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terça-feira, 5 de janeiro de 2010

2010, o ano em que não conseguimos parar de fazer contato.


E aqui estamos nós, 2010, esperando que alguém faça o contato prometido no filme. Ou, quem sabe, querendo evitar um pouco de contato. Temos contato demais ás vezes. O contato pode ser tenebroso em certas ocasiões, não é? Você sabe, já esteve nessa situação. Alguém insuportável que te conhece vagamente ancora ao teu lado como um transatlântico de incoveniência, se põe á falar sobre seus problemas com riqueza de detalhes enquanto você age no modo reativo-bovino, balançando a cabeça e fazendo "Mmmmmmmmm..." como se ligasse a mínima pra o que ouve.
Outra situação de contato não requerido é quando tu entra em uma loja, olhando de maneira isuspeita pros produtos expostos e aquele vendedor murrinha, aquele com cara de irmão mais novo de namorada aparece do nada com uma cara entre o solícito e o jocoso dizendo com voz musical "Oi, tudo bem? Posso te dar uma ajuda?", a resposta sai no automático "Não, não, tô só dando uma olhada.", "Fique á vontade, se precisar de mim, meu nome é Gervásio.". O diálogo termina com aquela falsa sensação de liberdade, tu volta á olhar os produtos, menos furtivo, afinal, já deixou claro que está só olhando. Aí, de maneira incauta, tu pega uma camiseta pra olhar o tamanho, e aquela voz surge detrás de ti:
"Se quiser algum tamanho é só avisar. Eu tenho outras cores, também.".
Pronto. Pra mim, a experiência acaba aí. "Muito obrigado." que é pra não passar por mal educado, e adeus, mala.
Mas esse é um jogo pra dois. Tem cliente chato pra cacete, também. O vendedor lá, sentado, tranquilo. O camarada entra, avisando que só queria dar uma olhada, beleza, fique á vontade. Mas o cara não quer só dar uma olhada. O xarope diz isso pra se eximir de ter que comprar alguma coisa. Mas ele quer mais que olhar. Ele quer olhar, quer pegar, quer saber...
"Posso dar uma olhadinha nesse?"
"Claro."
"Bacana... Pra que serve?"
Putz. Tu explica, afinal, melhor perder tempo ensinando um idiota do que deixar ele morrer na ingnorância, mas a tua explicação não é suficiente, e o cara que queria só dar um olhada, já pegou o item, ouviu a explicação teórica de pra que ele serve, e viu uma complexa demonstração prática de como funciona. Assim que a tal demonstração termina, ele repete o processo com outra coisa, sem absolutamente nada á ver com a primeira.
É... Contato não requerido.
No trabalho, aquele colega que adora falar, e te conta coisas da vida de outros colegas que adoram falar e fizeram a besteira de falar com ele. E tu, que não tinha o mais remoto interesse no implante de cabelo do Henrique, nem no tratamento dentário da Vera, nem em pra quem o Junqueira, a bicha do departamento pessoal, andou arrastando a asa, se vê subitamente exposto á vida de todos, de um modo ou de outro, por que as pessoas adoram se expôr. Adoram contato.
Deve ser um reflexo desse tempo louco em que vivemos nos últimos dez anos, cada vez temos menos contato de fato com outras pessoas, tudo se resolve via internet, via SMS, via telefone, tudo em um mundo virtual que não respeita o espaço individual (Aí está o telemarketing, invadindo sua casa pelo telefone para vender coisas que você não quer, que não me deixa mentir.), aí estão os sites de relacionamento, onde as pessoas fuçam umas na vida das outras sem dó, os sites de compartilhamento de videos, onde a intimidade de todo mundo vira domínio público, até os medonhos reality shows onde pessoas comuns agem como pessoas comuns servem pra isso, pra tirar o espaço privado do indivíduo e, por que não, criar uma falsa sensação de intimidade via televisão.
As pessoas carecem de contato. E vivemos em um tempo de solidão, não temos tempo pra manter contato com quem amamos, ás vezes nem temos tempo de amar, então, algumas pessoas mandam o senso do ridículo lá pra casa do Capita e se apegam ao contato com qualquer pessoa. Ou até com bichos, quem não conhece aquela clássica velhinha apaixonada pelo seu cachorro ou pelo seu gato? É um paradoxo interessante, vivemos em uma época tão solitária, individualista, que as pessoas nos forçam ao contato sem respeitar nosso espaço.
E aqui estamos, sendo atacados por pessoas que nem conhecemos com um inerminável arsenal de coisas que não queremos saber, enquanto, as pessoas que queremos por perto estão longe de nós.

"Quem me dera ao menos uma vez..."

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