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segunda-feira, 31 de julho de 2017

Resenha Série: Game of Thrones, Temporada 7, Episódio 3: The Queen's Justice


Atenção! Há spoilers!
A sétima temporada de Game of Thrones segue em sua marcha acelerada rumo ao oitavo episódio, e o terceiro capítulo do ano foi tão recheado de eventos, tramoias, conversas, reuniões, batalhas e reviravoltas que o reencontro entre dois Stark que não se viam desde a primeira temporada acabou sendo um dos momentos menos significativos da noite.
Bran Stark e Meera Reed (Ellie Kendrick) finalmente cumpriram o longo percurso até Winterfel, mas o reencontro acabou sendo mais frio que o próprio inverno. Bran parece absolutamente desligado do mundo agora que é o Corvo de Três Olhos, e tudo o que o abraço entre Jon e Sansa foi na temporada passada, o abraço entre ela e o caçula não foi na noite passada. Sentado junto ao represeiro branco do bosque sagrado, Bran tentou explicar à irmã como funcionam seus dons, mas talvez o tenha feito de maneira excessivamente insensível, ao deixar claro que viu a irmã sendo estuprada por Ramsey na sua "noite de núpcias".
A ruivona está fazendo um excelente trabalho como líder do Norte na ausência de seu irmão mais velho, mas Mindinho, conforme eu temia após o episódio da semana passada, está ali, buzinando-lhe no ouvido o tempo todo, e eu não posso deixar de temer, considerando o histórico de Sansa, que ela, confrontada com a frieza de Bran e os traumas que ela sofreu e aos quais o jovem Stark trata com tanta frieza, possa acabar se deixando levar pela conversa de Petyr, que ao menos lhe deu uma boa dica ao falar de como aborda seus problemas, imaginando cada cenário possível o tempo todo em qualquer situação, para não ser surpreendido pelo resultado.
Mas não foi o reencontro entre Bran e Sansa que abriu o episódio.
Não, senhor.
Tivemos, antes, o reencontro entre Tyrion e Jon, em Pedra do Dragão, outros dois que não se viam desde a primeira temporada e voltaram a se ver, e, finalmente, o encontro pela qual muita gente ansiava nos últimos sete anos: Jon Snow e Daenerys Targaryen.
A mãe dos dragões e o bastardo do norte dividiram a tela e não foi por um flash como poderia ter acontecido em uma temporada anterior. Os dois estiveram juntos por um bom tempo e em mais de uma cena para deleite da audiência.
Eu gosto da Daenerys e à essa altura já estou convencido de que ela é a melhor e mais interessada pessoa para reger os sete reinos, ainda assim, não posso dizer que não vibrei com o fato de Jon Snow não ter dobrado o joelho diante da khaleesi.
O jogo de ponto e contra-ponto entre Dany, Missandei e Tyrion e Jon e Davos foi um dos momentos mais bacanas da temporada até aqui, com ambos os lados deixando claro que tanto Jon quanto Daenerys são pessoas que se ergueram às suas novas posições através de esforço e luta, e o fizeram, não em nome de interesse próprio, mas para proteger os indefesos e que o rei do Norte é tão merecedor de seu título quanto Daenerys é (da maioria) dos seus (e aqui abro mais um parentese para aplaudir o sor Davos Seaworth de Liam Cunningham, que não deixou os arautos de Dany saírem por cima no confronto de status e feitos).
Nenhum ponto ficou descoberto, nenhum dos dois deu sequer um passo atrás, e ainda assim, não chegaram a hostilizar um ao outro (o que foi bom, já que são dois dos poucos mocinhos ainda vivos em Westeros).
A teimosia da rainha dragão e do rei lobo, por sinal, levou a um dos pontos altos do episódio, pra mim. Uma participação maior e mais ativa de Tyrion Lannister.
Nos momentos mais chatos de Game of Thrones, nominalmente a temporada 4, Peter Dinklage meio que carregou o programa nas costas em diversos momentos, algo que ficou impraticável após ele deixar Porto Real e outras linhas narrativas ganharem corpo. Eu achei o ator subaproveitado nas últimas duas temporadas, e foi bom vê-lo voltar a ter um papel de destaque fazendo o meio campo entre Dany e Jon, e garantindo que o bastardo pudesse extrair a obsidiana que Sam revelou existir sob Pedra do Dragão.
Sam, por sinal, apareceu em uma breve cena com meistre Marwyn e sor Jorah, totalmente curado da escamagris graças ao tratamento que o aspirante a meistre realizou clandestinamente. Agora saudável, Jorah pode reassumir seu lugar ao lado da khaleesi e se tornar, novamente, o senhor da friendzone, enquanto Sam cresceu aos olhos do arqui-meistre e foi premiado não sendo punido por seu audacioso movimento.
Punição, aliás, foi o que não faltou em The Queen's Justice. Euron Greyjoy curtiu um raro momento de adoração em Porto Real, chegando à capital de Westeros com três presentões para Cersei Lannister: Yara Greyjoy, Ellaria e sua filha, Tyene Sand (Rosabell Laurenti Sellers).
Todos nós já vimos o quanto Cersei pode ser cruel ao longo dos últimos sete anos. Cersei é tão vaca que conseguiu transformar sexo oral em uma forma de maldade (nos livros ela assume que preferia fazer sexo oral em Robert para poder devorar os herdeiros do rei, uma declaração que eu não me lembro se chegou à TV), imagine se ela não encontraria uma forma absolutamente tenebrosa de devolver a perda de Myrcella à Ellaria com todos os juros e correção monetária que sua mente psicopata poderia imaginar?
Aqui, porém, cabe um novo parentese, essa pode ser a primeira vingança de Cersei que é totalmente justificada, afinal de contas, Myrcella, ao contrário de Joffrey, era uma criança inocente e indefesa, e foi uma tremenda sacanagem Ellaria matá-la da maneira que fez. Óbvio, a forma que Cersei encontrou de retribuir foi consideravelmente mais cruel, ainda assim, esse é um daqueles momentos em que quase podíamos entendê-la e até simpatizar com ela.
Ao menos até ela se sentir tão extasiada por ter tocado o horror em Ellaria que saiu correndo para dar pro irmão e até deixou que a criadagem da Fortaleza Vermelha visse Jaime em sua cama.
Jaime, aliás, é outro personagem por quem andamos tendo sentimentos conflitantes nessa temporada tamanha a quantidade de camadas que ele vem desenvolvendo desde que deixou de ser apenas o escroto com cara de príncipe encantado do Shrek.
Foi legal ver que as provocações de Euron na sala do trono o afetaram, e também que, no desfecho do episódio, quando aconteciam simultaneamente os ataques dos Imaculados à Rochedo Casterly, com uma estratégia criada por Tyrion, e o ataque de Jaime à Jardim de Cima, usando uma estratégia que Jaime aprendeu com Robb Stark (apesar da desvantagem inicial, Cersei, Jaime e Euron estão dando um banho em Dany, Tyrion e Varys, o placar agora está em 2 x 0 fora o baile), foi o regicida quem resolveu apresentar misericórdia à Olenna Tyrell.
A cena com o Lannister e a última Tyrell viva, por sinal foi muito boa. Enquanto ele escolhia o caminho magnânimo, oferecendo uma morte rápida e indolor à Olenna, ela meteu o pé na garganta dele ao assumir a autoria pela morte agonizante que Joffrey sofreu nas suas bodas. Resta saber se Jaime vai contar isso à Cersei, já que a rainha culpa Tyrion pelo assassinato, e Jaime parecia ainda nutrir afeto pelo irmão...
Estamos chegando à metade da temporada de Game of Thrones e o placar da guerra começa a favorecer Cersei de maneira bastante clara à essa altura. Com os esforços de Daenerys e companhia sendo sistematicamente arruinados e a lista de aliados da rainha dos dragões diminuindo rapidamente a necessidade que ela tem de que Jon Snow se una à sua causa começa a ficar tão desesperadora quanto a necessidade que ele tem de dragões em seu fronte contra o Rei da Noite.
A cada semana os episódios parecem mais curtos.
É esse o nível de excelência da atual temporada.

