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sexta-feira, 30 de agosto de 2019

Resenha Cinema: Yesterday


Após assistir 007 contra Spectre, o que, pra mim, foi um dos piores filmes de James Bond já feitos, cheguei a escrever nesse espaço que aquela fórmula já dera o que tinha pra dar, e que o próximo filme de James Bond seria o fiel da balança para saber se o 007 de Daniel Craig estaria na coluna de Sean Connery e Timothy Dalton (Sim, Dalton foi um baita 007), ou na coluna de George Lazenby e Roger Moore.
Quando o nome de Danny Boyle surgiu para a direção do novo filme do espião, eu pensei que os Broccoli e a MGM estivessem decididos a colocar Craig na primeira coluna. É esse o tanto que eu aprecio o trabalho do cineasta por trás de Cova Rasa, Trainspotting, Steve Jobs e Quem Quer Ser um Milionário.
Claro, eventualmente Boyle deixaria o projeto do novo James Bond por divergências com os produtores e 007 Sem Tempo para Morrer já não parece mais uma ideia tão divertida, mas o cineasta seguiu seu caminho e, ao lado do roteirista Richard Curtis (Um Lugar Chamado Notting Hill, Simplesmente Amor e quase todas as comédias românticas inglesas que chegaram aos cinemas em anos recentes), criou este Yesterday, que eu queria ver desde que assisti ao primeiro trailer alguns meses atrás.
No longa conhecemos Jack Malick (Himesh Patel).
Jack é um ex-professor tentando uma carreira na música sem grande sucesso em Suffolk, na Inglaterra.
Ele canta em calçadas, praias, festas infantis, bares, cafés ou tendas semi-abandonadas em festivais onde sua única audiência fiel são um grupo de amigos liderados pela doce Ellie (Lily James, terrivelmente adorável). Ellie é amiga de Jack desde a infância, e acumula as funções de roadie, empresária e motorista dele desde o início de sua empreitada de tentar a sorte no mundo da música.
Vivendo com os pais e trabalhando meio-expediente em um atacado, Jack está começando a ver o seu sonho musical se desvanecer, e após uma apresentação particularmente frustrante no festival de música Latitude, a despeito dos apelos de Ellie, ele está com um pé de volta às salas de aula.
É então que algo acontece. Um blecaute de proporções globais deixa o mundo inteiro no escuro por doze segundos, exatamente durante esse ínterim, Jack é atropelado por um ônibus para despertar no dia seguinte sem seu violão e dois dentes em um mundo onde os Beatles jamais existiram.
Quando Jack pergunta à Ellie se ela ainda vai precisar dele, se ela ainda irá alimentá-lo quando ele tiver 64 anos, ela pergunta "Veremos. Por que sessenta e quatro?".
E quando Jack ganha um novo violão de seus amigos e resolve tocar para eles Yesterday, dos Beatles enquanto bebe uma cerveja, arrancando lágrimas de Ellie, e elogios de todos os outros, que perguntam quando ele escreveu aquela música tão linda, ele tenta explicar que não é ele o compositor, mas Paul McCartney. Os Beatles. Mas ninguém sabe do que ele está falando.
Estupefato ele corre pra casa para procurar por seus discos dos Fab Four, mas eles não existem. Ele procura no Google, mas não há Beatles, apenas beetles, Não há John, Paul, George e Ringo, apenas João Paulo II, outras bandas, como os Rolling Stones ainda existem, mas os Beatles, não.
