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sábado, 30 de julho de 2011

Resenha Cinema: Capitão América - O Primeiro Vingador


Todo mundo sabia que em algum momento ele tinha que sair das páginas das revistinhas e alcançar os cinemas do mesmo modo que haviam feito seus colegas X-Men, Homem-Aranha, e Demolidor. Mais ainda depois que o Homem-de-Ferro se transformou em ícone pop, o Thor não fez feio e o incrível Hulk, mesmo injustiçado, ressucitou no cinema com Ed Norton depois da incursão desastrada com Ang Lee. E o que esse povo todo tem a ver com o bandeiroso?
Bom, eles fazem parte do supergrupo mais clássico da Marvel, os Poderosos Vingadores, a resposta da casa das ideias à Liga da Justiça da DC. E, esses heróis já citados, Homem-de-Ferro, Thor, Hulk, e outros mais, são membros dos vingadores sob a liderança dele. Do Capitão-América.
Bueno, se o cara é o líder do grupo, se ele é, como alardeia o título do filme, o primeiro vingador, e tudo mais, então por que esperaram todo mundo já ter seu próprio filme (O Homem-de-Ferro já tem sua própria franquia!) pra apresentar o sujeito?
Provavelmente por que, pro público civil (E quando eu digo civil, quero dizer não-nerd), o Capitão-América é apenas um valentão vestido de bandeira. Pior ainda, de bandeira dos EUA.
Não deixa de ser algo que provavelmente assusta os executivos de um estúdio. Hoje em dia, o grosso da arrecadação de um blockbuster vem do estrangeiro, então, como convencer o público que nunca abriu um gibi que o Capitão-América é mais que um cara anabolizado brigando por petróleo com gente menor que ele?
Como mostrar que o personagem surgido em 1941 nas páginas da editora Timely como um herói da antiga que espancava seus inimigos com um violento cruzado de direita não era só um xarope veículo de propagação do americanismo?
Bom... Capitão-América - O Primeiro Vingador acerta a mão ao tentar fazer isso contando a história de Steve Rogers (Chris Evans, ex-Tocha Humana), um mirrado rapaz do Brooklyn, filho de um soldado americano morto na Primeira Guerra Mundial e de uma enfermeira, jovem que sempre foi brutalizado pelos valentões da região mas jamais desistiu de lutar. Com a Segunda Guerra Mundial matando soldados americanos na Europa, Steve sente que tem a obrigação de ajudar, mas com seu físico de tuberculoso e extensa lista de problemas de saúde ele simplesmente não é aceito nas Forças Armadas não importa o quanto tente.
Até que surge em seu caminho o Dr. Abraham Erskine (Stanley Tucci, competentíssimo, emprestando ao cientista uma profundidade inexistente nos quadrinhos e muito bem-vinda), físico alemão que desertou e, nos EUA, oferece aos americanos o seu Projeto Super-Soldado. Erskine reconhece em Rogers a coragem de alguém que, mais que apenas "matar uns nazistas", quer fazer a coisa certa. Alguém que reconhecerá o valor da força e do poder por conhecer as amarras da fraqueza e da impotência, e, acima de tudo, um bom homem.
Após receber o Soro do Super Soldado e ser exposto à radiação de raios Vitta Steve aparece com físico de Hércules, capaz de realizar prodígios de força, de velocidade e resistência.
O rapaz, porém, acaba se tornando o único espécime do que deveria ser um exército, e, sendo valioso demais para ser desperdiçado, acaba sendo empurrado, ao invés das linhas de frente, para os palcos dos shows de captação de bônus de guerra. Entretanto, na Europa, após descobrir que a dissidência tecnológica do Reich, a Hidra, encabeçada pelo cruel Johann Schmidt, capturou praticamente todo o 107° batalhão, Steve decide abandonar os palcos e abraçar o conflito para salvar seus companheiros.
Eis aí a premissa do filme. E ele funciona. Chris Evans, pra quem quase todo mundo, incluindo eu, torceu o nariz quando foi anunciado não faz feio. Ele abandona as caretas e piadinhas presentes em sua filmografia anterior e abraça com competência o personagem, sendo heróico e corajoso, sim, mas também passando sempre a impressão de ser um sujeito humilde. O resto do elenco não faz feio, Tucci, como já foi dito, é ótimo no papel do Dr. Erskine, Tommy Lee Jones, no papel do Cel. Chester Phillips é divertidíssimo em sua rabugice e responsável pelos melhores momentos cômicos do filme, que felizmente estão sob controle. Há ainda Hayley Atwell, como Peggy Carter, obrigatório interesse romântico do herói, Sebastian Stan, no papel de Bucky Barnes, melhor amigo de Rogers, Neal McDonough como Dum-Dum Dugan, e Dominic Cooper como um jovem Howard Stark.
No lado do mal, Johann Schmidt, o Caveira Vermelha é interpretado por Hugo Weaving, que não tem muito que fazer com o personagem, demasiado raso, cheio de frases de efeito e obviamente calcado no (ótimo) visual. O Arnin Zola interpretado por Toby Jones tem um pouco mais de profundidade, e se mostra mais interessante quando está em cena.
O trabalho do diretor Joe Johnston, de Rockteer, é bem feito, e ele entrega uma aventura divertida e despretensiosa, que escapa de algumas armadilhas recorrentes da filmografia Marvel mas incorre novamente em outras tantas. O negócio, agora é torcer para que, com o tabuleiro montado para Os Vingadores os filmes solo da Casa das Ideias possam se focar mais em seus personagens principais e em aparar arestas que têm ficado em todos os longas.
Como de hábito, fique até o final dos créditos. Você não se arrependerá.

"-Você quer matar nazistas?
-Eu não quero matar ninguém. Eu não gosto de valentões; não me importa de onde eles vêm."

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Rapidinhas do Capita


-Tu sabe que não existe esse negócio de perfeição, né?
-Lá vem tu, de novo...
-Não, só pra tu saber, por que, tipo, eu já tinha te dito isso antes.
-Tá.
-Então, de repente, até pra tirar o peso que tu pode depositar em cima dos ombros dessa pessoa, fica esperto... Perfeição, e tal... Isso não existe.
-Arram.
-Só pra tu saber.
-OK, obrigado.
-...
-...
-... Não adianta, né? Tu ainda acha que ela é perfeita.
-Não.
-Não?
-Não.
-Me diz um defeito que tu acha que ela tenha, então.
-Bom... Eu não tenho certeza se ela tem, sabe? Ás vezes acho que sim, mas não tenho cem por cento de certeza. Mas espero que ela tenha mau-gosto pra homem.

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Um amigo, alguém especial, ou não, que gosta de você, que se importa com você, tem que fazer tudo ao seu alcance pra que você seja feliz, pra que não se machuque, e não enfie os pés pelas mãos. Não cuidar de você. A gente cuida é de criança. Amigos, e outras pessoas que nos são caras e especiais, esses a gente aconselha.
Não é raro, porém, que as nossas palavras e ações sejam mal-interpretadas. Não é uma coisa impensada que, vez que outra, nossos conselhos sejam vistos com desconfiança. As pessoas têm tendência à maldade por natureza, então, também por natureza, nós reagimos com reserva quando alguém nos sugere esse ou aquele rumo de ação.
Um amigo, ou uma pessoa que se importa com você, e que te tem como especial pra si, tem que ser bom pra sua vida. Te trazer coisas boas. Não dúvidas. Não tem que te fazer passar trabalho ou dificuldade de qualquer espécie. Não é assim que funciona. Não é assim que é. Quando uma pessoa é especial pra ti, quando ela entra na tua vida a ponto de estar nos teus pensamentos todas as horas do dia, de estar nos teus planos, e nos teus melhores cenários, isso exige dedicação. Exige cuidado.
Poder e responsabilidade, manja?
Dar coisas boas pra vida de alguém que só traz coisas boas pra tua. É assim que tem que ser. É assim que é pra ser.

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-Nossa, eu acho o Rorschach muito atraente...
-Sério? O Rorschach do Watchmen?
-Arram...
-Putz...
-É, aquela personalidade meio psicótica dele. Pensa bem, imagina uma mulher com aquela característica... Não é atraente?
-Não. É a Glen Close de Atração Fatal.
-Hmmm. É, acho que só funciona pra homens.

