Bem vindos a casa do Capita. O pequeno lar virtual de um nerd à moda antiga onde se fala de cinema, de quadrinhos, literatura, videogames, RPG (E não me refiro a reeducação postural geral.) e até de coisas que não importam nem um pouco. Aproveite o passeio.
Pesquisar este blog
sexta-feira, 29 de agosto de 2014
Resenha Cinema: Magia ao Luar
Jurava que ontem era dia de assistir Scarlett Johansson chutar bundas em Lucy, mais recente extravagância cinematográfica de Luc Besson, mas, ao chegar ao cinema, me deparei com o pôster de Magia ao Luar, e, ainda que não soubesse nada a respeito do filme, o elenco interessante, com Colin Firth e Emma Stone, ergueram minhas orelhas, especialmente porque, logo ali embaixo, estava o nome de Woody Allen.
Embora o diretor norte-americano não agrade todo mundo, nos últimos anos tenho assistido apenas ótimos filmes dele, e ainda me remoía por não ter ido ao cinema ver Blue Jasmine, de modo que a comédia romântica que o pôster sugeria, podia ser uma boa forma de me redimir e passar 97 minutos agradáveis.
Dito e feito.
No longa conhecemos Stanley Crawford (Firth), um ilusionista britânico de grande sucesso que viaja o mundo num espetáculo onde encarna Wei Ling Soo, um misterioso mago do extremo oriente (Com direito a maquiagem clichê completa com bigode longo, touca simulando careca e olhos puxados).
A despeito de ganhar a vida com mágica, Stanley é um homem da razão. Um incréu misantropo niilista e cínico para quem tudo deve ser provado por A mais B.
Logo, ele é a escolha ideal para seu amigo Howard (Simon McBurney), também um ilusionista e amigo de infância, que está tentando ajudar um casal próximo com um problema. O psicanalista George (Jeremy Shamos) teme que a mãe e o irmão de sua esposa, Caroline (Erica Leershen), estejam sendo vítimas de um golpe.
Ambos acolheram uma jovem que afirma possuir poderes paranormais, após sucessivas demonstrações dos dons da jovem, enquanto a matriarca Grace (Jacki Weaver) planeja usar a fortuna da família para financiar um centro para a jovem ensinar seu dom ao mundo, o filho Bryce (Hamish Linklater) deseja se casar com ela.
George e Caroline chamaram Howard para descobrir o que havia por trás dos "poderes" da jovem, Howard, porém, confessou ser incapaz de encontrar falhas nas demonstrações dela, mas, Stanley, um ilusionista de grande calibre, deveria ser capaz de fazê-lo.
Intrigado e ansioso por expôr a charlatã, Stanley aceita a proposta do amigo, e parte para a Riviera Francesa.
Lá, ele conhece a bela Sophie (Emma Stone) e sua mãe (Marcia Gay-Harden), e se põe a preparar o ardil para desmascará-las. Mas enquanto é confrontado com os dons da jovem sem ser capaz de explicá-los, Stanley se vê diante de um dilema que considerava impensável:
E se ela for, de fato, o artigo genuíno?
É muito bacana.
Muito mais próximo do clima agridoce de Tudo Pode dar Certo do que do cinismo pleno da tragédia de Blue Jasmine, Magia ao Luar traz todos os truques do baralho de Allen em uma experiência das mais agradáveis.
Com a trilha sonora cheia de jazz, a luz morna na fotografia e boas performances do elenco, Allen se dá bem com seu alter-ego, um Colin Firth exalando cinismo e uma boa dose de auto-indulgência e neurose controlada, bem superior a Jason Biggs e Owen Wilson (Embora meu favorito ainda seja Larry David), mas especialmente na mocinha.
Longe do talento quase aflitivo de Cate Blanchett ou das curvas deliciosas de Scarlett Johansson, Emma Stone tem um espetacular tempo de comédia, e uma doçura inerente que a tornam perfeita para o papel de Sophie.
Com seus enormes olhos verdes encarando o infinito durante seus acessos de vibração mediúnica, ela faz rir de imediato, e sorrindo ao comer pêssegos à luz do sol poente na Riviera Francesa, faz suspirar.
Esse par romântico absolutamente desparelho (Firth podia ser pai de Emma Stone) funciona que é uma beleza no libelo de um Woody Allen que está claramente envelhecendo, e embora veja na beleza juvenil de Emma Stone uma fagulha de esperança na magia, tem na carranca pretensiosa e esnobe de Firth os pés bem firmes no chão.
É bom envelhecer assim.
"-Você nasce, não comete nenhum crime, e então é sentenciado à morte."
quarta-feira, 27 de agosto de 2014
Médias
Era a segunda metade da hora de almoço. Andavam juntos, protegendo-se da chuva. Ele segurava uma sacola de compras no pulso enquanto sacava algo lá de dentro. Era uma caixinha de papelão azul. Ele abria a embalagem com dificuldade, ela segurava o guarda-chuva enquanto andavam contra o vento. Uma lufada mais forte fez com que ela lutasse pra manter o guarda-chuva sobre ambos, com o movimento, ela baixou a proteção e arranhou o topo do crânio dele, arrancando do conjunto alguns fios do seu coque samurai improvisado.
-Âe... - Ele exclamou... -Tá querendo me arrancar o escalpo, criatura?
-Pensa positivo - Ela disse passando a mão na cabeça dele e colocando os fios mais ou menos de volta no lugar. -Se eu fosse baixinha estaria te furando o olho...
-Se tu fosse baixinha eu me casava contigo. - Ele respondeu.
Ela olhou pra ele fazendo cara de confusa. Ele suspirou:
-Dos males, escolhe-se sempre o menor.
-Eu estava com saudades de ti, mesmo tu sendo um cretino de vez em sempre... - Ela disse, dando-lhe um abraço de lado, e deitando a cabeça no ombro dele.
Ele riu, retribuindo o amplexo e a trazendo pra junto de si.
-Também estava, alemoa. - Estalou um beijo na cabeça dela. O cabelo cheirando a maracujá. Se soltaram e ele e estendeu a caixinha de bombons pra ela, que apanhou um e olhou brevemente:
-Eu mordo isso ou como inteiro...?
-Eu sugiro que tu coma inteiro, isso é recheado com sorvete, já está fora da geladeira a algum tempo, o sorvete derreteu... Se tu morder isso vai escorrer pelo teu queixo e vai ser um lance quase erótico...
Ela deu um soco no braço dele e caiu na risada enquanto jogava o bombom inteiro na boca. Fez um ruído de satisfação:
-Hmmm... Que bom isso...
Ele comeu um e concordou:
-Bom, mesmo... E isso que esse é um genérico da Sorvelândia. A Kibon faz uma caixinha de mini eski-bon que é de comer de joelho...
-Deve ser bom...
Entraram no prédio onde ele trabalhava e sentaram na escada.
-E então, loura - Ele disse, largando as sacolas no chão, entre as pernas. -Por que esse convite súbito pra almoçar após esse longo período de trevas? Tem alguma grave revelação pra me fazer? Encontrou o amor da tua vida? Tá grávida? Vai voltar pra Argentina ou pro teu planeta natal?
Ela ficou séria olhando pra ele. Chegou a tomar fôlego pra dizer algo, mas deteve-se e sorriu.
Começou de novo, calmamente:
-Não... Nada disso. E não seriam só essas coisas que me fariam te ligar... A gente é amigo. As coisas andaram estranhas entre nós... Eu queria normalizar. Isso é errado?
-Não. - Ele respondeu sorrindo. -Não mesmo. Eu gosto de te ter por perto...
Ele estendeu a caixinha e ela pegou outro bombom.
Ele perguntou:
-E aí? Tem ido ao cinema ou só assistido espetáculos de dança folclórica javanesa?
-Deus pai, foi só uma vez, e era polonesa... Mas não... Não tenho ido ao cinema, mas tenho alugado um monte de filmes, inclusive, obrigada, tenho seguido algumas indicações tuas. Vi o Capitão-América 2, essa semana. Bem bom, mesmo...
