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quinta-feira, 29 de agosto de 2019

Resenha Série: Mindhunter, Temporada 2, episódio 9


Atenção! Há spoilers abaixo.
Aqueles familiarizados com o caso do estrangulador de Atlanta sabem que Wayne Bertram Williams (Christopher Livingston), o suspeito parado por Bill, Barney e Ford no episódio passado de Mindhunter eventualmente seria condenado como o Monstro de Atlanta, e muito desse último episódio da temporada revolve ao redor dos três agentes federais liderando as autoridades na tentativa de juntar as pistas capazes de criar um caso contra o sujeito, seja com visitas surpresa à sua casa, seja perseguindo-o pelas ruas de maneira não muito discreta, seja mendigando vigilância sobre ele junto ao promotor público.
Novamente, o acerto da série é não inserir os personagens fictícios com muita veemência na narrativa real, o que a mantém com um pé na realidade, e não deixa que a história se torne um daqueles filmes feitos para a TV dos anos 80/90. A Unidade de Ciência Comportamental não está no miolo de todos os casos envolvendo assassinos em série, e certamente não estivera nesse, o que torna as coisas mais críveis quando Holden e Bill se percebem sem nenhum controle da situação como, por exemplo, no momento em que Williams é preso pela polícia de Atlanta e os dois não sabem ao certo por que, ou quando Williams passa a tentar virar o jogo ao se perceber sob vigilância policial e eles se veem constrangidos por sua impotência, ou quando ainda se veem lidando com a desconfiança das autoridades da Georgia e, eventualmente, com o uso político do trabalho da unidade.
O caso do estrangulador de Atlanta é verdadeiro e famoso, e conforme é lembrado à audiência no final do episódio, Williams seria condenado pelos homicídios de dois adultos, enquanto os outros vinte e sete casos jamais seriam ligados a ele de oficialmente. Por mais que isso possa ser uma estratégia da promotoria para pegá-lo através dos casos pelos quais ele foi efetivamente responsabilizado garantindo sua punição, não é difícil enxergar a conveniência de afirmar que Wayne Bertram Williams era o responsável por tudo e encerrar o caso para que a cidade pudesse voltar ao normal de uma vez por todas.
A despeito de todas as queixas da promotoria pedindo por evidências físicas dos crimes para emitir mandatos, Wayne foi processado por conta de fibras de carpete e a pressão de políticos ávidos por colocar o passado atrás de si em um ano eleitoral.
E esse é um desfecho que Holden, mais do que ninguém, acha difícil de engolir.
Porque o FBI recebe o crédito por usar suas técnicas e resolver o maior caso do país, mas as justiça pode não ter sido feita. Quando Ted Gunn aparece em Atlanta em um jatinho privado parabenizando Holden e Bill pelo trabalho e porque agora o bureau é a primeira opção para esse tipo de caso, o agente Ford não vê um sucesso.
E essa nota de frustração para o final da série é depoimento em favor de sua coragem.
O programa que celebra a inteligência de seus protagonistas é corajoso o suficiente para mostrar que eles não têm todas as respostas não importa o quanto acreditem em seu programa.
Essa acaba sendo uma lição de humildade mais pesada para Holden. Ele tinha tanta certeza do perfil que havia montado que ver os resultados de sua presunção questionados talvez seja mais amargo do que descobrir que sua crença se encaixava tão candidamente na narrativa que melhor servia às autoridades que jamais se comprometeram com ele. A descoberta de que os crimes eram responsabilidade da Ku Klux Klan poderia ter acendido um barril de pólvora na cidade, mas a condenação de Williams manteve Atlanta relativamente sob controle e sua violência racial debaixo do tapete.
Bill, mais experiente e calejado sabe como a banda toca o suficiente para não cair nas armadilhas das promessas de Gunn, obviamente mais interessado no ganho político que poderia ordenhar dos sucessos da UCC, mas Holden levou uma tremenda rasteira. Ele não consegue ver o sucesso absoluto de Gunn ou o sucesso relativo de Bill, ele vê apenas um fracasso. Especialmente ao descobrir que sua promessa de que a investigação continuaria foi engavetada à revelia de sua vontade. Ele realmente pretendia retornar e continuar no caso tanto para ligar mais crimes a William quanto para investigar outras possibilidades com Barney, e o faria para satisfazer o desejo por justiça das famílias, mas também sua própria curiosidade intelectual, como ele vai lidar com esse revés, descobriremos na próxima temporada.
O preço da investigação de Atlanta, para Bill, pode ter sido até mais caro do que para seu colega.
Nancy aparentemente não tinha mais como suportar a ausência do marido e o ostracismo ao qual julgava Brian exposto, e resolveu ir embora.. É difícil simpatizar com Nancy à essa altura, e eu não sei se isso é proposital ou reflexo de má escrita. É difícil dizer, mas a personagem encerra a segunda temporada como a Skyler White de Mindhunter.
Resolver ir embora porque o marido precisou responder a um chamado no meio de um churrasco é o cúmulo da futilidade...
Quanto a Wendy, ela não desempenha papel algum nesse capítulo final.
Sua única participação é jogar no lixo uma das revistas de Kay, talvez sinalizando que ela vai se dedicar mais profundamente à sua profissão no futuro, seja como for, seu papel ampliado nessa segunda temporada foi um dos acertos da série, e o fato de ela ter falhas de caráter e cometer erros enriqueceu a personagem.
Fechando o capítulo, saem as cold openings de BTK, entra uma cold closing. O "funcionário da ADT" aparece em um quarto de motel, novamente munido de seus apetrechos de masturbação que haviam sido enterrados no meio da temporada, e vários troféus arrancados de suas vítimas.
Vale lembrar que, na vida real, BTK só seria capturado em 2005, então, é uma linha narrativa com muito tempo para seguir, talvez, um recado para Holden e membros mais apressadinhos da audiência:
Mindhunter não é uma procedural. Nem todos os criminosos do mundo podem ser capturados rapidamente após um perfil ser montado baseado em entrevistas com criminosos notórios, na natureza de seus crimes e seu modus operandi.
Ás vezes, é preciso um longo, longo trabalho, e mesmo assim, seja necessário se contentar com alguma migalha de justiça, e tocar o barco.
Que venha a terceira temporada.

"Nós fizemos nosso trabalho. Não temos controle sobre mais nada..."

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