terça-feira, 26 de julho de 2011

Das certezas e das crenças


-Eu tenho certeza - Elucubrava Leomir. - De que se o Calvin, do Waterson, fosse casar com alguém, não deveria ser com Susie Derkins. Susie é uma boa menina, cresceria e se tornaria uma boa moça, provavelmente toleraria o Calvin, mas não seria feliz ao lado dele. Susie seria feliz casando com um sujeito como o pai do Calvin. Alguém ajustado, correto, que se exercita com frequência, e que gosta de inúmeras atividades ao ar-livre. Se o Calvin fosse casar com alguém, seria com a Mafalda, do Quino. São dois espíritos inquietos, duas mentes afiadas, dois desafiadores de autoridades. São o tipo de crianças que você odeia ter como vizinho a menos que também tenha seis anos de idade. São os alunos que os professores não querem, e os filhos que os pais têm que aprender a amar. São projetos de gente com o tipo de visão que mais pessoas deviam ter.
Os amigos da Mafalda são todos toscos demais pra ela. Ela jamais teria o estímulo intelectual necessário pra se desenvolver enquanto ser humano do lado do Filipe, ou do Manolito, ou do Miguelito, nunca daria certo entre eles, e não apenas por que ela os conhecia desde a infância, mas sim por que ela conhecia todos os defeitos de todos eles desde a infância. Mafalda e Calvin, sim, teriam tudo a ver, ela seria até capaz de tolerar a fixação dele com o Haroldo. Ela seria capaz de aprender a usar o fato de a consciência dele ser um tigre de pelúcia e extrair o melhor do Calvin através do Haroldo.
Da mesma forma, ela sendo tão voltada pra questões humanitárias e tudo mais, daria a ele um perímetro de liberdade pra suas divagações filosóficas e momentos de introspecção profundos pra ser o Homem-Estupendo, o Astronauta Spiff, e tudo mais.
Eu não vejo casal mais perfeito do que Mafalda e Calvin, não vejo, mesmo. - Ele disse, tomando fôlego, e continuando:
-O problema, aí, seria o fato de que eles vivem em universos diferentes. Têm backgrounds diferentes, coisas diferentes a fazer. A Mafalda deixaria de fazer tanta coisa pra estar nas tirinhas do Calvin, ela abriria mão de tanta coisa. Ela valoriza tanto aqueles amigos abestalhados dela, o Filipe, do Manolito, do Miguelito, a Susanita, o Guile e a Liberdade, que nem dá pra imaginar o tamanho do sacrifício que ela teria que fazer pra deixar todos pra trás e viver nas tiras do Calvin, que nem sequer são separadas em quadrinhos.
E o Calvin... Por mais que ele fosse querer estar com alguém como a Mafalda. Por mais que ele fosse ser feliz com a Mafalda, por mais que a ausência da Mafalda depois da sua presença fosse deixá-lo arrasado por algum tempo, talvez muito tempo... Ele ainda teria o Haroldo. Eu creio que ele ainda poderia, vez que outra ser o Homem-Estupendo, ou o Astronauta Spiff. Moleques são extremamente flexíveis. Ele ia se virar.
Leomir terminou e respirou fundo, mordendo ruidosamente um chocolate Bis. Não havia mais ninguém na sala. Apenas um retrato da Rejane enfiado no meio de uma revista que ele prometera não voltar a abrir.

Tempo Pretérito


-Eu sou um lobo solitário. - Disse, Heitor, de peito cheio, no alto de seus oito anos de idade com um álbum de figurinhas do RoboCop sob o braço. Não era a primeira vez que Heitor se via excluído de uma atividade. Na verdade, a exclusão era matéria frequente para ele. Heitor jamais fora a mais social das pessoas. Jamais fora de demonstrações gratuitas de afeição. Seus pais nunca se preocuparam com o fato de Heitor ser um moleque um pouco mais ensimesmado. A verdade é que, para eles, a introspecção do rebento era um sinal de bom comportamento, e, por consquência, de um trabalho bem realizado pelos genitores. E, quiçá em parte, fosse, de fato. Entretanto, não era apenas isso.
Heitor não era afeito às regras do mundo.
As conhecia à todas. As respeitava. Mas não gostava delas. Então, encolhia-se do mundo, vivendo à seu modo sempre que essa opção lhe era oferecida. Não era um isolacionista convicto, o Heitor. Mas era, sim, um menino solitário. Em parte por opção, em parte por imposição. Não se queixava, porém. Sabia aproveitar o seu tempo, sendo um soldado, um caubói, um guerreiro medieval enfrentando monstros imaginários, fazendo parte de projetos científicos que o transformavam em um ciborgue, em um super-ser, ou fugia pra uma galáxia bem, bem distante, onde se unia à Ordem Jedi e enfrentava o malvado império galáctico.
De toda sorte, Heitor aproveitava sua infância quando estava sozinho. E na escola, onde poderia fazer amigos, fazia-os poucos. Não era de ter um milhão de amigos. Um ou dois a cada ano. E, aficcionado que era por ficção, quadrinhos e aventuras fantásticas, não raro era excluído dos grupos de trabalhos. Das brincadeiras organizadas no recreio, e dos esportes da Educação Física. Não se importava, contudo. Era nesses momentos em que Heitor dizia a frase lá do início:
-Eu sou um lobo solitário.
E tocava em frente. Servia-lhe. Na infância, por estranho que pareça, foi fácil para Heitor ser solitário a maior parte do tempo. Havia, claro, interlúdios de companhia. Amizades fugazes. Todavia, nada que mudasse quem Heitor era. E Heitor passou incólume pela infãncia. Sem traumas, sem dores, ou amarguras. Aproveitou o tempo que partilhou com seus amigos de ocasião, ofereceu o que tinha de si em abundância, e recolheu o que lhe era oferecido. Aprendeu ali sua lição. Aprendeu a viver e saber viver sozinho, mesmo em meio à multidão. Aprendeu a partilhar quando acompanhado, mas a não precisar de companhia ou de partilha pra viver.
Na adolescência, houve muito mais companhia na vida de Heitor. Ele chegou a se distanciar da pessoa que fora anos antes. Chegou a pensar que sabia ser diferente. Que sabia viver acompanhado. E soube, apenas não gostou tanto assim. E lembrou-se: Era um lobo solitário.
E logo, voltaria a recolher-se sob o manto da solitude onde preferia trafegar.
Já adulto, aprendeu a equilibrar a solidão que o agradava com o acalanto da companhia tantas vezes saudável, necessária. Sem esquecer quem era. O que era. Sempre lhe serviu a consciência de que, alguns de nós, são, sim, vá lá, senão lobos, solitários de coração.
Quando era abandonado, vilipendiado, esquecido, jamais permitia que aquilo o ferisse. Pois sabia ser só. Sabia não precisar de ninguém.
Sabia...
Hoje, já não tem certeza se sabe mais. E lhe dói não saber.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Medidor


-Tu me ama? - Ela perguntou, enquanto ele segurava a mão dela esfregando o próprio nariz na maçã de seu rosto.
-Eu não sei... Acho que sim. Mas não tenho certeza, ainda. - Ele respondeu, dolorosamente honesto.
Ela ficou dividida entre admirar-lhe a franqueza, ou sentir-se açoitada pela verdade, de que, a despeito de ela ter se entregado de corpo, alma e coração, ele ainda tinha restrições. Engoliu em seco. E, com voz firme, quis saber:
-E por que tu veio falar comigo?
Ele sorriu.
-Por que? Não era pra ter ido?
-Não... - Ela replicou suspirando. - Não foi o que eu disse. Eu só... Sei lá...
Ele viu que ela estava incomodada. Parou de sorrir.
-Foi por que eu te achei bonita.
-Ah. - Ela fez virando o rosto. -Fala sério comigo, pôxa...
Ele se endireitou, colocando a mão sobre o peito dela, muito sério:
-Não foi nada que tu tenha dito, não foi nada que tu tenha feito, nenhum gesto, nenhum movimento, nada. Me deixa ser sincero a respeito da minha superficialidade: Foi porque tu é linda. Eu nem imaginava todo o resto. Eu nem sequer podia sonhar com todo o resto. Se alguém me falasse antes, de tudo mais que havia, eu chamaria de trovador e seguiria caminhando. Eu jamais poderia acreditar em tudo o que tu é antes de ver, tocar, experimentar. Porque tu é praticamente perfeita, tudo de bom, de linda, de melhor, só não é perfeita por uma razão, que é o teu péssimo gosto pra homem. Tirando isso, menina, tu é o ó do borogodó.
Ela ficou olhando pra ele:
-Mas ainda assim tu não me ama. - Disse com a voz embargada de decepção.
-Não foi o que eu disse. - Ele se defendeu.
-Tu não tem certeza se me ama. - Ela corrigiu, ainda decepcionada.
-Não. Não totalmente. - Ele admitiu. -Mas eu diria que tem uns bons noventa e cinco por cento de chances de que sim. - Ele disse com o cenho franzido numa careta falsa de preocupação.
-E tu me avisa quando forem cem por cento? - Ela pediu.
-Pode apostar. - Ele disse a abraçando enquanto buscava, com seus lábios os dela, e seu medidor interno de certeza subia a passos largos em direção ao máximo.

terça-feira, 19 de julho de 2011

Rapidinhas do Capita


Semana pra ter orgasmos nerd na web:
Teaser de Dark Knight Rises, de Os Vingadores, e de O Espetacular Homem-Aranha, trailers de John Carter of Mars, Cowboys & Aliens e Sherlock Holmes, fotos de Thorin Escudo-de-Carvalho na rede, críticas positivas ao filme do Capitão-América e Harry Potter quebrando recordes de bilheteria. Se o mundo acabar, mesmo, em 2012, eu ao menos vou ter visto os filmes que queria ter visto.

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-As pessoas me dão crédito demais, Firmino. Demais. - Disse Franco, quase suspirando.
-Estourou o cartão de crédito? - Perguntou Firmino, desligado.
-Não, burro. Eu disse que as pessoas me dão crédito demais. - Explicou Franco.
-Ah. - Assentiu Firmino. Mas virou-se quase instantaneamente perguntando: -Como assim?
-Ah, meu Deus... As pessoas pensam que eu sou capaz de mais coisas do que eu de fato sou, Firmino. Elas me têm em conta demasiado alta. Sempre acham, pro bem ou mal, que eu sou capaz de mais do que eu de fato sou. Geralmente, pro mal. Elas me tomam por um canalha manipulador desprovido de moral, decência ou bons sentimentos capaz de trapacear, mentir e realizar toda a sorte de atrocidades suburbanas.- Explanou Franco, professoral. -Elas esquecem que, á despeito de eu ser um sujeito reservado, distante e quiçá, até um pouco frio, mesmo, eu suponho, eu ainda sou capaz de me magoar.
-Hmmm... Eu não te tenho em alta conta, Franco. Te acho um tremendo trouxa. - Disse, o Firmino, cândido, colocando a mão no ombro de Franco, que hesitou brevemente, e, deu de ombros, pousando, também sua mão no ombro do amigo e dizendo:
-Obrigado, meu velho.