-Maneiro, né? Não gostei da mocinha nova, mas o filme é maneiro...
-Quê? Tu não gostou da Scarlett Johansson, a tua adorada musa com corpo de "mulher de verdade"?
Ele riu.
-Claro que gostei, mas a Scarlett não é minha musa, e a Viúva Negra não é mocinha de filme nenhum, ela provavelmente é o personagem feminino mais forte do cinema nerd desde a princesa Leia. A mocinha nova é aquela guria que faz Revenge... Alguma coisa Van Camp, eu acho...
-Não me lembro dessa... - Ela reconheceu, pegando outro bombom da caixa.
-Meu ponto exatamente. Tu bota aquela guria sem graça no filme perto do potentado que é a Scarlett Johansson e ela desaparece. Especialmente no Capitão América, que teve a mocinha mais bonita dos filmes de super herói recente no primeiro...
-Quem era essa mocinha nova...?
-A enfermeira que morava no mesmo prédio dele, mas era da SHIELD...
-Ah, tá... Tá, já sei. A guria do Everwood...
-Isso.
-Sem graça, mesmo. Mas peraí... Quem era a que tu acha a mais bonita delas todas?
-A mocinha do primeiro Capitão América. A Peggy Carter.
-Bah... Dessa eu não me lembro, mesmo... - Ela reconheceu num suspiro.
-Ela aparece no segundo, mas tá maquiada pra parecer velha... - Ele tentou.
-Não lembro, mesmo...
-Ela fazia aquela série, Os Pilares da Terra. Era a Aliena... - Ele tentou novamente, usando uma referência que ela poderia entender já que era fã da mini-série em questão.
Ela ergueu as sobrancelhas como quem lembra:
-Ah, tá... Tá, já sei quem é... - Parou brevemente e olhou pra ele com o cenho franzido:
-Sério que tu acha ela a mais bonita?
-Sim. - Ele disse, cobrindo a boca cheia e mastigando outro bombom.
Ela se inclinou pra frente:
-Ai... Eu não sei se ela é bonita...
-Como não é bonita? A mulher é linda... - Ele protestou, se escorando pra trás.
-Peraí, peraí... A gente tá falando da mesma mulher? Aquela que é militar e tal? - Ela quis saber, fechando os olhos como se tentasse visualizar a pessoa em questão.
-Sim. - Ele disse. -Cabelos e olhos castanhos, bocão, maxilar mais quadrado... Alta, peituda...
Ela riu.
-Quando tu coloca dessa forma eu entendo porque tu acha ela a mais bonita...
-Nem vem - Ele protestou. -Tu, mais do que ninguém sabe que eu não sou nenhum terneiro que se derrete por peitos. Sempre fui muito mais um homem de pernas e de bundas femininas...
-Isso fere - Ela disse, fazendo cara de triste e cobrindo os próprios seios com as mãos.
Os dois riram. Ele estendeu mais um bombom pra ela, que pegou. Antes de levá-lo à boca disse em desafio:
-Mais bonita que a Natalie Portman?
Ele pensou brevemente. Era um fã declarado da Natalie Portman.
-Na verdade... Tão bonita quanto, mas mais sexy. A Natalie Portman é meio chatinha fazendo Thor. Devo confessar que, em Thor, acho a Jaimie Alexander, que faz a Sif, muito mais bonita, mas sou tarado, mesmo, é pela Kat Dennings...
Ela ergueu as mãos:
-Meu Deus... Eu não consigo guardar o nome desse povo todo...
Ele comeu outro bombom:
-Sif, morena, olho castanho claro, usa armadura, é amiga do Thor em Asgard... Fazia Kyle XY...- Tentou.
-Ah, tá. - Ela interrompeu. -Ah, aquela guria é linda...
-Sim. - Ele concordou. -Mas a Sif não é uma mocinha. É uma guerreira durona que sabe se cuidar sozinha. Assim como a Darcy Lewis, da Kat Dennings, não é mocinha, é alívio cômico...
-Ah, tá... A tetuda aquela, morena de olho azul... Já sei quem é, também... - Ela disse com pouco-caso. -Mas... E a Liv Tyler?
-Francamente, acho bonita, mas superestimada... Não vejo essa graça toda nela. - Ele disse, olhando pra rua.
Ela matutou mais um pouco. Suspirou.
-E... A... Hum... Deixa ver... E a... Não... A Gwineth Paltrow é sem graça...
-Total... - Ele concordou.
-Ah, já sei, a Amy Adams! - Ela disse, iluminando-se.
-Acho muito bonita, mas ainda acho a Hayley Atwell mais interessante no conjunto.
-E a mulher-Gato? - Ela perguntou.
-Michelle Pfeiffer, Anne Hathaway, Halle Berry, Julie Newmar ou Lee Meriwether? - Ele quis saber.
-Hã? Que? Quem? - Ela perguntou confusa, pegando outro bombom.
Ele riu.
-Citei todas as Mulher-Gato de quem eu lembrei... Ainda tá faltando uma... Teve uma outra Mulher-Gato negra antes da Halle Berry, no seriado do Batman do Adam West, mas eu não me lembro do nome dela... Hearta Kitty... Alguma coisa assim... - Ele franziu a testa tentando lembrar.
-Tá, mas eu tava falando da última... Daquele filme com o cara que quebra o Batman... - Ela restringiu.
-Bane. - Ele acudiu.
-Isso... Lindão... - Ela suspirou.
Ele olhou pra ela fazendo uma expressão entre o surpreso e o enojado.
-Quê? Ele é bonito. - Ela se defendeu. -Tu já viu um filme com ele e a Reese Whiterspoon, que também tem outro cara...
-O capitão Kirk. Eu sei que filme é... Não lembro o nome e nunca vi todo...
-Bom, não importa, ele é bonito. - Ela sentenciou.
-Se tu diz...
Ela continuou:
-E aí? A Mulher-Gato?
-A Anne Hathaway é muito bonita, mas não tanto quanto a Hayley Atwell, nem é, exatamente, uma mocinha. A Mulher-Gato é meio Viúva-Negra e Sif, pra mocinha não serve. De qualquer forma, há pelo menos três Mulher-Gato mais bonitas que a Anne Hathaway. A Michelle Pfeiffer era linda quando fez o papel, e a Julie Newmar e a Lee Meriwether até hoje habitam meus sonhos.
Ela riu.
-Tá... Então é a Hayley Atwell, mesmo...
-É... Pode não ser a mais bonita, pode não ser a mais atraente, pode não ser a melhor atriz, mas tem a melhor média. - Ele explicou.
-Entendi. - Ela disse.
Ele estendeu a caixa de bombons pra ela:
-Ó... É o último.
Ela pegou:
-Obrigada, cavalheiro, você é muito gentil. - Ela disse, fazendo uma voz engraçada e uma pronúncia de candidato a vereador lendo teleprompter.
Ele olhou o relógio, e disse:
-Uma hora... Tenho que retomar meu posto.
Levantou-se e a ajudou a fazer o mesmo. Deu-lhe um abraço apertado e um beijo estalado no rosto, que ela retribuiu dobrado, um em cada bochecha.
-Tchau, alemoa. De novo outro dia?
-Semana que vem... Segunda, pode ser? - Ela perguntou.
-Combinado. - Ele concordou.
Quando começou a subir a escada percebeu que ela estava parada junto à porta, olhando pra ele.
-Que foi...? - Perguntou, desconfiado.
-Esse lance da guria d'Os Pilares da Terra... Da média... - Ela começou.
-Hã? O que tem? - Ele quis saber.
-Tu faz a mesma coisa pra decidir quem vai ficar contigo?
Ele balançou a cabeça brevemente...
-Não... Não sei... Não conscientemente, eu diria. Mas talvez... É natural, não é? Pesar prós e contras... Quem é mais bonita... Quem é mais inteligente... Mais legal, te faz mais feliz... Não é como fazer uma listinha com duas colunas coloridas igual o Ross, mas... Acho que na hora de escolher a gente toma a decisão baseado nos prós e contras, cria numa média e aí decide baseado nisso... Não é?
