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terça-feira, 16 de novembro de 2010

Silêncio


Salu era tímido. Muito tímido. Salu era tão tímido que estava a meio passo de algum grave transtorno anti-social. Salu não se sentia bem entre desconhecidos, nem estava disposto a fazer um esforço e conhecer as pessoas. Ele preferia que elas continuassem sendo estranhas, assim ele poderia continuar afastado delas com a desculpa do desconforto.
Salu tinha amigos, por incrível que possa parecer. Não eram muitos, mas eram bons. Aliás, pra sustentar uma amizade com Salu, ser um bom amigo, mas bom amigo, mesmo, era uma condição básica. Era dessa forma por que Salu era algo inconstante no seu comportamento.
Hoje, ele ia, de bom grade, ao jogo do Inter contigo, no Beira-Rio. Vocês riam, se divertiam, xingavam o árbitro, comentavam sobre os quadris bem torneados da morena com a camiseta branca de 1997 que ficava pendurada na mureta gritando á plenos pulmões:
"D'alessaaaaaaaaaaaaaaandroan!"
Vocês bebiam Pepsi morna, e celebravam o gol do Damião ou do Sóbis gritando feito cro-magnons em volta da fogueira.
Amanhã, porém, Salu podia não atender ao telefone. Ou recusar peremptoriamente um convite para ir ao cinema, ou para jogar bola. E desaparecer por um ou duas semanas.
Salu não fazia por mal. Era apenas o seu jeito. De vez em quando Salu se desligava do mundo em geral. Seus colegas do trabalho achavam-no mal-humorado, os colegas da faculdade o achavam antipático, seus parentes sabiam que Salu era daquele jeito, mesmo, e seus conhecidos, ou amigos menos próximos e menos pacientes diziam à boca pequena que o Salu era "meio autista".
Enfim, isso não chegava a preocupar Salu, ele era quem era, e pronto. Não podia e nem achava que queria mudar. Pelo menos não de todo, não de uma hora pra outra. O que Salu podia fazer era tentar relevar aqui e ali, abrir uma ou outra exceção. Submeter-se a certos rituais sociais que considerava absolutamente risíveis em nome da amizade das pessoas que ele achava que valiam a pena. Não eram muitas, de qualquer forma, então, ele podia abrir mão de uma parcela de sua privacidade de quando em quando, Salu era tranquilo quanto a isso.
Menos tranquilo Salu ficava naquelas raras ocasiões em que, de fato, sentia que se apaixonava por alguém. Nesses momentos Salu se perguntava como seria para uma pessoa socialmente normal, se relacionar com alguém que era praticamente um eremita. Como uma mulher sociável, divertida e comunicativa faria para viver com um sujeito que contava nos dedos as pessoas com quem gostava de passar tempo, e, ainda assim, não era lá muito tempo?
Salu não sabia responder a essa pergunta. E por isso, por mais que de vez em quando tivesse vontade de gritar bem alto que amava alguém, respirava fundo, engolia a declaração, e se recolhia por uns tempos. Pra se acalmar de novo.

3 comentários:

  1. Pessoas diferentes podem ter um relacionamento saudável, embora isso seja bem difícil. Acredito que pra não ter complicações, o Salu precisa se apaixonar por uma eremita, igual ele! Vai por mim, as meninas eremitas são legais !! Ai tá tudo resolvido. Fica os dois na caverna e pronto.
    Tá, agente não escolhe por quem sem apaixona, e como a vida é cruel, na certa ele, um meio autista assumido, vai cair de amores por alguma menina que é promoter de festas e eventos ou coisa parecida...

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. ah, ah, ah, ah, seria, de fato o fim da picada o eremita apaixonado pela promotora de eventos.

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