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Não é tu. É o que tu divide com o mundo. O que tu tem, de sobra, e que quase escorre pelos teus poros, é isso que tu pode dividir. A gente não divide as coisas que não tem em quantidade suficiente. Como diz minha mãe, em uma analogia extremamente católica mas que estranhamente faz sentido, não se tira dos pés de um santo pra colocar nos de outro. É por isso que nós só dividimos o que temos em excesso. Aquilo de que podemos dispôr. De outro modo, a partilha é inócua. Quando dividimos apenas aquilo que temos de sobra não estamos sendo egoístas, estamos apenas sendo justos. Oferecendo o que temos em quantidade suficiente pra satisfazer outrem, sem prejudicar nem a nos mesmos, nem a eles.
Como tu. Tu que tem tanta alegria, tanta doçura, tanta vida que transborda de ti. Que inunda os lugares que têm a sorte de te receber, que encabula o mundo com teu sorriso tão grande e tão bonito. Tu tem coisas boas de sobra pra partilhar. Tanto tem que, a despeito de ter lá suas restrições com gente, escolheu ajudá-las. Pois é doçura demais. É carinho demais. É tudo de bom demais pra guardar pra si, então, tu divide.
Eu não. Eu sou um bicho do mato. Não tenho lá coisas muito boas pra dividir com ninguém em quantidade alguma. Sou o oposto de ti em vários sentidos e por várias razões. Não escolhi ser assim, apenas, foi o que saiu. É o produto resultante de vários fatores em sucessão. O que eu tenho de bom pra dividir eu meço a conta-gotas.
Mas quer saber? Não vou dividir com ninguém, exceto contigo. Aliás, nem dividir vou. Pega que é teu.
É meio amargo, mas é de coração.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Sensível


Estavam o Maiquél e o Jeison na locadora. Dois fedelhos na parte mais triste da adolescência, aqueles anos que que não há certo ou errado, preto ou branco, mas apenas tonz de cinza, e, nesses tons de cinza se realizam projetos e prodígios que, ás vezes, em se contando, ninguém acredita.
O Jeison, um poço de hormônios em ebulição andava entre as estantes de filmes tendo um nervoso Maiquél ao seu lado. Jeison parou em frente à estante onde lia-se "romance", e passou a mirar as lombadas dos DVDs com interesse sacando um ou outro título escolhido e olhando a capa de forma atenta.
A tensão finalmente foi demasiada para Maiquél enfrentar em silêncio e ele acabou desembuchando:
-Essas gurias que tu vai levar na tua baia, hoje...
-Hã?
-Como elas são?
-São gurias, Maiquél. Tu já viu, um pouco menores que um guri, têm cheiro melhor, cabelo comprido, tetinhas, bundinhas, e outras coisas que nos interessam... - Respondeu, com pouco caso, um chovinista Jeison.
-E essas gurias vão ver filme com a gente? - Inquiriu Maiquél, ainda nervoso.
-Um pouco, pelo menos. Na verdade, eu espero que lá pela metade elas já estejam ocupadas fazendo outras coisas, eh, eh, eh, eh. - Riu o Jeison, maquiavélico.
-Hã...
-Que foi, mano?
-É que... Tipo... Que filme tu vai levar pra elas verem? - Quis saber Maiquél, torcendo os dedos das mãos.
-Tava pensando em romance, tá ligado? Pra amolecer elas pra gente atacar! - Respondeu Jeison, com um DVD na mão. - Olha esse. Antes do Amanhecer. - Mostrou a capa ao Maiquél.
-Ih, velho... Leva esse, não... - Suplicou Maiquél.
-Por que? - Quis saber Jeison, examinando a capa do filme. - É muito ruim? Tu já viu?
-Não é ruim, não... É que... Leva esse, não. Leva outro...
-Esse aqui, então...? Antes do Pôr-do-Sol? Acho que são as mesmas pintas na capa. O cara que fez Dia de Treinamento, e pá... - Sugeriu Jeison, tirando outro filme da prateleira.
-Não... Esse aí, também, não... - Vetou Maiquél, olhando pro outro lado.
-Tá... Então esse... Simplesmente Amor. É de comédia, até.
-Não... Não... Leva outro. Tipo, um de terror, aí elas se assustam e abraçam a gente, e talicoisa! - Sugeriu Maiquél, iluminando-se.
-Aê! Boa! Vamo pegá um de terror bem casca-grossa! - Assentiu Jeison, animado. Mas deteve-se.
-Peraí, peraí...
-Que foi? - Perguntou Maiquél, já a meio caminho dos filmes de horror.
-Que papo é esse, de elas abraçarem a gente, velho? Tu é todo encabulado, e agora vem com esse papo pra cima de mim? Aí tem coisa... - Declarou Jeison, desconfiado.
-Tem nada, mano. Eu quero abraçar as gurias, e tal... - Desconversou Maiquél.
-Qué, nada, velho. Desembucha a real, aí.
-Tem nada, meu. Tô dizendo.
-Fala, mano.
-... Tá, mas, tipo... Tu não pode falar pra ninguém. - Respondeu Maiquél, cochichando.
-Tá, diz, aí. - Concordou Jeison, com pouco caso.
-Não, mano, tu tem que prometer que não vai contar pra ninguém, nem pro Pestana. - Exigiu Maiquél.
-Ih, véio, até parece que eu conto tudo pro Pestana... - Disse Jeison, ofendido.
-Tu conta, mano, tu conta e depois o Pestana conta pro resto da galera, o Pestana parece uma lavadeira, só tu que é trouxa e não vê. - Exasperou-se Maiquél.
-Que foi que o Pestana andou contando pra galera? - Quis saber Jeison, agora ele, nervoso.
-Da Cledinéia. - Disse Maiquél.
-Masquefilhadaputa! - Exclamou Jeison, atraindo um olhar feio do balconista da locadora.
Com a boca coberta repetiu o impropério em um cochicho:
-Aquele filha da puta, mano! Eu pedi pra ele não dizer nada!
-É, mas ele contou. Contou da Cledinéia atrás do muro da casa da dona Rose, contou que tu roubou um pacote de Bono no super no começo do semestre e que tu sonhou com o Anderson Silva andando pelado no vestiário do clube. - Declarou Maiquél.
-Mas que! Cara, quem sonhou com esse negão pelado foi ele, mano! Ele que vive assistindo MMA e malhando feito alucinado na academia! E eu não roubei a bolacha, enfiei no bolso e esqueci de pagar, véio! Aquele Pestana filho de um cão! Eu quebro ele! - Exclamou Jeison com as mãos na cabeça.
-Tá, tá... - Interrompeu Maiquél. - Seguinte, eu acredito em ti, mano. Mas ó, tu quer saber o porque de eu não querer esses romances aí, tu não pode contar pra ninguém. Especialmente pro Pestana.
-Eu não falo nada, véio. Especialmente praquele filho de uma égua do Pestana. Otário... Por que não dá pra ser romance... Aquele corno...
-Mano. Eu... Ó, não fala pra ninguém, mesmo, hein? - Reforçou Maiquél.
-Não falo, mano, juro no pé da santinha. - Disse Jeison, erguendo a mão, solene.
-Mano... É que esse filmes de romance, e pá... Eles, tipo... Bah... Eles me fazem chorar tá ligado? - Disse Maiquél, engolindo em seco.
Jeison ficou sério alguns segundos, mas suas bochechas foram se enchendo de ar conforme ele apertava os lábios e seus olhos se reviravam, até que ele não resistiu e explodiu em uma estridente gargalhada.
-Porra, mano! Tu, tipo, chora vendo filme de guria, véio? - Perguntou Jeison, secando uma lágrima.
-Porra, meu! Fala baixo, véio, tá todo mundo olhando. - Ralhou Maiquél, entre dentes.
-Tá, tá... Peraí... Desculpa... - Disse Jeison, recuperando o fôlego. -Tá... Então, tu chora vendo esse filmes. Tipo... Todos?
-Ah, não todos... Só... Só, tipo... - Hesitou Maiquél.
-Tipo quais? - Encorajou o amigo.
-Ah... Tipo, os bons, tá ligado?
Nova risada de Jeison, seguida de novo protesto de Maiquél.
-Porra, véio...
-Tá... Parei, parei...
Jeison suspirou.
-Mas mano, filme de terror é tipo, faca de dois gumes, tá ligado? Se não for terror de susto, tipo, elas podem nem curtir, podem ficar só de estômago revirado, e aí ferrou a barca, mano.
Maiquél estacou pensativo ante a inegável lógica da ponderação de seu companheiro. Encarou o chão por breves segundos, indeciso. Jeison reforçou seu ponto:
-Tipo, será que não tem como tu engolir o choro, mano? Um filme só? E tipo, com a Mariana, véio, do teu lado, toda romântica e tal, querendo beijinho. Se pá tu estréia tua mão num peito, hoje.
Maiquél ergueu uma sombrancelha, parecia inclinado a tentar, mas ainda não estava certo. Jeison apanhou um filme ao acaso, e mostrou para Maiquél.
-Ó, esse aqui é musical. Mamma Mia! Que tu acha? Tentamos?
Maiquél olhou por um instante pra capa do filme, respirou fundo. Pensou na Mariana. Nem a conhecia, mas o cenário proposto por Jeison era, de fato, inspirador. Concordou.
-Tá bem. A gente tenta. -Assentiu ante uma pequena dancinha de satisfação de Jeison.
Mas complementou enquanto passavam no caixa:
-Mas tipo, quando a Meryl Streep cantar The Winner Takes it All eu vou ter que sair da sala, mano...