"-Você está na presença de Daenerys nascida da tormenta, da Casa Targaryen, legítima herdeira do trono de ferro, rainha legítima dos ândalos e dos primeiros-homens, protetora dos sete reinos, a mãe de dragões, a khaleesi do grande mar de grama, a não queimada, a quebradora de correntes.
-Este é Jon Snow. ... Ele é rei do Norte."

sábado, 29 de julho de 2017

Resenha Cinema: Dunkirk


Christopher Nolan é um diretor que polariza opiniões. Mesmo entre a nerdalhada, geralmente referida como o público cativo que endeusa o cineasta britânico, ele não é essa unanimidade toda, e já vi até fãs do Batman picharem sua interpretação do homem-morcego com um pé na realidade. Gosto, já dizia aquela velha que comia ranho, é muito pessoal, e eu me enquadro entre o público nerd que, se não endeusa Nolan, certamente o respeita e reverencia pelo cinema de qualidade que produz, seja na trilogia das trevas, seja em filmes como Amnésia, Interestelar e O Grande Truque.
O cinema de Christopher Nolan pode não ser perfeito, mas fala comigo enquanto audiência de cinema, e eu jamais deixei uma sala de cinema após assistir um filme de Christopher Nolan sentindo que meu tempo fora desperdiçado ou que eu fora enganado.
Muito antes pelo contrário.
É por isso que eu assisto aos filmes de Nolan no cinema, e ontem, com um dia de atraso, fui assistir a Dunkirk, longa que relata um episódio pouco referido da Segunda Guerra Mundial, a Operação Dynamo, quando o fronte francês sucumbiu ao avanço alemão no final de maio de 1940, e quase quatrocentos mil soldados ingleses ficaram presos na cidade portuária de Dunquerque (como chamamos em português), no norte da França, onde as instalações portuárias permitiam uma evacuação marítima.
Com a força aliada presa entre uma divisão de tanques panzer alemães e o mar, onde os submarinos U-Boat nazistas patrulhavam as águas, e aviões da Luftwaffe sobre a cabeça, a única esperança de voltar para a Inglaterra era uma evacuação milagrosa que o próprio alto-comando inglês considerava impossível, tanto que dos 400 mil homens em Dunquerque, o esperado era resgatar de 30 a 45 mil.
no longa escrito e dirigido por Nolan nós acompanhamos esse resgate através dos olhos de três grupos distintos de personagens, o do soldado Tommy (Fionn Whitehead), que vê todo o seu pelotão ser baleado nas ruas de Dunquerque e mal consegue chegar à praia onde o comandante Bolton (Kenneth Brannagh) e o coronel Winnant (James D'Arcy) organizam a evacuação que se torna cada vez mais complexa; o do civil Dawson (Mark Rylance) que com seu filho Peter (Tom Glynn-Carney) e o jovem George (Barry Keoghan) resolve pegar seu iate de lazer, o Moonstone, e tomar parte nos esforços de resgate, e do piloto Ferrier (Tom Hardy), um dos aviadores da RAF designados para combater os nazistas no céu para tentar impedir a destruição dos navios.
O longa não perde tempo. Após cartões informativos nos darem a ideia geral da situação, já somos jogados atrás de Tommy e no meio da ação literalmente no primeiro minuto de Dunkirk, o enxuto longa de uma hora e quarenta e seis minutos não está interessado em situar o espectador, pelo contrário, o esforço parece ser feito exatamente para que a audiência experimente a confusão e o pavor dos personagens na tela, e o cardápio de confusão e pavor é generoso. Seja a presença das metralhadoras nazistas, dos aviões, dos submarinos, seja o medo de espaços confinados, de se afogar, de altura... Está tudo lá, e Nolan e o cinematógrafo Hoyte Van Hoytema parecem engajados em fazer com que seja tudo o mais vívido e angustiante possível para mostrar a experiência ao espectador pelos olhos dos personagens.
Talvez por isso a maioria dos personagens não tenha nome (Eu só descobri que o personagem de Fionn Whitehead se chamava Tommy ao ver o cast no IMDB, a mesma coisa com o Alex vivido pelo One Direction Harry Styles ou o "soldado trêmulo" interpretado por Cillian Murphy), para que eles se tornem avatares de quem assiste ao filme e nós sintamos na pele o terror que eles sentem a cada nova presepada. Mesmo os diálogos, geralmente uma queixa nos filmes de Nolan que apostam na exposição verbal de tudo o tempo inteiro, são econômicos em Dunkirk, quase sovinas.
Há sequências inteiras de vários e vários minutos sem diálogos audíveis, e tomadas longas onde coisas acontecem simultaneamente e nós nos pegamos escolhendo onde focar enquanto as pessoas na tela lutam por suas vidas num exercício de individualidade que se sobrepõe aos indivíduos sem background ou nome na tela.
Se tudo isso te faz pensar que Dunkirk é um daqueles filmes emocionalmente estéreis que são quase como um passeio no zoológico, não se apoquente. Não é o caso.
Nem teria como ser em um longa que retrata um esforço civil de resgate de soldados através do Canal da Mancha que resultou na formação da mais audaciosa frota não-militar do Século XX, especialmente com um elenco cascudo como o que temos aqui.
Mark Rylance é ótimo como o senhor Dawson, com uma estranha mistura de fleuma e candura em sua pétrea resolução de ir até Dunquerque de qualquer forma ajudar no resgate, Cillian Murphy e seu "soldado trêmulo" são o retrato de um trauma e seu arco dramático é particularmente tocante junto com Tom Glynn-Carney e Barry Keoghan, Kenneth Brannagh mantém a boa média e Tom Hardy impressiona ao passar praticamente o filme inteiro de máscara e, com os olhos, mostrar mais do que muitos atores conseguem mostrar com o corpo inteiro (experiência prévia com o Bane, talvez).
Claro que Dunkirk tem seus problemas, a trilha sonora de Hans Zimmer, por exemplo, é ótima, mas por vezes parece algo invasiva, o anonimato intencional de diversos personagens pode não funcionar para todas as audiências, e a estrutura narrativa do longa, dividida em três segmentos, um deles iniciado uma semana antes da evacuação, o outro um dia antes e o terceiro uma hora antes, pode atrapalhar os mais desatentos (a galerinha pra quem a vida não existe fora da rede social e que não tira a fuça do telefone), mas ainda que tenha resultado em pequenas licenças poéticas do longa que, pra justificar o timing de certas sequências se sustenta numa percepção algo relativa do tempo, se sustenta quando as três culminam em um desfecho simultâneo que sozinho já valeria um ingresso.
E Dunkirk inteiro vale a ida ao cinema.
É um épico de guerra sem grandes arroubos, sem sequências de batalha como as de Até o Último Homem ou O Resgate do Soldado Ryan, mas tem sua própria voz, seu próprio ritmo, e conta uma história que merece ser contada, mesmo dramatizada.
Um dos melhores do ano. Assista no cinema.

"-E se esse for o preço pra voltar pra casa?
-Eu vou viver com isso, mas é errado."