Eles jamais existiram.
Subitamente, Jack tem um dos maiores repertórios da história da música a seu inteiro dispôr, e a chance de se tornar, possivelmente, o maior compositor da história do Rock ao se apropriar do trabalho de quatro músicos que não existem para serem roubados.
Em um mês Jack vai de zero a sucesso mundial, mas começa a ser assaltado por sua consciência, ao mesmo tempo em que percebe que, talvez, a fama e o sucesso não sejam as coisas mais importantes de sua vida.
Yesterday é um filme adorável.
A história de amor entre os personagens de Patel e James é cheia de uma convicção tocante que torna o casal imediatamente gostável. Os dois atores vendem essa história de amor não consumada com habilidade e garantem que a audiência se flagre torcendo por eles. O roteiro é repleto daquela mistura entre sarcasmo e doçura que é característica do texto de Curtis, e toda a vez que esse roteiro ameaça emburacar pelo lado mais melado da Força, a mão de Boyle entra em cena, enchendo o longa de potência visual e narrativa. O diretor lança mão da bela fotografia de Christopher Ross e da edição acelerada de Jon Harris para encher de cor, vida e movimento o que ameaçava se tornar uma tela estática.
Há problemas no longa, que aventa perguntas interessantíssimas que acabam não sendo respondidas ou exploradas a contento. Por exemplo, como seriam a música popular e o rock em um mundo sem o Beatles? Qual seria a recepção à essas canções pelas audiências de hoje em dia se elas não fossem clássicas? Sem os quatro intérpretes, o fenômeno seria o mesmo? Um mundo com uma imitação dos Beatles seria um mundo melhor do que um mundo sem nenhum traço dos quatro rapazes de Liverpool?
Há ainda uma participação especial no final do filme (com um irreconhecível e não creditado Robert Carlyle) que me causou sentimentos conflitantes, mas que, de modo algum, estragam o filme.
O longa tem muitos acertos para isso, a começar por seu elenco. Lily James poderia estampar o verbete "doçura" na enciclopédia (não na minha. Conheço uma moça mais doce), Joel Fry (o Hizdahr zo Loraq de Game of Thrones) é um bem intencionado alívio cômico como o roadie maconheiro Rocky, Kate McKinnon transforma a empresária Debra Hammer em um nada lisonjeiro retrato dos executivos de gravadoras do mundo, e até Ed Sheeran está hilário interpretando a si próprio da maneira mais auto-depreciativa possível, mas o grande achado do filme é mesmo Himesh Patel.
O ator britânico tira de letra a indigesta tarefa de interpretar Beatles sem necessariamente imitar ninguém, e o faz com inegável talento, realmente cantando essas músicas com sua voz que evoca algo de Paul McCartney.
Além de seu elenco e equipe, Yesterday ainda possui a música dos Beatles em seu corner, o que inevitavelmente advoga em favor do filme, e coração em proporção industrial.
O longa dificilmente entrará para a história do cinema como o melhor trabalho da carreira de qualquer um dos envolvidos, e talvez a música dos Beatles merecesse um filme melhor, mas a despeito de seus eventuais tropeços, é um feel good movie bem-sucedido.
Eu saí me sentindo bem, e acreditando, ao menos por um momento, que amor é tudo o que você precisa.