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Iluminação súbita


O Daniel vinha andando pela rua, distraído enquanto olhava, uma a uma as revistas da pilha que tinha na mão após sair da banca. Homem-Aranha, um especial do Sandman, Aventura na História, Superinteressante, uma Playboy e uma revista de cinema genérica da extinta SET, estava olhando a imagem dos X-Men da Primeira Classe estampados na capa da revista quando ergueu os olhos, meio por reflexo e também pra não cair dentro de um eventual bueiro aberto, ou esbarrar em algum mendigo bêbado quando viu um casal andando na direção oposta. Levou uma fração de segundo para perceber que a mulher sorria, outra fração de segundo para ver que o sorriso dela era direcionado a ele, Daniel, e uma fração de centésimo para perceber que aquela mulher era Tainá. Ah, Tainá. A Tainá que a quem Daniel fez silentes juras de amor, a Tainá a quem Daniel via em seu futuro, mãe de seus filhos, dona de sua casa, a Tainá com quem Daniel se via brigando pelo controle remoto, e que o deixou. O deixou por culpa sua, e sua apenas, diga-se de passagem. Por que Daniel era demasiado fechado. Incapaz de demonstrar o que sentia. Incapaz de acenar com algum envolvimento ou... Suas reminiscências foram interrompidas pela proximidade do casal.
Tainá, ainda linda, mais linda do que antes, talvez, com seus cabelos pretos ondulados caindo sobre os ombros delicados, e o sorriso de propaganda de creme-dental e a maquiagem charmosa nos olhos o mirava. Daniel estacou enquanto embaralhava ao acaso as revistas temendo que sua Playboy fosse vista.
-Oi. - Disse Tainá.
-Oi... - Respondeu Daniel, incerto. -Tudo jóia?
-Tudo... Deixa eu te apresentar... - Respondeu Tainá enquanto se movimentava na direção do homem que segurava sua mão.
"Ah, meu Deus", pensou o Daniel. "Ela vai me apresentar esse calhorda. Esse calhorda sortudo que tá segurando a mão dela. Que pode enterrar o nariz no pescoço dela, no cabelo dela, atrás da orelha, meu Deus! Esse desgraçado que está ocupando um espaço que devia ser meu, que podia ser meu!". Daniel esboçava um sorriso enquanto Tainá se mexia. O mundo ficou em câmera lenta. O sujeito ao lado de Tainá começava a sorrir, também.
"Ela vai dizer 'Esse é meu namorado, o fulano', e eu vou fazer o quê? Me parar a chorar? Espernear deitado no chão dizendo que é injusto? Ah, meu Deus, ela vai dizer noivo. Ela vai dizer 'Esse é o fulano, meu noivo'. Caraca, eu me mato...".
A Tainá pigarreou:
-Daniel, eu quero que tu conheça o Fabrício...
"Vou bater nele. É isso. Vou meter a porrada nele. Ele vai dizer 'Encantado', eu vou responder 'É o cacete' e meter a porrada nele. Um socão bem no nariz, ou no bico do queixo, pra ele desmontar. Não! Supercílio. O desgraçado é mais baixo que eu, eu bato de cima pra baixo no supercílio. Vai sangrar, e ele vai entrar em pânico, aí eu encho ele de pontapé quando ele cair no chão.".
O Fabrício estendeu a mão, cumprimentando Daniel. Deu uma piscadinha e disse: -Beleza, velhão?
-Opa, beleza, tchê, e tu? - Respondeu Daniel, afável.
"Filho de trinta putas! É um fremps. O calhorda é um trouxa, um boçal, um cretino. Quem é que conhece uma pessoa e sai piscando e chamando de 'velhão'? Eu não vou nem me dignar a bater nesse cretino, se bater vou bater de mão aberta, bofetão, por que essa coisa não vale um soco. Essa mulher é uma tosca, mesmo, merece um abestalhado desse. Garanto que é o tipinho que deixa declaração de amor no Orkut.".
-Bom te ver. - Disse a Tainá. O que tu anda fazendo? -Perguntou.
-Ah... O de sempre. Trabalhando, estudando, tentando evitar a insanidade... - Respondeu Daniel balançado o corpo pra frente e pra trás feito um autista.
O Fabrício apertou a mão da Tainá dizendo:
-Amorzin, o filme.
-Ah, é... Desculpa, a gente tem que ir, estamos indo ao cinema...
"'Amorzin', ele fala 'amorzin', eu quero mais é que esses dois se explodam. Quero que os dois se enterrem. Quero que sejam açoitados por um torpedo de ressonância do Sun-Crusher, que caiam na jaula dos velociraptores, que..."
-Foi bom te ver, Dan.
-Prazerão, velhão.
Daniel chegou a fazer a sua cara de insulto. Ele tinha uma cara específica pra insultos. Mas Tainá, o olhou nos olhos enquanto começava a andar de mãos dadas com Frabrício. O castanho profundo dos olhos dela, envoltos pelo rímel preto generosamente aplicado em seus cílios longos. E foi como se Daniel fosse banhado por alguma luz súbita e misteriosa, e ele não conseguiu disparar nenhum impropério. Não conseguiu sequer manter a cara de insulto, pois ele compreendeu:
A Tainá estava onde devia estar. Nos braços de alguém que a valorizava. Que a chamava de "amorzin", que devia deixar declarações de amor no Orkut, e escrever frases românticas no status do MSN. Alguém capaz de fazer todas as coisas que Daniel não era capaz. E ele, envergonhado, engoliu os insultos e as más palavras. E disse apenas:
-Bom te ver, também, Tá. Prazer, Fabrício. Tudo de melhor, pra vocês.
A Taíná acenou delicadamente enquanto andava, o Fabrício, porém, virou meio corpo e ergueu o polegar enquanto estalava o canto da boca fazendo um "tsc".
"OK...", pensou Daniel, olhando desgostoso pra cena. "...Tudo de melhor pra Tainá. Câncer testicular pro Fabrício. Pelo menos em uma das bolas.".
Até pra nobreza proveniente da iluminação súbita havia limites.