Ela olhou pra ele, mas desviou os olhos um segundo.
-Acho que seria a coisa mais racional pra fazer... - Concordou. -Mas a gente nem sempre é racional, não é?
-Não. - Ele assentiu.
-Se eu te perguntasse qual a minha média, o que tu diria?
Ele sorriu:
-Tu é uma amiga nota dez, alemoa.
Ela riu forçado.
-E namorada?
Ele, ainda sorrindo, disse:
-Aí a tua média cai um pouco.
Ela subiu as escadas rapidamente com as pernas compridas, e o abraçou novamente.
Quando começou a descer as escadas ele perguntou:
-E aí? Ainda estamos de pé pra segunda?
-Sim. - Ela disse sem virar.
E completou:
-Quando tu for escrever sobre isso, eu não quero ser o Everaldo numa daquelas crônicas do bar do Paulo Roberto.
Sem Vencedores
Viram essa?
Segundo o site Hitfix, a Warner estabeleceu uma regra mandatória para sua nova produção cinematográfica que deve culminar com a criação de um universo cinemático à imagem e semelhança do criado pela Marvel em seus super-filmes:
Sem piadas.
Isso mesmo. De acordo com o repórter Drew McWeeny, embora ninguém tenha assumido tal normativa de maneira pública, ele já ouviu pelo menos cinco vezes a resolução da Warner com relação aos filmes de super-heróis da DC.
Sem Piadas é o mantra da hora com relação ao universo cinematográfico que deve culminar com o filme da Liga da Justiça.
Considerando o que se viu em O Homem de Aço, um filme sem nenhum único momento de leveza, é difícil não acreditar, especialmente após o violento fiasco que foi a tentativa da DC de fazer um filme de super-herói mais leve e divertido com o Lanterna Verde estrelado por Ryan Reynolds.
A questão é que a pegada grave demais de O Homem de Aço não chegou a ser unanimidade. Eu sou uma das pessoas que gostou do filme, já disse, inclusive, que achei O Homem de Aço o segundo melhor filme de Superman já feito perdendo apenas para o Superman - O Filme de Richard Donner. Mas as bilheterias não mentem. Um filme do maior herói de todos os tempos, com uma produção caprichada, cheia de cobras, um bom elenco, e em 3-D, fazendo menos de 700 milhões de dólares em bilheterias, é um sinal bastante óbvio de que nem todo mundo curtiu a ideia.
Se a resolução da DC/Warner for pensando em abraçar o tom sombrio e realista dos Batman de Christopher Nolan, é um equívoco. Os filmes das trilogia Cavaleiro das Trevas eram soturnos e dramáticos mas não abriam mão das piadas e dos alívios cômicos. Não bastassem as tiradas sarcásticas de Alfred e de Gordon, o próprio Bruce Wayne era dono da melhor piada da trilogia (Quando prestes a revelar sua identidade para impedir a onda de assassinatos do Coringa, é confrontado com a pergunta de Alfred "Suponho que eu também serei preso como cúmplice?".), provando que se pode fazer um filme que se leve a sério sem torná-lo um dramalhão mexicano ou uma tragédia grega.
Se a decisão de deixar as piadas de fora é apenas uma contrapartida ao cinema dos estúdios Marvel, composto praticamente de comédias de ação, a DC dá um tiro no próprio pé, pois a Marvel já demonstrou em Capitão América - O Soldado Invernal, que é capaz de fazer blockbusters de qualidade sem a muleta da piada a cada dois minutos, que, diga-se de passagem, foi assumida de vez em Guardiões da Galáxia e funcionou que foi uma beleza, novamente.
Enquanto se preocupa demais com o que a Marvel faz ou deixa de fazer, a DC se apequena num duelo que não precisa ter perdedores.
A Marvel começou a edificar seu universo cinemático dividindo espaço com os espetaculares filmes do Batman do Nolan sem que ninguém precisasse abrir mão de nada no processo.
Se a DC/Warner apenas se preocupar em fazer os melhores filmes possíveis com seus personagens, vai faturar uma grana federal, e dividir o mercado com a Marvel como fazem nos quadrinhos desde os anos trinta.
Se continuar abrindo mão da alma para ver "quem pisca primeiro" nesse duelo besta com a Marvel, todo mundo perde.
A Marvel, que sem competidores pode se estagnar.
A DC/Warer, que não conseguirá emplacar seus heróis além do Batman nas telonas.
E especialmente o público, que não poderá curtir filmes qualificados com todos os heróis que aprendeu a amar nas páginas dos quadrinhos.
Marcadores:
Cinema,
Ensaio,
Nerd,
Quadrinhos,
super-heróis
sexta-feira, 22 de agosto de 2014
Resenha Cinema: Os Mercenários 3
Ah, a celebração da testosterona... O prazer de dizer ao mundo "Nós não estamos velhos demais pra isso."... A liberdade de fazer filmes sem saber atuar... Todas as maravilhas que apenas o cinema hollywoodiano oitentista oferece, de maneira rediviva, na cinessérie Os Mercenários.
O festival de músculos e rugas iniciado por Sylvester Stallone em 2010 segue após o episódio de 2012 trocando algumas caras amassadas por outras e adicionando um pouco de sangue novo à mistura.
No arremedo de trama dirigido por Patrick Hughes, os dispensáveis de Barney Ross (Stallone), Lee Christmas (Jason Statham), Gunnar Jansen (Dolph Lundgren), Tool Road (Randy Couture) e Hale Caesar (Terry Crewes) partem para uma missão de resgate, arrancando o colega Doc (Wesley Snipes) da prisão onde ele esteve nos últimos oito anos.
Após causar a quantidade tradicional de destruição gratuita, eles partem para Mogadíscio, na Somália, onde foram contratados pela CIA para dar fim a um perigoso traficante de armas chamado Simms.
Ao chegar ao local, Barney e seu grupo descobrem que o tal Simms na verdade é Conrad Stonebanks (Mel Gibson), um dos fundadores do grupo, dado como morto anos antes.
A missão fracassa, um dos membros é gravemente ferido, e Stonebanks escapa.
Temendo pela vida de seus companheiros, Barney dissolve o grupo, mas é coagido pelo agente Drummer (Harrison Ford) a continuar a caçada.
Para isso, ele recorre a Bonaparte (Kelsey Grammer), que o ajuda a montar uma nova equipe de jovens mercenários incluindo o especialista em armas Mars (Victor Ortiz), o hacker Thorn (Glenn Powell), a lutadora Luna (A campeã do UFC Ronda Rousey), e Smilee (Kelan Lutz).
Porém, talvez mesmo a combinação da experiência de Barney com os recursos e a vitalidade de seu novo grupo sejam insuficientes para capturar Stonebanks, um sujeito tão obstinado e perigoso quanto qualquer membro do time original de Ross.
É ruim, mas é bom.
O festival de auto referência (do "get to the choppa de Trench ao "I am the Hague de Ross, passando pelo "evasão fiscal" de Doc ou o fato de Drummer ser um piloto de helicóptero e mencionar que o Church de Willis está "out of the picture", e o background SRRS de Stonebanks...) e não-atuações dos mercenários (reforçado por Snipes, Lutz e Rousey, que têm todo o espectro emocional de um naco de presunto cru) é quebrado pela adição de quatro atores de verdade ao elenco.
Kelsey Grammer, que rouba o espaço que talvez pertencesse a Mickey Rourke com mérito, Harrison Ford, que assume o lugar de Bruce Willis, numa substituição que acrescenta, e, especialmente Antonio Banderas, roubando totalmente a cena com seu mercenário Galgo, o espanhol que não para de falar nunca, se sente mais jovem do que de fato é, e precisa de um serviço porque matar gente é a única coisa que sabe fazer, e é muito bom nisso, além, claro, de Mad Mel Gibson, que interpreta o melhor vilão da franquia até aqui, merecia mais tempo em cena e deveria ter matado mais gente (Todos os jovenzinhos e um ou dois membros originais, talvez?).
