmente em paz com sua dupla identidade. Se nos filmes anteriores ser Homem-Aranha era um fardo com qual o jovem fotógrafo tinha de lidar, nesse terceiro ele finalmente abraçara com gosto seu alter ego e via sua vida entrar nos eixos. Bem na faculdade, namorando a mulher dos seus sonhos, e finalmente vendo o Homem-Aranha ser aceito como um herói pela mídia.
Entretanto, na vida do Peter Parker de Sam Raimi nada funciona por muito tempo. Ao mesmo tempo em que decide pedir Mary Jane em casamento Peter é atacado por um vingativo Harry Osborn, turbinado pelo soro do Duende Verde, descobre que o verdadeiro assassino de seu tio Ben, Flint Marko, ainda pode estar à solta, que o fotógrafo Eddie Brock pode ficar com seu emprego no Clarim e, não bastasse tudo isso, ainda se torna alvo de um simbionte alienígena que vê nele um parceiro perfeito.
Conforme vê sua vida degringolar em várias frentes, Peter vai sendo dominado pelos seus instintos mais obscuros, tornando-se presa fácil para o simbionte.
Enquanto luta contra Marko, transformado no Homem-Areia após um acidente, e lidar com a trama engendrada por Harry para destruir sua vida pessoal, o herói ainda precisa enfrentar seu próprio lado negro, o que pode colocá-lo em rota de colisão com mais um mortífero antagonista.
Homem-Aranha 3 era um filme repleto de promessas e condições de cumpri-las, entretanto, aquele que seria o último longa do herói dirigido por Sam Raimi acabou não vingando.
Embora tivesse boas sequências de ação, e uma ou outra sacada interessante, Homem-Aranha 3 acabava se mostrando como um produto visivelmente conflituoso. De um lado via-se as tentativas de Raimi de manter o foco intimista na história de amor de Peter e Mary Jane prestando homenagens aos gibis que ele crescera lendo, e de outro a mão da Sony e dos produtores empurrando Venom, popularíssimo entre os leitores neófitos, goela abaixo do diretor que já tornara pública a sua aversão ao personagem.
Como resultado disso o longa tinha três vilões mas não tinha tempo de desenvolvê-los a contento mesmo que os conflitos que transformaram Harry em um sucessor de Norman já fossem conhecidos.
O surgimento do simbionte que dava origem ao Venom era rápido e insípido, o que de certo modo fazia justiça ao personagem do gibi, que sempre foi raso como um pires e galgado apenas no visual de "Homem-Aranha do Mal", mas acabava sendo apenas um acessório sem graça no cinema. Sua aparição como o vilão, após se unir a Eddie Brock só não era mais despropositada do que o fato de sua influência transformar Peter em um emo violento e dançarino.
Melhor sorte teve Flint Marko, o Homem-Areia de Haden Church, que até teve um background interessante, embora excessivamente melodramático (Mantendo a tradição da trilogia de Sam Raimi de ter vilões que eram vítimas em todos os filmes).
O excesso de vilões e subtramas paralelas tornava Homem-Aranha 3 um filme apressado e abrupto, ainda colocava personagens caríssimos aos fãs como Gwen e o capitão Stacy em papéis que, pra serem coadjuvantes, precisariam ser aumentados.
Pra piorar, a música do filme sentiu falta de Danny Elfman. A partitura de Christopher Young não tinha nenhuma música memorável, de modo que várias sequências de ação eram embaladas pelo main theme do filme original num arranjo mais rapidinho com a maior cara de trilha sonora de filme de TV.
Melhor sorte tiveram os efeitos visuais, que funcionaram a maior parte do tempo, embora na grande batalha final houvessem algumas texturas que ficavam devendo às do filme anterior, e muitos dos efeitos dos poderes do Homem-Areia parecessem reciclagens de A Múmia.
Mas talvez o grande golpe de misericórdia do terceiro longa fosse a retcon à morte do tio Ben no filme original. Todo fã de quadrinhos (e de cinema depois do longa de 2002) sabia que o assassino de tio Ben foi um ladrão que Peter deixou escapar por ser irresponsável, certo?
É... Era assim até o terceiro filme colocar a morte, ainda que acidental, de Ben Parker na conta de Flint Marko.
Mesmo tendo feito uma bela carreira no cinemas, faturando mais de oitocentos e noventa milhões de dólares só em bilheterias, Homem-Aranha 3 acabou azedando a relação de Raimi com a Sony, tanto que antes do reboot que estréia oficialmente amanhã, no Brasil, o diretor estava já em estágio de pré-produção de um Homem-Aranha 4, que teria como vilão o Abutre a ser vivido por John Malkovich até que as divergências criativas com a Sony acabaram de vez com a parceria.
Uma pena. Homem-Aranha 3 não convenceu ninguém, e deu uma derrubada bonita na qualidade da série aracnídea no cinema, ainda assim, a despeito dos defeitos do terceiro longa, Homem-Aranha e Homem-Aranha 2 têm um lugar muito especial no coração de todos os fãs do personagem.