segunda-feira, 24 de julho de 2017

Resenha Série: Game of Thrones, Temporada 7, Episódio 2: Stormborn


Atenção! Há spoilers!
Após seis temporadas, Game of Thrones chegou a um ponto onde nós podemos ver, com resultados agridoces, que o programa está se preparando para o seu encerramento. A sétima temporada, com oito episódios ao invés dos dez habituais, tem sido mais concisa do que as anteriores, e se não está correndo, e não está, também não está nem um pouco interessada em encher linguiça de forma alguma. As coisas têm acontecido em ritmo acelerado, e o episódio de ontem, Stormborn, fechou 25% da temporada num episódio que foi praticamente inteiro destinado a preparar terreno para encontros que queremos ver, e mostrar encontros que não estávamos tão interessados em ver, mas precisavam ser vistos, como a reunião onde Daenerys e sua equipe de conspiradores tramavam a melhor forma de tomar os sete reinos, ou ao menos os três reinos que Cersei tem consigo.
Se o núcleo e Dorne segue sendo o mais chato da série (a culpa, eu suponho, seja do Oberyn Martell de Pedro Pascal, que tinha um carisma simplesmente inalcançável por qualquer outro personagem do reino sulista), ver Ellaria Sand (Indira Varma) à mesa junto com Daenerys, Tyrion, Varys, Olenna, Yara (Gemma Whelan) e Theon Greyjoy (Alfie Allen) certamente deixa as coisas menos xaropes para os membros da casa Martell (apesar de, na verdade, nenhum deles ser Martell de fato, já que Ellaria era uma concubina e as Víboras da Areia são todas bastardas de sobrenome Sand, mas não deixem eu me ater a pormenores literários).
Muito do falatório estratégico do time de conselheiros de Daenerys serviu para mostrar à audiência que Dany teria um caminho incrivelmente fácil a seguir com sua conquista. Jogar hordas de dothrakis e tropas de Imaculados nas casas nobres leais à Cersei, incendiar Porto Real com seus dragões, sentar no Trono de Ferro e reconstruir a porra toda, mas Daenerys não é assim.
Se uma coisa ficou cristalinamente clara ao longo dos últimos seis anos (e foi reforçada pelo diálogo entre Daenerys e Varys que abriu o episódio) foi que a rainha-dragão se preocupa em demasia com o povo para submeter cidades inteiras aos horrores da guerra aberta; é por isso que os planos de Tyrion e Varys são de sitiar Porto Real com tropas westerosis e vencer Cersei e aqueles leais à ela pelo cansaço.
O plano não chega a impressionar Olenna Tyrell, que sugere a Daenerys que seja um dragão e pare de agir como uma ovelha.
Podemos pensar que Olenna tem razão, mas não podemos dizer que a série está criando novos obstáculos para Daenerys de maneira gratuita. Sua personalidade vem sendo moldada há seis anos, e ela definitivamente luta para ser melhor do que seu irmão ou seu pai. Logo, sua decisão de se negar a simplesmente incendiar Porto Real como o Rei Louco teria feito, é plenamente condizente para com a nobreza que a personagem vem cultivando.
Outro personagem que cultiva nobreza há seis temporadas, mas, sejamos honestos, geralmente o faz de maneira mais proativa, é Jon Snow.
O bastardo coroado rei do Norte e senhor de Winterfel segue sendo o norte moral de Game of Thrones ainda mais do que a mãe dos dragões nascida da tormenta, e a despeito de sua ascensão social após matar Ramsey Bolton, a missão de Jon segue sendo apenas uma:
Impedir que a Grande Noite recaia sobre Westeros.
Assim sendo, quando ele recebe um convite de Tyrion para conhecer Daenerys em Pedra do Dragão, e quase imediatamente após isso recebe o aviso de Sam de que Pedra do Dragão está sentada sobre um imenso bloco de Vidro de Dragão, uma das armas capazes de matar tanto os Caminhantes Brancos quanto os Outros, ele imediatamente aceita o convite, apesar dos protestos de seus súditos das casas setentrionais e de Sansa.
Foi bacana ver que a relação de confiança entre Jon e a irmã está amadurecendo, fato que fica comprovado ao vê-lo deixando Winterfel, e o Norte inteiro, nas mãos da ruivona. Sansa pediu para ser ouvida no episódio anterior, e ser feita senhora na ausência do irmão mostra o tamanho da confiança que ele deposita nela.
Se Sansa, de fato, está se tornando a ponte entre a inteligência de malfeitores como Petyr e Cersei e a nobreza e bravura dos Stark, descobriremos no período em que ela estará sozinha à mercê do Mindinho enquanto Jon viaja para o sul.
Jon e Mindinho, por sinal, tiveram uma bela sequência na cripta de Winterfel, com Jon repetindo o gesto de Ned Stark, que na primeira temporada prensou Baelish na parede e o esganou. Torçamos para que o bastardo não tenha o mesmo destino do pai/tio e acabe morto com a cabeça espetada em uma lança.
Falando em lanças, também tivemos uma breve visita a Porto Real, com Cersei reunindo as casas que seguem leais à sua coroa. É estranho ver Jaime do lado errado dos conflitos após termos tido uma espécie de redenção pro personagem no período em que ele andou com Brienne. É difícil, quando se tem noção do caminho que o personagem toma nos livros, não vê-lo como um corpo estranho entre os aliados de Cersei, ainda assim, isso serve para manter o esquema um pouco mais coerente com o padrão de Game of Thrones, onde, ao menos no início, nenhum personagem era totalmente bom, ou mal. Com Jaime ao lado de Cersei, ao menos o entourage da rainha não fica absolutamente desprezível, com figuras como ela própria e meistre Qyburn (Anton Lesser), o sujeito desenvolvendo balestras de grande potência, capazes de perfurar o crânio dos dragões de Daenerys.
Entrando no assunto de meistres, por sinal, Sam segue sua rotina em Vila Velha, aprendendo tudo o que pode na Cidadela, inclusive coisas que, talvez, ainda não devesse aprender.
Pesquisando por conta própria na biblioteca, ele descobre uma forma de tentar salvar sor Jorah (Iain Glenn) da escamagris que se espalha por todo o corpo do súdito mais devotado da khaleesi.
Aqui, é importante registrar que dá gosto de ver Sam tendo sua curiosidade recompensada. É bom ver que podemos ter um reflexo de Qyburn do lado dos mocinhos na forma de Sam, um sujeito que não está com medo de tentar dar um passo além do conhecimento convencional dos meistres em nome do bem. E fica cada vez mais claro que Jorah pode ser a chave para reunir Sam e Jon, talvez em Pedra do Dragão, onde o exilado Mormont pode tentar se reunir à Daenerys, mesmo que o preço para isso seja Sam deixar de estar atolado em bosta para se atolar em pus.
Enquanto esses reencontros não acontecem, tivemos Arya em, não um, mas dois reencontros, um, por sinal, pela qual vários membros da audiência ansiavam.
Se o reencontro dela com Torta Quente (Ben Hawkey), o garoto padeiro a quem ela conheceu em seus dias de Arry, o menino a caminho da Muralha serviu para oferecer a ela a informação de que Jon está vivo e é agora o Senhor de Winterfel.
Essa informação aparentemente foi capaz de soprar algum calor na frieza da jovem Stark (que relembrou, casualmente, que até andava fazendo algumas tortas ela própria), e, talvez, colocá-la na estrada para o norte, e não para o sul, não sabemos com certeza, até, porque, o segundo reencontro de Arya, com Nymeria, sua loba, solta nas Terras Fluviais após um chilique de Joffrey, ainda na primeira temporada, pareceu ter um efeito contrário na sua decisão prévia...
Enquanto Lady, a loba de Sansa foi sacrificada, Nymeria foi expulsa por Arya para não sofrer o mesmo destino, e Arya a encontrou reinando soberana em uma alcateia que assola a região. Ao tentar se aproximar da loba gigante, porém, a fera a rejeita, e dá-lhe as costas, fazendo com que Arya experimente algum tipo de epifania.
Não fica claro para nós se não ser reconhecida por Nymeria fez Arya se decidir em seguir seu caminho rumo a Porto Real, abrindo mão de vez de sua identidade como Stark em nome da vingança, ou a fez perceber que já não é mais quem costumava ser e precisa ir pra casa para reencontrar sua família e a si mesma.
Ainda que a narrativa não deixe isso claro, o simples fato de lançar tais dúvidas sobre nós, já mostra o quão tocante foi a sequência.
Falando em sequências tocantes, a cena de amor entre Missandei e Verme Cinzento foi bastante bonita, e nos deu a chance apreciar novamente a nudez de Nathalie Emmanuel, que além de talentosa é uma das mulheres mais bonitas na TV.
Pra fechar o capítulo, uma grande cena de ação, o confronto entre as frotas de ferro de Yara e Euron Greyjoy. Euron, conforme eu havia suspeitado, vai se juntar a Cersei como o personagem a ser odiado em Game of Thrones na temporada seis. Ao contrário do Rei da Noite, que é uma criatura maléfica, seres humanos desprezíveis como Joffrey, Ramsey e Cersei são mais fáceis de odiar, e Euron parece estar se esforçando para chegar ao rol dos outros citados.
O grande presente prometido por ele no capítulo anterior, aparentemente era Ellaria, a mulher que matou Myrcella, e, nesse caso, podemos esperar uma morte lenta e dolorosa para a dornesa nos episódios vindouros, afinal, como nós descobrimos através da septã Unella, Cersei Lannister não é de esquecer as afrontas contra si.
Com Danenerys em Westeros a guerra é iminente, e Cersei não está brincando e pretende descontar de todas as formas possíveis sua aparente desvantagem. Uma hora de TV de qualidade, tão enxuta que ao final do capítulo nós nos pegamos pensando "Mas já?!!".
Será outra semana longa até domingo.

"-Eu não vim até aqui para ser a rainha das cinzas."

sábado, 22 de julho de 2017

O Trailer 2 de Thor: Ragnarok

E não foi só a DC que chutou o pau da barraca, a Marvel não ficou muito atrás e divulgou uma nova prévia do seu lançamento de novembro. Enquanto a DC apresentou o time de super heróis definitivo de seu Liga da Justiça, a Marvel mostrou sua nada modesta dupla, o Golias Esmeralda e o Deus do Trovão que co-estrelarão Thor: Ragnarok.
Confira abaixo o trailer do longa divulgado hoje na Comic Con de San Diego:



Dirigido por Taika Waititi, Thor Ragnarok tem no elenco Chris Hemsworth (Thor), Mark Ruffalo (Bruce Banner/Hulk), Cate Blanchett (Hella), Tom Hiddleston (Loki), Anthony Hopkins (Odin), entre outros, e estréia em novembro batendo de frente com Liga da Justiça.

