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segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Detalhezinho


A Agnes era assim, uma solitária boa moça. Muito boa moça. Era gentil, educada, estudiosa, dedicada. Cozinhava bem, limpava com esmero, era asseada, e prendada. Sabia cerzir meia. Sabia tirar mancha de mostarda escura de roupa branca sem usar esses removedores de manchas industrializados, tinha a própria mistura que incluia limonada, água com gás e pinho-sol. A Agnes também era boa de matemática, ajudava a vizinha, dona Cenira, a ajustar as contas do mês, sempre sobrava um dinheirinho pra dona Cenira comprar uma roupinha nova graças à ajuda da Agnes. A Agnes era extremamente controlada. Trabalhava na biblioteca local, e era uma apreciadora do silêncio. Não gostava de música alta, ou barulhenta, gostava de clássicas, e de MPB. Não gostava de filmes de ação, preferia romances ou dramas mais contidos. Se vestia com discrição, cabelos loiros e lisos sempre presos sob um chapéu nos dias de frio, pois o calor do corpo, já lhe dizia sua avó, se perde quase todo pela cabeça, os olhos castanho-claros sempre ocultos sob os óculos de descanso prescritos pelo oftalmologista, doutor Azeredo.
Ela se exercitava com frequência, fazia caminhadas, corridas, e praticava Pilates. Fazia musculação de baixo impacto na academia e se alimentava direito. Não era afeita a refrigerantes, nem frituras, ou chocolates e doces em geral.
Na faculdade Agnes entregava os trabalhos sempre no prazo, caprichosamente acomodados dentro de pastas plásticas com canaletas que seguravam as folhas justamente na margem recomendada pela ABNT. Estudava com afinco para as provas e nos livros, lia sempre um capítulo além do recomendado pelos professores.
Raramente aceitava o convite dos colegas e das colegas para reuniões ou confraternizações da turma. Não fazia trabalhos em grupo, exceto se fosse condição imposta pelo professor. Não que a Agnes não gostasse de gente, ela gostava, gostava tanto que era voluntária em um par de ONGs, e inclusive lia para cegos no Instituto Santa Luzia. Era um doce de menina.
Pode-se imaginar que uma moça com tantos predicados não fosse ser atraente. Pode-se pensar que uma menina tão rica em prendas quanto Agnes seria inversamente afortunada em termos de predicados físicos. Não era, porém, o caso.
Agnes era uma menina bonita. Não era linda. Não. Mas era bonita. Bem ajeitada, com maquiagem e roupas que valorizassem as suas formas bem feitas moldadas com exercício, certamente seria até mais do que bonita. E eram todos capazes de ver isso sob a imagem fria que ela deixava visível ao mundo.
Há de se pensar, então, que Agnes fosse solitária por opção.
Não era, exatamente o caso.
Agnes sonhava em ter alguém com quem dividir o tempo. Alguém para fazer a contabilidade do lar com ela ao final de cada mês. Alguém que a pegasse pela mão e a levasse ao show do Djavan, ou para ver o último filme do Lars Von Trier no cinema. Alguém que pudesse aninhá-la junto ao peito e a aconchegasse até que o sono viesse.
Agnes sonhava com isso. Chegara a ter um ou dois pretendentes que achou que seriam essa pessoa especial. Tudo, porém, esbarrava em uma verdade inabalável. Um detalhe inescapável que sepultava todas as chances da doce Agnes de encontrar alguém que a amasse:
A Agnes era chata pra cacete!
Fica a dica, Agnes, se me ver na rua, me erra.

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