É graças a esses quatro, às boas sequências de ação e à assumida comicidade do filme (que ainda tem o retorno de Schwarzenegger como Trench e Jet Li como Yin Yang) que nós podemos perdoar os efeitos especiais com cara de série de TV e o roteiro todo esburacado.
Que venha Os Mercenários 4, mas que sumam com os jovens mercenários e mantenham só os vovôs briguentos. Eles é que têm permissão pra quebrar tudo com zero talento dramático.
"-Quão difícil pode ser matar dez homens?"
quinta-feira, 21 de agosto de 2014
Resenha DVD: O Grande Mestre
Eu sou um admirador confesso de filmes de artes marciais chineses. Sou fã declarado do cinema de Jackie Chan e Jet Li antes de serem descobertos por Hollywood, inclusive tenho, em casa, alguns DVDs de filmes de Hong Kong de ambos, e, volta e meia, pesco nas madrugadas da TV a cabo, filmes antigos de Bruce Lee, e os filmes em que Donnie Yen interpreta o mestre Ip Man, legendário herói das artes marciais chinesas que foi retratado em pelo menos outros quatro filmes antes de Wong Kar Wai dar sua visão da biografia do homem que treinou Bruce Lee.
No longa, Ip Man (Tony Leung) vive pacificamente na província de Foshan, no sul da China. Um respeitado mestre de kung-fu do estilo Wing Chun, Ip Man diz que, se a vida fosse dividida em estações, seus primeiros quarenta anos, teriam sido a primavera.
Tudo muda, porém, quando, durante uma visita do grande mestre Gong Yutian (Qingxiang Wang), Ip Man se oferece para representar o sul em um desafio.
Vencedor, Ip Man precisa lidar com os desafios frequentes de lutadores de todas as partes, bem como lidar com o desejo de vingança da filha de Gong Yutian, Gong Er (Zhang Ziyi), inconformada com a derrota do pai.
Paralelo a tudo isso, começa a segunda guerra sino-japonesa, obrigando Ip Man a viajar a Hong Kong, e lutar pelo sustento de sua família com seu caminho seguindo paralelo ao de Gong Er e sua busca por vingança pela morte do pai.
Devo confessar que estranhei a forma de Kar Wai abordar a vida de Ip Man.
Após os filmes recheados de pancadaria estrelados por Donnie Yen, O Grande Mestre soa lento e reflexivo, e de fato o é.
A figura de Ip Man no longa de Wong Kar Wai, com seu casaco/batina estilo Neo em Matrix Revolutions e seu estiloso chapéu branco é a impassividade em pessoa, e tem na sanguínea Gong Er de Zhang Ziyi seu contraponto perfeito, pois, de fato, O Grande Mestre de Wong Kar Wai é um filme sobre a filosofia das artes marciais, muito mais do que artes marciais em si.
Ainda que tenha uma série de boas sequências de luta (todas coreografadas pelo papa do wire work Yuen Woo Ping), a verdade é que o longa empolga muito mais pela casta sugestão de romance entre Ip Man e Gong Er, pela belíssima fotografia de Philippe Le Sourd e pela reverência pela experiência e pela longevidade em detrimento da força pura e simples que o roteiro de Jingzhi Zou e Haofeng Xu (e do próprio Wong Kar Wai) ilustra em um delicado espetáculo que demanda certo nível de concentração e paciência da audiência em seus 130 minutos.
Não é filme pra qualquer platéia, mas é certamente um belíssimo esforço de realização cinematográfica.
Vale a locação.
"-Eu tenho acompanhado sua performance na grande ópera da vida. Você demonstrou grande senso de momento e habilidade; entretanto, você jamais foi além do papel que interpreta.
-Eu não fazia ideia que que possuía tão ardente espectador."
Comigo na Madrugada
Eu me peguei te querendo do meu lado.
Querendo conversar contigo... Que tu estivesse ali, comigo, naquela madrugada...
Foi algo súbito, no meio da noite. Me imaginei conversando contigo, deitado do teu lado, contigo nua, enrolada nas cobertas. Eu sei, é estranho, tu dormiu nua comigo poucas, pouquíssimas vezes... Mas eu acho bonito quando a mulher dorme nua com o homem. Eu vejo, além, claro, da beleza que é uma mulher, especialmente uma como tu, nua, um lance de confiança... De cumplicidade... Um negócio de ausência de temores e pudores que requer um determinado grau de intimidade que, pra mim, é crachá de amor verdadeiro.
E eu me flagrei pensando nisso... Em ti, nua do meu lado, e na gente conversando... Não formulei todo o cenário... Não sei se essa conversa hipotética se deu depois de uma sessão de sexo suado, barulhento e resfolegante, ou antes de uma sessão de sexo íntimo e silencioso, bem estilo namoradinhos, com os dois abraçadinhos e arfando baixo... Não sei nem se tinha sexo envolvido, ou se tu apenas teria saído do banho, e estando um dia de temperatura mais amena, e tu, antevendo o calor que sentiria quando eu, dormindo, colasse meu corpanzil no teu, resolveu se precaver e se livrar do pijama para que não ficasse suado... Nada disso eu formulei...
O que eu pensei, é que tu estaria nua, vagamente coberta por uma colcha, deitada do meu lado, e eu estaria deitado de barriga pra cima, segurando a tua mão, e nós estaríamos conversando.
Eu não sei se eu estaria, também, nu. Provavelmente não... Tu sabe como eu sou tímido. Até banho junto contigo eu tinha vergonha de tomar embora a possibilidade de estar sob o chuveiro contigo sempre me excitasse demais, ou talvez por isso...
Mas eu seguraria tua mão... A ponta dos teus dedos, e nós conversaríamos. E vez que outra, eu puxaria tua mão até os meus lábios e sapecaria um beijo estalado nas costas e na palma da tua mão.
E falaríamos de amenidades... De bobagens... Curiosidades e até algumas graves ponderações...
Eu te diria que tem um velhinho que faz compras no Zaffari da Fernando Machado todo o dia perto do meio-dia que é tão igual ao Grand Moff Wilhuff Tarkin que eu já quis tirar foto com ele, e tu me entenderia. Eu te diria que no domingo eu não saio de casa, e tu não entenderia. Eu te diria que existe uma ordem certa pra assistir aos filmes do Indiana Jones que não é a ordem em que foram lançados, e tu quereria assistir nessa ordem pra ver se notava diferença. Eu te diria que uma mulher usando o perfume que eu te dei apareceu no meu trabalho, e ainda que ela não fosse atraente ou sequer simpática, a presença de um cheiro que eu associo a ti, meu deixou inebriado, e tu sorriria. Eu te diria que eu te amo, que tu me ensinou a ser um homem na acepção da palavra, e que, sem ti, eu me vejo desnorteado, despreparado, desprevenido, e que era ótimo não precisar sentir isso, de de lambuja, ainda poder sentir teu cheiro nas minhas mãos, e aí, viria a calhar tu estar despida, pois eu iria querer demonstrar o quanto eu te quero, beijando cada milímetro cúbico de pele descoberta que eu encontrasse entre o teu cabelo e os dedos dos teus pés... Ali... Comigo naquela madrugada... E em todas as madrugadas por vir...
Mas tu estava longe... Sabe Deus quão longe, e o silêncio reinou a madrugada toda...
segunda-feira, 18 de agosto de 2014
Resenha DVD: A Recompensa
Quando conhecemos Dom Hemingway (Jude Law), ele está parado na cela da prisão completamente nu. Ele segura as grades enquanto encara a câmera com uma expressão de grande alegria que vai se transformando em fúria conforme declama um elaborado solilóquio em honras ao próprio pênis, que considera lindo, duro como aço e titânio, capaz de realizar prodígios e curar a fome na Somália, feito pelo qual seria vencedor do Prêmio Nobel da Paz (E seria a primeira vez que tal prêmio seria oferecido a um pau, ele frisa.).
