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quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Agradável.


-Tapa na cara.- Ele disse casualmente, antes de levar o copo à boca.
-Ah, tá. - Ela riu, algo incrédula.
Ele colocou o copo de volta na mesa e não disse nada. Era bonito, alto, cabelo preto, olhos castanhos algo marotos. Sorriu pra ela enquanto passava o garfo no prato onde só haviam vestígios do que fora uma massa ao funghi.
Ela, também bonita, cabelo castanho, curto, rosto bonito, nariz pequenininho, olhos pretos como os da Mary Louise Parker, ficou meio tensa, ergueu a taça para beber um gole do vinho, mas desistiu. Não podia resistir, a curiosidade era mais forte, além disso, aquela era uma questão que não podia ser ignorada:
-Sério, isso?
-O quê?- Ele perguntou, casual, ainda sorrindo.
-Essa coisa que tu falou, aí. Do tapa na cara.
Ela terminou de falar e só então percebeu o garçom parado ao seu lado, com uma expressão de contida malícia.
-Posso recolher os pratos?
-Claro, claro.- Ambos assentiram.
O garçom se retirou com a bandeja e ele falou:
-Tu me disse que gosta de viajar, não foi? Pra onde tu foi na tua última viagem?
-Montevidéu.
-Ah, lindo lá, né?
-Demais.
-Faz tempo que eu fui, mas me lembro que-
-Olha, desculpa, mas eu tenho que perguntar... Era sério?
-O quê?
-O lance do tapa na cara.
-Olha...
-Não, não, olha tu. Tu é bonito, simpático, parece inteligente, eu ainda não tenho certeza por que é só a segunda vez que a gente sai, eu gostei de ti, acho que tu gostou de mim, e... Olha, eu sou uma pessoa direta. Tava achando que a gente tinha algum futuro, não quero me casar contigo, não quero ser a mãe dos teus filhos, pelo menos não já, sem te conhecer direito, mas achei que a gente poderia namorar, sim, quem sabe, daqui a algum tempo, ter a chave do apartamento um do outro, viajar junto, coisa do tipo, mas eu preciso saber: O lance do tapa na cara, é sério?
-É. -Ele admitiu deixando os ombros caírem. -Tapa na cara me excita uma barbaridade. Sempre gostei. Não sei por quê. Nunca apanhei na cara dos meus pais, já levei soco na cara quando era moleque, em briga. Tapa na cara nunca. Uma vez, com uma namorada da adolescência, ela acidentalmente me deu um tapa leve quando estava se virando na cama, e eu gostei. Muito. Fiquei muito excitado. Foi o melhor sexo da minha vida. Aquele namoro terminou, mas a vontade de levar tapa na cara continuou. Eu vou entender se tu for embora agora. Muita gente já fez isso. Eu sou adulto, e posso entender se tu não te sentir á vontade com isso, então... Fique á vontade.
Ele limpou a boca com o guardanapo, e, em silêncio, levantou-se apanhando a bolsa. Fez menção de dizer algo, mas ele a conteve com um gesto. Ela entendeu e se dirigiu à saída.
Ele esperou ela sair, e bebeu, de um só gole, o vinho que ainda tinha na taça, secou a boca com força, amaldiçoando a própria perversão, e ergueu a cabeça procurando pelo carçom para pedir a conta, mas deparou-se com ela. Parada á sua frente, sua forma esguia e longuilínea preenchendo bem o vestido preto. Ela mordia levemente o lábio inferior, e tinha um dos olhos fechados quando perguntou:
-Tu gosta de apanhar ou de bater?
-Apanhar. Só apanhar - Ele respondeu prontamente.
-Então vamos pedir a sobremesa. -Ela sentenciou sentando-se novamente.
A verdade é que ela não se sentiu muito á vontade com a coisa do tapa na cara, mas já suportara chulé, roncos, namorados ausentes, grosseiros e até um viciado em drogas, podia fazer um esforço e esbofetear esse de vez em quando. Olhando em perspectiva, parecia até agradável.

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