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terça-feira, 28 de janeiro de 2020

Resenha Série: Star Trek: Picard, Temporada 1, Episódio 1: Rememberance


A verdade, já admitida por mim nesse espaço um sem-número de vezes, é que eu sempre gostei mais de Star Wars do que de Star Trek. A ópera espacial de bem e mal que movimentava o destino da galáxia sempre foi mais atrativa pra mim, com seus vilões vestidos de preto e espadas de luz do que a utopia espacial de paz e amor de Gene Roddenberry. Ao mesmo tempo, olhando em perspectiva, ao longo de minha vida, eu tive mais contato com Star Trek.
Enquanto a luta entre Jedi e Sith de George Lucas era um evento cinematográfico de grandes proporções, que eu assisti na TV quando tinha sete anos de idade, e no cinema aos dezesseis, depois aos vinte e poucos e finalmente aos trinta e tantos, quando toda a alma fora sugada da franquia a tornando um pastiche vazio de si própria... Star Trek, não.
Eu acompanhei a tripulação da Enterprise na extinta TV Manchete, quando Kirk, Spock, McCoy, Uhura e companhia dividiam as tardes na rede de Adoplho Bloch com Os Herculoides, Bacamarte e Chumbinho, o Bionicão e Spaceghost.
E eu adorava as aventuras com cenários de papel machê e máscaras de borracha da tripulação número 1 da Frota Estelar. Adorava tanto que, quando do advento d'A Nova Geração, eu odiei a série, sentindo-me traído pela substituição dos heróis a quem eu conhecia desde a mais tenra infância. Apenas bem mais tarde eu fui aprender a respeitar Crusher, La Forge, Troi, Ryker, Data e, especialmente, Jean Luc Picard.
Picard assumia a cadeira de comando da Enterprise trocando a macheza e o heroísmo sessentista de William Shatner e seu capitão Kirk por um comedimento e diplomacia aculturada que eram a epítome do que a Frota Estelar deveria ser.
Os conflitos eram resolvidos na conversa. Os Klingons se tornavam parte da federação. As espaçonaves se tornavam mais confortáveis e famílias inteiras podiam viver nelas durante as missões... Por sete temporadas Star Trek: A Nova Geração foi transmitida na TV norte-americana, mantendo o recorde de série mais longeva da franquia de múltiplas encarnações, e elevando Picard ao posto de capitão favorito, atrevo-me a dizer, da maioria dos trekkies.
Mas, já diria Nero (não o romano, o romulano), isso foi em outra vida.
O tempo e a Paramount não esperam por ninguém, e a vida seguiu. Depois de Picard nós acompanhamos Sisko, Janeway, Archer, Kirk, de novo, e Lorca (e Georgiou, e Pike...), mas a verdade é que, desde então, ninguém mais conseguiu firmar o pé. Enquanto Deep Space Nine e Voyager foram sucessos razoáveis, Enterprise mal se sustentou por três temporadas, a linha temporal paralela cinematográfica da USS.Kelvin teve três filmes dos quais eu gostei em diferentes níveis, mas que não cativaram o grande público, e Discovery, aparentemente, é uma série divisiva, da qual algumas pessoas gostam, algumas detestam, e a maioria, como eu, nem mesmo tiveram curiosidade para assistir... E como a Paramount aparentemente não sabe ao certo o que fazer com Star Trek nesses dias, eles foram atrás da última pessoa a comandar uma nave da federação com sucesso para mais uma missão:
Jean Luc Picard.
Quando encontramos o almirante Picard (Patrick Stewart), ele acaba de despertar de um pesadelo no qual jogava cartas com Data (Brent Spinner) na órbita de Marte. Picard não é mais um militar.
Há vinte anos afastado da Frota, ele vive em chateau Picard, na França, cuidando de seus vinhedos com os romulanos Laris (Orla Brady) e Zhaban (Jamie McShane) e seu cachorro, o pitbull Imediato.