Sundae


O Afonso e o Lúcio saíram da sorveteria cada um com um sundae na mão. Encaravam as guloseimas com um sorriso. Não que estivessem particularmente esfaimados, apenas foram surpreendidos pelo calibre da sobremesa. Era um sundae imenso. Eles tinham entrado quase ao acaso na sorveteria para aproveitar aquele incomum dia de dezenove graus em pleno inverno gaúcho, e, após olharem um desses cardápios cafonas cheios de fotos, escolheram o sundae. Não puderam evitar a surpresa quando se depararam com um doce que fazia, de fato, justiça à imagem do cardápio. Quiçá era maior do que a representação no cartão plastificado sobre o balcão.
Agora deixavam a sorveteria após pagarem a conta com seus sorvetes desproporcionados enquanto riam.
Lúcio ficou satisfeito, seu amigo Afonso andava meio cabisbaixo, mais introspectivo e ensimesmado do que o habitual. Ele percebera que algo estava errado quando Afonso se abstivera de imitar vozes e entonações diferentes durante a última partida de RPG do grupo. Embora tivesse um sorriso no rosto, porém, Lúcio percebeu que Afonso ainda não estava bem quando ele encarou o sorvete por longos segundos e suspirou olhando pra cima antes de dar a primeira colherada na iguaria.
Sentaram em uma praça pouco mais de uma quadra de distância da sorveteria, e começaram a comer seus doces. Lúcio falou:
-Velho, eu recém almocei, não sei se dou conta desse sundae inteiro...
-Tá brincando? - Replicou Afonso. - Eu vou começar a comer agora, mas vou levar pra casa e comer sundae na sobremesa a semana inteira. - Exagerou.
Riram.
Continuaram comendo, em silêncio. O sorvete era muito bom. Lúcio, porém, não consegiu terminar o seu. Largou o copo ao lado do próprio pé com o conteúdo pouco abaixo da metade. Afonso continuava comendo. Mecanicamente, enquanto olhava pra frente. Lúcio perguntou:
-Tudo bem?
Afonso hesitou brevemente antes de responder:
-Sim. Eu vou terminar nem que gele até minha alma. Eu não vou largar o sundae de dois litros pela metade, agora, senão, amanhã eu tô comendo meia barra de cereais de sobremesa após comer batata ao vapor e frango grelhado no almoço.
Lúcio riu. Mas perguntou de novo.
-Tudo bem?
-Tudo. Eu aguento. - Respondeu Afonso dando mais uma colherada.
Lúcio repetiu:
-Tudo bem?
Afonso pousou a colher no copo do sorvete e encarou sério o amigo.
-Vai dar de Robin Willians pra cima de mim, gênio indomável?
Lúcio riu de novo, mas não falou nada. Encarou Afonso como quem aponta uma obviedade. Afonso suspirou:
-Não... Claro que não. Não tá tudo bem. Tá o oposto de tudo bem. O tudo bem tá aqui: - Ele disse erguendo a mão trinta centímetros acima da cabeça.
-E eu tô aqui. - Continuou baixando a mão rente ao chão entre os pés.
-É... Dá pra ver. Que merda... E o que tu vai fazer?
-O que que eu vou fazer... Eu vou fazer o que eu sempre faço nessas situações. Eu vou continuar tocando em frente, fazendo as minhas coisas. Vou me lamuriar feito uma velha, encher o saco dos meus amigos com a minha cara de bunda, evitar a estagnação apenas reagindo ao mundo, e tentar evitar canudinhos, pantufas, super-heróis, cinema, RPG, Star-Wars e tudo mais...
Lúcio encarou Afonso com uma expressão de incredulidade. Afonso suspirou:
-É... Eu sei...
-E não tem outro jeito?
-Não. Não tem. Não tem por que eu não sei ser diferente. Não tem por que eu sou a porra do produto do meu ambiente. Se eu fosse Frank Costello e meu ambiente fosse um produto de mim, talvez tivesse jeito, mas não é o caso. Eu sou quem eu sou. Eu sou quem eu posso ser. Não é muito, mas é o que dá. E isso não é o bastante. Eu sabia que não era, todos os meus instintos diziam que não era, mas eu ainda assim, ignorei tudo o que eu sei a respeito de tudo, e tentei um salto de fé...
-De fé? Tu?
-Te fode.
Os dois riram.
Lúcio suspirou enquanto Afonso mexia o sorvete já em estado mais pra líquido do que sólido dentro do copo. Tomou fôlego e abriu a boca:
-E se...
-Não. - Interrompeu Afonso. -Nós passamos da fase do "E se". Acho até que já tem mais gente na parada.
-Isso é linguagem da prisão? - Riu Lúcio.
Afonso riu, também. Olharam pra distância. O céu já estava escuro, apenas com rajadas de cor de laranja e rosa junto ao horizonte.
-Vamo indo? - Perguntou Afonso.
-Vamos. - Assentiu Lúcio, levantando-se e jogando o seu resto de sorvete na lixeira. Afonso se levantou e foi acompanhando o amigo carregando o que ainda restava de sorvete em seu copo consigo.
-Tu ainda vai comer esse troço derretido? - Perguntou Lúcio.
-Eu vou levar ele pra casa. Vou colocar no freezer em potência alta, deixar estar, e torcer pra que ele esteja apresentável amanhã, e quem sabe, eu, ou outra pessoa queira ele...
Lúcio sorriu colocando a mão no ombro do amigo:
-Que analogia mais gay.
-Vai te foder. - Replicou Afonso, rindo.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Rapidinhas do Capita


Foi tão engraçado, eu tava trabalhando, normal, sentado na minha mesa, com um relatório de entrega na frente, e aí, do nada, senti o gosto do teu beijo! Direitinho! Super nítido, exatamente o gosto que eu sentia quando eu te beijei! Cheguei a me arrepiar, quis te ligar, sabe? Perguntar se tu estava, sei lá, fazendo alguma macumba, se tu, por alguma eventualidade tinha atirado um beijo pra alguma foto minha no frasco de um inseticida, ou se sei lá... Mas foi incrível. Nítido demais, vívido demais. O teu gosto, ali, na minha boca, contra todas as possibilidades, cheguei a ficar chocado!
Ele pensou nisso tudo olhando pro telefone. Chegou a apanhar o fone e erguê-lo do gancho. Mas deteve-se. Quem era ele pra ficar invadindo o espaço dela assim? Pra ficar impondo a própria presença dessa forma? Logo ele.
Deixou pra lá. Contaria a ela mais tarde, quando se falassem. Fez questão de guardar os detalhes, como o horário, e o que estava fazendo, pra ver se ela lembraria o que ela estava fazendo no mesmo horário do dia.
Foi só uma das histórias que ficaram pelo caminho.

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Foi de mim.
Foi das coisas que eu não disse.
Foi das demonstrações de afeto que ficaram no vácuo.
Foi da minha maneira não-verbal de ser, quando o verbal era tudo o que nós tínhamos.
Foi da minha incapacidade de entrega, de todos meus mecanismos de defesa ininteligíveis.
Não foi de ti.
Não foi da delicadeza das tuas palavras.
Não foi de ti acontecendo e correndo todos os riscos.
Não foi das tuas marretadas no muro do meu perímetro de quilômetros e quilômetros.
Não foi da tua coragem surpreendente, do teu encanto surreal e da tua franqueza indefectíveis.
Não foi nada disso. E agora, só o que ficou foi esse "não" medonho entre aspas, pulsando onde já houve tanto mais.
A pele que eu "não" vou mais tocar.
O beijo que eu "não" vou mais provar.
O cabelo que eu "não" vou mais cheirar.
O sorriso que eu "não" vou mais causar.
As coisas tuas e minhas que "não" serão mais nossas.
E o tu e eu que "não" vai mais ser nós.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Rapidinhas do Capita


-Tu vai seguir acordando pela manhã, fazendo o que precisa fazer, sendo quem precisa ser, da melhor forma possível. Tu vai abrir os olhos, sair da cama, e vai seguir fazendo tudo o que sempre fez. E vai doer. Ainda vai doer por muito tempo. E, em algum momento, tu vai pensar, "puxa, não dói, hoje!", e então, vai começar a doer outra vez, e aí, tu vai ter dado o primeiro de muitos passos com relação à essa dor, e ela nunca irá embora. Não totalmente. Ela sempre vai estar lá, e sempre vai doer. Quando tu não sentir mais nada, vai querer dizer apenas que está meio dormente, e então, quando a dormência passar, quando tu pensar a respeito, a dor vai voltar. Ela nunca vai diminuir de intensidade, tu apenas vai se acostumar com ela, e aprender a conviver com ela, até ela não incomodar tanto, como aqueles velhinhos com reumatismo que fazem previsão do tempo de acordo com a dor no quadril, sabe?
-Valeu. Puta força tu tá me dando, velho.
-Sabe de onde saiu esse discurso?
-Não.
-Faz um esforço.
-... Não sei...
-Mesmo?
-...
-Tá lembrando?
-...Cacete...
-Pois é. Tu me disse isso, quase nessas exatas palavras dois anos atrás. Lembra?
-... Lembro.
-É.
-...
-...
-E?
-E o quê?
-Me diz que eu tava errado. Diz pra mim que passa. Diz que, depois de duas semanas eu nem vou me lembrar mais.
-Tu tava errado. Passa. Daqui duas semanas tu nem vai te lembrar mais.
-Valeu.
-De nada.
-...
-...
-É mentira, né?
-É.
-Cacete...
-Pois é.

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-Não existe solidão mais vil do que a do sexo feito sem amor, Fabí. - Disse o Antenor olhando pra Fabíola sobre um copo de coca-cola pela metade.
-Consigo pensar em duas ou três solidões muito mais vis do que essa, Antenor... - Respondeu a Fabíola com pouco caso.
-Não. Não consegue. Tu só quer me dar o contra como tu faz desde que a gente se conheceu. - Replicou o Antenor tomando de um gole o refrigerante no copo e servindo o que ainda havia na garrafa.
-De onde tu tirou essa frasesinha cafona, diga-se de passagem? Coisa mais brega e puritana... - Perguntou a Fabíola como quem se dá conta de que está sentado em uma tábua com pregos virados pra cima.
-Ela é de um puritano dos mais tradicionais, mesmo. - Respondeu o Antenor rindo com um lado apenas do rosto.
-De quem é a citação? - Quis saber a Fabíola.
-Nelson Rodrigues. - Respondeu Antenor, com pouco caso.
-Mentira. - Disse Fabíola, virando pro outro lado.
-Verdade. - Respondeu Antenor, rindo.
-Mentira, tua. Mentiroso. - Disse Fabíola, ficando ruborizada de raiva.
-Procura no Google. - Desafiou Antenor.
-Procuro, mesmo. Procuro. Tu quer é me enrolar, dar lastro pra essa besteirinha pueril. - Disse Fabíola entre dentes cerrados.
-O que importa de quem é a citação? O autor te faz sentir mais ou menos culpada por ter sido responsável pela mais vil das solidões em ene oportunidades? - Perguntou Antenor, jocoso.
-"Ene" o teu cú. - Respondeu Fabíola, falando alto e se levantando da mesa do bar atraindo a atenção de todos ao redor enquanto ia embora.
Antenor não se levantou. Continuou sentado sorvendo a sua Coca-Cola enquanto Fabíola saia pela do estabelecimento a passos largos. Seu sorriso, no entanto, desapareceu. Ele nem lembrava se a frase era de Nelson Rodrigues, mesmo, apenas quis cutucar Fabíola. Sentiu uma ponta de vergonha. Era, depois de velho, o moleque que durante o recreio puxa as tranças da coleguinha por quem é apaixonado.

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TRADUÇÕES:

Ele disse:
-Não, capaz, tô tri bem, vamo jogar, sim, amanhã tô aí com a minha chuteirinha e o meu futebol de Nílton Santos.
Mas na verdade ele quis dizer:
-Claro que eu não tô bem, eu tô demolido, mas vou fazer um esforço aparecer e jogar pra ninguém me tirar pra veado.

