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sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020

Resenha Cinema: O Chamado da Floresta


Eu não sou um profundo conhecedor dos escritos de Jack London. O pouco que sei, porém, me faz pensar que o romancista era obcecado com garimpeiros e cães. Jamais li nenhum de seus livros, e o único filme baseado em sua obra que realmente assisti foi um dos segmentos de A Balada de Buster Scruggs (apesar de ele ser autor do livro que originou Caninos Brancos e mesmo esse O Chamado da Floresta ter tido uma generosa quantidade de adaptações ao longo das décadas), de modo que não foi o nome do autor ou o livro no qual o filme se baseia (eu não sei com que grau de fidelidade), que me levaram ao cinema.
Na verdade foi a mera ideia de um homem vivendo uma aventura no ermo com seu cachorro, por mais que o CGI do cão Buck, no trailer não fosse exatamente de encher os olhos (no filme ele está consideravelmente melhor polido). Harrison Ford, Omar Sy, uma aventura canina no Alaska... Me pareceu um filme que eu gostaria de ver, e então ontem eu corri pra casa depois da academia para estar no cinema mais perto de mim no horário da única sessão legendada do longa de Chris Sanders em seu primeiro (quase que totalmente) live action.
No longa, ao fim dos anos 1890 a descoberta de ouro na região do Yukon, junto ao rio Klondike no norte do Canadá deu origem a uma corrida do ouro sem precedentes na América do Norte, com milhares de homens se aventurando nas terras inóspitas às bordas do círculo polar em busca do minério.
A região gélida, coberta de neve durante praticamente três estações por ano, gerou uma enorme demanda por cães capazes de puxar trenós, a única forma confiável de viajar pelo território.
Um dos cães enviados ao Yukon foi Buck.
Buck era o cão de estimação de um juiz (Bradley Whitford) na Califórnia. Mimado por todos os habitantes da cidade de Santa Clara, ele era um cão bagunceiro cuja ideia de punição era dormir na varanda da bela casa do magistrado, até que um sujeito viu no grande porte do animal a oportunidade de conseguir uns trocados ao vendê-lo para prospectores a caminho do norte.
Buck foi sequestrado, trancado em uma caixa, e viajou de carroça, trem e barco. Foi espancado e passou fome e sede até que aprendesse a responder aos comandos do porrete e pudesse ser vendido.
Chegando ao Yukon, Buck começa uma jornada que cruzará o seu caminho com o de pessoas tão distintas quanto o carteiro Perrault (Omar Sy), o aspirante a garimpeiro Hal (Dan Stevens), e o eremita John Thornton (Harrison Ford), passando por aventuras e desventuras que irão moldar e transformar Buck, e todos aqueles que o cercam e têm suas vidas tocadas por ele.
Antes de mais nada, eu não sei por que, todas as críticas que eu li a respeito de O Chamado da Floresta são negativas, então deixe-me dizer:
Não acredite nessas críticas.
O longa é ótimo!
O Chamado da Floresta é um filme de família que combina drama, aventura, e calidez em uma embalagem majestosa e grandiloquente como a Disney de seus melhores dias (quando o estúdio era mais do que a Marvel, remakes de suas animações clássicas e a destruição de Star Wars).
Através da lente de Chris Sanders, diretor de Lilo & Stitch, Os Croods e o excelente Como Treinar o seu Dragão, o Yukon se transforma em um lugar tão inóspito quanto mágico, e cada percalço no caminho de Buck se torna um pedaço de uma grande aventura com cara de matiné de antigamente. É eletrizante, tocante, engraçado, estrelado por cães criados digitalmente para mesclar a aparência de cachorros de verdade com a personalidade e o espectro emocional de cachorros de desenhos animados gerando um resultado que é terno e majestoso em mesma medida (e a audiência ganha o bônus de saber que nenhum animal de verdade passou pelas situações que vemos na tela).
Não bastasse ser tecnicamente excepcional, o roteiro de Michael Green (de Logan e Blade Runner 2049) ainda consegue inserir um sem-número de lições de vida edificantes na jornada de Buck. Durante seu calvário o cão aprende a importância de trabalhar em equipe, de fazer o que é certo em face da adversidade, se orgulhar de seu trabalho, acreditar nos próprios instintos e de jamais esquecer as lições ensinadas pelas pessoas que passam pela nossa vida, mesmo quando elas se vão.
Se as estrelas do longa são os cachorros, há um qualificado elenco humano para ajudá-los a desenvolver a narrativa. Omar Sy finalmente ganha um papel à altura de seu talento em um filme de Hollywwod, e transborda carisma, Cara Gee está ótima, Dan Stevens tem pouco a fazer em cena e Karen Gillan faz uma ponta, quem realmente surpreende, porém, é Harrison Ford.
O veterano há anos parecia um astro que se cansou de Hollywood. O último filme "recente" em que ele não parecia estar no piloto automático havia sido 42: A História da uma Lenda, mas atrevo-me a dizer que, em O Chamado da Floresta, ele realmente parece acreditar no texto, se importar com a história, e percorrer a distância para vendê-la de verdade como ator e como narrador do filme. O resultado é a melhor performance do homem mais próximo de Deus em Hollywood em muito, muito tempo.
O longa por vezes é triste, por vezes é violento, mas a vida também é, e nem sempre tem a candura de O Chamado da Floresta. Então, novamente, ignore as críticas, e vá assistir ao longa. Ele vale o teu tempo, e vale o dinheiro do ingresso. Não é sempre que temos a chance de ser divertidos, emocionados e aprender alguma coisa em uma hora e quarenta minutos.
Veja no cinema.

"Buck era um cachorro como nenhum outro. Ele foi mimado. Ele sofreu. Mas ele jamais foi quebrado."

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