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segunda-feira, 17 de junho de 2013
Conjugação
"Tô aqui embaixo.", dizia a mensagem no display do celular. Ele encarou o aparelho por longos segundos, e não pôde conter o sorriso. "Tô aqui embaixo." era sempre prenúncio de sorriso de uma forma ou outra... Olhou pras letras pretas sobre a tela branca, treze letras, dois espaços, um ponto final... Trinta e dois toques na tela sensível do celular, se ele não errasse nenhuma letra e tivesse que compensar com toques adicionais... Não que ele escrevesse aquilo com frequência. Na verdade tinha aquela mensagem salva na memória do telefone. Bastava entrar ali e enviar. O remetente também estava salvo... Bastavam cinco toques na tela do telefone pra enviá-la e esperar que começasse... Uma pequena cadeia de eventos que sempre culminava com felicidade, leveza e riso.
E agora ali estava ele... Celular na mão, nervoso... Deveria mandar a mensagem? Melhor não. As coisas haviam mudado. Por mais bacana que fosse parecer, simplesmente mandar aquela mensagem e esperar o resultado, ele achou melhor não fazer isso... Poderia mandar algum texto mais elaborado que treze letras... Podia começar com um "oi, tudo bem?", ou "Queria te ver", ou "queria falar contigo"... "Queria", não. "Quero"... Melhor né? "Quero" é presente... "Queria" é pretérito. Pior ainda, é pretérito imperfeito. O pretérito dela e dele já era imperfeito que chegasse... "Quisera" era mais que perfeito, mas aí não se aplicava... Mais que perfeita era ela... Mais que perfeito, o "quisera", se aplicava ao futuro que ele quisera ao lado dela. Isso sim... Isso sim, era mais que perfeito. Mas aí não era pretérito. Não era pretérito porque essa vontade não tinha passado. Era prólogo. Era futuro. Não existe futuro mais que perfeito... Foda-se.
Eles inventariam um.
Eram bons nisso. Ela era melhor, claro, mas acabava contaminando ele com essa qualidade e ele ficava bom nas coisas, também.
Estava terminando de colocar os cadarços na chuteira amarela. Celular do lado.
"Quero te ver, falar contigo... Pode ser?", se a resposta fosse positiva escreveria: "Tô aqui embaixo"... Mas e se ela não estivesse em casa? E se estivesse na casa de uma amiga, ou de um amigo? Ela responderia "não tô em casa, pode ser depois?", e aí? O que ele diria?
"Sem problema. Me avisa quando tu chegar. Eu não vou à parte alguma.".
Poderia ser assim? Poderia ser fácil assim?
Passou um dia... Passaram dois. Estava matutando essa ideia. Estava ansioso, nervoso, excitado, tímido... Poderia ser tão fácil?
Voltar a ser feliz? Voltar a estar vivo. A ser metade de algo especial?
Sentado na sala de casa, tablet no colo, começou a procurar horários e salas de filmes em Porto Alegre com um em mente. Um em especial. E totalmente ao acaso, acabou encontrando outra coisa. Acabou encontrando uma ideia.
Uma ideia dela, a respeito dele. Deles.
Se em algum momento, ele fora uma presença positiva na vida dela. Se em algum ponto, ele fora sinônimo de conforto e acalento, se ele já fora um porto seguro, pra ela, já não era mais.
Ele nem sequer era alguém a quem ela recorreria em um momento de necessidade.
Em alguma curva do caminho tortuoso dos dois, ele tanto fez que conseguiu sumir da vida dela.
Ela disse "Ele me perdeu".
E estava errada. Está errada.
Está errada porque, como já disse Gandalf, o cinzento, nós sempre podemos voltar a encontrar as coisas que perdemos, mas não aquelas que abandonamos.
E em algum ponto, em meio à sua tristeza, mágoa e rancor excessivo, ele conseguiu abandoná-la... Inadvertidamente, sim, mas aceitando o risco ao tomar todas as decisões erradas.
Ao fazer isso, ao notar do que fora capaz de fazer com alguém que lhe era tão caro. Com alguém que lhe era tão especial, que amava tanto, ele percebeu o quanto era incompleto. O quanto estava quebrado.
E viu que não...
Não era tão fácil. E que se condenara a ter, como única coisa perfeita em sua vida, a conjugação do pretérito, e tudo o que quis... Mas não fez.
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