O Trailer 2 de Liga da Justiça

E a Comic Con de San Diego começou a apresentar as armas grandes. Hoje o painel da Warner confirmou que Mulher Maravilha 2 já está em produção e terá o retorno da diretora Patty Jenkins, que o longa solo do Flash será The Flash: Flashpoint, e divulgou o segundo trailer de Liga da Justiça, que unirá os maiores heróis da DC contra a ameaça do Lobo da Estepe, arauto de Darkseid.
Confira o clipe:



Com estréia marcada para novembro, o longa é estrelado por Ben Affleck (Batman), Gal Gadot (Mulher Maravilha), Ray Fisher (Ciborgue), Ezra Miller (Flash), Jason Momoa (Aquaman), Henry Cavill (Superman), entre outros.
Dirigido por Zack Snyder o longa passa por refilmagens sob a batuta de Joss Whedon.

segunda-feira, 17 de julho de 2017

Resenha Série: Game of Thrones, Temporada 7, Episódio 1: Dragonstone


Atenção! Há spoilers de Game of Thrones abaixo!
Parece apropriado que a sétima temporada de Game of Thrones, que teve sua estréia adiada em 2017, tenha retornado justamente no dia em que o inverno, que andava bem elusivo aqui no Rio Grande do Sul, resolveu mostrar a cara derrubando as temperaturas conforme um vento nordeste gelado e uma chuva fina como agulhas de gelo despencava do céu.
Foi com o clima gritando "Inverno" a plenos pulmões que eu me sentei ontem às dez da noite para acompanhar os retornos de Jon, Dany, Tyrion e, bem, de todos os personagens que ainda não morreram na série que, ao longo de sete temporadas, aprendemos a amar tanto quanto a odiar.
Afinal de contas, se os anos quatro e cinco de Game of Thrones haviam sido mornos pra dizer o mínimo (sejamos francos, haviam episódios insuportáveis no meio de episódios chatos onde um ou outro capítulo se salvava), a sexta temporada finalmente deu pinta de que o programa voltaria aos eixos, com dez episódios bons de se assistir onde sempre havia algo interessante acontecendo com um dos nossos personagens favoritos, mesmo que fossem personagens que nem sabíamos que eram favoritos, como Sandor Clegane, por exemplo.
A temporada passada terminou com uma tomada épica de Daenerys Targaryen (Emilia Clarke) rumando para Westeros com mais de mil navios e o maior exército de que se tinha notícia desde o desembarque de Aegon, também havia mostrado que sim, R+L=J, com Bran Stark (Isaac Hempstead-Wright) descobrindo que seu meio irmão Jon Snow, na verdade é seu primo, Jon Stark-Targaryen, filho de sua tia Lyanna e do irmão de Daenerys, Rhaegar Targaryen. Jon, por sinal, retomara Winterfel com a ajuda de Sansa, a alcateia Stark diminuíra novamente com a morte de Rickon, e tivemos o prazer de ver Ramsey Bolton (Ewan Rheon) ser espancado por Jon e morto por Sansa (Sophie Turner, mais linda a cada temporada), mas, talvez o maior prazer do season finale tenha sido a incursão à Corre Rio engendrada pela agora Mulher sem Rosto, Arya Stark (Maisie Williams), tocando o horror em Walder Frey (David Bradley) de maneira cabulosamente cheia de estilo.
É justamente nos domínios dos Frey que a sétima temporada começa.
Não em Corre Rio, mas nas Gêmeas, onde os Walder reúne toda a sua família de traidores e assassinos, e propõe um brinde à casa Frey. Óbvio, nós vimos o season finale da temporada anterior, nós sabemos que Walder provavelmente foi moído e colocado na torta, e que aquele, na frente da família, é Arya, levando adiante sua vingança, e riscando de sua lista todos os nomes que nela existem. É uma boa forma de retomar a série com um daqueles momentos pra agradar ao fã fiel que vem acompanhando esses personagens há sete anos e precisa ver os vilões se darem mal de quando em quando.
Apesar do que se poderia pensar, porém, Arya não está retornando ao Norte. Ao menos, não de pronto. Seu caminho segue ao sul, para Porto Real, onde ela pretende perseguir seu prêmio final, a rainha Cersei Lannister (Lena Headey). Se por um lado é sensacional ver o quão focada Arya está em sua busca de vingança, a maneira metódica como ela opera e o quão letal ela se tornou após seus apuros, também não é menos verdade que a jornada que Arya segue é terrivelmente perigosa. Ela marcha rumo à toca do leão (literalmente), pronta para se submeter, sozinha, a perigos que podem lhe custar a vida. E, como seu Madruga nos ensinou, a vingança nunca é plena, e não dá pra, considerando a natureza de Game of Thrones, não imaginar que a jovem Stark pode pagar o preço definitivo por sua sede de sangue, especialmente conforme sua confiança a faz admitir, em alto e bom som ao grupo de soldados Lannister que encontra nas Terras Fluviais, que ruma para Porto Real para matar a rainha.
Por sinal, bom encontrar um grupo de soldados inimigos que não é composto por psicopatas, assassinos e estupradores. Os homens que Arya encontra são gente simples, pais de família capazes de partilhar o pão e cantar musicas (com Ed Sheeran no grupo) que sentem falta de suas famílias. Bom saber que, à essa altura do campeonato, podemos ser surpreendidos pela presença de gente decente que não tem sangue Stark.
O ex-companheiro de viagens de Aria, Sandor Clegane (Rory McCann), teve uma bela participação aqui. Seu retorno à choupana que ele roubou na quarta temporada ao fugir com a comida do dono do local foi surpreendente e tocante, mas de uma maneira menos estranha do que sua proposta de redenção anterior, que de tão diametralmente oposta à natureza do personagem quase não parecia Game of Thrones.
Vê-lo viajando com a Irmandade sem Bandeiras de Thoros de Myr (Paul Kaye) e Beric Dondarrion (Richard Dormer) e chegando à um local simples que ele arruinou, sentir seu remorso e arrependimento... Bem, agora a mudança de disposições do Cão de Caça tem mais razão de ser, e seu caminho de redenção parece mais claro e plausível.
Enquanto Arya marcha para sul, seu alvo principal começa a fazer seus movimentos oficiais. A família Lannister vem sendo sistematicamente reduzida em temporadas recentes. Tywin, Kevan, lancel, Joffrey, Myrcella, Tommen... Todos foram comer capim pela raiz, e os últimos Lannisters vivos são Tyrion (Peter Dinklage), que assumiu a causa de Daenerys como a sua própria, e os gêmeos Cersei (Lena Headey) e Jaime (Nicolaj Coster Waldau).
Após mandar seus inimigos mais próximos pro espaço junto com o Grande Septo de Baelor Cersei senta no trono de ferro para descobrir que a cadeira mais desconfortável do mundo vem ainda mais espinhos do que parece. Os inimigos dos Lannister vêm de todos os lados e sua lista de aliados é menos do que magra, é esquálida.
Jaime faz questão de lembrar sua irmã, que se recusa a lamentar a morte dos filhos já que precisa assertar seu domínio sobre Porto Real e os Sete Reinos (ou três, no máximo, conforme lembra o regicida), e pretende fazê-lo através de alianças, e qual sua maior chance de aliança bem-sucedida?
Os Homens de Ferro de Pike, liderados por Euron Greyjoy (Johan Philip Asbæk), que procura por uma rainha.
A cena com Euron, Cersei e Jaime na sala do trono, carregada de provocações de parte à parte deixaram claro que Euron deve ser o grande antagonista humano dessa temporada, assumindo o posto que já pertenceu a Joffrey e a Ramsey.
De fato, a sequência com Euron não foi particularmente inspirada, especialmente depois da ótima discussão entre os gêmeos incestuosos, mas já pudemos ver pra onde as coisas devem andar daí por diante.
Falando em andar, ninguém andou mais no episódio do que Samwell Tarly (John Bradley-West), encarcerado em uma rotina de organização, bosta e sopa na Cidadela dos Meistres em Vila Velha sob a tutela de Meistre Marwyn (Jim Broadbent), e, através dele, nós descobrimos que a maior fonte de vidro de dragão em Westeros está em Pedra do Dragão, uma informação que pode ser vital para Jon Snow (Kit Harrington), o novo Rei do Norte, que se prepara para a maior das guerras.
Falando em Jon Snow e em Pedra do Dragão...
Os Stark retomaram Winterfel, e Jon Snow foi aclamado Rei do Norte mesmo pelas famílias que, inicialmente, se opuseram a ele. Divergindo da opinião de Sansa a respeito dos Carstark e dos Umber, Jon não tomou as fortalezas ancestrais das duas famílias, apenas exigiu dos novos chefes das respectivas linhagens um voto de fidelidade. Foi interessante ver Sansa notar que Jon parece ter uma vocação natural para a liderança e mantém a mesma nobreza teimosa de Ned e de Robb, e ainda mais interessante vê-la dizer que o irmão/primo não pode cometer os mesmos erros dos últimos cabeças da casa Stark. Sansa chama a atenção de Jon e o lembra de que ele deve ser mais esperto que seu pai e irmão. Se Jon for capaz de ouvir Sansa e ela não se deixar levar pelas maquinações de Mindinho (Aidan Gillen) e pela própria urgência em ver as coisas sendo feitas a audiência pode estar diante de uma nova Casa Stark, nobre e heroica como Jon, mas temperada com a astúcia que Sansa colheu de suas desventuras com Cersei e Petyr. Outra boa sacada do episódio foi garantir que a audiência tivesse acesso aos pontos de vista de Jon e de Sansa sobre nenhum dos dois está absolutamente certo ou errado a respeito de nada, e que o meio-termo entre as vontades de um e de outro parece o caminho mais provável para o sucesso.
Eu francamente espero que Jon não seja teimoso demais para ouvir Sansa e que ela não fique enciumada pelo novo status do bastardo, pois a dupla parece ter muita lenha pra queimar ao longo da temporada.
E, pra fechar o capítulo, Daenerys chegou, em uma sequência silenciosa, a Westeros.
Finalmente.
Esse provavelmente era o momento mais antecipado da série nos últimos sete anos, e ver a rainha dos dragões alcançar as praias do continente foi bacana. Seu andar silencioso, acompanhada de Missandei (Nathalie Emmanuel), Verme Cinzento (Jacob Anderson), Varys (Conleth Hill) e Tyrion Lannister à morada ancestral dos Targaryen em Westeros foi tratada com a solenidade merecida na sequência que encerrou o capítulo, para que os espectadores soubessem que aquele era o pináculo do programa e, talvez, simbolizando que finalmente entramos na reta final de Game of Thrones.
Agora é hora de aguardarmos ansiosamente até o próximo domingo, e ver pra onde as coisas andam.

