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segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Coisas simples


O Aristides admirava a engenharia das coisas do dia-a-dia, das coisas simples, das mais simples, até algumas mais elaboradas, ele adorava conhecer o funcionamento de tudo. Embora ele admitisse, tivesse mais apreço pelas coisas simples. Era no mundano que Aristides encontrava mais satisfação, no que parecia mais tosco, mais básico, era onde Aristides depositava seu mais sincero apego, seu mais genuíno deslumbramento.
Um exemplo bem claro, era que Aristides achava telefone celular muito bacana, sim. Achava maneiro até o modo como o nome servia pra designar o sistema de células que tornava as ligações possíveis, mandando o sinal de uma antena pra outra e talicoisa. Mas ele achava dobradiça muito mais bacana. Dobradiça, mesmo. Dessas de porta, sabe? Então. O Aristides achava dobradiça muito maneiro. Ficava pasmo olhando aquelas cartelinhas que vende na parte de ferragem do supermercado com duas dobradiças dentro, manja? Pois é, ele achava aquilo, sei lá, uma demonstração inquestionável da triunfo do intelecto humano. Achava glorioso. Ás vezes, quando ia entrar em algum lugar, olhava a dobradiça das portas, e fazia, baixinho, um ruído de satisfação.
"Eheh... Aaaah."
Ninguém entendia, se bem que quase nunca reparavam. De qualquer forma, dobradiça era uma das coisas que deixavam o Aristides feliz da vida, admirado, maravilhado. Um lance tremendamente simples, mas, ao mesmo tempo, com uma certa sofisticação rude, se é que existe tal coisa.
Tubo de pasta de dente, também. Nossa, cara, tubo de pasta de dente ele achava tudo de bom! De manhã, quando acordava, o Aristides já estava com um sorrisão no rosto, antevendo o prazer de apertar o tubo de pasta de dente bem embaixo, sabe? Na ponta oposta a da tampa, e ver o creme dental branco, com as risquinhas vermelhas sair lentamente de dentro do tubo... Nossa. Era um lance quase erótico pro Aristides, além, claro, de ser outra notável invenção da raça humana. Áfora, claro, toda a engenharia química da produção do creme dental em si, a forma como o creme era inserido dentro do tubo, a maneira exata como ele passava pelo micro recipiente da substância colorida perto da abetura do tubo, pressionado contra as ranhuras que davam aquelas riscas fininhas pra pasta... Caraca... O Aristides ficava estático pensando em como aquilo funcionava. Não tinha outra, era mais uma das grandes invenções humanas. Um troço tão maneiro, e que ainda protegia os dentes de cáries, e deixava o hálito cheiroso? Ah, não... Tipo, o Aristides ás vezes se sentia quase na obrigação de escovar os dentes ajoelhado, agradecendo aos céus e aos homens de ciência que criaram aquela maravilha.
O Aristides era assim. Um sujeito de admirações simples. De ideias simples, de vontades e desejos e sonhos simples. Ele era capaz de curtir as coisas mundanas do dia-a-dia, e de ver milagres de sapiência humana onde os outros são incapazes de ver qualquer coisa. Era seu modo de ser. Talvez por isso, por ser um camarada de pretensões tão básicas, ele andasse tão desconfiado com a felicidade que experimentava naqueles dias.
Felicidade tão em excesso, sem precisar de explicação ou palestra... Sei lá, precisava de alguma explicação ou palestra.

Um comentário:

  1. Pessoas desconfiadas são assim: como ter recebido tanto? Parece que a esmola é demais... então, você sabe, o santo desconfia.

    Mas acho que a felicidade é simples e não foi uma invenção do homem ou qualquer pordígio de gênio, talves seja por isso que o Aristides ainda olhe a felicidade com essa necessidade de explicação!

    Mas que dobradiças e tubo de pasta de dente são geniais, ah, são!!! (já pensou ficar mastigando hortelã o dia todo e ter que arrastar a porta pra entrar? E olha, nem me refiro a porta do banheiro em maiores necessidades!!!)

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