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sexta-feira, 29 de julho de 2016

Resenha Cinema: Jason Bourne


Quase dez anos se passaram desde que David Webb, também conhecido como Jason Bourne deu as caras pela última vez nos cinemas.
Após redescobrir seu passado, expôr a face negra da CIA, ser baleado e jogado do alto de um prédio de trinta andares no rio Hudson, Bourne nadava para o anonimato, mas jamais para o esquecimento.
O espião desmemoriado vivido por Matt Damon em A Identidade, O Ultimato e a Supremacia Bourne era um personagem muito bacana, envolvido em filmes muito bons para ser esquecido. Prova disso é que, com apenas três filmes, ele era capaz de rivalizar tanto com o Ethan Hunt de Tom Cruise em Missão Impossível quanto com James Bond e sua infinita série de filmes 007. Mais do que isso, Jason Bourne influenciou o avô dos filmes de espionagem de maneira clara e cristalina, ou alguém é capaz de negar os traços Bournescos nos primeiros 007 com Daniel Craig, apelidado maldosamente por detratores de Bourne, James Bourne...
A série Bourne exerceu grande impacto sobre o gênero, criando um personagem que ganhou cadeira cativa no coração da audiência.
Tanto que, após Matt Damon e Paul Greengrass, o diretor dos dois últimos (e indiscutivelmente melhores) filmes chegaram à conclusão de que a história de Bourne havia chegado ao final no topo daquele prédio em 2007, a Universal ainda tentou seguir com a franquia no bem intencionado e só O Legado Bourne, que tentava seguir outro agente de um programa-irmão do Treadstone em uma aventura paralela estrelada por Aaron Cross, vivido por Jeremy Renner.
Ainda que O Legado fosse um filme de ação competente, com um ótimo elenco e uma trama sólida, faltava alguma coisa para Cross ter chance de rivalizar com seu predecessor... Talvez fosse o talento de Matt Damon, talvez a visão de Greengrass, talvez um filme que não fosse uma tentativa tão clara e desesperada de capitalizar em cima de uma história conhecida, porém esgotada em si própria.
O Legado não fez feio, mas Aaron Cross e Marta Shearing sumiram nos mares paradisíacos da Malásia e a Universal se viu, novamente, despida de sua franquia.
Mas um produto como Bourne não pode ser ignorado em tempos onde uma marca conhecida e uma série de filmes são o pão com manteiga de um estúdio. E, após Matt Damon declarar que voltaria à série se Greengrass voltasse, a Universal abriu, não apenas a mão, mas as pernas, em sua desesperada busca por mais um Bourne.
Matt Damon e Paul Greengrass receberam ampla liberdade criativa, créditos de produção, e provavelmente um monte de dinheiro para trazer à vida Jason Bourne, quarto filme da saga do espião amnésico após um hiato de quase uma década.
Ontem, como bom fã da série, corri pro cinema pra conferir o novo capítulo do que é, de longe, minha franquia de espionagem preferida.
Em Jason Bourne, após uma breve montagem nos levando de volta aos primeiros passos da luta de David Webb para recuperar seu passado, encontramos o envelhecido ex-operativo da CIA, ainda assombrado por ecos de seu passado, vivendo em constante movimento, fora dos radares das agências de segurança, saindo do esconderijo e do anonimato apenas eventualmente para ganhar alguns trocados como lutador de boxe sem luvas na fronteira da Grécia com a Macedônia enquanto tenta continuar esquecido por todos.
Os planos de ostracismo de Bourne são frustrados quando Nicky Parsons (Julia Stiles) retorna à sua vida.
A ex-funcionária da inteligência agora trabalha contra a CIA, ajudando Christian Dassault (um hacker estilo Julian Assange) a expôr os segredos sujos das agências norte-americanas na internet. É durante uma de suas incursões que Nicky se depara com novidades a respeito do passado de Bourne. Mais precisamente, sobre o destino de seu pai, Richard Webb (Gregg Henry).