Dom Hemingway é um notório arrombador de cofres. Um gângster de carreira. Ele passou os últimos doze anos preso após um golpe dar errado, e cumpriu a totalidade de sua pena pois se negou a delatar seu empregador, o senhor Ivan Anatoli Fontanovich (Demian Bichir), um dos homens mais perigosos da Europa.
A primeira coisa que Dom faz ao sair da prisão é procurar pelo homem que casou com sua esposa enquanto ele esteve encarcerado, e lhe dar uma surra violentíssima, a segunda, ir a um pub e encher a cara com seu amigo Dickie Black (Richard E. Grant), a terceira, ele espera, é receber a sua parte no golpe que resultou em sua prisão mais de uma década antes, mais juros, e um presente.
Com tudo isso, Dom acredita que poderá ter mais chances de fazer as pazes com sua filha Evelyn (Emilia Clarke, a Daenerys de Game of Thrones), a quem não vê desde criança, e que não tem exatamente as melhores lembranças do pai.
Mas, como tudo na vida do explosivo criminoso, as coisas talvez não saiam de maneira tão tranquila quanto o planejado.
É ótimo.
O filme do diretor/roteirista Richard Shepard, o mesmo de O Matador, é muito menos uma história, e mais um veículo para o personagem central, uma excepcional criação de um Jude Law que se despe da vaidade de galã (e das roupas em uma cena hilária) para dar vida, voz, barriga protuberante, uma barba cabulosa, pontes dentárias e um nariz deformado ao impagável criminoso, que mesmo sendo a epítome da grosseria operária britânica, ainda guarda uma pequena, e sempre notável, fagulha de doçura em meio a seus rompantes de ira, sua absoluta falta de decoro e suas orgias de sexo, álcool e drogas.
Ainda assim, há mais do que apenas comédia escrachada em A Recompensa. Shepard é um cineasta esperto, e não tenta construir um filhote do cinema de Guy Ritchie.
Ao lado de Law, ele trata de manter Dom um calhorda de temperamento explosivo, um camponês de coração, um servo mesquinho com ótimo cabelo e fígado forte, mas sem perder a fagulha de ternura mencionada antes, que é importante no terceiro ato do filme, quando abre-se espaço para algumas sequências capazes de emocionar.
Com um elenco esperto e o que talvez seja a grande atuação da carreira de um Jude Law à vontade até não mais poder, A Recompensa é uma divertida sessão de cinema, e, quem sabe, um futuro cult movie.
Alugue e divirta-se, vale demais a pena.
"-Eu não sei quem é esse homem.
-Oh, eu vou te dizer quem eu sou. Eu sou o fodido que vai arrancar teu nariz fora com os meus dentes. Eu sou o fodido que vai te eviscerar com uma faca de queijo cega e cantar Gilbert e Sullivan enquanto faz isso. Eu sou o fodido que vai desovar teu cadáver num lago congelado e olhar enquanto tu afundar que nem o teu peso em merda. Eu sou esse fodido. Esse é o fodido que eu sou."
Resenha Cinema: Planeta dos Macacos: O Confronto
Nem sei explicar porque demorei tanto tempo para assistir a Planeta dos Macacos: O Confronto.
O primeiro filme, Planeta dos Macacos - A Origem, foi o meu filme preferido de 2011 ao mostrar a jornada do macaco Caesar (Andy Serkis), de refugo de laboratório e filhote órfão a líder revolucionário e herói dos símios oprimidos pela humanidade.
O excelente longa metragem de Rupert Wyatt mostrava o primeiro passo rumo ao futuro sombrio e terrível encontrado pelo astronauta Taylor no filme original de 1968 com uma história esperta, bacana e bem contada, que terminava com o vírus sintético se espalhando mundo afora, preparando terreno para uma continuação que, esse ano, chegou aos cinemas, e que sábado, eu finalmente fui assistir em tela grande.
Desta vez dirigido por Matt Reeves dos bons Cloverfield e Deixe-me Entrar, Planeta dos Macacos - O Confronto abre mais ou menos de onde seu antecessor se encerrava, com um recorte de notícias da TV mostrando a epidemia do que passa a ser chamado de "gripe símia" se espalhando pelo mundo e consumindo milhões de vidas num processo que dura uma década.
Após essa década vemos que Caesar (novamente Andy Serkis) e seus companheiros do primeiro filme estão bem.
Enquanto a raça humana definhava, os macacos super-inteligentes que se revoltaram anos antes criaram uma sociedade organizada que começa a florescer. Vivendo juntos nas florestas a norte de São Francisco, os macacos caçam, pescam, coletam e aprendem uns com os outros enquanto organizam famílias como a que Caesar, seu óbvio líder, agora tem.
Com sua companheira Cornelia (Judy Greer, que eu achava que teria uma participação maior no filme), ele tem o filho Olhos Azuis (Nick Thurston) e acaba de ser pai novamente.
Enquanto toma decisões ao lado do babuíno Maurice (Karin Konoval) e dos chimpanzés Rocket (Terry Notary) e Koba (Toby Kebbell, substituindo Christopher Gordon, intérprete do macaco repleto de cicatrizes no primeiro longa), Caesar raramente pensa nos humanos, a quem julga extintos.
Essa crença, porém, se prova equivocada quando um grupo de humanos chega aos domínios simiescos em uma expedição engendrada por Malcolm (Jason Clarke) para tentar reativar uma velha usina hidrelétrica e levar energia ao que restou de São Francisco, onde ele lidera um grupo de sobreviventes ao lado de Dreyfus (Gary Oldman).
Após as tensões iniciais, Caesar e Malcolm alcançam uma trégua, mas ela se prova frágil à medida em que a desconfiança e o medo despertam o que há de pior em ambos os lados, ameaçando iniciar uma guerra que pode determinar quem será a espécie dominante da Terra.
É excelente. Tão bom quanto o predecessor, ou talvez melhor.
O roteiro, novamente de Rick Jaffa e Amanda Silver, com a adição de Mark Bomback, se profunda no drama do herói peludo Caesar, agora um líder experiente, chefe de família e de tribo, que se vê dividido entre suas obrigações para com seus semelhantes e seus sentimentos para com os humanos.
Ao contrário dos outros macacos, em especial Koba, o lanhado sobrevivente de abusos infinitos em laboratórios, Caesar foi realmente amado por Will Rodman (James Franco, que aparece em uma cena breve e tocante) e seu pai, Charles, de modo que é capaz de reconhecer um bom homem em Malcolm quando o vê.
É essa disposição em ver o lado bom do inimigo que semeia a desconfiança entre os macacos.
O paralelo é traçado com Malcolm, também um pai de família e um líder de seu povo, que temendo pela segurança de sua esposa Ellie (Keri Russell) e de seu filho Alexander (Kodi Smit-McPhee), tenta garantir a coexistência pacífica entre as duas raças, mas esbarra na obstinação de Dreyfus, a exemplo de Koba um veterano marcado, senão física, emocionalmente, pela doença que varreu a Terra.
Ao escolher colocar heróis e vilões de ambos os lados do conflito, e dar a ambos chances de justificarem suas escolhas, Planeta dos Macacos: O Confronto acerta a mão, criando uma experiência que, a exemplo do primeiro filme, diverte sem abrir mão do cérebro.
Com boas atuações, efeitos especiais assustadores de tão perfeitos (o close final em Caesar é de chorar de tão perfeito) e sequências de ação inspiradíssimas, O Confronto é item obrigatório pra qualquer fã de cinema, e apesar da nota amarga do final, deixa gostinho de quero mais.
Que venha o terceiro Planeta dos Macacos. Estamos esperando ansiosos.
"-Koba luta por macacos!