Resenha Cinema: Transformers 3 - O Lado Oculto da Lua


Ontem fui ver a última empreitada de Michael Bay e seus amigos Autobots no cinema. Uma semana depois da estréia, encarei uma sessão em 3-D de Transformers 3, último capítulo da (Inevitável) trilogia dos robôs que estrelaram algumas das brincadeiras infantis que guardo com mais carinho na minha memória oitentista.
Se no primeiro filme Bay conseguiu mesclar com competência comédia e ação e ainda contar uma história obtendo um sucesso de público (Familiar) e (um estranho) de crítica, no segundo longa, o injustiçado A Vingança dos Fallen, ele foi achincalhado além de todos os limites. Transformers 2 era tão divertido e competente quanto o primeiro filme. Ainda havia um fiapo de história (Ou alguém quer me convencer de que a história do primeiro longa era assim tão superior?) servindo pra que Bay, um diretor tremendamente limitado, fizesse a única coisa que sabe fazer direito: Mostrar espetaculares cenas de ação intercaladas com piadinhas por vezes infames e deixar a platéia de queixo no chão com os embates entre Decepticons e Autobots e as corridas de Megan Fox em câmera lenta.
Porém, mesmo com todo o sucesso de bilheteria do segundo longa, as críticas magoaram o esquentadinho e vaidoso Bay, e ele prometeu que, na terceira incursão ao mundo dos aliens de organismo cibernético, ele iria "acertar a mão".
Se em um primeiro momento parecia uma boa ideia, afinal, um bom roteiro nunca fez mal pra filme nenhum, as coisas foram começando a soar estranhas conforme a produção caminhava.
Enquanto John Malkovich, Frances McDormand e Ken Jeong eram contratados, Megan Fox, após trocar picuinhas com Bay via internet era demitida. Skids e Mudflap, robôs "negros" do segundo longa eram limados, também, enquanto Bay não parava de dizer que as coisas seriam diferentes do segundo longa que taxou como "lixo".
Rosie Huntington-Whiteley, modelo da Victoria's Secret entrou no lugar de Fox, deixando claro que, pra Michael Bay, Mikaela era uma personagem descartável, cenas de A Ilha foram usadas no filme, que teve problemas durante as filmagens por conta das câmeras de Avatar, e, alguns meses, vários milhões de dólares e muita fofoca depois, o filme estreava.
E, depois de assistir, dá pra dizer que, embora ainda seja um ótimo e divertido filme de ação, que o 3-D seja espetacular e que os caras da Industrial Light & Magic só melhoraram depois que a WETA entrou no mercado, Transformers 3 - O Lado Oculto da Lua, mantém a maldição hollywodiana das trilogias, e é o pior dos três longas.
Na história de como os habitantes de Cybertron influenciaram a corrida espacial na aurora da Guerra-Fria (O que criou situações como o medonho dublê digital de John Kennedy), e como os Autobots resolveram que deviam visitar a nave abatida na lua e ressuscitar o Sentinel Prime, antecessor de Optimus como líder dos Autobots (dublado com estilo por Leonard Nimoy), e como isso faz com que uma guerra entre Decepticons e a humanidade seja travada, muita coisa desnecesária acontece e aparece.
Começamos com o elenco.
Por quê John Malkovich está no longa? Malkovich é ótimo ator, mas se era para colocá-lo no papel de um afetado dublê de Steve Jobs que tem, quando muito, dez minutos em cena, que chamassem outro cara.
Frances McDormand. Ela repete um papel que já havia sido feito por outros atores no primeiro e no segundo filmes, o do político burocrata que não gosta nem confia nos transformers, não vê nada demais em Sam Witwicky, e que quer as coisas da sua maneira. Então, pra quê Frances McDormand? Por que, não um rosto desconhecido?
Ken Jeong. O afetado Mr. Chou de Se Beber, Não Case dá as caras como um funcionário de uma empresa de software que sabe alguns segredos da ligação Decepticon com a humanidade. Aparece fazendo caretas e envolvido em situações de cunho sexual que não fazem o menor sentido, nem têm lá grande função pra trama. Por que, então, Ken Jeong?
Bay foi colocando bons e conhecidos atores em papéis reciclados dos longas anteriores ou escritos com giz-de-cera pra ver se eles fariam um milagre com o roteiro meia-boca? Bem, não fizeram, os personagens desses intérpretes, assim como praticamente todo o núcleo humano, permanece sendo nada além de acessório pra que as verdadeiras estrelas brilhem:
Os robôs gigantes!
Quem vai ao cinema ver Transformers 3 em 3-D, não espera muito além de robôs gigantes lutando com uma desculpa plausível (Plausível em um mundo onde um cara com a estampa de Shia LaBeouf troca Megan Fox por Rosie Huntington-Whiteley, e existem robôs gigantes alienígenas.), quem diz o contrário não manja nada de cinema nem sabe o que a audiência quer. Quem quer um mega-roteiro, atuações de luxo, e ideias criativas assiste outro tipo de filme, e não Transformers. É por isso que apenas quando finalmente entrega o que a audiência quer, Transformers apresenta as qualidades de um excelente exemplar de seu gênero.
Bumblebee, Ratchet, Ironhide, e, claro, Optimus Prime quebrando o pau contra as forças de Megatron, Soundwave, e companhia valem o ingresso. As espetaculares sequências de ação em câmera lenta ficam lindas, as explosões digitais e de verdade são magníficas e ver uma megalópole ser engolida por uma robô-lula-gigante em três dimensões não tem preço (Na verdade, tem, vinte e um reais, no sábado.).
Os Transformers transformam (rá-rá, entendeu o trocadilho?) um longa que se arrastava chafurdando em falta de ritmo e más escolhas de roteiro e elenco em um filme espetacular nos quarenta minutos finais, quando o pau canta em Chicago, e o combate entre Decepticons e Autobots alcança todos os limites da película. Alguém devia avisar a Michael Bay que, no caso dele, pensar demais faz mal, e, quando se trata de Transformers, todos os humanos são tão descartáveis quanto Megan Fox (Só esse filhote de Hitler pra achar Megan Fox descartável.), inclusive ele próprio.
Que venha Transformers 4, Optimus Prime e companhia nasceram pro cinema, só não vê quem é frutinha.

"-O que seria de você sem mim, Optimus?
-Vamos descobrir..."

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Tentando Melhorar



Uma vez, quando era criança, o Genaro acompanhado de seu primo mais velho, Jonathan andava pelo quintal da casa de praia de sua avó quando encontraram um morcego oculto sob arbustos de hortênsias em uma tarde de verão. O bicho estava em frangalhos, tentando desesperadamente se proteger da luz do sol. Genaro sempre teve aflição com morcegos, já não tinha, aos sete anos, a ideia equivocada de que morcegos fossem vampiros, sabia, inclusive que eles eram responsáveis pela polinização de flores, disperção de sementes e que eram predadores de insetos. Ainda assim, as asas de pele quase translúcidas, os braços alongados e o nariz revirado dos morcegos lhe causavam repulsa.
E foi com repulsa na voz que Genaro disse a Jonathan, enquanto colocava as mãos para trás do corpo por reflexo, ainda que estivesse distante quase um metro do animal, que deixasse o animal onde estava. Genaro não escondeu as mãos por receio de tocar no morcego. Ao menos não específicamente. Genaro tinha medo de tocar em qualquer criatura viva.
Genaro, já tocara em outro animais. Gatos, coelhos, cachorros... Mas sempre tocava da mesma forma: Com a ponta do dedo indicador esticado. Com o braço esticado, e, normalmente oferecendo o corpo de lado ao seu alvo, como fazem os grandes zagueiros ao marcarem um adversário habilidoso, ou os pistoleiros do faroeste ao enfrentar um adversário no duelo.
Genaro era ruim de contato. Muito ruim de contato.
Jonathan era diferente de Genaro. Não que fosse amante de morcegos, ou que não tivesse receio de tocar em animais de qualquer espécie.
Ele tinha.
Especialmente com relação a morcegos. Mas era, como já foi dito, diferente de Genaro. Com dois galhos de madeira, Jonathan apanhou o morcego de sob as sombras acolhedoras do arbusto de hortênsias, e, equilibrando o animal, o carregou como pôde até um recipiente de plástico com tampa, onde o prendeu.
Fez tudo isso sob os protestos de Genaro, que pediu o tempo todo que Jonathan deixasse o animal em paz. Mas Jonathan não o fez.
Pelo contrário. Com o quiróptero preso dentro da embalagem plástica, o levou para a rua, onde, diante das demais crianças do quarteirão, o bicho foi exposto como um troféu. As crianças bolavama brincadeiras onde o morcego era um vampiro capturado. Um pterodáctilo assassino. A cobaia de um experimento para acabar com monstros que infestavam a vizinhança.
Em todas as ideias o morcego foi um vilão, e como vilão foi tratado. Sendo sacudido, molhado, cutucado e espetado. Em meio a todos os gritos, alarde e à esposição ao sol inclemente, o morcego foi deixando de se movimentar, ficando mais e mais estático. Foi quando Jonathan bradou que, o momento era de dar cabo do animal, e perseguido por um séquito de infantes acéfalos, marchou até os fundos da casa abandonada do seu Mauro, onde jogou o morcego dentro de um balde, e posicionou o recipiente sob a torneira do tanque de lavar roupas.
Enquanto o balde se enchia d'água com o morcego lá dentro, Genaro, com lágrimas nos olhos, sentia como se fosse nele próprio a agonia experimentada por aquela criatura. E, como ele não estava sendo acossado pela luz do sol, nem estava enfraquecido por ter sido exposto a sevícias de nenhuma espécie por uma corja de sádicos, decidiu que cabia a ele pôr fim áquele prepóstero. Juntando tudo o que tinha de auto-respeito e dignidade, Genaro caminhou a passos firmes, que se tornaram uma decidida corrida, e por fim uma carga inexorável em direção ao algoz do morcego, Jonathan, que pagaria diante de seus asseclas pela sua crueldade.
Porém, era uma praia pequena do litoral norte do Rio Grande do Sul em meados de mil novecentos e oitenta e sete, não uma fortaleza rebelde dominada pelo império galáctico. Genaro era apenas um moleque de sete anos de idade usando calções azuis e uma camiseta amarela do Homem-Aranha, e não um glorioso paladino de Dol-Amroth trajando uma brilhante armadura. E Jonathan, por mais que estivesse executando uma ação que era um claro sinal de psicopatia futura, era só um moleque sádico, e não um déspota vil. Aquele não era um cenário para milagres, nem para confrontações épicas, ou para mudanças definitivas de rumo.
Genaro errou seu ataque. Apanhou de Jonathan, e de mais um ou dois moleques. Gabriel, e Márcio, talvez, ele não viu pois estava no chão. Não chorou. Ficou ali, abraçado nos joelhos, ouvindo o alarde das crianças enquanto o morcego se cansava de lutar para permanecer à tona e abraçava a morte por afogamento no fundo daquele balde velho nos fundos da casa do seu Mauro. Depois que as crianças foram embora, deixando o animal no balde, Genaro caminhou até lá. Esvaziou o recipiente, e com a ajuda de uma pá de plástico, carregou e enterrou o morcego na beira da praia. Pra ele, depois daquela tarde de suplícios, o animal merecia alguma deferência. Enquanto encarava a cova improvisada nas dunas, Genaro não pôde deixar de pensar que talvez, se não fosse tão ruim de contato, ele pudesse ter feito algo por aquele animal. Algo além de colocá-lo em um buraco cavado com uma pazinha roxa nos cômoros.
Mais de vinte anos depois, Genaro ainda é muito ruim de contato.
Mas está mais forte. E tentando melhorar.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Conserto