"-É Yesterday. É a maior canção de amor já escrita!
-Não é a maior... Não é ruim, mas não é Coldplay... Não é Fix You."

quinta-feira, 29 de agosto de 2019

Resenha Série: Mindhunter, Temporada 2, episódio 9


Atenção! Há spoilers abaixo.
Aqueles familiarizados com o caso do estrangulador de Atlanta sabem que Wayne Bertram Williams (Christopher Livingston), o suspeito parado por Bill, Barney e Ford no episódio passado de Mindhunter eventualmente seria condenado como o Monstro de Atlanta, e muito desse último episódio da temporada revolve ao redor dos três agentes federais liderando as autoridades na tentativa de juntar as pistas capazes de criar um caso contra o sujeito, seja com visitas surpresa à sua casa, seja perseguindo-o pelas ruas de maneira não muito discreta, seja mendigando vigilância sobre ele junto ao promotor público.
Novamente, o acerto da série é não inserir os personagens fictícios com muita veemência na narrativa real, o que a mantém com um pé na realidade, e não deixa que a história se torne um daqueles filmes feitos para a TV dos anos 80/90. A Unidade de Ciência Comportamental não está no miolo de todos os casos envolvendo assassinos em série, e certamente não estivera nesse, o que torna as coisas mais críveis quando Holden e Bill se percebem sem nenhum controle da situação como, por exemplo, no momento em que Williams é preso pela polícia de Atlanta e os dois não sabem ao certo por que, ou quando Williams passa a tentar virar o jogo ao se perceber sob vigilância policial e eles se veem constrangidos por sua impotência, ou quando ainda se veem lidando com a desconfiança das autoridades da Georgia e, eventualmente, com o uso político do trabalho da unidade.
O caso do estrangulador de Atlanta é verdadeiro e famoso, e conforme é lembrado à audiência no final do episódio, Williams seria condenado pelos homicídios de dois adultos, enquanto os outros vinte e sete casos jamais seriam ligados a ele de oficialmente. Por mais que isso possa ser uma estratégia da promotoria para pegá-lo através dos casos pelos quais ele foi efetivamente responsabilizado garantindo sua punição, não é difícil enxergar a conveniência de afirmar que Wayne Bertram Williams era o responsável por tudo e encerrar o caso para que a cidade pudesse voltar ao normal de uma vez por todas.
A despeito de todas as queixas da promotoria pedindo por evidências físicas dos crimes para emitir mandatos, Wayne foi processado por conta de fibras de carpete e a pressão de políticos ávidos por colocar o passado atrás de si em um ano eleitoral.
E esse é um desfecho que Holden, mais do que ninguém, acha difícil de engolir.
Porque o FBI recebe o crédito por usar suas técnicas e resolver o maior caso do país, mas as justiça pode não ter sido feita. Quando Ted Gunn aparece em Atlanta em um jatinho privado parabenizando Holden e Bill pelo trabalho e porque agora o bureau é a primeira opção para esse tipo de caso, o agente Ford não vê um sucesso.
E essa nota de frustração para o final da série é depoimento em favor de sua coragem.
O programa que celebra a inteligência de seus protagonistas é corajoso o suficiente para mostrar que eles não têm todas as respostas não importa o quanto acreditem em seu programa.
Essa acaba sendo uma lição de humildade mais pesada para Holden. Ele tinha tanta certeza do perfil que havia montado que ver os resultados de sua presunção questionados talvez seja mais amargo do que descobrir que sua crença se encaixava tão candidamente na narrativa que melhor servia às autoridades que jamais se comprometeram com ele. A descoberta de que os crimes eram responsabilidade da Ku Klux Klan poderia ter acendido um barril de pólvora na cidade, mas a condenação de Williams manteve Atlanta relativamente sob controle e sua violência racial debaixo do tapete.
Bill, mais experiente e calejado sabe como a banda toca o suficiente para não cair nas armadilhas das promessas de Gunn, obviamente mais interessado no ganho político que poderia ordenhar dos sucessos da UCC, mas Holden levou uma tremenda rasteira. Ele não consegue ver o sucesso absoluto de Gunn ou o sucesso relativo de Bill, ele vê apenas um fracasso. Especialmente ao descobrir que sua promessa de que a investigação continuaria foi engavetada à revelia de sua vontade. Ele realmente pretendia retornar e continuar no caso tanto para ligar mais crimes a William quanto para investigar outras possibilidades com Barney, e o faria para satisfazer o desejo por justiça das famílias, mas também sua própria curiosidade intelectual, como ele vai lidar com esse revés, descobriremos na próxima temporada.
O preço da investigação de Atlanta, para Bill, pode ter sido até mais caro do que para seu colega.
Nancy aparentemente não tinha mais como suportar a ausência do marido e o ostracismo ao qual julgava Brian exposto, e resolveu ir embora.. É difícil simpatizar com Nancy à essa altura, e eu não sei se isso é proposital ou reflexo de má escrita. É difícil dizer, mas a personagem encerra a segunda temporada como a Skyler White de Mindhunter.
Resolver ir embora porque o marido precisou responder a um chamado no meio de um churrasco é o cúmulo da futilidade...
Quanto a Wendy, ela não desempenha papel algum nesse capítulo final.
Sua única participação é jogar no lixo uma das revistas de Kay, talvez sinalizando que ela vai se dedicar mais profundamente à sua profissão no futuro, seja como for, seu papel ampliado nessa segunda temporada foi um dos acertos da série, e o fato de ela ter falhas de caráter e cometer erros enriqueceu a personagem.
Fechando o capítulo, saem as cold openings de BTK, entra uma cold closing. O "funcionário da ADT" aparece em um quarto de motel, novamente munido de seus apetrechos de masturbação que haviam sido enterrados no meio da temporada, e vários troféus arrancados de suas vítimas.
Vale lembrar que, na vida real, BTK só seria capturado em 2005, então, é uma linha narrativa com muito tempo para seguir, talvez, um recado para Holden e membros mais apressadinhos da audiência:
Mindhunter não é uma procedural. Nem todos os criminosos do mundo podem ser capturados rapidamente após um perfil ser montado baseado em entrevistas com criminosos notórios, na natureza de seus crimes e seu modus operandi.
Ás vezes, é preciso um longo, longo trabalho, e mesmo assim, seja necessário se contentar com alguma migalha de justiça, e tocar o barco.
Que venha a terceira temporada.

