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quarta-feira, 18 de setembro de 2019

Um Bom (Re)Começo


Olhando em perspectiva, há algo de muito estranho na nossa relação. Ela tem muitos elementos de um casamento arranjado, já que meus pais decidiram quando eu ainda não era capaz de opinar, que eu pertenceria a ti, e tu a mim.
Eu fui, desde muito cedo, tratado como se tudo estivesse acordado, e faltasse apenas consumar o ato e, a verdade é que na minha tenra infância não fazia diferença.
Era tudo algo vago. Nublado. Teórico...
Não havia nenhuma espécie de implicação prática no que havia entre nós. Era apenas algo que eu respondia de maneira compulsória se me fosse perguntado, muitas vezes encorajado por minha mãe e meu pai quando a resposta me faltava, alheio que eu comumente estava ao nosso relacionamento.
Já às portas de tornar-me adolescente foi que me dei conta de que fora empurrado à revelia de minha vontade para ti. E, ao finalmente começar a entender como funcionava esse tipo de ligação, percebi que eu não estava certo de que era contigo que eu queria estar.
E eu experimentei outras companhias.
Não me envergonho de dizer que busquei me envolver e descobrir o que criava uniões como a que deveria ter existido entre tu e eu, que procurei em outros lugares, que tentei em outras companhias, mas jamais descobri.
Tudo parecia tão artificial e efêmero quanto aquilo que minha família tentara forçar entre tu e eu.
E durante algum tempo eu tentei ignorar essa lacuna em minha vida.
Foi apenas aos quatorze anos que resolvi te dar uma nova chance.
Ascendendo aos píncaros da rebeldia púbere, não fora por influência de meus pais, mas de amigos, que resolvi voltar a olhar pra ti.
Hoje, poderiam dizer que eu escolhera um péssimo momento para te reencontrar. Corria o ano de 1995, e tu estavas tão longe de tua melhor forma que, tenho certeza, não teria sido a hora que tu escolheria para tentar seduzir a alguém.
Mas ali, naquele dia, houve um estalo que não houvera quando o que havia entre nós era meramente platônico.
Eu ainda sou capaz de me lembrar da primeira vez em que nos vimos, da eletricidade quando entrei em tua casa e te vi em toda a tua beleza, e pude entender o amor que outros sentiam por ti.
Nosso amor não foi à primeira vista. Foi ao primeiro toque. Foi à primeira vez que senti o que tu, mesmo em teus piores momentos era capaz de proporcionar. E ali eu tomei tua mão e prometi que jamais quereria outra coisa.
E nós tivemos uma bela jornada.
Tu me levou a lugares onde eu não achava que chegaríamos quando te assumi, lá atrás. Como se me recompensando pela fé que coloquei em ti em tua hora mais sombria. A cada nova conquista, eu tinha pra mim que, por mais que elas fossem partilhadas entre todos os que te amam, elas tinham um elemento de cumplicidade que era só entre nós. Quase como se tu me lançasse uma piscadela dizendo "Te falei que valeria a pena".
E valeu.
Tu me deu muito mais alegrias do que dissabores. E ainda que eu tenha fervido de ódio e estado a dois passos de explodir de tensão, em muito mais ocasiões me vi experimentando sensações de felicidade que, sim, eram ligeiras, talvez rasas no grande esquema das coisas, mas como eu poderia demandar mais de ti?
Nós tivemos uma bela jornada...
Não é segredo para ninguém que nossa relação tem estado estremecida. Tu fez coisas que me afastaram de ti. Paulatinamente trilhou um caminho que tornou impossível pra mim te seguir. Fez todas as escolhas erradas que podia ter feito em um curto espaço de tempo... E eu sei, eu sei que não foi tanto tu, quanto as pessoas tomando as decisões em teu nome. Eu sei.
Prova disso é que mantive minha promessa, e jamais quis outra coisa.
Se é verdade que não era tu, também é verdade que não houve nada que assumisse teu lugar.
Tu deixou um vazio.
E sim, vez e outra eu te procurei com fingido desinteresse. Olhei ao redor e acenei, tu acenou de volta, sorrimos e seguimos nossos caminhos. Mas jamais vi novamente aquela piscadela cúmplice de outrora. Jamais senti que tu estava, de fato, tentando me chamar de volta.
Hoje poderia ser um bom momento pra isso.
Eu não quero, de forma alguma, soar volúvel ou interesseiro.
Eu não quero dizer que, se tu for bem-sucedido hoje, eu caio de volta nos teus braços como se nada tivesse acontecido.
Não...
Mas hoje, às 21:30 no Beira-Rio lotado de playboys e patricinhas tirando selfies nas cadeiras que se empilharam sobre as arquibancadas de sagrado concreto, se tu não me decepcionar de novo, se tu fizer tudo certo, pode ser um bom (re)começo pra nós.
Pense a respeito, Internacional.

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