-Koba luta por Koba."
sábado, 16 de agosto de 2014
Resenha Cinema: As Tartarugas Ninja
Quem regula de idade comigo certamente conheceu as Tartarugas Ninja na época do programa da Xuxa. No início dos anos oitenta, a rainha dos baixinhos dominava as manhãs da Globo com sua seleção de desenhos animados que incluía Capitão Planeta, He-Man, Caverna do Dragão, e os quelônios marciais que se tornaram, ainda que brevemente, um tremendo fenômeno de vendas entre a molecada.
Eu tinha bonecos, livros de colorir, álbuns de figurinhas, gibis, assistia aos desenhos e aos longa-metragens das tartarugas.
Vi As Tartarugas Ninja II - O Segredo de Ooze no cinema não uma, nem duas, mas três vezes (Depois gastei o VHS). Não sei quantas vezes assisti ao primeiro filme no vídeo cassete da minha avó (era um artigo meio luxuoso quando eu era criança, nem todo mundo tinha...), e também vi e revi o terceiro filme, quando as tartarugas inexplicavelmente viajavam no tempo...
Claro que, a segunda onda das Tartarugas, já no começo dos anos 2000 com a série live action que passava nas manhãs da Globo e que acrescentava uma tartaruga fêmea (Shinobi, talvez fosse seu nome?) ao quarteto principal, e depois, ainda mais recentemente, o desenho TMNT da Nickelodeon, eu já estava meio velho e impaciente demais pra me interessar, mas a verdade é que os répteis mutantes com nomes de pintores renascentistas ainda tinham um lugarzinho nas minhas afeições infantis que garantiram que, anos atrás, quando confirmaram que Michael Bay seria o responsável pelo reinício das tartarugas no cinema, eu chiei quando se especulou que elas seriam alienígenas, e não mutantes.
Nós, nerds, somos puristas, especialmente com nossas afeições infantis.
Uns bons quatro anos se passaram desde então, e o filme produzido por Bay ganhou a direção de Jonathan Liebesman, de Invasão do Mundo: Batalha de Los Angeles e Fúria de Titãs 2, roteiro de Andre Neméc e Josh Appelbaum (Missão: Impossível: Protocolo Fantasma) e Evan Daugherty (Branca de Neve e o Caçador, Divergente), seria estrelado por Alan Ritchson (O Aquaman de Smallville), como Rafael, Noel Fisher (Michelangelo), Jeremy Howard (Donatello), além de Pete Ploszek como Leonardo e Danny Woodburn (Seinfeld, Watchmen) como o mestre Splinter, todos atuando com captura de performance estilo Gollum.
Após o fim das filmagens, Ploszek e Woodburn foram dublados respectivamente por Johnny Knoxville (Jackass) e Tony Shalhoub (Monk, Sem Dor, Sem Ganho).
No elenco que nós veríamos em cena, William Fichtner (O Cavaleiro Solitário) ganhou o papel de Eric Sachs, um dos vilões do filme, Will Arnet (Arrested Development) seria o câmera man Vernon Fenwick e para alegria de todos os homens do mundo, a intrépida repórter April O'Neil ganhou o rostinho lindo e o corpo gostoso de Megan Fox.
Como a Megan Fox, sozinha, já me faria ir ao cinema ver o filme, ontem eu estava a postos para conferir o longa que, na pior das hipóteses, me permitiria curtir a morena mais fabulosa do universo por 101 minutos, e, na melhor, teria algumas boas sequências de ação e comédia.
Longa conferido, posso dizer que Michael Bay, Liebesman, Nemec, Appelbaum e Daugherty conseguiram, com seus poderes, construir mais um blockbuster genérico para uma geração de retardados.
O longa conta a história das tartarugas ninja, quatro quelônios geneticamente alterados por um experimento humano que se tornaram criaturas humanoides de imensa força física. Criadas pelo mestre Splinter, uma ratazana afetada pelo mesmo agente mutagênico, as tartarugas foram treinadas na arte do ninjitsu para manterem-se focadas e disciplinadas, mas, também, para combater o temível Clã do Pé, uma organização criminosa que não hesita em pisotear quem quer que se interponha entre eles e os objetivos nefastos de seu líder, o Destruidor.
Vivendo em absoluto segredo nos esgotos de Nova York, o caminho das tartarugas se cruza com o da repórter April O'Neil, que, cansada de fazer o noticiário levinho do canal 6, pretende se tornar uma jornalista séria, e, para tanto, está disposta a se colocar em risco para conseguir A grande matéria sobre o grupo que ameaça a cidade e os misteriosos vigilantes secretos que ousam combatê-los.
Quando April consegue, finalmente descobrir quem e o quê são os guardiões ocultos da cidade, ela e as tartarugas ninja precisam trabalhar juntos para impedir que o plano definitivo do Destruidor acabe com Nova York.
Va lá... As Tartarugas Ninja não chega a ser ruim como outros remakes blockbusters genéricos recentes. Está anos-luz à frente de coisas como O Vingador do Futuro, RoboCop e mesmo os dois Fúria de Titãs. Inclusive começa bem, com uma bela sequência animada situando o espectador no mundo das tartarugas, Megan Fox, o visual dos protagonistas está muito bacana, criando um equilíbrio entre o design agressivo originalmente criado por Eastman e Laird para os quadrinhos e a personalidade galhofeira dos quatro irmãos nos desenhos animados, Megan Fox, belas sequências de ação filmadas de maneira a permitir que o espectador efetivamente veja tudo o que está na tela ao invés do fetiche visual bagunceiro que Bay tornou regra em Transformers, Megan Fox, sequências de comédia genuinamente engraçadas, em especial as encabeçadas por Michelangelo e, claro, Megan Fox.
Ainda assim, o filme tem sérios defeitos.
O plano do Destruidor foi copiado do Lagarto em O Espetacular Homem-Aranha, tirar o foco das Tartarugas, que têm uma dinâmica de família que realmente funciona, em especial quando encarnam numas de nerdice adolescente, e colocá-lo na repórter April (por mais linda e gostosa que seja a Megan Fox ela não é lá uma grande atriz, e o arco "dramático" que o roteiro dá a ela é simplesmente risível) é um tiro no pé, dividir a atenção entre dois vilões, também é bobagem, especialmente porque o cientista malvado Sachs rouba o foco do Destruidor, de quem pouco sabemos e que acaba reduzido praticamente em um robô samurai gigante (quase igual ao Samurai de Prata de Wolverine - Imortal).
A mudança na origem dos heróis também é desnecessária e boba (vá lá... Mais boba), com Splinter aprendendo ninjitsu sozinho em um livro para então ensiná-lo às tartarugas, e há uma ligação passada entre eles e April que é absolutamente desnecessária, além, claro, daquela tradicional hiper exposição que se tornou regra em um cinema feito pra uma geração que não consegue olhar pra tela do cinema por quinze minutos sem dar uma olhada no WhatsApp.
Ainda assim, considerando tudo, Tartarugas Ninja não é horrível, e, se considerarmos que é um filme da Nickelodeon com um público alvo bem específico, é até razoável.
Assista no cinema se você for fã de longa data das Tartarugas Ninja, ou se é apaixonado pela Megan Fox (e quem não é?), o 3D é bonito, e vale a pena.
"-O quê são vocês?
-Somos ninjas.
-Somos mutantes.
-Tecnicamente somos tartarugas.
-E somos adolescentes. Mas conseguimos conversar como adultos...
-Então vocês são... Ninjas mutantes tartarugas adolescentes?
-Quando você coloca dessa forma soa ridículo."
sexta-feira, 15 de agosto de 2014
MIL
Por mil vezes ele remoera aquela cena.
Mil vezes ele havia repassado aqueles eventos tornando-os uma marca indelével em sua memória.
Ela tinha lágrimas nos olhos quando disse que não iria ficar arrasada nem nada do tipo porque, se fosse pra eles ficarem juntos, ela sabia que ficariam.
Que poderia demorar alguns meses, alguns anos, mas que, se no plano geral das coisas, eles pertencessem ao lado um do outro, a vida se encarregaria de juntá-los novamente.
