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segunda-feira, 29 de abril de 2019
Resenha Série: Game of Thrones, Temporada 8, Episódio 3: The Long Night
Atenção! Há spoilers abaixo!
E finalmente a batalha derradeira pela alma de Westeros recaiu sobre nós todos, espectadores de Game of Thrones há quase uma década com a fúria do Rei da Noite no que vinha nos sendo prometido como um evento sem precedentes na História da televisão e foi entregue, eu tenho certeza, da melhor maneira que foi possível para os produtores.
Sim, eu sei, o final desse primeiro parágrafo dá uma brochada na coisa toda, não é? Eu lamento, mas sob diversos aspectos The Long Night, terceiro episódio da derradeira temporada da série que se tornou um marco no que tange a cultura pop foi um tanto desapontador.
Considerando todo o hype que se criou ao redor do que deveria ser a única guerra que importa, não deixa de ser estranho que tenhamos visto os heróis pagarem um preço tão baixo por sua vitória.
Não me entenda errado, eu gosto muito de todos os personagens que tombaram em batalha, realmente gosto, mas em suas primeiras temporadas Game of Thrones havia criado a expectativa de que não havia personagem que estivesse a salvo, e se The Long Night nos provou alguma coisa, foi que há personagens que estão protegidos pela mais poderosa armadura da ficção:
A Plot Armor.
O fenômeno que garante a sobrevivência de qualquer um na trama não importa quão equivocadas sejam suas decisões ou quão inaptos eles sejam em seu ofício. Não que eu quisesse que mais dos meus personagens preferidos tivessem morrido, mas o fato de toda a contenda ter poupado a vida de todo o elenco principal reduz drasticamente a escala de risco do que deveria ter sido uma batalha de proporções monumentais.
Com isso eu não quero dizer que The Long Night tenha sido ruim, longe disso, em termos de escala o capítulo supera com folgas The Battle of the Bastards e Hardhome, dois dos melhores episódios da série, ambos dirigidos por Miguel Sapochnik que repete o trabalho aqui.
O capítulo se inicia basicamente de onde A Knight of the Seven Kingdoms terminara. Os heróis que juraram defender o lado dos vivos na guerra se entrincheiraram junto às muralhas de Winterfell e viram os exércitos dos mortos se perfilarem do outro lado do campo.
Enquanto dothraki e imaculados se preparam para a carga alguém cruza a neve parando junto a ser Jorah Mormont, é Melisandre de Ashai (a linda Carice van Houten, retornando após longa ausência), que faz uma das suas orações ao Senhor da Luz e, em um dos mais belos momentos do episódio, inflama os arakhs de toda a cavalaria dothraki, apenas para que, minutos depois, nós vejamos todas aquelas espadas flamejantes sumirem na escuridão absoluta ao final de sua carga.
Escuridão absoluta, por sinal, é uma constante ao longo dos oitenta e dois minutos deste que é o mais longo episódio da série em todos os tempos. Um recurso que já vimos antes para enxugar o orçamento de episódios da série e poupar no CGI, a escuridão em The Long Night é, por vezes, incômoda, fazendo vários momentos da batalha parecer uma briga entre dezenas de ratos dentro de uma caixa.
Seja como for, o fracasso instantâneo da cavalgada dos dothraki liderados por Jorah é o suficiente para Daenerys jogar o plano de batalha pela janela, montar em Drogon e fazer chover fogo nas hordas de mortos vivos que se chocam com as fileiras dos vivos, e daí por diante é uma sucessão de recuos estratégicos dos heróis, um passo de cada vez, sempre sendo superados em números pelo exército dos mortos que parece não ter fim e supera todos os obstáculos, seja aço valyriano, obsidiana, poços de chamas ou as muralhas da fortaleza ancestral da casa Stark.
Depois de algum tempo, o episódio ganha ares de Guerra Mundial Z, com os mortos vencendo a contenda, não por possuírem qualquer tipo de tática superior, mas apenas pela sua quantidade que é quase um enxame.