Hoje vou conferir o reboot da franquia, e amanhã conto por aqui se essa nova encarnação do cabeça de teia merece a mesma deferência por parte dos fãs.
"-Buscando perdão? Tente uma religião."
quarta-feira, 4 de julho de 2012
Rapidinhas do Capita
Você sabe que está ouvindo/lendo/assistindo um veículo da Rede Baita Sol quando o Zé Roberto, aos trinta e oito anos, recebendo estimados quinhentos mil reais por mês é "uma ótima contratação", "reforço de peso", "craque repatriado" e etc, e Diego Forlán, 33 anos, melhor jogador da Copa do Mundo de 2010, recebendo salários estimados em quatrocentos mil por mês é "aposta de risco", "investimento pesado em jogador velho", "golpe de marketing" e etc...
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-O que tu quer fazer? - Ela perguntou naquela mistura de lânguida e dengosa com meio moleca e descolada que ele aprendera a amar. Ele, se ajeitando no sofá respondeu em forma de pergunta:
-Contigo?
Ela sorriu e o beijou, enquanto confirmava:
-Sim, comigo.
-A gente pode ir ao cinema. Ou ver um filme em casa, mesmo. Ou sair pra jantar, ou chamar uma pizza. Ou só ficar sentado aqui conversando, ou ouvindo uma música que tenha um milhão de significados pra nós dois e mais ninguém. A gente pode jogar video-game, uma vez pra cada um. Mudar pra um apartamento maior. Ou mudar pra uma casa com pátio por causa do cachorro. A gente pode ter um filho. Ou uma filha. Discutir sobre qual vai ser o nome. A gente pode brigar e depois se reconciliar. A gente pode se beijar na chuva, numa reprodução do clichê mais recorrente do cinema. A gente pode organizar uma festa à fantasia e eu vou de Capitão América e tu de Mulher-Aranha. A gente pode ser feliz. A gente pode envelhecer juntos. A gente pode rir dos desencontros, no futuro. A gente pode fazer qualquer coisa... Contigo eu sei que eu posso fazer qualquer coisa.
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Quem mais está roendo as unhas pra assistir a'O Espetacular Homem-Aranha? Estou tentando manter as expectativas baixas, especialmente depois de ter feito maratona dos três filmes anteriores, que são espetaculares, mas tá difícil. Amanhã eu tiro essa febre...
terça-feira, 3 de julho de 2012
Street Smart
A Suzana, dezesseis anos, bonita, descolada, e avoada que não podia ser mais. Não que fosse burra, não era, mas certamente não era "book smart", o tipo de pessoa estudiosa que aprende ouvindo e lendo, era "Street smart" total, daquelas pessoas espertas que vão muito mal na escola, o que lhe causava sérios problemas em casa, mas tinha traquejo pra se livrar dos maiores perrengues. Andava com as companhias erradas, e diziam seus pais, tinha mais sorte que juízo.
Tinha passado mal duas vezes naquela semana, e ouviu de seu pai, o desembargador Fernandes, que era pra ir ao médico dar jeito nisso pra poder se dedicar aos estudos, que ele, com a idade dela, já trabalhava, estudava e ajudava o pai com os afazeres da oficina mecânica, e blá, blá, blá, tudo isso sob o olhar acusador de sua mãe, dona Sofia, que com dezesseis anos já era normalista e noiva do desembargador.
Aí foi a Suzana ao médico. Marcou hora pra de manhã, espertamente pensando em ter uma justificativa pra matar aula naquele dia.
Passou a manhã fora, o dia todo fora, dona Sofia já agoniada, ligou pro celular da filha para repreendê-la, mas não obteve resposta. Ficou fula, mas não era incomum ter uma ligação ou duas eventualmente ignoradas por aquela menina desmiolada.
Ligou novamente meia hora mais tarde, outra vez sem sucesso. E uma terceira ligação uma hora depois, novamente infrutífera. Aí, dona Sofia já estava nervosa, pensando no que podia ter acontecido à Suzana.
Quando o desembargador chegou em casa precisamente às dezoito e trinta e seis, mesmo horário em que chegava todos os dias, ao invés de encontrar a esposa o esperando com o cachimbo e os chinelos, a encontrou desesperada dentro de casa, exclamando à sua mera visão:
-Astolfo, a Suzana sumiu!
Em que se pese que a Suzana não era uma menina caseira, ela também não era do tipo que passa o dia todo fora de casa. Sempre aparecia em casa de duas a três vezes durante o dia pra mudar de roupa, tomar banho, recarregar o celular ou pedir dinheiro, logo, aquela ausência de mais de dez horas, incomunicável, não era natural. Sabendo disso, o desembargador Fernandes já começara a se movimentar para ligar para os amigos da Suzana em busca de notícias quando a porta da frente fez barulho, e a Suzana, muito cabisbaixa, entrou em casa, e, antes que o desembargador e a dona Sofia pudessem repreendê-la, deu o mais profundo suspiro de todos os tempos.
