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sexta-feira, 25 de julho de 2014

Resenha Cinema: O Grande Hotel Budapeste


Eu sou um admirador contido dos filmes de Wes Anderson, e acho que desde Os Excêntricos Tenenbaums, o único que eu não assisti foi O Fantástico Sr. Raposo (Afora seus curta-metragens).
Gosto do cinema de Wes Anderson, de seu jeito quase estranho de fazer filmes, com aquelas tomadas assinatura de personagens olhando direto pra câmera com cara de quem está confuso, e suas histórias carregadas de sensibilidade e de humor, e, ao contrário de alguns fãs do cineasta, não acho que ele deva mudar sua forma de fazer cinema, pois, pra mim, ela funciona, ainda que não empolgue tanto quanto a crítica especializada, mas eu sou apenas um nerd que adora cinema, e não necessariamente entendo do assunto.
De qualquer forma, eu não sou um fã apaixonado do cinema de Anderson, ou não era, até ver O Grande Hotel Budapeste.
No filme conhecemos a história de monsieur Guastave H. (Ralph Fiennes, brilhante), concierge do Grande Hotel Budapeste do título, uma joia da prestação de serviços de hospedagem encravada nas montanhas da fictícia nação leste-européia de Zubrowka nos anos entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial.
As aventuras de M. Gustave, são lidas por uma jovem aos pés da estátua de um celebrado autor (Tom Wilkinson), que nos remete a um documentário gravado e narrado pelo próprio, onde ele relembra sua passagem pelo Grande Budapeste, quando, na juventude (vivido por Jude Law), pôde ouvir o conto da boca do proprietário do hotel, Mr. Moustafa (F. Murray Abraham) em pessoa, numa estrutura narrativa com cara de matrioska, com história dentro da história dentro da história.
História essa que nos remete ao ano de 1932, quando a partida de uma iminente hóspede do hotel, madame Céline Villeneuve Desgoffe und Taxis, uma abastada viúva de 84 anos (Tilda Swinton, irreconhecível) e um dos muitos casos amorosos de monsieur Gustave, um artista na arte de entreter velhas senhoras ricas, faz o concierge notar a presença do novo mensageiro, Zero Moustafa (o estreante Toni Revolori).
Monsieur Gustave toma o jovem Zero como seu protegido, e passa a instruí-lo na arte sutil de ser um mensageiro perfeito, mas a notícia da morte de Madame Céline, e a presença de monsieur Gustave em seu testamento, sendo agraciado com uma notável pintura renascentista, o coloca em rota de colisão com toda a família da falecida, em especial seu impossivelmente malvado filho, Dmitri (Adrien Brody), que com a ajuda de seu capanga Jopling (Willem Dafoe, sensacional), não medirá esforços para impedir que Gustave consiga qualquer migalha da fortuna de sua mãe, dando início a uma série de eventos que formam a deliciosa trama farsesca com cara de cinemão de antigamente temperado com o humor esperto de Anderson que é O Grande Hotel Budapeste.
É excelente.
O longa-metragem talvez seja o trabalho de Anderson que mais se beneficie das obsessões do cineasta na hora de filmar. Dos enquadramentos dramáticos ao trabalho de direção de arte esmerado passando pelos planos-sequência com movimento de câmera pensado em cada milímetro, tudo funciona para dar a O Grande Hotel Budapeste a cara que ele tem, e que é a que precisava, uma farsa tragicômica que esconde em meio ao riso uma homenagem ao cinema dos anos 30 e 40, assim como a todo um capítulo da História da cultura. Um capítulo que seria fechado com a eclosão da Segunda Grande Guerra.
A Europa do início do Século XX.
Oculto entre os vilões que retorcem seus bigodes, às moças camponesas de coração puro e aos improváveis heróis criados pelas circunstâncias estão a Europa oriental sendo subjugada pelos alemães, e depois entregue ao comunismo, a perseguição à minorias étnicas e os refugiados de zonas de conflito. Nada que transforme Wes Anderson em um documentarista, mas que serve para mostrar que o diretor/roteirista é capaz de ir além do núcleo familiar problemático para contar suas histórias.
Ajuda o diretor ter, em mãos, um tremendo de um elenco, que tem atores que já participaram de produções de Anderson (Brody de Viagem a Daarjeling, Dafoe e Jeff Goldblum de A Vida Marinha com Steve Zissou, Swinton, Edward Norton e Harvey Keitel de Moonrise Kingdom), os atores recorrentes de praticamente todos os filmes do cineasta (Bill Murray, Jason Schwartzman, Owen Wilson, Bob Balaban, todos em pontas), além de Mathieu Almaric (o mordomo Serge X), a deliciosa Léa Seidoux, e Saoirse Ronan, todos ótimos mas eclipsados pelo verdadeiro dono do filme, Ralph Fiennes.
É ele o autêntico protagonista de direito em O Grande Hotel Budapeste, esbanjando uma insuspeita veia cômica de fazer chorar de rir em alguns momentos e capaz de emocionar em outros, genuinamente se divertindo com seu trabalho, e sendo a alma do filme com seu inexplicável concierge, amante de poesia que volta e meia pragueja palavrões e xingamentos de fazer corar de vergonha, que não fica sem seu perfume L'Air de Panache, que usa em grandes quantidades, e um apaixonado por velhas senhoras a quem chama, nada sutilmente, de "cortes mais baratos".
Em suma, Wes Anderson acerta em tudo, da estrutura narrativa à direção de elenco, passando pela forma de contar sua história, escondendo suas influências, mensagens e homenagens em meio a uma comédia que diverte e faz rir, mas que não abre mão da nostalgia e da melancolia habituais do trabalho do cineasta.
Bravo, senhor Anderson. Tem um novo fã de seu trabalho.
Um dos melhores filmes do ano. Assista no cinema.

"Veja só, ainda permanecem tênues fagulhas de civilização neste matadouro bárbaro outrora conhecido como humanidade. De fato, isto é o que provemos em nossos próprios modestos, humildes, insignificantes... Ah, que se foda."

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