"Nós fizemos nosso trabalho. Não temos controle sobre mais nada..."

quarta-feira, 28 de agosto de 2019

O Trailer Final de Coringa

E agora a tarde a Warner divulgou o trailer final de Coringa, filme solo do príncipe palhaço do crime, inicialmente independente dos resto do DCUE (isso ainda existe?).
A prévia não tem o mesmo impacto do teaser anterior, mas dá mais pistas da trama do longa e mostra o que deve ser mais um espetáculo de Joaquin Phoenix:



Dirigido e co-escrito por Todd Phillips de Se Beber Não Case, Um Parto de Viagem e Cães de Guerra e Scott Silver, o longa ainda tem no elenco Robert De Niro, Zazie Beetz e Mark Maron, Coringa tem estréia marcada para 3 de outubro.

Resenha Série: Mindhunter, Temporada 2, episódio 8


O oitavo episódio da temporada de Mindhunter finalmente retoma o melhor ritmo da série.
Temos, novamente a cena com o assassino BTK (que nos créditos é chamado de funcionário da ADT) antes dos créditos de abertura e Holden fazendo ostensivamente aquilo que faz melhor, ou, pelo menos tentando.
A jornada de Holden Ford por Atlanta tem sido um exercício de frustração. As autoridades municipais e estaduais não queriam a interferência federal ordenada pelo Departamento de Estado, de modo que o agente tem sido constantemente empurrado de uma pista aparentemente inútil para a próxima, seus insights como o plano das cruzes ou dos folhetos esbarram em burocracia que ele não consegue entender, e desvio de recursos que só fazem irritá-lo. Para piorar, os problemas de Bill na Virgínia tornaram o veterano um parceiro inconsistente que nunca está presente para ajudá-lo a defender suas ideias junto às pessoas que tomam as decisões no caso do estrangulador, o que, por sinal, leva à uma boa cena onde os dois federais colocam os pingos nos is, e parecem chegar à alguma espécie de entendimento. Seja como for, no penúltimo capítulo da temporada, as autoridades locais parecem ter chegado a um ponto de desespero grande o suficiente para prestar mais atenção no que Holden diz.
Ainda há muita resistência à aplicação da ciência comportamental no caso, tanta que Bill precisa trabalhar com um grupo de investigação local vigiando uma seção da KKK sem nenhum efeito. Mas quando vaza a notícia da presença de fibras nos cadáveres, e o assassino muda sua tática para se livrar dos corpos, jogando-os o nos rios da região, Bill, Barney e Holden apresentam a ideia de vigílias do pôr ao nascer do sol nas pontes da cidade na esperança de flagrar o assassino no ato da desova de uma vítima.
É um empreendimento tremendamente caro, à moda antiga, sem vínculos com a parte teórico científica da montagem de perfis, o que é um benefício político à essa altura, e que, após cinco semanas de mosquitos e privação de sono e com o número de vítimas chegando a vinte e oito, finalmente pode ter rendido frutos.
Mas, se a primeira temporada de Mindhunter foi toda a respeito de Holden, que com sua visão e iniciativa deu início ao que se tornaria a UCC, e com sua volatilidade emocional era o foco do drama da série, e os assassinos seriais que eles entrevistavam, e o sucesso que essa abordagem rendeu na resolução de um homicídio, nesse ano as coisas mudaram.
