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quarta-feira, 6 de abril de 2016

Resenha Blu-Ray: Olhos da Justiça


O norte-americano médio tem preguiça de ler legendas da mesma forma que o brasileiro médio. Enquanto aqui, nós temos uma longa tradição de dublagens (já tivemos as melhores dublagens do mundo, até o final dos anos noventa), nos EUA existe uma onga tradição de remakes em língua nativa.
De Os Sete Samurais de Korosawa se tornando o bangue-bangue The Magnificent Seven a B-13: 13º Distrito virando Brick Mansions, toda a vez que o cinemão americano vê um filme com potencial de venda em território americano falado em outro idioma, eles vão lá e refazem o filme com diretor, elenco e roteiro nativos.
O resultado por ser tão bom quanto Os Infiltrados, baseado no policial coreano Infernal Affairs, ou tão ruim quanto O Turista, baseado no thriller francês Anthony Zimmer. Entre uma coisa e a outra podem haver produtos que não ofendem, mas são apenas desnecessários como o fofinho terror sueco Deixe Ela Entrar, que virou o fofinho terror norte-americano Deixe-me Entrar, ou o pesadão suspense escandinavo Os Homens Que Não Amavam as Mulheres, que virou o pesadão suspense norte-americano Millenium: Os Homens Que Não Amavam as Mulheres... A lista vai e vai.
De qualquer forma, não chegou a ser surpreendente que o excelente suspense argentino O Segredo de Seus Olhos, de Juan Jose Campanella entrasse na fila pra virar filme hollywoodiano.
O vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro em 2010 provavelmente foi tão ignorado na terra do tio Sam quanto qualquer outro filme sul-americano, de modo que havia uma potencial mina de ouro no suspense escrito por Campanella e Eduardo Sacheri apenas esperando por um estúdio que bancasse a empreitada.
Infelizmente tal estúdio surgiu. E também um diretor/roteirista. Billy Rai, responsável pelo script indicado ao Oscar de Capitão Phillips assumiu a adaptação e a cadeira do diretor, e logo o elenco ganhou as caras de Julia Roberts, Nicole Kidman e Chiwetel Ejiofor, todos atores laureados com indicações e prêmios de atuação no ue parecia um grande time para tentar repetir a densidade do original portenho.
Mas não rolou.
No longa, o ano é 2002. E meio à histeria pós 11/09, uma força tarefa anti-terrorismo formada pela polícia, o FBI e a promotoria pública trabalha arduamente em Los Angeles acreditando que a cidade deve ser o próximo alvo de um atentado engendrado por extremistas islâmicos.
Em meio à investigação, o corpo de uma jovem não identificada é encontrado com sinais de estupro em uma lixeira próximo à uma mesquita. Chamados para investigar o local em busca de conexões com a possível célula terrorista local, o investigador Ray Kasten (Ejiofor) descobre que a jovem assassinada é Carolyn Cobb (Zoe Graham), filha de sua colega Jessica Cobb (Roberts).
Em meio ao luto, Ray começa uma obstinada investigação em busca do culpado, descobrindo que o principal suspeito é um informante da equipe anti-terrorismo, e uma fonte vital para a investigação em andamento, Ray é obstruído por todos os seus superiores à exceção da assistente da promotoria Claire Sloane (Nicole Kidman), com quem partilha um amor platônico.
Treze anos mais tarde, Ray Kasten retorna a Los Angeles trazendo consigo uma pista do paradeiro do principal suspeito do crime, reabrindo velhas feridas enquanto se reaproxima de Claire em sua busca obsessiva pela verdade.
Não... Não funciona.
Na verdade o filme de Billy Ray, a despeito dos esforços de um bom elenco que ainda conta com Dean Norris (o Hank Schrader de Breaking Bad) e Michael Kelly (o Doug Stamper de House of Cards), simplesmente não há nada em Olhos da Justiça que faça justiça ao filme original.
O longa de Campanella era um thriller investigativo com uma terna história de amor em seu cerne que visivelmente se estendia por anos, cozinhando tanto a investigação quanto o relacionamento dos personagens de Ricardo Darín, Soledad Villamil e Guillermo Francella enquanto marinava tudo em frustração e becos sem saída, tudo contribuindo para que a audiência fosse capaz de entender a justificada obsessão de Benjamin Esposito com o caso.
Na versão americana, a fixação do protagonista é justificada através de sua ligação pessoal com o caso, o que, ao invés de fortalecer a trama, a enfraquece. A sombra da corrupção da ditadura militar argentina, um elemento importantíssimo no longa original, se desvanece no batido tema da guerra ao terror, que também não cumpre seu papel com a mesma batida, e a história de amor, essa consegue ser a parte da história que mais foi vilipendiada na nova versão.
Ray Klasten olha para Claire Sloane como se fosse um gurizinho apaixonado pela professora, e com a química zero de Ejiofor e Kidman, a coisa toda soa mais constrangedora do que romântica (conforme diz o personagem de Alfred Molina à certa altura), pra piorar, o roteiro de Billy Ray parece ignorar a passagem do tempo exceto pelo intervalo de 13 anos entre as duas partes da história, o que presta mais um desserviço à relação do casal, de modo que, mesmo mantendo a história bastante próxima do filme original, com cenas que são, literalmente, idênticas à produção portenha de 2009, Olhos da Justiça simplesmente não consegue sair da sombra de O Segredo de Seus Olhos, e nem mesmo andar com as próprias pernas, tornando-se apenas outro filme policial que lembra remotamente um filme muito bom que tu viu há um tempo atrás.
Não chega nem mesmo a ser uma pena. Tava na cara que seria assim.
Ignore e reveja o original argentino.

"-Prisão perpétua.
-Pra você também..."

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