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sábado, 3 de agosto de 2013
A Replicante
Ela, bonita, bem vestida, estilosa... Dava pra ver que se cuidava. Não era a mulher mais linda do mundo. Por Deus, não. Pra ser bem honesto ela nem sequer era a mulher mais linda da sala, mas era bonita. Tinha uns olhos muito bonitos, verdes, bem claros...
Ela parecia achar a vida muito chata, com as pálpebras parcialmente fechadas, encarava todo mundo como se lhe dessem sono.
Ele sentou-se em frente a ela num ato de pura coragem etílica. Bebera duas doses de cachaça azul de Poços de Caldas, uma dose de vodka e um uísque com energético. Não se sentia o Superman, mas experimentava um princípio de liberação de suas inibições, apenas um início.
Se estivesse totalmente livre de suas inibições, não teria sentado na frente dela, mas sim da loira longilínea com o cabelão estilo Gisele Bündchen que andava pra lá e pra cá com uma frente-única prateada que a fazia parecer uma divina elfa de Lórien trajada pra guerra.
Mas não. O álcool consumido até ali não era suficiente para colocá-lo na frente de uma deusa loira de um metro e oitenta. Não... Ele tinha, ainda, alguma noção de suas limitações. Alguma... Afinal, essa moça diante da qual ele se sentava agora não era, nem de longe, uma mulher feia. Era bonita, como já comentamos. Bem vestida, estilosa e tudo mais... Tinha esses olhos verdes faiscantes e um cabelão castanho bem claro e bem lisinho... Parecia coisa de propaganda de xampu. Daqueles de produto de beleza pra acabar com pontas duplas, e que promete hidratação e vitalidade e a mulher faz uma franja com as pontas do cabelo, ou solta um nó no cabelo preso e ele dança como uma criatura viva se libertando do jugo escravista de um simbionte alienígena até se deitar lânguido sobre as costas nuas da modelo em um cenário branco...
Enfim, era bonita. Curvilínea, mas não gorda. Nem de longe gorda. Tinha aquele volume agradavelmente bem colocado na bunda, no braço, e acima do joelho. E tinha uma expressão no rosto, meio diva enjoada, que só a tornava mais sexy.
Enfim, ele, turbinado pelos destilados, sentou-se em frente a ela, e a encarou. A verdade era que ele caminhara até a mesa dela com a única certeza de que "era ela", mas sem lá muita certeza de como convencê-la disso.
Sentou-se ainda ruminando o que diria, e ficou aturdido quando ela se virou, como se estivesse em slow-motion .4 e o encarou com aqueles olhos verdíssimos e uma expressão que tanto podia dizer "que mormaço, hein?", quanto "Suma, verme, antes que eu exploda seu cérebro com o poder da minha mente.".
Ele a avaliou rapidamente, sabia que corria o risco de estar sendo precipitado em sua avaliação, visto que estava um pouco bêbado, e a mulher tinha uma expressão facial de esfinge. Mas, com mil demônios, ela não era aquela ruiva tetuda de vestido roxo, tampouco era a moça negra com o penteado dread lock e as coxas épicas e, definitivamente, não era a elfa loira de roupa prateada. Ele podia se arriscar.
Teve uma epifania. Uma mulher com aquela expressão de enfaro, só podia ser mal comida. Lembrou-se do Tony Montana de Al Pacino se apresentando pra Michelle Pfeiffer em Scarface.
Resolveu ser ousado, audacioso. Quase pornográfico. Pigarreou de leve, escorou-se em um cotovelo projetando os ombros em direção à moça do outro lado da mesa, e modulou a voz num tom mais grave:
-Eu não pude deixar de notar que tu está precisando de uma boa trepada.
Sentiu as palmas das mãos suarem... O coração palpitar. A expressão facial dela não se alterou em nada. Ele quis sair correndo, mas seria um vexame... Precisava continuar. Estava bêbado, mesmo. Sempre teria essa desculpa.
Continuou:
-Eu também estou. E depois de olhar todas as mulheres daqui, cheguei à conclusão de que só quem pode me dar a trepada de que eu estou precisando, é tu.
Os cantos da boca dela se mexeram... Muito pouco. Haviam realmente se mexido ou fora só um espasmo? Ela respirou tomando fôlego. Sim! Sim! Era um sorriso que se desenhava. Um sorriso meio que nem o da Kate Winslet, em que os lábios se mexem vagamente pra baixo... O que ela diria? Se estava sorrindo o prognóstico era positivo...
Ela se inclinou, também, levemente pra frente, reduzindo a distância entre os dois:
-Eu admiro a tua coragem... - Disse.
"Sim!", ele pensou. "Sim! Me dei bem! Vou comer essa gostosa!", exultou. "Todos os meus amigos vão ficar sabendo. Essa cantada foi épica! É-Pi-Ca".
Ela se aproximou mais um pouco.
"Meu Deus! Meu Deus! O que é que ela vai dizer? 'No meu apartamento ou no teu?', alguma coisa assim. Ou vai me listar as alegorias de alcova que sabe fazer!".
Ela tomou fôlego, sua voz quase um sussurro, sua boca, quase encostada ao ouvido dele.
Continuou:
-... Geralmente homens que nem tu, com ombro estreito, bunda grande e mão de tiranossauro rex não têm essa ousadia. Mas eu não daria uma trepada contigo nem se fosse a alternativa à extinção da raça humana.
O sorriso ainda estava lá, mas os olhos ainda denunciavam um enfaro quase patológico. Como se ela tivesse visto naves de ataque em chamas no cinturão de Órion, raios K cintilando no escuro, no portão de Tannhaüser, e estivesse só esperando todos esses momentos se perderem no tempo, feito lágrimas na chuva. Ele ainda pensou em articular um "Vaca frígida" antes de ir embora, mas a verdade é que ficou com medo de ela ter uma réplica ainda mais dolorosa pra ele. Levantou-se e saiu, com o orgulho em cacos e os pés moles tanto pelo álcool quanto pela bangornada moral que levara.
Ela continuou lá, sentada olhando o movimento como se tudo aquilo a chateasse sobremaneira.
E a verdade é que precisava, mesmo, de uma boa trepada. Mas não ia sair dando pro primeiro retardado bêbado que verbalizasse isso.
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