Não tarda para que a descoberta de Nicky a leve novamente ao encontro de Bourne, inadvertidamente levando em seu rastro o diretor da CIA, Robert Dewey (Tommy Lee Jones), a chefe do departamento de defesa cibernética da Agência, Heather Lee (Alicia Vikander) e o agente conhecido apenas como "Operativo", (Vincent Cassel) numa tensa sequência de perseguição por Atenas durante uma onda de protestos e conflitos entre a polícia e manifestantes, culminando com Bourne novamente enredado na teia de mentiras da CIA, e precisando viajar pela Europa em busca da verdade sobre a morte de seu pai e seu alistamento voluntário no programa Treadstone enquanto escapa dos inimigos que decidem que, ou o trazem de volta, ou o matam.
Essa familiar campanha pessoal acaba cruzando o caminho de Bourne com o do bilionário das redes sociais Aaron Kapoor (Riz Ahmed), um jovem start-up que criou sua companhia sobre o mantra da liberdade e da privacidade mas se envolveu com a CIA muito além do que deveria, e não tarda para que o destino de todos esses peões se tornem entrelaçados de maneira irretorquível no tabuleiro que se desenha.
Jason Bourne é um filme que tem dois grandes problemas:
O Ultimato Bourne e A Supremacia Bourne.
O longa é certamente superior ao primeiro filme da série, A Identidade Bourne, mas empalidece na comparação com os dois antecessores mais recentes.
A verdade é que a história de Jason Bourne e sua busca por sua identidade e seu passado havia sido plenamente contada nos três filmes originais quando Jason "encontrou" David Webb, então não deixa de soar como uma desnecessária trapaça trazê-lo de volta para mais buscas pelo passado, ainda que haja peso e estofo na trama que movimenta o longa. O que vemos em Jason Bourne não deixa de ser uma repetição dos eventos de Identidade, Supremacia e Ultimato.
As passagens por Londres, Berlim, Atenas parecem revisitas ligeiras com o cartaz "Lembra do que aconteceu aqui no primeiro filme? E no segundo? E no terceiro"... O personagem de Tommy Lee Jones não é diferente de Chris Cooper ou Brian Cox ou David Stratairn... O personagem de Vincent Cassel não é melhor do que o de Clyve Owen, Karl Urban ou Édgar Ramirez...
Melhor sorte têm Alicia Vikander, fazendo um equivalente da Pamela Landy de Joan Allen em uma versão mais dúbia em suas motivações, e Riz Ahmed, que eu cheguei a pensar que se tornaria uma nova versão do repórter vivido por Paddy Considine em O Ultimato, mas conseguiu seguir seu próprio caminho enquanto ajuda o roteiro a situar Jason Bourne em um mundo pós Edward Snowden, pós Wikileaks, e sugerir um debate a respeito de liberdades individuais em um mundo de vigilância constante, e isso é um mérito que não pode ser subtraído do longa.
Não bastasse dar um lastro de realidade ao seu filme, Greengrass e o co-roteirista Christopher Rouse, conseguem imprimir o mesmo senso de urgência dos outros filmes às sequências de ação, e a perseguição pelas ruas de Las Vegas é tão boa quanto a perseguição de Paris em Identidade e a de Nova York em Ultimato (A perseguição em Moscou de Legado segue soberana).
Com um grande elenco, ótimo diretor, um protagonista incrivelmente talentoso e carismático e uma trama firme embalada em grandes sequências de ação, Jason Bourne está meia dúzia de degraus acima da imensa maioria dos filmes de ação recente, e em pé de igualdade com os melhores. Seu grande senão é o absurdo nível de excelência da série, que eleva as expectativas a picos difíceis de se alcançar.
Assista no cinema.
Vale a pena.

"-Eu sei quem eu sou. Eu me lembro de tudo."

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