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terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Não mexa com quem está quieto...


A Nena e o Décio, sentados no bar, desde que se conheceram que o Décio deu em cima da Nena. Ela era bonita, loira, alta e magra. Tinha um ar meio escandinavo, algo frio, mas era simpática, educada, muito inteligente e reservada. O Décio era um sujeito mais comum. Cabelo e olhos castanhos, um e oitenta, era extremamente expansivo, boa-praça, e meio mulherengo, meio escamoso, tinha aquele ar de galã de rodoviária e não economizava latim quando queria sair com uma moça. Assim que Nena apareceu com a Carlinha em um churrasco da turma, o Décio a notou. E só piorou conforme a Nena ia se tornando um pouco mais próxima de todos a ponto de ser considerada "da galera". O Décio começou a assediar a Nena. No bom sentido. Nada de grave. Talvez a expressão mais correta fosse "cortejar" a Nena. Fazia gentilezas, servia bebida, quando assava o churrasco dizia que estava preparando a carne favorita dela "do jeitinho que ela gostava", essas coisinhas. A questão é que a Nena não dava lá muita abertura pras investidas do Décio, nem o atalhava de maneira violenta, de modo que ele seguia tentando. A Nena continuava não lhe dando bola, mas, ao mesmo tempo, parecia não se incomodar muito em ser cortejada por ele, não levava a mal, nem nada, e ele, percebendo isso, foi se prevalecendo, começou a pegar pesado com o seu assédio, mas ela nem aí, não dava nenhuma bola pra ele.
-Nena... Foge comigo, Nena, hoje. A gente se enfia em um motel barato lá na Farrapos e fica o final de semana inteiro explorando o corpo um do outro, parando só pra comer coisas vagamente brancas e beber champagne...
-Champagne em um motel barato da Farrapos, Décio? Acho brabo, hein?
-Eu levo o champagne, Nena, vou comprar agora, depois a gente só entra no carro e vai pro motel. Eu quero conhecer o teu corpo, Nena, quero saber o sabor e o aroma dele em todas as horas do dia, conhecer o ruído que tu faz quando dorme, te ouvir ronronando feito uma gata enquanto-
-Tu quer me ouvir roncar? Tu quer me arrastar pra um motel barato da Farrapos, me encher de champagne e me ouvir roncar?
-Qual é, Nena... Eu quero saborear tudo o que tu for fazer, se tu dormir, se tu for tomar banho... Tudo.
-Sai fora, Décio...
-Vamo lá, Nena, me dá a chance e eu vou fazer coisas inomináveis contigo, juntos nós vamos realizar prodígios que tu vai levar pro túmulo, por mais que não fiquemos juntos, ao longo dos anos, quando tu tiver um tempinho em algum momento do dia e parar e pensar, tu vai suspirar, e vai ser por causa desse final de semana...
A Nena encarou o Décio com a mesma expressão indefinida de sempre:
-Tá bom.
-Como assim, "tá bom"? - Perguntou o Décio, confuso.
-Tá bom, vamos. Vamos lá realizar prodígios, eu quero que tu faça coisas inomináveis comigo. Em algum momento eu vou me casar, ser uma mãe de família, e talvez me arrependa de não ter feito uma bobagem ou uma loucura antes, então vamos. Vamos fazer coisas abjetas em um quarto mequetrefe de motel. Vamos inventar nomes esdrúxulos pra posições sexuais inimagináveis. Vamos ficar com certo asco de nós mesmos por algum tempo.
O Décio riu, nervoso:
-Sério?
-Seríssimo. Vamos lá, vamos estremecer os pilares das convenções sociais, vamos desconsiderar a anatomia e as funções fisiológicas do corpo humano. Eu vou te mostrar quão flexível uma mulher pode ser sob efeito de champagne.
-Arram... Tá... Hã... Quando tu quer ir? Por que tipo, hoje eu não sei se vai dar, tinha ficado de-
-Agora.
-Quê? - Décio não conseguiu esconder o tremor na sua voz.
-Agora. Me leva agora. No carro eu já vou começar a fazer coisas que vão te deixar de cabelo em pé, Décio. Aliás, esquece o champagne, eu vou te mostrar toda a minha flexibilidade sóbria, mesmo. Depois do que eu fizer contigo, tu nunca mais vai olhar as mulheres da mesma maneira.
-Olha, Nena... Pensando bem, eu acho que talvez a gente possa deixar pra semana que vem, ou, sei lá, pra outra, eu não quero-
-Não me enrola, Décio, tu não sabe o que tu fez comigo, agora eu quero, e quero já.
-Tá, olha, o pessoal me chamando lá. Nos falamos, viu, Neninha. Beijo.
O Décio saiu nervoso pelo bar, esbarrando entre as mesas, sob o olhar frio de uma sorridente Nena, que nunca mais foi importunada por ele novamente.

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