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segunda-feira, 12 de junho de 2017
Resenha DVD: John Wick: Um Novo Dia Para Matar
Há uma piada recorrente entre fãs de cinema a respeito das minguadas capacidades artísticas de Keanu Reeves, um astro de cinema sem tirar nem pôr, mas, segundo o senso comum, um ator de médio pra menos.
Eu, particularmente, sempre gostei dos filmes de Reeves, ou ao menos gostei de Reeves em seus filmes, até as porcarias como O Dia em que a Terra Parou, Os Reis da Rua e A Casa do Lago, filmes menores, ou mal executados onde a presença de Reeves, que exala uma qualidade cool que independe de talento dramático, atenua a jornada, por vezes, indigesta.
Reeves não precisa ser bom ator, porque é boa pinta, carismático e tem presença de astro de cinema.
Por isso nós seguimos indo ao cinema para ver coisas como 47 Ronins, e paramos pra ver Matrix toda a vez que está repetindo na TNT.
Mas nesse final de semana, fiz uma maratona de John Wick, os dois longas, de 2014 e desse ano um após o outro, e percebi que chegar aos cinquenta anos, ainda que não tenha mudado a fisionomia de Reeves em nada, o fez amadurecer como ator de uma maneira curiosa.
Keanu Reeves não se tornou Jack Nicholson, acredito que jamais desejou sê-lo, mas ele alcançou uma maturidade e um senso de si mesmo que fazem com que sua expressão corporal diga tudo o que a sutileza de suas expressões faciais eventualmente não diz.
O diálogo de Reeves é escarço nos dois filmes, ainda assim, seus rosnados, acenos e a forma como ele luta dizem tudo o que o anti-herói está pensando, e nos mostram tudo o que ele é.
É difícil não achar espetacular que o diretor (e ex-dublê de Reeves em Matrix) Chad Stahelski, tenha sido capaz de criar uma atmosfera para aproveitar essa faceta do talento de Reeves, além de sua fisicalidade quase bailarina para sequências de ação e, claro, sua presença de tela nos dois longas.
John Wick: Um Novo Dia Para Matar, cretino título em português de John Wick: Chapter 2 abre quase que imediatamente após os eventos do primeiro longa, quando o legendário matador de aluguel vivido por Reeves saiu da aposentadoria após a viuvez para se vingar dos marginais que roubaram seu carro e mataram seu cachorro.
Apesar de já ter matado todos os responsáveis diretos e indiretos pelo crime, Wick ainda precisa recuperar seu cabuloso Mustang.
É nessa sequência de abertura, com a participação de Peter Stormare vivendo o irmão de Viggo Tarasov, personagem de Michael Nyqvist no primeiro longa, que somos lembrados da profundidade da lenda de John Wick.
O bicho-papão do submundo dos matadores de aluguel é uma força tão inexorável que, quando ele quer sua cabeça, tudo o que você pode fazer é sentar no escuro e rezar.
Mas Wick não foi atrás da cabeça de Abram Tarasov. Ele foi atrás de seu carro.
E após eliminar uma dúzia de capangas, ele oferece paz ao mafioso, que, incrédulo, aceita.
John volta para sua casa confortável, para viver entre as lembranças de sua esposa (Bridget Moynahan) ao lado de seu pitbull sem nome.
Ele enterra novamente suas armas e moedas de ouro, e se prepara para voltar à sua aposentadoria.
Mas a aposentadoria parece um objetivo impossível para John, pois ele imediatamente recebe a visita de Santino D'Antonio (Riccardo Scamarcio), um poderoso mafioso que tem uma Promissória de John, após tê-lo ajudado a sair da vida de matador, e a utiliza para pedir um serviço.
Inicialmente, John nega, mas as Promissórias, assim como tudo mais na admirável mitologia desse submundo de matadores do Wickverso, é uma obrigação pétrea, e após ter sua casa explodida, John repensa sua resposta, e aceita o trabalho.
Infelizmente, porém, realizar a tarefa que D'Antonio lhe deu não é o caminho para a paz que John supunha. E ele não tarda a se ver enredado em uma teia de traição que coloca sua cabeça a prêmio novamente, e todos os assassinos de Nova York em seu encalço, o forçando a permanecer em movimento e encerrar o contrato contra si da única maneira que sabe:
Matando todos aqueles que são burros o suficiente para ficar em seu caminho.