Picard está mais rabugento do que o normal porque terá que dar uma entrevista para a TV a respeito de sua carreira, nessa entrevista, nós descobrimos que Jean Luc liderou uma missão de resgate não-sancionada pela Frota Estelar para evacuar 900 milhões de romulanos de seu planeta, mas durante esse esforço, Marte foi atacada por "sintéticos", e os estaleiros onde as espaçonaves eram montadas foram destruídos, levando a Frota a abandonar o resgate.
Picard, desgostoso com a decisão, escolheu aposentar-se em protesto, e retirar-se para cuidar de seus vinhedos.
O estados das coisas nesse momento da história, então, tem romulanos não mais como os vilões da história, mas como refugiados, androides, ou "sintéticos", foram proibidos e toda a pesquisa relacionada a eles tornou-se ilegal além da mera teoria, e a Federação dos Planetas Unidos se tornou isolacionista, defensiva e ressentida dos refugiados romulanos à suas portas.
É nesse cenário que conhecemos Dahj (Isa Briones) em Grande Boston. Dahj está comemorando o fato de ter passado no seu vestibular futurista quando um grupo de assassinos se teleporta pra dentro de sua sala, mata seu namorado, e tenta capturá-la. No momento em que eles enfiam um saco na cabeça da jovem, ela tem uma visão de Jean Luc, entra em modo kung-fu automático e desce a porrada em seus pretensos captores, fugindo em seguida.
Eventualmente, ela surge na vinícola de Picard, e por alguma razão, os dois parecem partilhar uma conexão que não sabem de onde vem. Nessa mesma noite, Jean Luc tem outro sonho com Data, e isso o leva até os Arquivos da Frota Estelar em São Francisco, onde ele descobre que a origem de Dahj pode estar ligada a seu antigo primeiro-oficial.
Isso, combinado a um trágico evento que se segue, e a uma fascinante descoberta que o almirante reformado faz em Okinawa, o leva a decidir que é hora de se mexer para mais uma aventura.
Rememberance é um primeiro episódio algo confuso para Star Trek: Picard.
À primeira vista fica claro que a série está tentando cativar fãs de longa data com uma boa dose de nostalgia ao mesmo tempo em que há doses cavalares de exposição para que os espectadores casuais não fiquem boiando. Há uma dose cavalar de política dos dias de hoje diluída no pano de fundo da série como sempre aconteceu em Star Trek, algumas coisas, porém, parecem um pouco fora de lugar, especialmente a Federação ter se tornado um bando de escrotos sem interesse em salvar refugiados e proibindo os androides. Isso é algo que vai contra tudo o que a entidade sempre representou em Star Trek, e contra as ideias originais de Roddenberry, que sempre mostraram o futuro como um lugar brilhante onde o que a humanidade tinha de melhor pôde florescer.
Obviamente existe um grande interesse em colocar tanta ação quanto possível na série para mantê-la atrativa à audiência mais jovem, algo que parece truncado quando temos um protagonista octogenário tentando correr de um lado pro outro, e com um bocado de coisas acontecendo e sendo explicadas nesses primeiros quarenta e quatro minutos de Picard, é difícil não ter a impressão de que a equipe responsável teve meia dúzia de ideias para a série, não soube escolher qual delas tocar e resolveu seguir com todas elas.
Por outro lado, foi bom voltar a ver Patrick Stewart como protagonista de algo.
Aos 80 anos de idade o ator britânico segue tendo mais carisma, talento e presença de cena do que todo o elenco de Discovery combinado.
Os efeitos visuais estão muito bons para uma série de TV, e apesar de eu ter ficado algo dividido com relação a esse primeiro episódio, eu provavelmente vou voltar para ver como as coisas seguem.
Star Trek: Picard está disponível no Amazon Prime Video.

"-Pelos últimos vinte anos eu não vivi, eu esperei a morte."

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