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quarta-feira, 20 de maio de 2015
O Vô
Enquanto crescia, Alan passou muito tempo na casa dos avós. Como filho mais velho de uma família relativamente pobre, era até natural que ele, de quando em quado, fosse o escolhido para ser "dispensado" de casa, especialmente após o nascimento de seu irmão caçula, quase dez anos mais novo, já que bebês custam muito dinheiro, e tempo.
Alan não chegava a se importar. Na verdade, Alan gostava de ficar na casa da avó. Um apartamento amplo, com grandes sacadas e janelas, perto da escola onde estudava e onde, claro, ficava embaixo da asa da avó, aquele tipo de mãe açucarada que fazia todas as vontades.
Entretanto, se a avó era aquele livro aberto de mulher sem disposições para tarefas domésticas que compensava no excesso de mimos por vezes inconsequente, o avô era outra história.
O Vô era um homem misterioso. Velho calvo, com restolho de cabelos ainda nas têmporas já bastante encanecidos, era alto e tinha a compleição física quadrada de uma bigorna. Se alguém dissesse a Alan que o Vô não tinha órgãos internos, ele acreditaria.
O Vô realmente parecia maciço. Sólido.
Tinha sempre uma expressão séria no rosto, que mantinha mesmo quando contava piadas, o que, geralmente, apenas as deixava mais engraçadas.
Tinha mãos grossas e nodosas, um apetite voraz por comida de qualquer tipo, que por vezes constrangia Alan nos restaurantes.
Era tão forte quanto parecia, e era impossível não se sentir seguro quando ele estava por perto, o que apenas tornava sua falta mais latente quando ele partia em uma de suas misteriosas viagens regulares.
Os quatro, cinco dias que o Vô passava fora eram sempre aqueles em que os barulhos do apartamento amplo pareciam mais assustadores, e até mesmo a iluminação que entrava pelas sacadas se tornava assombrada.
Mesmo no final, quando já estava enfermo e com mais de oitenta anos, o Vô sustentava a velha força. Era capaz de dobrar o pulso de um rapagão com um terço de sua idade sem grande esforço, e ainda que tivesse dificuldade para caminhar, a família temia lhe dar uma bengala por medo de que ele a brandisse como arma.
Quando ele morreu, Alan sentiu um grande vazio. Uma tristeza, não pelo Vô, que finalmente descansaria de uma vida de intenso labor, mas por si mesmo. Pela saudade que sentiria dos raros mas bonachões sorrisos do velho bruto.
Alan não sabia muita coisa dessa vida, mas sabia que tipo de homem gostaria de ser.
Um que oferecesse àqueles que ama metade da segurança que seu avô proporcionava sem esforço.
Essa faculdade, a de oferecer guarida aos seus entes queridos, era, para Alan, uma preciosidade.
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