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quinta-feira, 2 de maio de 2013

O Eremita



O Berillo se olhou no espelho naquela manhã e enquanto ajeitava os cabelos, cada dia mais indisciplinados, pensou lá com seus cordões, pois a roupa que ele usava pra dormir não tinha botões, que aquele seria um bom momento pra largar tudo de mão e ir viver no meio do ermo.
Do ermo, mesmo... No meio do nada, afastado de tudo. Longe de todas as pessoas e tudo mais... Pensou em como faria isso... Conhecia lugares bem isolados na divisa de Santa Catarina com o RS, onde alguém que não estivesse sendo procurado pela polícia poderia desaparecer.
Com uma rede de selva, um saco de dormir e algumas roupas, o Berillo poderia facilmente ir viver como um eremita numa região desolada. Sempre fora meio eremita, mesmo... Tinha noções mais que suficientes de sobrevivência, sabia conseguir água, se abrigar, quando se esconder, quando seguir andando, o que podia e o que não podia comer na natureza... Não iria se tornar um caçador obviamente, primeiro porque provavelmente não era hábil o suficiente pra isso, segundo porque lhe partiria o coração matar graxains pra sua subsistência, mas poderia se valer de suas habilidades de faz-tudo pra perseverar. De onde planejava viver, eram cerca de seis, oito horas de caminhada até a cidadezinha mais próxima. Poderia fazer bicos... Consertar encanamentos aqui, ajeitar uma instalação elétrica dali, carregar coisas pesadas de lá, receber algum dinheiro, ou até virar homem das cavernas, mesmo e trabalhar em troca de comida.
Sentiria falta de coisas como seu video-game e seus filmes, mas aprenderia, em tempo, a viver sem isso.
Poderia levar alguns gibis consigo. Livros... E viveria no meio do mato, sem saber de nada nem de ninguém até os seus dias terminarem ou suas feridas cicatrizarem, o que viesse primeiro.
Vivendo solitário em meio à natureza, talvez Berillo encontrasse a sua medida de paz interior. Ele passaria por maus bocados, claro, sentiria falta de muitas coisas, mas francamente... Sentia falta de muita coisa agora, passava por mais maus bocados do que bons se fizesse a matemática da coisa, e na maior parte do tempo, tudo o que queria era sumir...
Quanto tempo levaria pra colocar esse plano em prática? Um mês? Dois? Tinha quase tudo o que precisava, exceto a rede de selva, que poderia perfeitamente ser comprada amanhã. E sua família? O que diria a eles? Alguma satisfação vaga... Diria que se uniu à Legião Estrangeira, aos Médicos Sem-Fronteiras, ou algo que o valha... Se despediria de seus amigos sem alarde, como se fosse voltar a vê-los no dia seguinte, e voilá... Desapareceria.
Sim... Podia ser feito... Não seria nenhum Ernest Shakleton, nenhum Indiana Jones, mas poderia fazê-lo.
Mas aí, Berillo percebeu que, onde quer que fosse, a levaria consigo... E aumentar a distância já tinha se mostrado tão ineficaz quanto esparadrapo no tratamento do câncer.

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