Não há espadachim habilidoso que seja capaz de suportar o ataque simultâneo de dezenas de inimigos, ou ao menos é disso que a primeira meia hora de batalha tenta nos convencer, apenas para, no decorrer da luta desmentir isso, conforme Jaime, Brienne e Arya se saem muito bem de qualquer forma.
E após os soldados do Rei da Noite adentrarem as muralhas de Winterfell, a abordagem muda, ganhando ares de filme de horror, como na sequência em que Arya faz um tenso jogo de esconde-esconde com um bando de zumbis na biblioteca, ou quando os não-lutadores nas criptas começam a ouvir o combate azedar para o lado dos vivos, e depois precisam enfrentar a própria batalha confinados embaixo da terra enquanto o destino do mundo é decidido no Bosque Sagrado.
Novamente, em termos técnicos, as falhas de The Long Night são compreensíveis quando analisamos as restrições orçamentárias de um programa de TV frente aos números de grandes produções cinematográficas. Eu estaria mais do que disposto a aliviar o breu quase total de The Long Night se esse fosse o único problema do episódio (ainda que The Battle of the Bastards tenha sido capaz de emular a desorientação de uma zona de guerra em plena luz do dia e com a audiência sendo capaz de enxergar tudo o que estava acontecendo), entretanto há mais questões a serem observadas no capítulo. As pequenas conveniências do roteiro, como por exemplo as longas ausências de Jon e Daenerys voando em círculos dentro das grossas nuvens invocadas pelo Rei da Noite em momentos-chave da batalha onde um dragão nas muralhas teria sido particularmente valioso para resistir ao cerco dos zumbis, ou como Tyrion e Sansa sobreviveram ao ataque às criptas, ou como Sam conseguiu sobreviver à luta deitado no chão tendo um chilique são momentos para apontar para os roteiristas e dizer "eu sei o que vocês fizeram ali".
Por mais que essas não sejam questões-chave que derrubem as estruturas lógicas da série (como a estranha passagem do tempo em Beyond the Wall), em um capítulo que era tão decisivo para o programa elas se tornam mais frustrantes conforme se combinam com outros pequenos elementos manipulados, seja para gerar tensão, seja para economizar em efeitos visuais sem fazer o sentido devido no contexto da porradaria, especialmente quando levamos em conta a baixa contagem de corpos entre os personagens centrais e a relativamente fácil resolução de toda a celeuma.
The Long Night flertou o tempo todo com o senso de perigo das primeiras temporadas de Game of Thrones, mas jamais deu a proverbial facada no coração da audiência que as mortes de Ned e Robb Stark deram anos atrás, e o fim do Rei da Noite (eu disse lá em cima que essa era uma zona de spoilers) não chega sequer perto de gerar a satisfação das mortes de Joffrey ou de Ramsey Bolton, de modo que, pra mim, é difícil não sentir uma ponta de desapontamento.
Mesmo o desenvolvimento dos personagens, um elemento que sempre colocou Game of Thrones acima de outras fantasias televisivas ficou escanteado ao longo do episódio, exceto por poucas boas cenas como o ataque de pânico do Cão de Caça em meio ao combate, a conversa entre Tyrion e Sansa nas criptas relembrando seu casamento, ou as palavras reconfortantes de Bran para Theon nos momentos finais do cerco.
Seja como for, após mostrar desde a primeira cena da série o tamanho do perigo representado pelos Andarilhos Brancos e seus zumbis, vê-los despachados em apenas um episódio, com tão pouco prejuízo e sem nenhum relance de suas motivações foi, sim, um anticlímax. Depois de sete anos esperando o exército dos mortos cruzar a Muralha, os vimos serem detidos no primeiro reino onde chegaram de maneira completa e irremediável.
Agora, com três episódios por vir, parece que as grandes ameaças serão mesmo Cersei, Euron, Gregor Clegane e Qyburn, o que, de certa forma, parece apropriado em um programa que sempre deu tanta ênfase à humanidade de seus personagens, resta torcer para que após o desapontamento de The Long Night, Game of Thrones consiga tirar da cartola um desfecho mais voltado a seus personagens centrais, e menos a um espetáculo que mal conseguimos distinguir.
"-O que dizemos ao deus da morte?
-Não hoje."
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