"-Diga que o Norte se lembra. E diga que o Inverno chegou para os Frey."

segunda-feira, 10 de julho de 2017

Resenha DVD: Triplo X: Reativado


Eu sou capaz de apreciar a razão pela qual a Sony resolveu bancar o retorno de Vin Diesel à franquia Triplo X quase doze anos após o lançamento do filme anterior, xXx: Estado de Emergência, uma sequência do longa original estrelado por Diesel em 2002 com Ice Cube no papel principal, já que Diesel havia saltado fora do projeto.
Eu suponho que os executivos da Sony, desesperados por uma franquia que fizesse lucro aos borbotões, assumiu que um retorno triunfal do astro de ação careca ao protagonismo da série poderia ter um efeito bilionário semelhante ao causado por ele na série Velozes & Furiosos.
Quer dizer... Faz sentido, não?
De uma maneira bastante rasa, na superfície do nosso cérebro de lagarto, nós podemos entender como um executivo de Hollywood chegaria à essa conclusão. Velozes & Furiosos, afinal de contas, está longe de ser um grande filme. Está longe de ser uma franquia repleta de filmes bons. Os melhores, de divertidos não passam, e os piores são ruins de uma forma quase inocente de tão honesta. Mas são máquinas de grana, especialmente após a trágica morte de Paul Walker dar um boost melancólico a série de corridas de carro que começou copiando descaradamente a trama de Caçadores de Emoção. Em suma, conforme atestam Velozes & Furiosos e Transformers, um filme não precisa ser bom pra fazer dinheiro. Nós cansamos de ver bombas se tornarem sucessos bilionários, e os nove zeros parecem ser o número mágico perseguido por todos os estúdios, então, por que não tentar ressuscitar a franquia Triplo X e faturar um bilhão com um filme ruim?
Eu passei longe de xXx: Reativado quando o longa estreou aqui em janeiro. Óbvio que ver Diesel com quase 50 anos posando de atleta de esportes extremos enquanto arranca suspiros de todas as gatinhas era coisa pra home vídeo e olhe lá.
Foi no sábado que, sem muitas opções na locadora, resolvi encarar o longa do brucutu nerd, e, posso dizer que, por mais que Triplo X: Reativado não tenha passado longe do bilhão, sendo, inclusive, um fracasso de bilheteria doméstica apesar da boa carreira internacional, a Sony certamente sucedeu em fazer um filme de ação ruim.
O longa começa com Augustus Gibbons (Samuel L. Jackson, veterano da série), tentando recrutar Nilmar para o programa Triplo X. O encontro da dupla é interrompido pela queda de um satélite que, nós descobrimos, foi utilizado como uma arma, sendo, literalmente, jogado do céu na cabeça do espião.
Isso foi possível graças à uma engenhoca chamada de Caixa de Pandora. Um dispositivo de vigilância criado pela NSA que, por alguma razão, pode ser utilizado para derrubar satélites, o potencial destrutivo da arma é absurdo, já que há mais de trinta mil satélites em órbita ao redor da Terra. O aparelho é roubado por um grupo de agentes multinacionais incrivelmente extremos liderados por Xiang (Donnie Yen, de Rogue One), e composto por Serena (a modelo e atriz indiana Deepika Padukone), Talon (o astro de cinema tailandês Tony Jaa) e Hawk (o campeão dos pesos médios do UFC Michael Bisping), que passam por cima da CIA e da NSA como se não fossem nada.
O sumiço da Caixa de Pandora obriga a agente Jane Marke (Toni Collette), sucessora de Gibbons a procurar alguém capaz de transitar no submundo e realizar prodígios tão absurdos quanto os ladrões, e o único homem capaz de fazê-lo foi dado como morto há mais de dez anos.
Mas Xander Cage (Vin Diesel) não morreu.
O ex-Triplo X forjou a própria morte, e hoje passa seus dias usando suas insanas habilidades nos esportes radicais para levar TV via satélite aos pobres da América do Sul (é sério). Após comer a guria mais gostosa da região e sentir que seu trabalho estava terminado, Cage está pesquisando seu próximo quando é abordado por Marke.
Inicialmente reticente em retornar à vida de agente secreto, Cage muda de ideia ao saber da morte de Gibbons, e reassume seu posto, sendo reativado.
Usando sua rede de contatos, Cage monta uma equipe tão insanamente extrema como a de Xiang, composta pela atiradora de elite Adele (a gatinha Ruby Rose), o motorista Tennyson Torch (o Sandor Clegane Rory McCann) e o... Pegador...? DJ...? Eu não sei ao certo o que Nicks, personagem de Kris Wu faz, já que sua habilidade principal, de acordo com o cartão que o apresenta, é ser "divertido de ter por perto".
Enfim, esse grupo de personagens extremos terá que perseguir o outro grupo de personagens extremos para tentar recuperar a Caixa de Pandora, vendo-se envolvidos em uma conspiração que alcança os mais altos escalões das agências de inteligência dos EUA.
Sim, conforme eu disse ali no começo, é muito ruim.
O roteiro de F. Scott Frazier poderia ter sido escrito com giz de cera em um guardanapo no bar após dez minutos de bebedeira, e a direção de D. J. Caruso (de Controle Absoluto e Eu Sou Número Quatro) é vergonhosamente genérica, beirando a má vontade, a trilha sonora inexiste, e as atuações são algo entre canhestras (Vin Diesel posando de galã com a sua cara de tiozão da venda) e constrangidas (Toni Collette, tentando manter uma expressão séria enquanto vomita o texto expositivo que cabe à sua personagem). Nem mesmo as cenas de ação, que poderiam ser um fator diferencial para um longa da estirpe acertam, com CGI meia-boca e proezas acrobáticas mornas que ignoram as leis da física. O que se salva são as breves cenas de luta de Donnie Yen, a cara de marrenta de Ruby Rose atirando nos caçadores de leões e Nina Dobrev interpretando aquela proverbial nerd-gostosa-demais-pra-ser-real de maneira simpática.
O longa tenta mostrar que é maneiro da forma mais começo dos anos 2000 possível com resultados algo embaraçosos, como o casação de peles, o ménage à sept ou as piadinhas infames que todo mundo arrota em um momento ou outro.
Eu, francamente, não creio que haja uma audiência capaz de assistir xXx: Reativado e pensar que é bom, nem mesmo o fã-clube de Vin Diesel deve gostar de ver o astro pagando mico fingindo que anda de skate, e, apesar de tudo isso, o longa ainda mostra participações especiais em seu clímax, e se encerra acenando descaradamente com a possibilidade de uma sequência que, sejamos francos, o próprio Diesel já tinha sacado que não funcionaria quando se negou a fazer xXx 2 lá em 2005.
Se estiver muito curioso, espere passar na Temperatura Máxima da Globo em alguns anos, talvez, num domingo de tarde, seja um programa menos indigesto.

