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segunda-feira, 3 de julho de 2017
Resenha DVD: A Bela e a Fera
A culpa é do Tim Burton.
Sério.
Antes de de o diretor de Os Fantasmas se Divertem reimaginar Alice no País das Maravilhas e faturar um bilhão de dólares com um filme que, francamente, nem sequer era bom, a Disney se limitava a caçar niqueis lançando sequências direto em vídeo de seus filmes mais cultuados, eventualmente espetáculos de patinação no gelo, ou desenhos animados em série que passariam no Disney XD... Coisas do gênero.
Foi quando, por alguma razão que me escapa, o Alice no País das Maravilhas estrelado por Mia Wasikowska se tornou um sucesso bilionário em 2010, que a Disney percebeu o tamanho da mina de ouro sobre a qual estava sentada.
Se Alice fora tão bem recebido em sua versão moderninha, sombria e turbinada por CGI de última geração, o mesmo não se aplicaria a todo o vasto catálogo de animações da empresa que criou as animações como as conhecemos?
Cinderella, de 2015, foi um sucesso bem mais modesto que Alice, ainda assim, faturou mais de 543 milhões de dólares pra um orçamento de 95, e se ano passado o segundo Alice foi um fracasso comercial e artístico, não é menos verdade que a fórmula se garantiu com o excelente Mogli: O Menino Lobo, que ultrapassou os 966 milhões em receita.
Com tanta grana rolando, ficou claro que a Disney podia começar a mirar mais alto, e não tinha como mirar mais alto do que A Bela e a Fera, que em 1991 conseguiu uma inédita indicação ao Oscar de melhor filme, e arrastou multidões ao cinema e ainda se tornou um dos primeiros sucessos de home-video de que sou capaz de me lembrar, com gente comprando o VHS adoidado.
O longa, lançado em março desse ano, faturou alto. Mais de um bilhão de dólares, e garantiu a produção de diversas outras produções, como O Rei Leão de Jon Favreau, e Alladin, de Guy Ritchie, e, apesar do hype, eu não fui assistir ao longa no cinema por conta da ditadura da versão dublada na imensa maioria das salas de exibição e, porque, sendo bem franco, não estava particularmente interessado.
Não foi mais senão acaso que me fez cruzar com o longa na estante da locadora no sábado, e nada além de falta de opção que me fez levá-lo pra casa. Ontem, com uma coberta sobre as pernas, um copo de guaraná gelado e um pacote de Pingo D'ouro, conferi o longa:
Na trama, conhecemos a história de um príncipe arrogante (Dan Stevens), que após escarnecer de uma pobre velha que lhe pede abrigo em seu palácio, é amaldiçoado, e condenado a passar o resto de seus dias vivendo como uma fera. A velha, na verdade uma feiticeira poderosa, dá ao príncipe uma rosa, e lhe avisa que, se ele não for capaz de fazer alguém amá-lo pelo que ele é, a despeito de sua aparência, até que a última pétala caia, ele estará condenado a ser uma fera até o fim de seus dias.
Graças a magia da bruxa, o povo da vila próxima esquece do príncipe, que tem seu palácio transformado em um sombrio castelo, e sua criadagem tornada em utensílios domésticos, e é deixado para esperar por um amor impossível.
Os anos se passam e, na vila próxima ao castelo, a jovem Bela (Emma Watson) é uma moça considerada estranha por todos.
Letrada, independente e voluntariosa, ela é diferente de todas as moças da região, desejando muito mais do que a vida provinciana que leva na companhia de seu pai, o relojoeiro Maurice (um subaproveitado Kevin Kline). Ela deseja vivenciar o mundo que explora nos livros que pega emprestados na minguada biblioteca do padre Robert (Ray Fearon).
Dividindo seu tempo entre a leitura, ajudar seu pai, cuidar de seus afazeres e evitar o fortão local, Gaston (Luke Evans), Bella lida com a rotina da melhor forma, sempre ansiando por mais na vida.
É quando seu pai, a caminho de uma feira numa cidade próxima, é pego por uma tempestade, e, após ser atacado por lobos, busca abrigo em um palácio aparentemente abandonado. Lá, após colher uma rosa, é arrebatado pela Fera, e trancafiado numa cela.
Eventualmente Bela descobre o destino de seu pai, e vai em seu auxílio, trocando de lugar com Maurice, e ficando, ela própria, à mercê do monstro.