O Mário entrou no escritório alguns minutos atrasado, ofegava. Não que tivesse corrido, não, ele não correra, mas queria causar a impressão de que correra, mesmo que houvesse chagdo ao trabalho andando a passos tranquilos, e chegado, inclusive, a assobiar antes de entrar no rpédio.
Olhou para Leandro, que estava sentado olhando pra tela do computador e não desviou os olhos pra dar bom-dia ao colega.
Mário começou a falar enquanto ia tirando a vasta quantidade de peças de roupas que o protegiam do frio inclemente da rua:
-Rapaz, que friaca. Eu não sou muito do calor, mas já perdeu a graça. Ontem saí com a nêga-véia e a gente quase congelou indo pro restaurante e pior ainda na volta, mas comemos uma pizza bem boa ali na Lima e Silva, bem pra lá, sabe? Passando a Venâncio, naquela parte onde ninguém vai. E tu? Fez o que, ontem?
-Tu te lembra do Andre Agassi quando ainda tinha cabelo?
-Quê?
-O Agassi. O tenista. Lembra dele quando ainda tinha cabelo?
-Agassi...
-É, era o cara da geração anterior, os fodões eram ele e o Pete Sampras, antes de Nadal e Federer virarem os reis do pedaço. Lembra?
-Acho que lembro... Um careca?
-Isso. Lembra dele com cabelo?
-Não...
-Ó. - Leandro virou o monitor do PC pro colega, mostrando uma foto de Andre Agassi com um flamante mullet descolorido, e um agasalho rosa pink e branco.
-Caraca... - Comentou Mário sem muita convicção.
-Arram. - Assentiu Leandro, ainda mexendo no teclado.
-Visse o jogo, ontem?
-Só o primeiro tempo, acabei dormindo, tava com sono.
-Não perdeu muita coisa. Valeu mais pelo domínio, sabe? O time tá se acertando.
-Que bom.
-Dormiu a noite toda?
-Te lembra de Os Intocáveis?
-Hã?
-Os Intocáveis, aquele do Brian DePalma, com o Kevin Costner e o Sean Connery?
-Filme?
-Sim, filmaço, com o Robert De Niro fazendo o Al Capone, e o Andy Garcia, tá ligado?
-Sim, sim, bom filme... Baita trilha. De quem é a trilha?
-Ennio Morricone, mestre...
-Verdade... O que tem o filme?
-Te lembra do Connery xingando um matador da máfia dizendo que era coisa de carcamano levar uma faca pra um tiroteio?
-Não...
-Aí ele persegue o cara com uma doze de cano serrado e o Nitti mata ele?
-Não me lembro de nada disso...
-Mas tu tá ligado no lance esse, de nunca levar uma faca pra um tiroteio?
-Sim, sim...
-Te liga, aqui. - O Leandro virou de novo o monitor pro Mário, uma foto ocupava a tela inteira, nela, Mace Windu decapitava Jango Fett com seus indefectível sabre-de-luz roxo sobre os dizeres "Jango Fett: Levou uma arma pra uma briga de espadas". Mário riu, mas deteve-se.
-Mas peraí, ô porra... Por que tu fica mudando de assunto o tempo todo? O que tu fez ontem de noite?
Os olhos de Leandro ficaram marejados um momento. Mário entendeu.
-Foi ela?
Leandro assentiu com a cabeça.
-E aí...?
Leandro novamente sinalizou com a cabeça, mas agora negativamente.
-E o que tu vai fazer agora, velho? Pra te consertar?
Leandro encolheu os ombros.
-Ver coisas engraçadas na internet, pra começar. - Disse, incerto.
-Tá funcionando?
-Não.
-Vai funcionar em algum momento?
-Não sei...
-Quer ajuda?
-Não... Obrigado, mas não. Quero ficar sozinho.
-Beleza. Mas tu sabe que isso provavelmente é a causa do problema, né?
-Sei...
-Me mostra esse do Jango e do Mace Windu, de novo, depois bota aí Megan Fox, biquíni, e vamo trabalhá. - Sentenciou Mário.

Um passo de cada vez.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

O Frio da Incerteza


Foi com pesar que o Alceu encarou o relógio e constatou que já eram duas e cinquenta e sete da madrugada daquela noite glacial. Sair de sob as cobertas doera fisicamente nele. Não que ele não gostasse do frio por conta disso. Não. Alceu era dessas pessoas capazes de sentir um certo prazer no desconforto. Uma certa alegria na dificuldade. Provavelmente reflexo de anos de desconforto e dificuldades aos quais ele fora exposto enquanto se tornava a meia-pessoa que hoje era.
Alceu levantou-se com dificuldade de sob as cobertas. Sentiu o ar gelado açoitar-lhe as pernas descobertas e sorriu. Usava um calção branco e preto do time do Santos que devia ser mais velho que o Neymar, mas era de estimação, e era muito confortável. Quando seus pés descalços tocaram o chão, ele sentiu a onda de frio se esticar da sola dos pés até os cabelos. Pensou que bateria os dentes de frio, mas cerrou o maxilar com força, evitando tiritar. Levantou-se sob os protestos rosnados de seu cachorro que estava sob as cobertas e não gostara da ideia de ser descoberto. Cobriu o cão com cuidado, e andou trôpego até o banheiro. Escovou os dentes, e passou água no rosto. A sensação de ser esfaqueado nas bochechas não podia ser muito diferente, mas ao menos estava mais desperto. Caminhou de volta rumando para a cozinha, deteve-se brevemente em frente ao rack da televisão. Vislumbrou uma foto em um porta-retratos customizado do Homem-Aranha. Não conseguiria evitar o sorriso mesmo se tentasse. Andou até a cozinha, tomou dois comprimidos, um anti-inflamatório e um analgésico empurrados goela-abaixo com um gole de Coca-Cola. "O desjejum dos campeões", pensou. Comeu dois biscoitos Bono, recheados com morango de dentro de um jarro. Horríveis.
Lavou o copo. Como a água doía em contato com a pele, pensou. Voltou à sala terminando de secar as mãos na camiseta. Sentou-se no sofá. Mirou a foto novamente. Dessa vez não sorriu. Não fez mais nada. Mirou a foto por alguns minutos esfregando a mão esquerda no braço direito. Lembrou dela. De uma noite fria em que fora feliz mesmo sem cobertas sob um ventilador. Uma noite em que não se mexeu como se fosse acossado por bichos carpinteiros. Uma noite em que tudo fez sentido. Apanhou o celular que estava na mesinha do telefone ao lado do fixo. Abriu a caixa de mensagens e navegou até a pasta com o nome dela. Estavam lá. Todas as mensagens. Talvez, pensou ele. Talvez fosse melhor deixar as coisas caminharem. Dar o próximo passo. Ser capaz de ser feliz por ela. Deixá-la ir, fazer suas coisas, viver o que havia pra ser vivido sem um pálido e distante fantasma a assombrá-la. Tocou no display do aparelho, selecionando a primeira mensagem da lista. Sorriu enquanto lia o recado. Moveu o polegar e tocou no ícone em forma de lata de lixo no pé da tela.
"Tem certeza de que deseja excluir essa mensagem?" perguntou-lhe o aparelho, friamente em letras brancas sobre um fundo vermelho.
Tenho? Perguntou-se Alceu.
Escorou-se sobre o sofá, puxando sobre as pernas uma colcha que jazia dobrada sobre o encosto. Largou o celular e ligou a televisão na Globo News. Esticou a mão sobre a pilha de revistas posicionada no vão sob a mesa do telefone e puxou um volume encadernado. Adormeceu novamente enquanto lia os dois últimos capítulos de Superman - As Quatro Estações. Acordou horas mais tarde enquanto seu telefone vibrava ao som de Beachwood Sparks, com o corpo encolhido sob o frio da madrugada, e o coração encolhido sob o frio da incerteza.
Aquele dia seria uma droga...