"-Bem, quem é você?
-Eu sou Triplo X."

quinta-feira, 6 de julho de 2017

Resenha Cinema: Homem-Aranha: De Volta ao Lar


Pra mim, enquanto fã de quadrinhos, é muito difícil fazer certas coisas. Me despir de certas expectativas e de certas noções pré-concebidas de como determinado personagem funciona.
Por mais que eu seja capaz de relativizar a morte de R'as Al Ghul em Batman Begins, eu não consigo fazer o mesmo com relação à carnificina de Batman vs Superman (especialmente porque matar dúzias e capangas e manter os arqui-vilões vivos é uma burrice sem tamanho). Da mesma forma que eu fui capaz de relativizar o quase-autismo do Peter Parker e a infalibilidade do Homem-Aranha de Tobey Maguire, ou a forma como eu fui capaz de relativizar o skate de Andrew Garfield e as falhas do roteiro de O Espetacular-Homem-Aranha 2: A Ameaça de Electro, que segue sendo meu filme favorito do personagem (ainda que Homem-Aranha 2 seja o que eu considero o melhor filme do personagem).
Acredito que isso signifique que, no meu papel de fã, eu estou disposto a aceitar muitas coisas se for pra ver um retrato fiel do que torna o personagem único pra mim. Provavelmente enquanto fã do Homem-Aranha eu estava disposto a ver filmes que não eram tão bem construídos porque o Homem-Aranha nesses filmes (nominalmente os dois O Espetacular Homem-Aranha) era, de fato e de direito, o personagem que eu li nos quadrinhos, e não a interpretação de Sam Raimi para esse personagem.
A forma como o diretor de A Morte do Demônio via o Homem-Aranha era "um rapaz que não conseguia fazer nada dar certo em sua vida sendo o maior dos super-heróis".
É uma interpretação plausível, justa, mas que não me cativava como poderia porque eu sou incapaz de dissociar Peter e o Homem-Aranha da forma como os filmes de Sam Raimi faziam a maior parte do tempo. Eu não sou um completo analfabeto cinematográfico, porém. Eu sei que Homem-Aranha e Homem-Aranha 2 são dois filmes de super-herói muito acima da média, mas eu era capaz de reconhecer o Peter Parker/Homem-Aranha dos meus quadrinhos da infância nos dois problemáticos O Espetacular, de forma que são os filmes que acabaram me cativando mais, tanto que eu nutria esperança de ver o personagem na pele de Andrew Garfield no Universo Cinemático Marvel, o que, óbvio, jamais aconteceu.
Após flertar com Asa Butterfield a Marvel escolheu Tom Holland para viver o mais icônico herói da casa das ideias em Capitão-América: Guerra Civil, e o resto já sabemos.
Ontem, bom nerd que sou, estava sentado numa sala de cinema à meia-noite esperando para conferir o primeiro voo solo do terceiro Homem-Aranha de carne e osso do cinema, e tive sentimentos conflitantes com relação ao filme.
O longa abre imediatamente após a batalha entre os Vingadores e o exército Chitauri de Loki. O conflito destruiu boa parte de Manhattan, e uma operação de recolhimento de resíduos está tomando forma com a empresa de Adrian Toomes (Michael Keaton) preparada para meter a mão na massa e limpar as ruas de Nova York de toda a tralha alienígena que ficou espalhada após os Vingadores rechaçarem o exército de Loki. A operação, porém, dura pouco. Antes mesmo que a empresa de Toomes tenha a chance de começar o trabalho de fato, executivos surgem para informar que todo o trabalho de remoção de material alienígena exótico será realizado por uma ação conjunta entre o governo dos EUA e as indústrias Stark, de modo que o contrato de Adrian com a cidade de Nova York não tem jurisdição válida.
Vendo seu negócio ruir, Toomes e seus associados mais próximos, Phineas Mason (Michael Chernus), Jackson Bryce (Logan Marshall-Green) e Hermann Schultz (Bokeem Woodbine) tomam uma atitude drástica, e resolvem manter um carregamento de tralha alienígena para si próprios, e que se danem Stark e o governo.
Corta pra oito anos no futuro (um lapso temporal esquisito, eu sei. Vingadores é de 2012, e estamos em 2017, então eu acredito que alguém comeu bola na hora de colocar esses letreiros na tela, ou eu não estou suficientemente inteirado de como funciona a linha do tempo da Marvel no cinema), o jovem Peter Parker (Tom Holland) está em um carro junto com Happy Hogan (Jon Favreau) fazendo um vídeo-diário a respeito de sua missão ao lado de Tony Stark (Robert Downey Jr.) e companhia mostrando os bastidores do que vimos durante Gurra Civil.
Após a missão, Peter é deixado em casa por Tony e Happy, e descobre que o traje criado pelo Homem-de-Ferro, agora é seu, e que ele será avisado da próxima missão quando chegar o momento.
Os meses se passam sem que Peter receba nenhuma notícia de Happy, a quem ele envia constantes relatórios a respeito de suas atividades, que incluem impedir roubos, orientar velhinhas perdidas e aprender a usar as funcionalidades de seu uniforme (que à certa altura ganha a voz da lindona Jennifer Connely).
Peter mantém sua rotina tentando conciliar suas obrigações de estudante do colégio de ciências Midtown com seus anseios de se tornar um Vingador em tempo integral, ele anda com seu melhor amigo Ned Leeds (Jacob Batalon), ouve conselhos de sua tia May (Marisa Tomei), seca vergonhosamente sua paixonite escolar, Liz (Laura Harrier) enquanto lida com o constante assédio do bully Flash Thompson (Tony Revolori) e sonha em ganhar o respeito de Tony Stark, algo que imagina estar muito além de seu alcance já que está combatendo os mais rasteiros tipos de crime de Queens.
As coisas mudam de figura quando Peter impede um roubo a caixas eletrônicos promovido por uma gangue usando armamento de altíssima geração, vendo na gangue de negocia tais armamentos a chance de dar um salto na cadeia alimentar super-heroica, mas ao confrontar Shocker e o Abutre, Peter percebe que talvez tenha abocanhado mais do que pode mastigar, e precisará aprender muito se quiser dar o próximo passo na sua jornada de herói.
Como eu disse ali em cima, tenho sentimentos conflitantes com relação ao longa.
Acho que podemos sintetizar isso dizendo que eu gostei de diversos conceitos apresentados pelo filme, mas não gostei da execução de vários deles.
O principal ponto positivo do longa, pra mim, foi ver o Homem-Aranha fazendo um meio-campo entre os heróis mais urbanos e pé-no-chão da Marvel (nominalmente os Defensores da Netflix), e o lado mais fantástico e mágico desse universo. Por mais que nós jamais vejamos Tom Holland dividindo uma cena com Charlie Cox (o que é uma pena), essa ideia fica bastante clara na forma como o herói transita entre esses dois mundos, impedindo roubos de bicicleta e tráfico de armas, mas armas com tecnologia Chitauri, enquanto é tutoreado pelo Homem de Ferro.
Tom Holland faz um bom trabalho, seu Homem-Aranha é bem mais próximo da versão piadista e tagarela que Andrew Garfield emulou à perfeição, do que da versão inchada e quase-muda de Tobey Maguire, o visual é correto, embora eu deva dizer que simplesmente odiei o traje cheio de tecnologia criado por Stark, que de tão exagerado é deixado de fora do clímax do longa.
O Peter Parker de Holland é um adolescente na acepção da palavra, inseguro, impaciente, tomando más decisões, ele fica longe da versão considerada "descolada" por alguns dos fãs nos filmes de Marc Webb, mas não parece ter problemas cognitivos como a versão imortalizada por Sam Raimi, no que soa como um esforço pra agradar todo mundo. O ator inglês faz o possível para interpretar o personagem da mesma forma com e sem uniforme, e isso, por si só, já é um esforço digno de nota.
A ausência a origem do personagem é compreensível, já vimos essa história duas vezes nos últimos quinze anos, e o personagem já apareceu como super-herói em Guerra Civil, ainda assim, não se pode deixar de notar que, ao deixar de fora a morte de Ben Parker, o roteiro escrito a doze(!) mãos por Jonathan Goldstein, John Francis Daley, Jon Watts, Christopher Ford, Chris McKenna e Erik Sommers simplesmente abre mão de qualquer tipo de drama. O problema, aqui, é que ao fazê-lo, Homem-Aranha: De Volta ao Lar se torna um filme excessivamente adolescente no pior sentido da palavra, algo que acabamos sentindo com mais clareza porque já vimos o Homem-Aranha em muito melhor forma, fosse em filmes melhores ou interpretado de maneira mais interessante.
A direção de Jon Watts é tão estéril quanto a de qualquer outro filme da Marvel, os efeitos visuais se dividem entre OK e bons, a trilha sonora é esquecível, exceto pelo tema do desenhos dos anos sessenta revisitado por Michael Giacchino, que infelizmente aparece pouco no filme. As sequências de ação são OK, a melhor do filme, sem sombra de dúvida é a que se passa em Washington, mas tanto a cena da balsa quanto o clímax no avião são interessantes. Há boas piadas no filme, e outras nem tanto, e há ao menos uma cena pós-créditos mostrando o que o futuro reserva a Peter (são duas, uma na metade dos créditos e outra no final), e eu tenho certeza de que essa abordagem do personagem vai cair nas graças da geração que tornou Transformers uma franquia bilionária, e dos fãs neófitos que jamais abriram um quadrinho e que têm Tobey Maguire como o Homem-Aranha definitivo, mas pra alcançar o coração de um cabeça de teia veterano como eu sou, francamente, o filme precisava de mais do que oferece. Nem sequer uma boa cena fazendo referência direta a um dos mais marcantes momentos do Homem-Aranha nos quadrinhos dos anos 60 foi suficiente para me cativar, mas nós sabemos que o Homem-Aranha voltará, e terá outras chances para retornar aos píncaros que já alcançou.
Apesar dos problemas, porém, Homem-Aranha: De Volta ao Lar é um bom e despretensioso divertimento pra quem não cresceu com o personagem na cabeceira, e deve garantir duas horas e treze minutos de entretenimento.