E deu um sorriso triste, enquanto as lágrimas escorriam dos olhos dela e desciam pelas maçãs cobertas de sardas do seu rosto bonito.
Ele a abraçou fraternalmente, e pediu que ela não se tornasse sua inimiga declarada.
Era algo que sua ex-namorada anterior havia feito.
Tornara-se uma militante anti-ele. Fazendo o possível para espezinhá-lo sempre que a chance se apresentava, ainda que ele, desligado que era, só ficasse sabendo quando alguém lhe contava dando a ênfase correta na maldade que lhe passara despercebida.
Ela ficou abraçada nele por alguns momentos, e então se desvencilhou respirando fundo. Sorriu, linda que era, e entrou em seu prédio onde ele a aguardara para dar a notícia do rompimento unilateral da relação.
Quando ele saiu andando, ela derrubou os cadernos e livros que trazia consigo, ele se virou a tempo de vê-la agachada juntando as coisas, e sorrir pra ele fazendo um gesto de "olha que desastrada que eu sou", embora chorasse de novo.
Aquela foi uma das coisas que mais lhe partira o coração na vida.
Ele achou que romper com ela fosse o caminho natural das coisas. Eram ambos jovens demais, e haviam namorado por quase três anos. Durante aquele período ele achava, tinha quase certeza, de que era quem gostava mais naquela relação. Por mil vezes acreditou de maneira pia que gostava sozinho. Se sentiu frustrado, enraivecido, vilipendiado, e só não terminou o relacionamento mais cedo porque ela não vivia o melhor dos momentos da sua vida, de modo que ele achava feio ser o sujeito que terminou com ela quando ela estava por baixo.
Quando as coisas começaram a dar certo pra ela, ele ficou genuinamente feliz. Achou, mesmo, que ela merecia as coisas boas que se avizinhavam pois era tenaz, diligente e focada como uma bela exterminadora do futuro.
Mas não só isso...
Ele viu as ondas benfazejas como uma janela pela qual ele poderia se retirar. Um espaço por onde poderia sair da vida dela de maneira quase invisível. Sem deixar saudades.
Pois, na cabeça dele, o jeito de ser dela, sempre o criticando, reprovando tudo o que ele fazia, implicando com seus amigos, transformando tudo em confronto... Aquelas eram provas irrefutáveis de que ela não o apreciava nem um pouco.
E ele... Ele era apaixonado por ela. Pela sua beleza, Pela sua voz... Até pelo seu jeito malvado, algo Veruca Salt... Ainda assim, pra ele, estar em uma relação tão desigual, não era sinônimo de felicidade mesmo que ele fosse perdidamente apaixonado pela outra metade do casal.
E então, ele saiu.
E apenas ao sair, ele percebeu que a desaprovação dela... O seu jeito ranheta... A sua forma quase rude de tratá-lo... Não eram formas de depreciação. Eram apenas características inerentes dela. Era o jeito dela ser...
Mil vezes ele lamentou ter dado fim precoce à relação após ter tido essa epifania.
Mil vezes pensou em ligar pra ela a convidando pra ir ao cinema, que ela odiava.
Mil vezes ele se deteve, acovardado.
Quando ela o convidou para o seu aniversário, ele ficou efusivo, não pensou duas vezes em aceitar. Comprou presente e escreveu um cartão onde queria colocar mil palavras, mas se contentou com 32 bem escolhidas.
Quando chegou à festa, e a viu com o namorado novo, seu coração se partiu em mil pedaços.
Mas ele absorveu o golpe. Era forte o suficiente. Tinha certa experiência com corações partidos, e encontrou consolo no fato de que, se ela o havia chamado à festa, mesmo com um novo namorado, é porque levara a sério o pedido feito por ele:
Não tornar-se sua inimiga.
Não sabia se era fato que ela tentava encontrar um lugar de amigo para ele em sua vida, ou se tentara apenas uma pequena vingança por ele tê-la deixado... Ela era bonita e orgulhosa. Mulheres assim não respondem bem a foras de nenhuma espécia... Ainda assim, ele preferiu ver as coisas pelo prisma positivo, contrariando todos os seus instintos naturais, e percebendo, pela milésima vez, que ainda a amava.
Os dias vindouros seriam sofridos. Mas ele sobreviveria.
Era sua maior, talvez sua única qualidade:
Era forte.
Aguentava tudo no osso. E seguia em frente. Respirou fundo e pensou nas palavras dela:
Se fosse pra ficarem juntos, ficariam. Se, no plano geral das coisas, pertencessem ao lado um do outro, o universo, o destino, a vida ou a Casa do Capita trataria de juntá-los. Dali a um dia... Sete, trinta, ou mil...
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
Essa foi a Milésima postagem da Casa do Capita. Obrigado por continuarem aparecendo, gente. As portas estão sempre abertas.
terça-feira, 5 de agosto de 2014
As Bocas
Quando criança, o Reginaldo tinha nojo da boca alheia. Muito nojo. Uma aversão inexplicável à qualquer boca que não a sua própria.
O Reginaldo não bebia do mesmo copo que outrem, ele não comia "um pedaço" ou "um teco" de nada que outros estivessem comendo, e nem cedia de nada que ele estivesse comendo.
Pro Reginaldo, canudinho e copo eram itens pessoais e intransferíveis que cada um deveria ter seu próprio. O mesmo valia para talheres, e escova de dentes, então, nem se fala.
O Reginaldo não gostava nem de tocar nas escovas de dentes dos outros, e já perdera as contas de quantas escovas descartara, ainda novas, por suspeitar terem sido usadas por terceiros.
O engraçado é que esse nojo todo que o Reginaldo tinha das bocas dos outros era algo absolutamente desprovido de maldade.
O Reginaldo nada sabia, quando criança, a respeito de felação, cunilíngua ou qualquer forma de sexo oral, tampouco tinha entre seus parcos conhecimentos infantis a quantidade de bactérias e germes existentes na cavidade oral humana.
Sua aversão pela boca dos outros era visceral, inexplicável.
Claro, conforme os anos se passaram, Reginaldo descobriria o prazer nas bocas alheias. Mais precisamente das meninas.
Mas levou tempo.
Tanto que, Reginaldo, segundos antes de dar seu primeiro beijo, ergueu os olhos e suspirou, pois, ainda que ansiasse pelo contato com os lábios da Graziela, a prima de sua amiga Denise, com seus cabelos pretos lisinhos e seus enormes olhos azuis, alguma coisa em seu inconsciente o alertava do perigo de colar sua boca à dela.
De qualquer forma, a boca de Graziela foi a porta de entrada.
Alguns meses mais tarde, sua primeira namorada de verdade o cumprimentaria, certa feita, de surpresa com uma lambida na bochecha.
Ela chegou por trás dele, sentado, o abraçou, e, quando ele se virou para ela, ela o surpreendeu colando a língua em sua bochecha e deslizando quase do maxilar até logo ao lado do olho.
Só na língua, pra seu governo, existem 92 tipos diferentes de micro-organismos.
Mas àquela altura, o Reginaldo já não ligava.
O "beijo de vaca" da sua namorada não o enojou. Ao menos não mais do que por uma fração de segundo, quase imediatamente a aversão se tornou calidez.
Conforme o tempo passou, Reginaldo foi adquirindo mais e mais afeição pela boca alheia, e deixando de lado as restrições que tinha para com a sua própria.
Aprendeu a encontrar conforto e prazer na boca das mulheres que cruzaram sua vida, e a oferecer, na mesma medida, com a sua.
Após tantos anos. Vendo-se apartado da boca que aprendera a amar, Reginaldo tenta reproduzir a aversão a bocas alheias, na esperança de que isso torne a distância um calvário menos rigoroso.
