Bem vindos a casa do Capita. O pequeno lar virtual de um nerd à moda antiga onde se fala de cinema, de quadrinhos, literatura, videogames, RPG (E não me refiro a reeducação postural geral.) e até de coisas que não importam nem um pouco. Aproveite o passeio.
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sexta-feira, 26 de novembro de 2010
Tem limite.
A moça, com cabelos bem negros, olhos castanho-escuros, óculos, muito bonita, estava sentada na praça de alimentação do shopping com meio milk shake de Ovomaltine do Bob's em frente a ela. Concentrada lia um livro. Meu Nome É Vermelho, do Orhan Pamuk. Lia com voracidade o livro, absorta na história do Negro. Foi quando desviou os olhos da página para tomar um gole da bebida doce e cremosa no copo diante de si, e viu, do outro lado da praça de alimentação, um rapaz. Era alto, magro. Tinha cabelos ruivos e uma barba de alguns dias. Olhos muito verdes. Vestido com um jeans desbotado, tênis All-Star vermelhos gastos e uma camisa de flanela xadrez azul e preta. Parecia ter estacionado no tempo na época do Nirvana. Era bonito. Parecia interessante. A moça pensou que poderia abraçar uma pequena dose de anacronismo visual em sua vida. Especialmente se viesse embrulhando um rapaz alto e bonito de olhos verdes como aquele. Estava olhando para o rapaz enquanto sugava com sofreguidão o milk-shake pelo canudo, foi quando deu-se conta que ele também a olhava.
Susto!
O que o sujeito iria pensar dela? Ali, olhando descaradamente pra ele enquanto chupava o canudo? Homens são costumeiramente podres na hora de associar qualquer coisa a sexo. Imagine o que ele iria imaginar? Baixou os olhos. Então, os ergueu novamente e o mirou. Ele ainda a olhava. Sorriu. Ai, meu Deus! Começou a andar em sua direção. O que ela ia fazer? O que ela ia fazer?
Respirou fundo. Fingiria desinteresse e continuaria lendo seu livro? Quando ele se apriximasse ela diria que não olhou pra ele coisíssima nenhuma e desejaria bom dia. Ou então diria que pensou que o conhecesse. Isso! Diria que achou que ele era seu primo Marvin.
"Marvin"? Precisava parar de ouvir aquele disco dos Titãs. Ele estava mais perto. O sorriso franco bem aberto. Dentes tortos... Meio Ethan Hawke. Charmoso até. Quem sabe... Quem sabe ele não era o homem da sua vida? Quem sabe todas as escolhas certas e erradas que ela fizera na vida tenham servido para fazê-la chegar até aquele momento, áquele lugar? Quem sabe os homens com quem ela pensara em dividir a sua vida até ali tenham sido meros estágios para que ela encontrasse aquele pseudo-Ethan Hawke ruivo no shopping enquanto bebia milk shake e lia Orhan Pamuk? Por que não? Ele era bonito, tinha algum charme, apesar de parecer um grunge perdido no tempo, mas que diabos, a moda vai e volta, quem sabe as camisas de flanela xadrez estivessem apenas esperando o momento de atacar novamente? Talvez ela estivesse sozinha por ser demasiado exigente consigo e com os outros, talvez aquele grunge extemporâneo fosse o teste derradeiro para ela deixar de lado os velhos preconceitos e abraçar a novidade e a espontaneidade de uma relação baseada no acaso e mais nada.
Respirou fundo, ele estava muito perto. Parou perto dela.
Ela ergueu os olhos e sorriu. Ele sorriu de volta:
-Tu é linda, pena que é colorada...
Ela não entendeu:
-Quê?
Ele apontou com o queixo pro livro sobre a mesa:
-Tá lendo livro do Inter...
-Desinfeta, fedelho burro.
O rapaz saiu sem entender e voltou pra onde estava. A moça suspirou. Espontaneidade, novidade, abandonar os velhos preconceitos, vá lá, mas tem limite: Burrice, não. Burrice nem morta.
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Isso eu levaria como um estupro ao meu raciocínio...
ResponderExcluirComo diria meu amigo Morin, e Montaigne que dizem e reafirmam: "mais vale uma cabeça bem feita que bem cheia"...
Muito antes, ser exigente e ter poucos que se enquadram do que sofrer com a mediocridade das mentes que não pensam... que apenas pseudo-vivem...
Ai, e vamos combinar... que cantada idiota!!!
Ahahahahaha, foi como eu me senti.
ResponderExcluirClaro, quando me perguntaram se era um livro do Inter não foi uma cantada, foi a pergunta da atendente da livraria, ainda assim, deu vontade de chamar a mulher de burra.