Enquanto Maurice volta para a vila em busca de ajuda para resgatar Bela, os criados do castelo, liderados pelo candelabro Lumiére (Ewan McGregor) e pelo relógio Cogsworth (Ian McKellen) veem na presença da jovem uma maneira de acabar com a maldição, mas precisarão dos esforços de todos, do cravo Cadenza (Stanley Tucci) ao bule madame Potts (Emma Thompson), passando pelo guarda-roupa senhora Garderobe (Audra McDonald) e o espanador Plumette (Gugu Mbatha-Raw) para convencer a Bela de que seu algoz é mais do que apenas uma fera, mas mesmo que consigam, será que isso bastará para livrá-los da maldição?
Se na premissa a história parece exatamente igual a da animação de 91, acredite, quando assistimos é ainda mais.
O longa repete o figurino, as canções, até alguns enquadramentos do filme animado dirigido por Gary Trousdale e Kirk Wise, afinal, em time que está ganhando, não se mexe.
A decisão parece ainda mais acertada quando as inserções na trama, alongada em uns bons 45 minutos com relação ao material de origem, não chegam a oferecer nada de muito excitante.
As números musicais extras, por exemplo, que aparecem na segunda metade do filme, soam completamente estéreis na comparação com canções que ganharam cadeira cativa no coração de fãs como a "Belle's Theme", "Something There", o já clássico "Beauty and the Beast", a fanfarra burlesca de "Be Our Guest" ou mesmo a cômica "Gaston" entoada por Evans e Josh Gad, que interpreta Le Fou.
Uma adição bem-intencionada à trama é a razão pela qual os criados do palácio entraram de carona na maldição do príncipe, além da inclusão de um personagem gay (Le Fou é obviamente apaixonado por Gaston), e pessoas negras no vilarejo de Bela, entretanto, o segmento sobre a verdade por trás do destino da mãe da protagonista, numa tentativa de criar um paralelo entre o casal já que a mãe da Fera também é mencionada no longa, é um esforço de desenvolvimento vazio por parte dos roteiristas Stephen Chbosky (do excelente As Vantagens de Ser Invisível) e Evan Spiliotopoulos (do atroz O Caçador e a Rainha do Gelo), que ainda tentam aumentar o nível de independência feminina de Bela mostrando que ela é capaz de construir uma máquina de lavar movida a burrico (nem pergunte).
A direção de Bill Condom é correta, o cineasta dos sofríveis últimos filmes da Saga Crepúsculo e dos ótimos Deuses e Monstros e Dreamgirls, um sujeito que provavelmente foi contratado por saber lidar com romances, musicais e efeitos visuais, não inventa, e trata o longa como ele merece, com a atenção e a grandiloquência que os números musicais da Disney carregam consigo.
Os efeitos visuais nem sempre funcionam, porém. Ainda que os utensílios sejam convincentes o bastante, a Fera, meio homem, meio leão, meio bisão sempre parece falsa na tela, fazendo Dan Stevens praticamente invisível sob a máscara digital (era mais fácil ver Benedict Cumberbatch em Smaug, pra se ter uma ideia) o que rouba um pouco da imersão do espectador que não se encanta de imediato com o romance, e a sequência de ação final, com Gaston e a Fera se digladiando entre as torres do palácio é toda meio deslocada, e não empolga, mas isso não chega a ser uma tragédia.
Dentro de sua proposta o longa se sustenta, repleto de adornos dourados em estilo rococó, um trabalho de elenco absolutamente acima da média, e uma história de amor mais velha que o tempo, A Bela e a Fera certamente cativou as audiências-alvo com louvor, conforme atesta sua bilionária bilheteria. A despeito de jamais alcançar a perfeição da animação de 1991, o filme, a despeito de resquícios de um inchaço todo próprio aos blockbusters, é um bom programa, e entrega um belo conto de fadas que, em meio aos excessos, consegue cativar.
Ainda que, na minha opinião, não valesse a visita ao cinema, certamente valeu a locação.
Se estiver procurando por entretenimento inofensivo, e uma bela história de amor, permita-me estender o convite de Lumiére: Fique à vontade.
"Se ele pudesse aprender a amar outra pessoa, e merecer seu amor de volta antes de a última pétala cair, o feitiço se quebraria. Se não, ele estaria condenado a permanecer para sempre uma fera. Conforme se passavam os anos, ele sucumbiu ao desespero e abandonou toda a esperança. Pois quem seria capaz de aprender a amar uma fera?"
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