Ele então, retoma seu mantra:
Na boca há cerca de 350 espécies bacterianas já cultivadas e mais de 200 que foram reconhecidas por métodos genéticos. Em número total de microrganismos, a microbiota bucal só encontra um concorrente na microbiota intestinal...
sexta-feira, 1 de agosto de 2014
Resenha Cinema: Guardiões da Galáxia
A essas alturas todo mundo sabia que, mesmo se Guardiões da Galáxia fosse um filme ruim, ao menos ainda seria um filme ruim dos estúdios Marvel, o que garantiria algum lucro modesto pro estúdio (que já fez dinheiro suficiente com seus super-heróis pra obrigar a DC/Warner a se coçar e parar de fazer filmes apenas com Superman e Batman), e, mais importante, garantiria ao menos alguns bons momentos durante as prováveis duas horas de projeção. Entre os maus filmes da Marvel, afinal de contas, estão Homem de Ferro 2, O Incrível Hulk, e Thor. Nenhum deles é um filme de triste memória pra quem foi ver no cinema, e, de uma forma ou de outra, foram filmes que ajudaram a pavimentar o caminho até Os Vingadores, maior êxito de bilheteria super-heroica da história do cinema.
Mais do que isso, Guardiões da Galáxia seria um teste para o estúdio, que, pela primeira vez, tentaria levar gente ao cinema apenas com o nome Marvel, ao invés do nome de algum super-herói encravado no inconsciente da audiência.
O super grupo do título, afinal de contas, por mais antigo que seja (a primeira formação do grupo remonta a 1969, Groot, a 1960, e Rocket Racoon a 1976...), não é exatamente popular, passando a uma distância considerável do prestígio de gente como Hulk, Thor e Capitão América, então, com um orçamento estimado de 170 milhões de dólares, Guardiões da Galáxia não deixava de ser uma aposta considerável do estúdio.
Por sorte, a aposta caiu em boas mãos.
O diretor James Gunn (do ótimo e ignorado Super) se juntou à roteirista Nicole Perlman para contar a história de Peter Quill (Chris Pratt), que, quando criança, logo após a morte de sua mãe, foi abduzido da Terra e levado aos confins do espaço por saqueadores espaciais, tornando-se, ele próprio, um saqueador, vagando por setores afastados da galáxia em busca de riquezas.
Em um de seus "trabalhos", Quill toma posse de um misterioso orbe que o coloca na mira de Ronan, o Acusador (Lee Pace, de O Hobbit).
Ronan, um conhecido fanático da raça Kree, deseja fazer o que considera justiça, e dizimar os Xandarianos, inimigos históricos dos Kree, com quem mantém uma frágil trégua idealizada pela tropa Nova.
Para recuperar o orbe, Ronan envia no encalço de Quill a assassina Gamora (Zoe Saldaña), uma das filhas adotivas de Thanos (Josh Brolin), que a exemplo de sua irmã, Nebula (a gatinha Karen Gillan, de Doctor Who), foi aprimorada pelo titã insano para se tornar uma exímia matadora.
Infelizmente para Quill, seu ex-companheiro de saque, Yondu (Michael Rooker, ator fetiche de Gunn, maneiro no papel), colocou sua cabeça a prêmio após não ser incluído na transação do orbe, o que o deixa na mira dos criminosos Rocket Racoon (voz de Bradley Cooper), um guaxinim geneticamente alterado, e Groot (voz de Vin Diesel) um tolkeniano homem-árvore de poucas palavras.
Quando o caminho dos quatro se cruza em Xandar, eles acabam presos pela Tropa Nova.
Encarcerados, eles conhecem Drax, o destruidor (Dave Bautista), um poderoso e eloquente guerreiro cuja vingança contra Ronan é a única razão de viver.
Ao descobrirem a verdadeira origem do orbe, e o que Ronan planeja fazer com ele, Quill, Gamora, Rocket, Drax e Groot precisam deixar as diferenças de lado e formar uma aliança pouco confortável na esperança de impedir a destruição de toda uma raça, mas será que esse bando de bundões está à altura da tarefa?
É notório o salto de qualidade dos filmes da Marvel após a união à Disney.
Todos os filmes da fase 2 do universo cinemático da casa das ideias são consideravelmente superiores aos filmes de origem, e esse Guardiões da Galáxia se perfila a Thor - O Mundo Sombrio e Capitão América - O Soldado Invernal como um dos triunfos do estúdio.
Nas mãos de Gunn, o longa deixa de ser uma fita de super-herói típica para se aproximar muito mais das aventuras especiais oitentistas que fizeram a alegria da minha geração. Se o eco mais óbvio é Star Wars (Quill obviamente queria ser Han Solo, Gamora tem um quê de princesa Leia, Groot é algo Chewbacca e a relação Ronan/Thanos traz ecos de Vader/Palpatine) o filme também tem uma aura de Viagem ao Mundo dos Sonhos, Os Caçadores da Arca Perdida, Caravana da Coragem e, mais impressionante, todas essas influências e inspirações funcionam no filme graças à sábia decisão de torná-lo uma comédia.
Sim.
Guardiões da Galáxia é uma comédia de aventura espacial, e muito boa.
As piadas são variadas e praticamente incessantes, mas não roubam do filme os momentos que deveriam ser tocantes ou tensos, pois eles estão lá e funcionam.
Se a direção de Gunn e o roteiro esperto de Nicole Perlman respondem por parte do êxito de Guardiões, o amplo e heterogêneo (sério, quem esperaria Glenn Close, Vin Diesel, Bradley Cooper, Djimon Hounsou e John C. Riley no mesmo filme?) elenco não fica atrás.
Chris Pratt vai bem com seu primeiro (que eu me lembre) protagonista, Zoe Saldaña acrescenta humor ao seu tradicional coquetel "girl power" e se dá bem. Dave Bautista é outro que se beneficia da comicidade do filme, dando a Drax vários bons momentos.
Surpreendente é ver Vin Diesel encher Groot de sentimento (embora seja difícil saber quanto do personagem é atuação do dublador e quanto é um ótimo trabalho do departamento de efeitos visuais), e Rocket roubar a cena de maneira tão inapelável.
A escolha de Bradley Cooper para o papel, diga-se de passagem, é inspiradíssima. Num primeiro momento, eu diria que é tão boa quanto as de Robert Downey Jr. como Homem de Ferro e Tom Hiddleston como Loki.
Se o grupo principal funciona que é uma beleza, infelizmente o mesmo não pode ser dito dos vilões.
Thanos aparece brevemente, apenas para deixar claro pra audiência que ele é mau pra caralho e que todo mundo tem medo dele.
As motivações de Ronan são algo confusas. Ele é um reconhecido genocida espacial trabalhando para Thanos com o intuito de receber ajuda do titã para cometer um... Genocídio...? Ainda assim, o visual do personagem é maneiro, e Lee Pace se esforça para torná-lo assustador tanto na expressão corporal quanto na voz empostada.
Nebula, por sua vez, tem motivações mais críveis e interessantes, entretanto, pouco aparece.
Não tema, porém. Essa falta de profundidade dos vilões é meio que a regra do cinema da Marvel, e não tira o brilho de Guardiões da Galáxia.
Com belo desenho de produção (o design das espaçonaves em particular, é muito maneiro), trilha sonora de deixar nascidos nos anos oitenta de olhos marejados, personagens coloridos (literalmente), belas sequências de ação, uma coleção de piadas que varia do absolutamente grosseiro ao inofensivo passando pelo auto-depreciativo (Na tomada definitiva do grupo, quando eles estão uniformizados e andam em câmera lenta em direção à tela, Gamora boceja e Rocket ajeita o saco dentro da calça justa), repleto de referências aos quadrinhos Marvel e à cultura pop em geral, Guardiões da Galáxia abre o leque de possibilidades da Casa das Ideias no cinema e entrega uma das melhores matinés do ano enquanto deixa parte da audiência babando de antecipação com a possibilidade de ver um encontro entre os Guardiões e os Vingadores.
Obrigatório para fãs, absolutamente recomendado para amantes de cinema que viveram os anos oitenta.
Assista no cinema, dispense o 3D.
"-Nós somos como Kevin Bacon!"
Marcadores:
Cinema,
Nerd,
Quadrinhos,
super-heróis
Assinar:
Postagens (Atom)