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sábado, 18 de janeiro de 2020
Resenha Cinema: Parasita
Há alguns anos, não sei precisar ao certo quando, lembro que o longa sul-coreano O Hospedeiro fez grande sucesso entre crítica e público, despertando o interesse de audiências pelo mundo todo como um inventivo filme de monstros... Recordo que, fã confesso de filmes de monstros que sou, assim que o longa foi disponibilizado em DVD, fui à antiga e saudosa TV3 Vídeo, e aluguei O Hospedeiro para assistir. Não me lembro direito da premissa do filme, apesar de ter achado os efeitos visuais bem intencionados, o que me lembro foi de não ter conseguido levar o longa a sério por causa das atuações do elenco principal.
Eu simplesmente não conseguia enxergar o comportamento dos atores em cena como natural. Nada do que eles faziam ou diziam era convincente pra mim, muito além da barreira do idioma. Eu assisto filmes em chinês, já assisti filmes em russo, pársi e outros idiomas dos quais não entendo nem as vírgulas, e não me vi tão apartado das atuações como me aconteceu assistindo O Hospedeiro.
Mais de uma pessoa me disse que é menos a maneira de atuação excessiva, quase canastrona, e mais o comportamento dos orientais em geral, contido, calculado, quase robótico aos olhos destreinados de ocidentais que não estão habituados ao modo de ser e de agir de nossos irmãos de olhos puxados, e que eu devia abstrair desse pormenor e me deixar envolver pela história.
Uma amiga minha chegou a me passar uma lista de filmes coreanos e japoneses que eu deveria assistir (e dos quais vi apenas Oldboy) para me aclimatar à escola de atuação oriental, mas não adiantou. Eu jamais me habituei, e embora jamais tivesse fechado meus olhos às qualidades do cinema oriental, coreano em particular, especificamente do diretor Bong Joon-Ho, de quem assisti além de O Hospedeiro, O Expresso do Amanhã e Okja, eu realmente fiquei procrastinando na hora de assistir Parasita justamente por causa das atuações...
Ontem, porém, engoli minhas neuras e dei uma chance ao longa que vem colecionando prêmios em todos os festivais por onde passa e é aposta óbvia ao Oscar de Melhor Filme Internacional além de ter sido indicado na categoria de Melhor Filme.
No longa conhecemos a família Kim.
Os quatro membros da família, o patriarca Ki-taek (Song Kang Ho), a mãe Chung-sook (Chang Hyae Jin), o filho Ki-woo (Choi Woo Shik) e a filha Ki-jung (Park So Dam) estão desempregados. Eles se viram como podem morando em um apartamento localizado no porão de um prédio em uma área empobrecida de Seul, aceitando trabalhos informais como montar caixas para uma pizzaria do bairro para se sustentar enquanto roubam o wi-fi dos vizinhos e sonham com dias melhores.
Quando um ex-colega de Ki-woo aparece na modesta residência dos Kim com uma posposta ao amigo, ele fica reticente.
O jovem universitário dá aulas particulares de inglês para uma aluna rica do ensino médio, mas irá fazer um intercâmbio, precisando abandonar o trabalho. Incapaz de confiar a jovem por quem se interessa a um de seus colegas "universitários bêbados" ele deseja recomendar Ki-woo para o serviço, que paga bem.
Sem outras alternativas para conseguir dinheiro, eventualmente Ki-woo aceita a oferta de seu amigo e chega à rica residência dos Park, onde é recebido pela governanta Moon-gwang (Lee Jung Eun), que o apresenta à senhora Park (Cho Yeo Jeong) e à jovem Da-hye (Jung Ziso).
Se Ki-woo estava inicialmente resistente à ideia de trabalhar com os Park, basta uma tarde na luxuosa mansão da família para ele mudar diametralmente de ideia.
Encantado com a riqueza de seus novos empregadores, ele imediatamente começa a elaborar um plano para que toda a sua família possa tirar uma casquinha do modo de vida dos ricaços, e conforme Ki-jung, Ki-taek e Chung-sook adentram o lar dos Park, eles logo se veem enredados em um estranho incidente enquanto um profundo ressentimento vai se edificando na forma de uma guerra fria de classes.
Bem, a primeira coisa que preciso dizer é que, terminando de assistir Parasita eu fiquei francamente coçando a cabeça sobre o porquê de tanto confete.
Não me entenda errado, não há nada de ruim no longa metragem de Bong Joon-Ho, ele é bem editado, bem dirigido, tem uma belíssima fotografia e dá até para destacar algumas atuações (Choi Woo Shik e Song Kang Ho, em particular), entretanto disso até "a grande obra cinematográfica de 2019" vai uma puta distância.
E eu sei como o hype pode prejudicar a visão da audiência de um longa metragem.
Sei bem como a antecipação advinda do excesso de láureas pode gerar uma expectativa impossível de alcançar para qualquer obra de entretenimento ou arte, e com tanta gente e tantos júris, e tantos críticos e tantos cinéfilos colocando Parasita como o melhor filme de 2019, ou um dos melhores filmes da década, seria fácil ver o longa falhar em alcançar tais píncaros de excelência e deixar um espectador como eu desapontado.
Mas a verdade é que eu não tinha imensas expectativas com relação ao longa por todas as razões que elenquei lá em cima, então, para mim, Parasita não foi uma experiência menor por ser incapaz de alcançar alguma expectativa irreal.
Meu maior problema com o longa nem é ele ser um longa que coloque a sua mensagem acima da história, já que a despeito de todos os ricos serem idiotas egocêntricos e egoístas, há ambiguidade suficiente para que a audiência se pergunte quem é o "parasita" do título, mas que ele parece desejar ser muitas coisas ao mesmo.
Um filme com uma mensagem, uma comédia, um drama, um romance, um thriller (e é fácil ver que a primeira faceta foi a que tocou setores da crítica especializada), e a maneira caótica conforme os eventos vão se sobrepondo na trama, ainda que faça sentido para uma comédia de erros, acabou me deixando anestesiado para o que deveriam ser os momentos de pujança emocional do fim do filme, para mim, superior à farsesca primeira metade.
Conforme eu disse, Parasita não é, nem de longe, um mau filme, há sequências genuinamente tensas nos momentos em que o longa se propõe a ser um thriller, mas francamente, em dois meses, o filme não estará mais em minha mente, e na hora de recomendá-lo, eu dificilmente conseguiria fazê-lo sem ressalvas do tipo "Olha, não é filme pra toda a audiência, mas se tu estiver disposto a experimentar...".
Então, aqui vai:
Parasita não é a oitava maravilha do mundo. Não é o melhor filme de 2019 (e nem de 2020, ano em que eu assisti apenas dois filmes...), mas é um filme interessante. Ele certamente prende a atenção por duas horas e dez minutos, não é pra toda a audiência, mas se tu estiver disposto a experimentar, certamente vale o ingresso.
"-Eles são ricos mas são legais.
-Eles são legais porque são ricos."
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