John Wick: Um Novo Dia Para Matar não é um filme tão redondinho quanto o primeiro longa com sua trama de vingança reta e direta, ainda assim é tão repleto de qualidades que fica difícil não se surpreender.
O longa escrito por Derek Kolstad, mesmo roteirista do primeiro longa (Já notaram que a quantidade de escritores é sempre inversamente proporcional à qualidade do filme?) é audacioso, divertido e violento, equilibrando a brutalidade das geniais cenas de ação com um sarcasmo cheio de personalidade dosado na medida e uma mitologia que dá uma surra de relho em qualquer remake e em muitas das adaptações de quadrinhos e livros que vemos inundando o cinema temporada após temporada.
Mesmo se o longa não fosse tão bem equilibrado quanto é em sua proposta, já seria um deleite poder andar novamente pelos obscuros corredores do labiríntico mundo dos assassinos desse universo cheio de regras, promessas de sangue e casas-seguras onde questões profissionais não devem entrar e pessoas que tentavam explodir a cabeça uma da outra cinco minutos antes podem sentar e cordialmente dividir uma bebida. Salas de informação com computadores que parecem rodar DOS sendo operados por telefonistas meio pin-up meio suicide girl, alfaiates que após perguntar a quantidade de botões do terno, o caimento das calças, e se o traje é para dia, ou noite, mostram o poder da blindagem entre as camadas de tecido, e o sommelier não é versado em vinhos, mas sim em armas que ele recomenda como se fossem as etapas de um banquete.
Sim.
É meio brega e sem sentido, mas é divertido, e, na realidade do Wickverso parece natural. Especialmente quando vemos Reeves usando um fino terno negro para se proteger de disparos de escopeta na cara enquanto atravessa mares de capangas letais como se fosse uma faca cortando um bolo.
O elenco manda bem demais, e todos parecem genuinamente se divertir fazendo seus papéis, dos egressos do primeiro longa Ian McShane, John Leguizamo e Lance Reddick aos novatos Franco Nero, Peter Serafinowicz, Common, Ruby Rose e Laurence Fishburne (Sim, Neo e Morpheus se reencontram em John Wick 2), cada um deles crava os dentes com vontade nesses personagens que são unidimensionais de uma maneira tão franca que não podemos evitar de gostar deles e dos sabores diversos que trazem ao desenvolvimento da trama.
Mas por mais que tudo seja bacana em John Wick: Um Novo Dia Para Matar, o grande diferencial do longa é a ação. E Chad Stahelski manja demais do riscado.
Contando com a visão do cinematógrafo Dan Lausten e o compromisso de Keanu Reeves ele transformm cada sequência de luta em um balé tão gracioso quanto violento que acompanhamos sem cortes excessivos, muitas vezes em belíssimos planos-sequência que transcorrem diante dos olhos da audiência que vê o quão versado é John Wick em seu ofício.
As sequências embaladas pelo som de ossos quebrando e sangue jorrando jamais são repetitivas, Stahelski e Kolstad sempre têm um ângulo diferente, uma abordagem diferente, um estilo diferente para chegar à história que aquela luta em particular conta.
É bacana ver um filme de ação que se preocupa em utilizar a expressão corporal da forma que John Wick faz.
Cada personagem que cai na porrada o faz com sua própria voz. Ares, a personagem de Ruby Rose, luta como uma fera, cheia de movimento exaltado, amplo, quase histérico. Cassian, o assassino vivido por Common, é direcionado, seus golpes são secos e parecem sempre estar tentando terminar a luta o mais cedo possível. E Wick é todo elegância e precisão, saindo das sombras para tragar os malfeitores em seu caminho como um Batman de paletó de dois botões que não pensa duas vezes antes de encerrar cada conversa com uma bala no crânio ou uma facada no peito. E Reeves o torna verossímil, ao menos neste mundo criado por Derek Kolstad, pois além de ser um ator que amadureceu e que usa a fisicalidade como voz, Reeves é um apaixonado pelo gênero que consegue percorrer distâncias que outros heróis de ação não conseguem.
John Wick: Um Novo Dia Para Matar é um programaço, o melhor longa de ação do ano até aqui, e deixa margem para uma sequência pela qual eu já estou ansioso.
Assista, vale demais a pena.
"-Quem quer que venha, eu vou matá-los. Eu vou matar todos."
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