Bill e Wendy foram nomeados suas babás tanto pelo diretor-assistente Gunn quanto entre si, de comum acordo após seus colapso nervoso, mas apesar da ameaça de que ele pudesse ter uma nova crise a qualquer momento, a temporada chega a seu oitavo episódio sem que Holden tenha estadado sequer perto de ter outra crise, fazendo seu trabalho de maneira contrita e, sem uma vida pessoal no momento, deixando o drama para Bill e Wendy.
Essa decisão tornou a série consideravelmente mais democrática, enquanto a crise familiar dos Tench transformou Bill num equilibrista tentando agradar aos chefões do FBI, às autoridades locais de Atlanta, Nancy, Holden e ainda resolver casos, Wendy tornou-se uma parte mais integral da Unidade de Ciência Comportamental e da série como um todo, mostrando-se como uma lésbica no armário tentando encontrar realização profissional e pessoal em uma época onde homossexualidade ainda era considerado uma espécie de desvio de conduta.
Isso também ajuda o programa a manter-se longe daquela fórmula CSI, porque ao invés de o drama do programa vir da investigação pintando a UCC como os heróis que resolveram o caso, ele vem das vidas pessoais de Bill e Wendy.
Um dos momentos mais surpreendentes do episódio vem quando Bill chega em casa para encontrar a pia da cozinha cheia de louça suja e Nancy fumando no quintal dos fundos, admitindo verbalmente que desistiu de Brian. Ela deixa Bill responsável pelo guri durante o resto do dia após ter aventado a possibilidade de uma mudança inicialmente rechaçada por ele.
A cena onde Bill e Brian vão comer sorvete juntos é de cortar o coração, e quando o moleque reage à história de seu pai, nos leva a pensar por onde anda a cabeça dele desde a morte do bebê, e se Bill tem razão em seus temores a respeito da natureza do filho. A propósito, Brian já tinha falado na série?
Wendy, por sua vez (além de sim, continuar laranja, meu amor) está ainda mais distante de Atlanta, e o diretor Gunn parece querer fazer todo o possível para manter as coisas assim. É difícil saber se essa ideia se baseia de fato em usar os talentos dela de maneira mais científica possível organizando e gerenciando as descobertas do projeto, ou se ele apenas é machista demais para ter uma mulher entrando em presídios e entrevistando assassinos em série nos anos 70. Seja como for, esse isolamento é incongruente com o momento que ela vive com Kay, que parece querer fazê-la se tornar mais aberta a respeito da própria identidade, ao menos até descobrir que Kay também compartimentaliza partes de sua vida, e não gostar nem um pouco.
Da mesma maneira que Holden vem fazendo em Atlanta desde o início do caso do estrangulador, Wendy resolveu defender seus princípios, e conforme nós vimos em Atlanta, defender seus princípios muitas vezes pode cobrar um alto preço.
Faltando um episódio para o fim da temporada, Mindhunter parece ter reencontrado seu ritmo e se encaminha para o encerramento do ano de maneira auspiciosa, vamos torcer para que não haja nenhum escorregão no último ato da trama que, até aqui, tem um placar amplamente positivo.