-Oi, gente...
O desembargador ainda pensou em começar um discurso, mas vendo a expressão preocupada de dona Sofia, entregou-lhe a palavra. E ela usou:
-Onde tu andava, minha filhinha? A gente tava morrendo de preocupação, tu sumiu, não atendia o celular...
-Ah, é... Desculpa... Tava no silencioso...
-Minha filha - Começou o desembargador -O que houve?
A Suzana sentou, joelhos cruzados, e, olhando pros próprios pés, disse:
-Pois é... Eu fui ao médico, sabe... E...
-E o que, minha filha? - Perguntou a dona Suzana, aflita.
-Eu tô com câncer terminal, mãe. -Bombardeou a Suzana. -O médico me deu mais seis, sete meses de vida. Um ano no máximo. - Completou.
A dona Sofia e o desembargador Fernandes correram até a filha abraçando-a com carinho, os dois choravam.
-Minha filha - Disse a dona Sofia -Desculpe a nossa intolerância. Nós te amamos tanto...
O desembargador, abraçando a filha e a esposa, também falava:
-Conte com o nosso amor, minha filha, com o nosso carinho e proteção. Vamos fazer tudo pra te ver bem. Tu nunca mais vai ouvir uma palavra de crítica nessa casa, eu te prometo, e tu sabes que quando eu prometo, tu podes levar a sério.
E a dona Sofia completou olhando pro teto, mas falando com o céu:
-Eu daria qualquer coisa pra te ver saudável, minha filhinha, qualquer coisa!
A Suzana, então, desvencilhou-se do abraço, e acariciando os ombros dos dois disse:
-Então eu tenho uma baita notícia pra vocês: Eu não tô com câncer, não, tô grávida. Só não tenho certeza quem é o pai, mas ou é o Buiú, ou é o Zôio, ou o Cadão, enfim, se precisarem de mim tô lá no quarto.
E subiu lépida as escadas, deixando na sala a dona Sofia, em um misto de alívio e baque, e o desembargador contando até mil enquanto esperava os punhos pararem de tremer de fúria pra ir à cozinha pegar um antiácido e se perguntava se queimaria no fogo eterno do inferno se desejasse que a filha desenvolvesse mesmo um câncer, pequenininho, do tipo tratável, no estômago.
segunda-feira, 2 de julho de 2012
Prepotência Romântica
Ela estava sentada atravessada no sofá. Com o corpo estendido paralelo ao assento e as costas apoiadas no descanso de braço do móvel. Olhava pra TV assistindo uma dessas séries de que só mulheres gostam, ele não sabia qual era. Ele estava sentado direito no sofá, com os pés dela em seu colo, óculos postos lendo um gibi qualquer enquanto acariciava o pé dela com a ponta de três dedos. De repente ele parou, ergueu os óculos colocando-os sobre a testa e desviou os olhos da revista, mirando ela, que, distraída com a televisão demorou pra ver. Quando viu olhou pra ele, e sorriu o sorriso pelo qual ele se apaixonara.
-Que foi? - Ela inquiriu.
-Nada. - Ele respondeu sorrindo.
Ela olhou de volta pra TV e continuou assistindo seu programa, mas ele não desviava os olhos dela. Ela virou de novo, agora rindo:
-Quié isso, menino? Tu tá me deixando agoniada.
Ele sorriu, e de maneira meio bruta, apanhou-a pelo tornozelo e deu-lhe um beijo estalado no peito do pé. Ela ainda olhava pra ele, e ele, ficando sério de repente, disse:
-Tu não faz ideia, não é?
-Do quê? - Ela quis saber.
-Do quanto eu sou louco por ti. De que eu, que sempre acreditei em amores construídos com muito trabalho e dedicação, me apaixonei por ti à primeira vista. De que, na primeira vez que eu te beijei, eu sabia que era só o que eu ia querer dali pra frente. Do medo que eu, que não tenho medo de nada, sinto de te perder. Do quanto eu me sinto ridículo por acreditar... Acreditar, não. Por saber que tu é minha alma gêmea, mesmo não acreditando em alma gêmea. Do quanto eu quero te aquecer nos dias frios. Do quanto eu quero te refrescar nos dias quentes. E do quanto eu quero te fazer feliz todo dia, pra recompensar o quanto tu me faz feliz a cada minuto, e que não vou te deixar em paz pelo resto da minha vida.
Ela se esgueirou agilmente até estar ajoelhada com o corpo colado no dele, acariciou seu rosto mal barbeado com a mão delicada, e o beijou. Então sorriu de novo, e sem nenhuma modéstia disse:
-Claro que eu tenho ideia, tonto. Na verdade eu sempre tive foi certeza.
Os dois riram e desligaram a TV enquanto voltavam a se beijar, e ele tinha certeza de que uma demonstração tão veemente de prepotência romântica só podia significar que ele encontrara o amor da sua vida.
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