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sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Resenha Cinema: Rogue One: Uma História Star Wars


Eu assisti Star Wars pela primeira vez, provavelmente com sete anos de idade, quiçá menos.
Acredito que o filme tenha passado numa Tela Quente da vida, ou algo que o valha, pois me lembro de que ele passou à noite, e não me lembro se eu já frequentava a escola porque me lembro de ter visto a chamada do filme na TV pela manhã. Mas eu não sei... Talvez eu estivesse de férias. Talvez fosse de tarde e eu não me lembre... As memórias colaterais da infância são nubladas depois de quase trinta anos.
Eu vou confessar que eu nem mesmo sei se terminei de assistir ao filme nessa primeira vez. Eu realmente não tenho memórias disso. Não consigo nem definir se o que assisti foi Guerra nas Estrelas, O Império Contra-Ataca ou O Retorno de Jedi, que eram os nomes dos filmes, então.
O que eu sou capaz de me lembrar, é de ter desenhado, com meu melhor traço à época, uma vilanesca figura negra com capacete de caveira e uma espada laser vermelha, e um herói de branco com uma espada laser verde...
Tenho quase certeza de que desenhei aquele Luke genérico de capa... Eu era criança e, na minha mente, capas eram parte importante da indumentária heroica, pergunte a qualquer kryptoniano.
O que também tenho quase certeza de ter feito é ter brincado de Guerra nas Estrelas. Tanto personificando algum personagem, quanto com brinquedos.
Os brinquedos de Guerra nas Estrelas eram anunciados pelo palhaço Bozo em seu programa matutino. Figuras de ação, que eu adorava, e os veículos que, vou confessar, não me despertavam grande interesse na tenra infância.
Que idiota eu era.
De toda a sorte, eu me lembro de ter ganho, ao menos um Chewbacca em um natal. Me lembro claramente de tê-lo mostrado à minha mãe antes de dormir. Era um boneco pequeno, pouco articulado, e, francamente bem sem-graça.
É engraçado porque, muito pequeno, e sem grande acesso à informação, eu não me apeguei tanto a Star Wars. Eu assisti o filme, brinquei um pouco, e meio que esqueci... Apenas anos mais tarde, já adolescente foi que eu reafirmei meu compromisso para com a saga.
Em 1997, quando George Lucas lançou as versões remasterizadas dos então Episódios IV, V e VI, eu fui ao cinema para revê-los,
E vou confessar, os filmes me pegaram de novo, se tornando parte indelével da minha memória afetiva e ganhando cadeira cativa nas minhas preferências.
Comprei livros, quadrinhos, memorabília, aluguei os filmes quando de seu lançamento em VHS e apresentei Star Wars ao meu irmão mais novo da maneira que eu gostaria que ele me tivesse sido apresentado.
Fui ao cinema assistir à trilogia prequel, à exceção de A Ameaça Fantasma, que vi direto em home-video, joguei os games, li os livros, ouvi os CDs, e joguei o RPG acrescentando meu próprio scroll de letras à saga espacial, me esforçando para tornar meus amigos jedi, senadores idealistas, pilotos ases, dróides e contrabandistas à sombra do Império.
Ano passado, na estréia de O Despertar da Força, eu estava no cinema trajando um garboso traje de Jedi misturando a roupa de Qui-Gon Jinn em Episódio I e a de Luke Skywalker em Episódio VI, faceiro feito guri de kichute novo para reencontrar, feliz da vida, uma das minhas mais longevas memórias infantis.
E ontem, de maneira muito mais sóbria, usando trajes civis, eu fui ver a estréia de Rogue One: Uma História Star Wars, o longa que conta a história de como a Aliança Rebelde obteve os planos da Estrela da Morte.
No longa acompanhamos Jyn Erso (Felicity Jones), filha de Galen Erso (Mads Mikkelsen), um cientista de quem foi separada ainda na infância, quando ele foi cooptado pelo diretor de desenvolvimento de armas do Império Galáctico, Orson Krennic (Ben Mendelsohn) para ajudar na criação de sua arma definitiva.
Criada pelo militante rebelde e veterano das Guerras Clônicas Saw Guerrera (Forrest Whitaker), Jyn cresceu para se tornar uma criminosa dura e arredia, lutando por sua sobrevivência e liberdade sem jamais ter-se dado o luxo de ideologias políticas.
Isso muda quando a Aliança Rebelde descobre que Guerrera foi procurado por Rook Bodhi (Riz Ahmed), um piloto imperial desertor que afirma possuir informações a respeito da última criação de Galen Erso.
O problema é que os métodos de Guerrera são extremos demais até para os rebeldes, que sabem que não serão recebidos pelo militante se não tiverem um trunfo.
Esse Trunfo é Jyn e seu passado em comum com o veterano.
Libertada da prisão pelo capitão Cassian Andor (Diego Luna), um frio assassino à serviço de Mon Mothma e Bail Organa (Jimmy Smits) e por K-2SO (Alan Tudyk), um dróide imperial reprogramado que é uma mistura de R2-D2 e C-3PO temperado com instinto assassino e uma sinceridade alarmante, Jyn é recrutada por Mothma (Genevieve O'Reilly) para intermediar um encontro com Guerrera e garantir que a Aliança possa partilhar as informações de Bodhi e saber o que é a tal arma imperial.
