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sexta-feira, 14 de agosto de 2015
Ideal
O Otão, triste, desenxabido, choroso, curtindo uma daquelas dores de cotovelo que volta e meia assaltam os corações partidos após um fim de relacionamento.
O Otão já tinha chegado àquela fase em que a dor pela mulher amada se diluiu em um desencanto geral com todas as mulheres e na descrença para com o amor como um todo. Ele se punha, junto com o amigo Heraldo, a chorar as pitangas. E elucubrava:
-A mulher ideal tem que me amar... Só isso. Só me amar. - Disse Otão, modesto, olhando pro próprio colo meio desacorçoado.
-Não precisa mais nada. Eu não quero nada. Só quero que ela me ame. Que goste de mim do jeito que eu sou. Sem agenda oculta, sem segundas intenções. Apenas amor incondicional. - Filosofou, tristonho.
-Então a tua mulher ideal é a tua mãe. - Disse o Heraldo, que já não aguentava mais a tristeza do Otão. -A velha te ama incondicionalmente. Sem segundas intenções.
O Otão ficou olhando incrédulo pro Heraldo, que continuou:
-Mulher ideal... Ideal. A palavra já está dizendo. Não existe. Tu não vai encontrar. Ela é uma ideia. Então coloca mais coisa aí. Todos os adicionais de fábrica e mais uns lances que não existem. A minha mulher ideal tem que ser linda. Linda demais... Tem que ser um monstro de Frankenstein da Victoria's Secret, estilosa que nem a Gisele Bündchen, ter os pernões da Naomi Campbell no auge, os peitos da Katy Perry, a barriga da Jennifer Garner, os pés da Anne Hathaway, a cara da Megan Fox, gostar de fazer sexo ao menos uma vez por dia, ser inteligente, gostar de cinema em geral, Guerra nas Estrelas em particular, cozinhar bem, gostar de comer porcaria e não engordar. A minha mulher ideal usa roupas discretas na rua, mas por baixo tá sempre de lingerie tesuda, incluindo cinta-liga, mesmo que isso não faça sentido quando ela tá de calça jeans e camiseta do Radio Head. Tem ser prendada, ser descolada, engraçada, boa de cama, liberar o brioco de vez em quando, gostar de fazer sexo oral e não cuspir, tem que ser cheirosa, ter a pele macia, ser meio vadia quando estamos sozinhos e meio bissexual.
O Otão ergueu uma sobrancelha como quem desiste:
-Mais alguma coisa ou esse teu retrato falado do chauvinismo tá completo?
O Heraldo fez uma careta de quem pensava e lembrou:
-Ah, claro... - Disse ele, despertando a esperança do Otão. -Ela tem que ter gosto de bacon!
Aí o Otão largou de mão.
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