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segunda-feira, 29 de agosto de 2016
Resenha DVD: Mogli: O Menino Lobo
Eu não sou exatamente um fã de animações. Se hoje em dia eu volta e meia abro exceções na minha agenda de idas ao cinema pra ver desenhos, isso nem sempre foi regra. Uma das minhas implicâncias juvenis, das quais hoje eu me arrependo, era com as animações da Disney.
Eu tinha uma inexplicável ojeriza para com os desenhos do estúdio que meio que inventou as animações de longa-metragem, por uma razão, e uma razão apenas:
Os números musicais.
Eu odiava, na infância, quando em meio à história os personagens paravam o que estavam fazendo pra cantar uma canção.
Eu era muito intolerante com musicais à época. Ainda mais do que sou hoje. Então, se eu tinha uma ideia vaga de sobre o que se tratava Mogli: O Menino Lobo, não era por conta da premiada animação de 1967. Mas apenas por ter lido ou ouvido falar a respeito da história original, dos livros de Rudyard Kipling aos quais, admito, não li.
Foi, então, com alegria que descobri que Jon Favreau estava trabalhando em uma versão (mais ou menos) live action da história.
Infelizmente, o prazer de assistir ao filme no cinema me foi sonegado à medida em que, em Porto Alegre apenas uma sala reservou um horário para exibição do filme com idioma original, casualmente num dos piores cinemas da cidade, o Cinemark Barra-Shopping sul, onde frequentemente os horários das sessões atrasam e o ar-condicionado da sala é desligado durante a exibição, tornando o cinema, infelizmente, impossível de frequentar.
De modo que, como eu não estava interessado em assistir ao filme com as vozes de um elenco de globais, me restou esperar que o longa alcançasse o mercado de home-video.
Assistido o filme na madrugada de ontem, só me resta erguer o braço em protesto, e amaldiçoar os cinemas de Porto Alegre por não terem pensado em reservar ao menos um horário do dia para adultos alfabetizados irem ao cinema apreciarem a adaptação.
Desde sua sequência inicial, Mogli: O Menino Lobo é um deleite.
E a corrida de Mogli, o estreante Nehil Sethi, com seus irmãos lobos e a pantera-negra Bagheera (brilhante trabalho de dublagem de Ben Kingsley) é apenas o primeiro passo de uma trama episódica que conduz a audiência por uma série de pequenas aventuras, perigos e piadas conforme acompanhamos esse "filhote de homem" encontrado por Bagheera e levado para a alcateia onde o lobo alfa Akela (Giancarlo Esposito) o acolheu, e a loba Raksha (Lupita Nyong'o) o criou como se fosse seu filhote.
A vida de Mogli, tentando se tornar um lobo de verdade, convivendo com os outros animais da selva é alterada quando, uma trégua da água é declarada.
Uma longa estiagem tornou a água escassa e com os animais reconhecendo que beber é mais importante do que comer, a margem do lago é declarada um ponto livre de caça e todas as espécias podem ser encontradas matando a sede juntas.
É nesse momento que surge o tigre Shere Khan (Idris Elba), um poderoso caçador marcado por um encontro prévio com homens.
Khan não suporta a ideia de Mogli viver entre os animais, pois filhotes de homem crescem e se tornam homens, e ele oferece a Akela um ultimato:
Quantas vidas valem a vida de Mogli?
Quando as chuvas retornam e a ameaça de Shere Khan se torna uma sombra cada vez mais pesada sobre a alcateia, Mogli resolve partir, e, com a ajuda de Bagheera, chegar à aldeia dos homens, onde ele finalmente estará entre os seus e seguro do ódio do tigre.
Mas além da insaciável sede de sangue de Shere Khan, há outros perigos na floresta, e não tarda para que o pequeno Mogli logo se veja frente a frente com criaturas tão distintas quanto a anaconda Kaa (Scarlett Johansson), o enorme orangotango (na verdade um exemplar do ancestral Gigantopitecus) Rei Louie (Christopher Walken), e o urso Baloo (Bill Murray), animais que nem sempre têm a segurança e o bem-estar do filhote de homem em mente.
Conforme segue seu caminho entre essas criaturas tão diferentes, Mogli se vê em um ponto onde precisa descobrir quem é, e qual seu lugar no mundo.
É magnífico.
A parte técnica do filme é um disparate de tão boa, da floresta, renderizada à perfeição como um labirinto de enormes árvores retorcidas, muitas vezes compostas por centenas de vinhas emaranhadas que se erguem do solo ao céu, passando pelas encostas enlameadas do momento das monções, a iluminada caverna de Baloo ou o fantástico palácio de Louie, tudo é encantador, feito, não para emular a realidade, mas para ter o tom fabular e fabuloso que a história pede.
O elenco, de fato, tem apenas o jovem Nehil Sethi em cena, os demais personagens do filme são todos gerados por computador, mas o elenco de dubladores escalado por Favreau é inspiradíssimo.
Muito mais do que uma coleção de celebridades fazendo pontas, cada uma das vozes casa perfeitamente com o animal a quem representam, ou seu papel no filme.
Ben Kingsley dá show como a imponente pantera-negra Bagheera, uma figura de mentor cheia de majestade. O paternalismo solene e digno das vozes de Giancarlo Esposito e Lupita Niong'o como Akela e Raksha é palpável, assim como é a disposição boa-vida na voz de Bill Murray como o divertido Baloo. Christopher Walken está sensacional como o ameaçador rei Louie, e Scarlett Johansson tem um tom de voz tão marcante que já conseguiu tornar um I-pod sensual, e faz a mesma coisa pela hipnótica cobra Kaa, enquanto Idris Elba destrói na sua interpretação assustadora da voz do obstinado Shere Khan. Tão assustadora é sua performance, por sinal, que só quando o filme se encaminhava para o fim eu me dei conta de que, na melhor tradição de bons vilões, suas motivações e pontos de vista são totalmente justificáveis e fundamentados.
Cada um dos personagens está ali com uma função, para ajudar Mogli a crescer e cumprir seu caminho, descobrindo que as coisas que o tornam diferente, sua engenhosidade inata e sua capacidade de usar a "flor vermelha" do fogo, não são necessariamente um mal, e podem ser usados para o bem daqueles que ama.
Embalando uma mensagem de coexistência pacífica entre o homem e a natureza em um espetáculo de efeitos visuais de primeiríssima linha equilibrando ação, aventura, suspense e comédia Mogli: O Menino Lobo encontra seu caminho direto até o coração da audiência graças às sacadas do roteiro de Justin Marks e um trabalho mais do que seguro de Jon Favreau na direção, oferecendo uma roupagem moderna e bela aos escritos centenários de Rudyard Kipling.
Palmas pra eles.
Assista. É um dos melhores filmes do ano.
"-Ele é especial.
-Eu sei que ele é especial. Eu o criei."
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