Não tarda para que Jyn descubra que seu pai ainda vive e é o principal engenheiro da arma chamada de Estrela da Morte, e para que sua missão logo se torne uma tentativa de resgatar seu pai e descobrir uma forma de neutralizar o abominável engenho de destruição em massa.
Juntam-se a Jyn, Cassian, Bodhi e K-2SO o monge jedaísta cego Chirrut Îmwe (Donnie Yen) e seu fiel companheiro e guardião, o especialista em armas Baze Malbus (Wen Jiang).
É a esse pequeno grupo de renegados que cabe enfrentar a máquina de guerra imperial, procurando desesperadamente por uma forma de impedir que a rebelião seja obliterada pelo invento de Galen Erso na mais fundamental missão da Aliança Rebelde até então.
É muito difícil, pra mim, avaliar um Star Wars apenas como filme, mas enquanto filme, Rogue One é muito bom.
Sob diversos aspectos o longa dirigido por Gareth Edwards, do último Godzilla é, de fato, muito superior a O Despertar da Força, e à trilogia Prequel.
Há um senso de urgência em toda a missão de Erso e companhia que é quase inédita em termos de Star Wars, o que é notável considerando que todo mundo sabe que, no final das contas é uma missão bem sucedida.
Ainda assim, é difícil não sentir uma pontada de aflição conforme os percalços se empilham no caminho do grupo, e muito do mérito disso está no trabalho de Edwards.
O diretor trabalha tão bem quanto possível o script de John Knoll, Gary Whitta e Chris Weitz que passou por diversas refilmagens e foi parcialmente reescrito por Tony Gilroy para chegar ao tom que a Disney queria para o longa metragem, tornando um filme cujo histórico por trás das cenas sugeria uma bagunça ao estilo Esquadrão Suicida em uma história coesa e uniforme apesar do desenvolvimento ligeiro ao estilo ponto A a ponto B, ponto B a ponto C...
Se as refilmagens e versões múltiplas do roteiro prestam algum desserviço de fato, é aos personagens.
Rook Bodhi, Chirrut Îmwe, Baze Malbus e o dróide K-2SO são personagens gostáveis e redondinhos em sua coadjuvância, Orson Krennick é um vilão entediado ao melhor estilo burocrata tentando ascender na cadeia de comando da "firma", e Saw Guerrera é uma interessante inversão dos vilões meio homem-meio máquina de Star Wars (com pernas biônicas e um respirador artificial é difícil não relacionar Guerrera a Vader e Grievous na tradição "mais máquina que homem" da saga, mas do lado do bem), mas não dá pra não pensar que Cassian Andor e Jyn Erso tinham mais a oferecer.
Andor especialmente por mostrar um lado pouco explorado da Aliança Rebelde: O das pessoas que aceitaram o pragmatismo de uma guerra suja e não estão exatamente em paz com suas consciências após anos de decisões difíceis e escolhas moralmente reprováveis.
Jyn Erso, por sua vez, foi apresentada nos trailers como uma tremenda casca-grossa com problemas de confiança e dificuldade em lidar com hierarquia, mas, no filme, se tornou uma mocinha com questões não resolvidas com o papai e que mesmo pesando uns 50 quilos ainda é capaz de derrubar stormtroopers a pancadas (e depois dos ewoks, quem sou eu pra duvidar?) e cuja história prévia com Krennic dá ao seu arco uma cara sonolenta de vingança.
Jyn e Cassian mereciam ser mais desenvolvidos, inclusive para que a sua relação fosse melhor desenvolvida, ainda assim, Diego Luna e Felicity Jones são bons atores, e certamente fazem o seu melhor com o que têm.
As batalhas aéreas são excelentes tanto no espaço quanto dentro da atmosfera dos planetas e não falta pancadaria pra todos os gostos. A produção de arte e o design de produção são caprichados, emulando com competência tudo o que já vimos naquela galáxia bem, bem distante, e oferecendo vislumbres de admiráveis mundos novos, mas a trilha sonora, pecado imperdoável para a franquia, é absolutamente esquecível.
O CGI é bastante competente, e apenas as recriações do Grão Moff Tarkin de Peter Cushing (interpretado digitalmente por Guy Henry) e da jovem Leia Organa (Ingvild Deila) destoam, parecendo personagens de vídeo-game no meio de um live action, mas isso é compensado pela presença de Darth Vader, em toda a sua glória malvada com direito até à voz de barítono do octogenário James Earl Jones, que é utilizado com parcimônia, aparecendo apenas um par de vezes com a pompa que o vilão mais maneiro do cinema merece.
Rogue One: Uma História Star Wars é um bom filme, um programa divertido e um raro caso de filme de Star Wars que provavelmente agradaria à uma audiência formada por não-fãs.
Enquanto admirador de cinema, Rogue One me agradou bastante, ainda assim, não pude deixar de sentir um certo vazio ao final do filme, quando me dei conta de que, no espaço de mais ou menos um ano, eu assisti a dois filmes inéditos de Star Wars...
Uma palpável sensação de que, o que antes seria um evento, se tornou algo banal.
Ainda assim, é Star Wars.
E certamente vale a ida ao cinema.

"Rebeliões são construídas com esperança."

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