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sábado, 27 de setembro de 2014

Resenha DVD: O Teorema Zer0


Graças a Odin existe Terry Gilliam. Se não fosse o ex-Monty Python norte-americano, provavelmente nenhum outro diretor/roteirista/produtor teria tido coragem de tirar do papel coisas como Brazil - O Filme, O Pescador de Ilusões, Os 12 Macacos... Gilliam é tão acima da média que perdoamos até mesmo suas escorregadas, ou seus filmes que o destino tratou de avacalhar, como Irmãos Grimm (que sofreu com a mão pesada dos irmãos Weinstein na produção após perder o financiamento da MGM), O Mundo Imaginário do Doutor Parnassus, totalmente modificado pela morte do protagonista Heath Ledger, e, talvez o mais famoso testemunho do azar de Gilliam, O Homem que Matou Dom Quixote, atrasado em anos por conta de um furacão quando começava a tomar forma(e que agora deve, finalmente, ver a luz do dia...).
Então, esse diretor mezzo cineasta, mezzo cientista louco, continua, meio aos trancos e barrancos, fazendo seus filmes que, volta e meia, o público não tem paciência pra tentar entender, o que provavelmente será o caso desse O Teorema Zer0.
O longa se passa em um futuro não especificado, numa Londres cyberpunk onde Qohen Leth (Christoph Waltz, ótimo como sempre...), funcionário de uma empresa de processamento de dados e recluso antissocial em potencial, leva sua vida de casa (a igreja abandonada onde mora) para seu cubículo na Mancom.
Qohen não está feliz. Trabalhando com um supervisor que parece nem mesmo saber seu nome, o trabalho obriga Qohen a sair de casa, e apenas em casa Qohen pode receber a ligação pela qual anseia. O telefonema de uma esfera superior que lhe dirá qual é o sentido da vida.
Temendo perder esse telefonema fundamental, Qohen tenta, sem sucesso, trabalhar em casa por deficiência, mas seu pedido é indeferido pela (hilária) junta médica.
Resta a Qohen levar seu pedido à Gerência em pessoa, o que ele consegue em uma festa de seu supervisor Joby (David Thewlis, que parece ter nascido pra fazer parte do Monty Python). A Gerência (Matt Damon), inicialmente parece não levar o pedido de Qohen em consideração, taxando-o de insano, mas acaba por lhe passar uma incumbência que ele poderá realizar em casa:
A conclusão do teorema Zero do título.
Uma equação que comprovará que toda a vida é acidental e sem sentido.
Para auxiliar Qohen a não enlouquecer em sua busca pela resolução do teorema, surgem a bela Bainsley (Mélanie Thierry, exalando uma sensualidade de pin-up), e o jovem Bob (Lucas Hedges), filho da Gerência.
Enquanto luta contra seus próprios fantasmas utilizando o programa psiquiátrico (uma hilária e quase irreconhecível Tilda Swinton), Qohen vê sua vida mudar conforme é obrigado a socializar, ao mesmo tempo em que seu trabalho o força a tentar provar seu maior medo.
Não vou mentir.
O Teorema Zer0 não é filme pra todas as audiências, o que, diga-se de passagem, é meio que regra pra filmografia de Gilliam inteira, mas ainda assim, funciona.
Ao mesmo tempo em que brinca com seus tradicionais fetiches, que vão do cenário perdido entre o futurista e o retrô, ao tema da vigilância do Estado sobre o cidadão, e a luta solitária do ente desajustado contra a "máquina estabelecida", Gilliam acrescenta à sua mistura o isolamento que a interconectividade sem intervalos cria (na festa de Joby os convidados dançam e andam pra lá e pra cá sempre carregando tablets, e a bela Bainsley não faz sexo, exceto se for virtual), e piadas ligeiras com ícones pop como Matrix e a Igreja do Batman Redentor, Gilliam conta com um elenco engajado pra mostrar que ainda que a humanidade anseie por isolamento, o faz porque tem a certeza de ser especial e fazer parte de algo maior, exatamente como faz Qohen, que deseja ser absolutamente sozinho enquanto espera um recado de Deus lhe dizendo o sentido da vida, e refere-se a si próprio no plural.
Com mais um trabalho muito acima da média de Waltz, fácil, um dos melhores atores em atividade no cinema, Gilliam pode não ter reencontrado sua melhor forma, ainda, mas certamente deu mais um passo na direção certa.
Quem sabe com O Homem que Matou Dom Quixote?

"Esperando A Ligação. Que outra razão existe para atender o telefone?"

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