Pesquisar este blog

sexta-feira, 12 de abril de 2019

Sabia


-Como tu sabe que eu sei o que é isso? - Ela inquiriu.
Ele não soube como responder.
Provavelmente, pensou, era por conhecê-la. Por antever certos padrões de comportamento de parte dela. Por passar horas e horas de seu dia imaginando como ela reagiria a determinada situação, como ela responderia a determinados impulsos, como ela se comportaria ante determinadas escolhas.
E não restringia tais pensamentos necessariamente a grandes e decisivos temas.
Das coisas mais mundanas, como qual a marca de amaciante e creme dental que ela preferia; Se o leite que ela tomava seria desnatado, semidesnatado, integral, sem lactose ou de soja (eca...); Se o chuveiro de casa esquentava o suficiente pra ela... Até as mais avultosas, de que cor pintar a parede atrás da estante dos quadrinhos e DVDs? Maratonar todos os filmes do Homem-Aranha incluindo os filmes de equipe onde ele aparece ou apenas os títulos solo? Dar uma chance à série d'O Senhor dos Anéis no Amazon? Quando fossem assistir a todos os Star Wars, incluir os episódios VII, VIII e IX?
Durante muito tempo de seu dia, era disso que ele se ocupava.
Flagrava-se a imaginar a vida ao lado dela. Sem arroubos ou graves ponderações. Pensando nos cenários que fossem mais simples e mais doces. Mais baunilha, que era o cheiro dela, suspirando e supondo-se feliz qualquer que fosse a reação dela, porque sabia que seria impossível estar em qualquer outro estado de espírito quando soubesse que a saudade que sentia seria curada assim que chegasse a noite ou o final de semana.
E sim...
Sabia que pensar e repensar e antever as reações que ela teria e as coisas que diria baseado em um padrão de noções pré-concebidas era vago e nem de longe garantia taxa de acerto maior do que cinquenta por cento.
Entretanto havia mais.
Havia uma forma de comunicação não-verbal e não-digital entre eles.
Um saber analógico, no sentido de dar-se entre criaturas análogas.
Ela e ele eram assim.
Partilhavam afinidades, interesses e conhecimento em comum em escala industrial.
Se entendiam e percebiam os humores um do outro sem precisar ouvir o tom de voz.
Ela dizia que ao voltar ele a trouxera de volta, e, como sempre, sempre, sempre, a recíproca era mais que verdadeira, era cânone e Escritura. Ao voltar, ela o salvara. O removera das sombras. O ressuscitara...
Como ele sabia que ela sabia do que falava?
Talvez fosse por ela ser a pessoa mais inteligente que ele conhecia. Que dominava todas as áreas de conhecimento que ele dominava e outras que ele ignorava totalmente...
Ou talvez fosse porque ele sabia e eles existissem um no outro partilhando tudo como apenas as mais gêmeas das almas fossem capazes.
Fosse como fosse, em se tratando dela, ele sabia.
Tinha a mais concreta e absoluta certeza.

Nenhum comentário:

Postar um comentário