"-Eu consigo fazer isso. Vamos Peter. Vamos Homem-Aranha."

terça-feira, 4 de julho de 2017

Resenha Filme: Okja


Eu não estava lá muito ligado em Okja, filme do diretor sul-coreano Joon-Ho Bong, mesmo de Expresso do Amanhã, e esbarrei com ele meio ao acaso enquanto vasculhava a Netflix em busca de algo para ver sábado à noite (aliás, cheio de filmes bons e novos no catálogo do serviço. Até o último Homem, Lion, e o vencedor do Oscar Moonlight).
Resolvi assistir ao longa pelo breve trailer que se desenrola quando colocamos o cursos sobre o título, sem saber ao certo o que me esperava, e acabei me deparando com um dos melhores filmes do ano, até aqui e, certamente, a melhor produção original Netflix que eu já assisti.
O longa escrito por Bong e Jon Ronson narra a história de Mija (An Seo Hyun), e seu mascote, um enorme animal que sugere uma mescla entre um hipopótamo e um porco, a quem ela chama Okja.
Mija, que é órfã, vive com seu avô numa porção de floresta tropical montanhosa nos confins da Coréia do Sul, passando por todo o tipo de aventuras junto com sua melhor amiga. Okja e Mija se conhecem desde a tenra infância quando o avô da menina, Heebong (Byun Hee-Bong) foi agraciado com a missão de criar um dos vinte e seis super-leitões encontrados no Chile pela multinacional Mirando.
Cada um desses fazendeiros receberiam a honra de criar um desses super-leitões por dez anos, e, ao final desse período, o melhor super-porco seria o escolhido para iniciar uma nova linhagem de animais para abate, que seriam o carro-chefe da empresa no ramo alimentício por anos vindouros.
Mija, porém, pensa que seu avô comprou Okja da Mirando em pequenas prestações, ignorando o fato de que seu tempo ao lado do animal está se esgotando. Por isso é um grande choque para ela quando os representantes da Mirando chegam à fazendola para recuperar Okja.
Mija ignora os avisos de seus avô, de que o animal pertence à companhia, e despreza o pequeno porco de ouro que o ancião lhe comprou ao descobrir que não poderia adquirir Okja, e pega suas economias seguindo para Seul para tentar recuperar sua amiga.
Em sua viagem para tentar resgatar Okja, o caminho de Mija se cruza com o da FLA, a Frente de Liberação Animal liderada por Jay (Paul Dano), que planeja equipar o sistema de bio-monitoramento de Okja com uma câmera clandestina de modo a revelar ao mundo a verdade por trás dos super-porcos da Mirando, que não são criaturas descobertas, mas animais geneticamente modificados em laboratório, que passam por sevícias cruéis nas instalações da companhia nos EUA, muito na contramão das promessas da diretora da empresa, Lucy Mirando (Tilda Swinton), que considera todo o seu estratagema "mentirinhas inocentes", usadas para enganar ativistas dos direitos dos animais e os consumidores que não têm interesse em comer carne geneticamente modificada.
Mija, então, segue sua porca gigante até Nova York, onde suas chances de resgatar Okja se tornam cada vez mais minguadas à medida em que elas contrariam os interesses dos altos escalões corporativos que investiram dinheiro e esforços na criação de Okja, e não estão dispostas a abrir mão do lucro que a nova raça poderá render.
Ao contrário do que o grande animal criado através de CGI e animatrônicos poderia sugerir, Okja está longe de ser um filme pra crianças.
Na verdade, mesmo adultos mais sensíveis podem ficar chocados com certos segmentos do filme, ainda que jamais haja choque pelo choque, ou sequer imagens gráficas além da medida.
Todos os momentos mais chocantes do longa, que ocorrem no seu terceiro ato, em cenas passadas nos abatedouros da Mirando, e estão diretamente ligadas ao destino de Okja, sem jamais serem gratuitas, entretanto, como à essa altura a audiência já foi carregada pra dentro do filme, e está completamente envolvida com a missão de reunir a super-porca e Mija, acaba sendo difícil não se sentir atingido quando Mija anda por corredores de concreto e azulejos manchados de sangue numa ambientação que emula um filme de horror, ou nos campos ao redor do abatedouro que praticamente gritam "Campo de Concentração".
É surpreendente quanta coisa o ambicioso roteiro de Okja seja capaz de englobar em uma história que pode ser resumida de maneira tão simples e breve.
O longa trata da ética do consumo de produtos de origem animal e do limite para a crueldade com animais, de responsabilidade corporativa, tudo isso sem jamais perder o foco da relação entre Okja e Mija, que propulsiona o filme ao longo de suas duas horas, e nem deixar que o panfleto óbvio suplante a história que o longa deseja contar.
Ainda que haja algumas escolhas equivocadas, como ignorar a faceta de fanatismo de Jay para com sua missão (Perdendo a oportunidade de explorar melhor o talento de Dano, que é brilhante nesse tipo de trabalho), Okja se segura com tranquilidade no seu desenvolvimento, graças ao talento de Bong para conduzir tanto a ação quanto o drama e a comédia.
Com isso, Okja consegue ser um filme que passa longe do final feliz tradicional, sem arrancar o coração da audiência pelas tripas como o longa de um cineasta menos hábil poderia se sentir tentado a fazer.
Equilibrando-se em uma narrativa segura, com um trabalho de edição acima da média (a sequência da perseguição no shopping subterrâneo em Seul testemunha a habilidade dos editores Meeyon Han e Yang Jin-Mo), fotografia de primeira (de Darius Khondji) e trilha adorável (de Jaeil Juing) e um elenco que ainda conta com Lilly Collins, Steven Yeun, Jake Gyllenhaal, Shirley Henderson e Giancarlo Esposito, Okja é um desses filmes calorosos sobre laços de confiança, mas consegue sê-lo sem se vender ou abrir mão do peso da mensagem que deseja passar, quer concordemos com ela, quer não.
No final das contas, quando Mija sussurra no ouvido de Okja, todos poderemos nos sentir mais confortáveis, não importa por quais horrores tenhamos passado.