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Olhar.


A Loraine sentou em frente ao Rubens na sala de aula como fazia todas as manhãs desde que eles haviam começado o ano letivo no distante e quente final de fevereiro. A Loraine sempre sentava mais na frente pois, apesar de ter um pequeno problema de visão que a obrigava a usar óculos com lentes prescritas, Loraine fazia tudo ao seu alcance pra evitar o aparato, inclusive "pagar de CDF", como diziam suas amigas, sentando-se bem na frente na classe.
Loraine, como se pode ver por esse breve relato, era bastante vaidosa. Não era nenhum escândalo a vaidade dela, não, existia a vaidade, mas era controlada, uma vaidade até saudável em uma menina nos seus quinze, dezesseis anos.
O Rubens sentava bem na frente pois o pessoal do fundão não se dava bem com ele. Rubens não chegava a ser um nerd na assepção da palavra. Não era particularmente estudiodo, nem inteligente, mas gostava, e como gostava, de ficção científica. O Rubens, por conta de sua preferência por atividades intelectuais, como devorar uma coleção de livros do Julio Verne no verão, não era lá um esportista dos mais bem dotados, então, não se enturmou com a galera do futebol, que dominava o fundo da sala. Não era um ermitão, o Rubens, não. Tinha amigos na sala. O gordo Jéfferson, que tinha uma cintura bastante ampla, o Matheus Roqueiro, que adorava pagode, e a Suíça, que não nascera na região dos Alpes, mas sim em Viamão, e fora batizada por sua mãe sob a graça de Aparecida, que os colegas reduziram para "Cida", depois aumentaram para "Suicida", e finalmente reduziram novamente para "Suíça".
Rubens sempre sentava, pois, na frente, como não queria ser CDF a ponto de sentar na primeira fileira, e tampouco ficar sob os holofotes da professora Maria do Carmo, que lecionava matemática e comandava aquela classe com mãos de ferro, ele resolveu se misturar e sentar na segunda fileira. Ali, tinha à sua esquerda a Suíça, à direita, o Matheus Roqueiro, atrás de si a proteção do muro de nome Gordo Jéfferson, e à sua frente, a Loraine.
Rubens jamais havia notado Loraine. Não que ela não fosse suficientemente bonita para ele, ela era. Na verdade, era bonita demais pra ele. Ele se via namorando, claro, qual moleque de quinze anos não pensaria nisso com a ebulição de hormônios que ocorria em seu corpo diariamente? Mas ele jamais havia pensado em Loraine daquele jeito. Nunca a vira como mulher, a via quase como um patrimônio do ensino médio, distante, inatingível, e, por isso mesmo, segundo o pragmatismo de Rubens, perfeitamente ignorável.
Até aquela manhã fria de julho. Todos estavam encasacados, usando várias e várias camadas de tecido para vencer o frio de quatro graus celcius que fazia nas ruas de Porto Alegre naquela manhã. Cachecóis, toucas, luvas e até cuecões e pijamas ainda sob as roupas haviam para alguns exagerados. Foi naquela manhã, em que Loraine sentou-se na frente de Rubens, como fizera todos os dias nos últimos quatro meses. Mas naquela manhã de frio glacial, aconteceu uma coisa que não acontecia em todas as manhãs. A Loraine sentou-se à frente de um entediado Rubens, e, uma vez acomodada, encurvou-se para a frente, apenas fazendo um movimento em forma de gancho com a coluna, projetando o tórax pra frente sem que o abdôme ou os quadris se movessem. E, com um movimento rápido e gracioso, ela removeu o cachecol de lã rosa-claro que lhe envolvia o pescoço longo e branco, deixando à mostra sua nuca, e em sua nuca, por Deus, em sua nuca, Rubens pôde perceber, sob a luz pálida daquela manhã de inverno que entrava pela janela do quarto andar, uma penugem dourada quase invisível deitada delicadamente sobre a pele clara da parte de trás do pescoço de Loraine.
Isso foi mais de quinze anos atrás. Se perguntarem a Rubens, ele ainda hoje não saberá o que foi que causou a promoção da beleza de Loraine de "perfeitamente ignorável", para "objeto do desejo". Ele jamais se decidiu entre a flexibilidade das costas dela, a penugem dourada sob o sol daquela manhã fria, ou a pele de pêssego de sua nuca. O que Rubens decidiu, de fato, foi que ele nunca, jamais, em tempo algum, descansaria enquanto não passeasse sôfregamente com seus lábios na pele sedosa da nuca de loraine. Foi com essas exatas palavras que Rubens anunciou seu intento à Suíça, Jéfferson e Matheus, e disse-lhes solenemente que contava com os amigos em seu intento.
Foi pensando nisso, e nisso apenas, que Rubens começou a cortejar Loraine. Primeiro tímida e desastradamente, é verdade, causando algo entre estranheza e lisonja no alvo de suas afeições.
Mas Rubens foi se refinando com o passar do tempo, e o que lhe faltava em jeito, e sutileza ele compensava com dedicação e afinco. Contava com a ajuda do gordo Jéferson e do Matheus Roqueiro e o filtro da Suíça, que lhe dizia quais dicas dos amigos podia, ou não, seguir, e lhe ajudava a ser insistente o bastante pra não ser esquecido, mas não a ponto de ser chato.
Eventualmente, com muita transpiração e um pouco de inspiração, com muito trabalho duro, e um pouco de sorte, Rubens pavimentou o caminho até o coração de Loraine. Ele conseguiu beijar com sofreguidão a nuca macia de Loraine, passar as mãos pela extensão completa de suas costas flexíveis, e ver o sol nascer sobre os pêlos dourados sob seus cabelos atrás de seus pescoço de alabastro, ah, sim...
E não foi nada do que ele esperava. E enquanto desligava o tom do seu celular ao ouvir o toque pessoal de Loraine, Rubens não conseguiu deixar de lamentar, não o fato de Loraine não ser tudo o que ele imaginava, mas o tempo e o esforço investidos em vão naquela relação.
Rubens, enquanto saía de casa pensando se iria à loja de informática ou ver um dos filmes do Fantaspoa no Cine Bancários nem sequer cogitou a hipótese de que o problema não fosse Loraine, mas sim, ele. Ou melhor, não ele, mas sim o fato de que uma relação não se encerra no começo. Pelo contrário. Ela deve seguir recebendo cuidados. Muitos, todos. Ainda mais do que antes, para manter o viço.
A nuca de Loraine, coberta de pêlos dourados quase invisíveis, exceto à luz do sol continuavam todos lá, no alto das costas flexíveis dela. O que mudara fora apenas o olhar que Rubens, aquele pseudo-nerd cretino, dedicara à eles.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Espaço


O universo é muito grande. Há quem diga que é infinito, mas eu não boto fé. Ainda acho que, em algum canto, o universo tem uma parede preta com estrelas pintadas, se bobear tem alguém sentado lá, torcendo pra ninguém chegar naquela parte só pra não ser obrigado a se explicar. De qualquer forma, o universo é grande. Só de espaço visível, estima-se que o bicho tenha quatorze bilhões de anos-luz. É um monte. Isso sem contar a parte que não podemos ver, pois, supõe-se, o universo esteja em constante expansão a sabe Deus quantos parsecs por dia. Um parsec, é uma medida que equivale a 3,26156 Anos-Luz. Eu nem sei estimar o que esse número significa, apesar de saber que um ano-luz é mais ou menos dez trilhões de quilômetros. Se eu manjasse de matemática seria astro-físico, pois eu adoro esses bagulhos, mas odeio cálculo...
Enfim, eu me distraí, mas o ponto aqui é, com o universo desse tamanho, quatorze bilhões de anos-luz, 140000000000000000000000 (que seriam cento e quarenta sextilhões) de quilômetros, e isso só de espaço visível! Fora os parsecs e mais parsecs de espaço invísivel, oculto, em expansão, ou as dez dimensões da teoria das supercordas (Que já foram vinte e seis!), e a teoria dos Muitos Mundos, e seu multifacetado multiverso habitado por versões de nós mesmos, com tudo isso, com todo esse universo, multiverso e o escambau, como é que a gente pode reclamar da distância?
Nós estamos na mesma dimensão. No mesmo sistema estelar. No mesmo planeta. Nós nos encontramos, e, contrariando nossos instintos naturais, não nos encolhemos e seguimos nosso caminho. Demos uma paradinha. Olhamos em volta. Nos aprochegamos... Claro... Podia ser mais fácil, mas ah... Quem quer moleza senta na gelatina. A gente não precisa disso, a gente aguenta o tranco. Com nós é lightsaber na caveira.