"-Eu amo todas as criaturas da existência, mas você está se esforçando pra ser a primeira exceção."

segunda-feira, 3 de julho de 2017

Resenha DVD: A Bela e a Fera


A culpa é do Tim Burton.
Sério.
Antes de de o diretor de Os Fantasmas se Divertem reimaginar Alice no País das Maravilhas e faturar um bilhão de dólares com um filme que, francamente, nem sequer era bom, a Disney se limitava a caçar niqueis lançando sequências direto em vídeo de seus filmes mais cultuados, eventualmente espetáculos de patinação no gelo, ou desenhos animados em série que passariam no Disney XD... Coisas do gênero.
Foi quando, por alguma razão que me escapa, o Alice no País das Maravilhas estrelado por Mia Wasikowska se tornou um sucesso bilionário em 2010, que a Disney percebeu o tamanho da mina de ouro sobre a qual estava sentada.
Se Alice fora tão bem recebido em sua versão moderninha, sombria e turbinada por CGI de última geração, o mesmo não se aplicaria a todo o vasto catálogo de animações da empresa que criou as animações como as conhecemos?
Cinderella, de 2015, foi um sucesso bem mais modesto que Alice, ainda assim, faturou mais de 543 milhões de dólares pra um orçamento de 95, e se ano passado o segundo Alice foi um fracasso comercial e artístico, não é menos verdade que a fórmula se garantiu com o excelente Mogli: O Menino Lobo, que ultrapassou os 966 milhões em receita.
Com tanta grana rolando, ficou claro que a Disney podia começar a mirar mais alto, e não tinha como mirar mais alto do que A Bela e a Fera, que em 1991 conseguiu uma inédita indicação ao Oscar de melhor filme, e arrastou multidões ao cinema e ainda se tornou um dos primeiros sucessos de home-video de que sou capaz de me lembrar, com gente comprando o VHS adoidado.
O longa, lançado em março desse ano, faturou alto. Mais de um bilhão de dólares, e garantiu a produção de diversas outras produções, como O Rei Leão de Jon Favreau, e Alladin, de Guy Ritchie, e, apesar do hype, eu não fui assistir ao longa no cinema por conta da ditadura da versão dublada na imensa maioria das salas de exibição e, porque, sendo bem franco, não estava particularmente interessado.
Não foi mais senão acaso que me fez cruzar com o longa na estante da locadora no sábado, e nada além de falta de opção que me fez levá-lo pra casa. Ontem, com uma coberta sobre as pernas, um copo de guaraná gelado e um pacote de Pingo D'ouro, conferi o longa:
Na trama, conhecemos a história de um príncipe arrogante (Dan Stevens), que após escarnecer de uma pobre velha que lhe pede abrigo em seu palácio, é amaldiçoado, e condenado a passar o resto de seus dias vivendo como uma fera. A velha, na verdade uma feiticeira poderosa, dá ao príncipe uma rosa, e lhe avisa que, se ele não for capaz de fazer alguém amá-lo pelo que ele é, a despeito de sua aparência, até que a última pétala caia, ele estará condenado a ser uma fera até o fim de seus dias.
Graças a magia da bruxa, o povo da vila próxima esquece do príncipe, que tem seu palácio transformado em um sombrio castelo, e sua criadagem tornada em utensílios domésticos, e é deixado para esperar por um amor impossível.
Os anos se passam e, na vila próxima ao castelo, a jovem Bela (Emma Watson) é uma moça considerada estranha por todos.
Letrada, independente e voluntariosa, ela é diferente de todas as moças da região, desejando muito mais do que a vida provinciana que leva na companhia de seu pai, o relojoeiro Maurice (um subaproveitado Kevin Kline). Ela deseja vivenciar o mundo que explora nos livros que pega emprestados na minguada biblioteca do padre Robert (Ray Fearon).
Dividindo seu tempo entre a leitura, ajudar seu pai, cuidar de seus afazeres e evitar o fortão local, Gaston (Luke Evans), Bella lida com a rotina da melhor forma, sempre ansiando por mais na vida.
É quando seu pai, a caminho de uma feira numa cidade próxima, é pego por uma tempestade, e, após ser atacado por lobos, busca abrigo em um palácio aparentemente abandonado. Lá, após colher uma rosa, é arrebatado pela Fera, e trancafiado numa cela.
Eventualmente Bela descobre o destino de seu pai, e vai em seu auxílio, trocando de lugar com Maurice, e ficando, ela própria, à mercê do monstro.
Enquanto Maurice volta para a vila em busca de ajuda para resgatar Bela, os criados do castelo, liderados pelo candelabro Lumiére (Ewan McGregor) e pelo relógio Cogsworth (Ian McKellen) veem na presença da jovem uma maneira de acabar com a maldição, mas precisarão dos esforços de todos, do cravo Cadenza (Stanley Tucci) ao bule madame Potts (Emma Thompson), passando pelo guarda-roupa senhora Garderobe (Audra McDonald) e o espanador Plumette (Gugu Mbatha-Raw) para convencer a Bela de que seu algoz é mais do que apenas uma fera, mas mesmo que consigam, será que isso bastará para livrá-los da maldição?
Se na premissa a história parece exatamente igual a da animação de 91, acredite, quando assistimos é ainda mais.
O longa repete o figurino, as canções, até alguns enquadramentos do filme animado dirigido por Gary Trousdale e Kirk Wise, afinal, em time que está ganhando, não se mexe.
A decisão parece ainda mais acertada quando as inserções na trama, alongada em uns bons 45 minutos com relação ao material de origem, não chegam a oferecer nada de muito excitante.
As números musicais extras, por exemplo, que aparecem na segunda metade do filme, soam completamente estéreis na comparação com canções que ganharam cadeira cativa no coração de fãs como a "Belle's Theme", "Something There", o já clássico "Beauty and the Beast", a fanfarra burlesca de "Be Our Guest" ou mesmo a cômica "Gaston" entoada por Evans e Josh Gad, que interpreta Le Fou.
Uma adição bem-intencionada à trama é a razão pela qual os criados do palácio entraram de carona na maldição do príncipe, além da inclusão de um personagem gay (Le Fou é obviamente apaixonado por Gaston), e pessoas negras no vilarejo de Bela, entretanto, o segmento sobre a verdade por trás do destino da mãe da protagonista, numa tentativa de criar um paralelo entre o casal já que a mãe da Fera também é mencionada no longa, é um esforço de desenvolvimento vazio por parte dos roteiristas Stephen Chbosky (do excelente As Vantagens de Ser Invisível) e Evan Spiliotopoulos (do atroz O Caçador e a Rainha do Gelo), que ainda tentam aumentar o nível de independência feminina de Bela mostrando que ela é capaz de construir uma máquina de lavar movida a burrico (nem pergunte).
A direção de Bill Condom é correta, o cineasta dos sofríveis últimos filmes da Saga Crepúsculo e dos ótimos Deuses e Monstros e Dreamgirls, um sujeito que provavelmente foi contratado por saber lidar com romances, musicais e efeitos visuais, não inventa, e trata o longa como ele merece, com a atenção e a grandiloquência que os números musicais da Disney carregam consigo.
Os efeitos visuais nem sempre funcionam, porém. Ainda que os utensílios sejam convincentes o bastante, a Fera, meio homem, meio leão, meio bisão sempre parece falsa na tela, fazendo Dan Stevens praticamente invisível sob a máscara digital (era mais fácil ver Benedict Cumberbatch em Smaug, pra se ter uma ideia) o que rouba um pouco da imersão do espectador que não se encanta de imediato com o romance, e a sequência de ação final, com Gaston e a Fera se digladiando entre as torres do palácio é toda meio deslocada, e não empolga, mas isso não chega a ser uma tragédia.
Dentro de sua proposta o longa se sustenta, repleto de adornos dourados em estilo rococó, um trabalho de elenco absolutamente acima da média, e uma história de amor mais velha que o tempo, A Bela e a Fera certamente cativou as audiências-alvo com louvor, conforme atesta sua bilionária bilheteria. A despeito de jamais alcançar a perfeição da animação de 1991, o filme, a despeito de resquícios de um inchaço todo próprio aos blockbusters, é um bom programa, e entrega um belo conto de fadas que, em meio aos excessos, consegue cativar.
Ainda que, na minha opinião, não valesse a visita ao cinema, certamente valeu a locação.
Se estiver procurando por entretenimento inofensivo, e uma bela história de amor, permita-me estender o convite de Lumiére: Fique à vontade.

"Se ele pudesse aprender a amar outra pessoa, e merecer seu amor de volta antes de a última pétala cair, o feitiço se quebraria. Se não, ele estaria condenado a permanecer para sempre uma fera. Conforme se passavam os anos, ele sucumbiu ao desespero e abandonou toda a esperança. Pois quem seria capaz de aprender a amar uma fera?"