"-Acho que a teoira faz sentido, mas se virmos um corpo sendo jogado de uma ponte, o perfil não importa.
-... Importa pra mim."

terça-feira, 27 de agosto de 2019

Resenha Série: Mindhunter, Temporada 2, episódio 7


Conforme Holden imaginava o encanador branco preso no final do sexto episódio não era culpado de coisa alguma além de carregar muita fita adesiva em sua picape e ter se masturbado casualmente na mesma floresta onde o verdadeiro estrangulador de Atlanta deixara algumas de suas vítimas.
A confissão envergonhada de que ele levou revistas de mulher pelada pro mato para se aliviar porque sua esposa está grávida e ele não tem visto muita ação em casa vem após Bill e Holden interrogá-lo como se ele fosse o próprio diabo, e após os dois, e Barney terem movido céus e terras para obter mandatos de busca com um promotor que não estava muito impressionado com as evidências que lhe foram apresentadas, e falharem em manter a imprensa longe do caso enquanto interrogavam um inocente por mais de cinco horas. Não fosse isso o suficiente, mais uma criança é encontrada morta no dia seguinte ao fiasco.
Holden está frustrado porque seu perfil, para ele, é escritura.
Ele quer encontrar um homem negro entre vinte e trinta anos capaz de se aproximar dessas crianças em plena luz do dia sem levantar suspeitas e para ele, qualquer linha de investigação que vá em outra direção é um desperdício de tempo.
Bill, por sua vez, é um investigador veterano que está disposto a verificar qualquer pista, nem que seja apenas para excluí-la, e ele nem é o maior problema para a aplicação das descobertas da UCC. Há uma comunidade enfurecida e que tem a mais absoluta e inabalável certeza de que os responsáveis pelos crimes são membros da Ku Klux Klan, uma suspeita justificável já que a organização racista ataca a população negra da Georgia há anos e que, com a presença de um prefeito negro, pode ter alcançado novos píncaros de ódio, de modo que, por mais que Holden deseje se ater à aplicação científica das descobertas da Unidade de Ciência Comportamental livre de política, burocracia e pistas falsas, ele não vai conseguir.
Ele espera virar a maré usando a tendência dos matadores seriais de retornar ao local de seus crimes, para isso, ele quer usar a marcha da associação das mães das vítimas de Atlanta, a PARE, mas descobrirá que esse está longe de ser seu único problema...
Enquanto Holden esbarra na resistência à suas teorias, e Barney resolve bater um pouco mais de perna para ouvir as mães das crianças desaparecidas estabelecendo relações óbvias demais para terem passado despercebidas pela polícia local, Bill volta para Williamsburg para dividir com Nancy os problemas de Brian.
À essa altura parece claro que Bill prefere estar na estrada, entrevistando assassinos e investigando casos medonhos como o de Atlanta a estar em casa. Ele se lamenta à Wendy, sua única confidente, a respeito da regressão de Brian, e de como suas expectativas de paternidade foram subvertidas pelo filho adotivo. Pior do que não ter com quem jogar beisebol ou futebol, ele começa a se torturar pensando se a situação do moleque é sua responsabilidade, ou apenas o curso da natureza.
Bill e Nancy não sabem que tipo de vida Brian levou antes de ser adotado aos três anos de idade, o que aconteceu a ele, ao que ele foi exposto. Ele pode ser apenas uma criança que não tem afinidades com o pai e a mãe, mas também pode ser um sociopata mirim, e Bill não sabe qual dos dois.
E, no que talvez seja a cena mais perturbadora do episódio, quando Nancy é visitada pela mãe do bebê morto, temos a impressão de que ela também não sabe.
A mulher devastada está convencida da versão alardeada por Nancy, de que Brian crucificou o bebê na esperança de ressuscitá-lo como jesus, e quer conhecê-lo e perdoá-lo, mas Nancy não permite. Talvez por perceber que Brian está simplesmente esquisito demais para causar qualquer tipo de boa impressão à uma mulher de luto, ou porque ela já não acredita na versão dos fatos que tem repetido como um mantra.
Restrita a uma participação pequena no episódio, Wendy (que, por culpa do comentário de uma morena muito linda a respeito de sua maquiagem agora praticamente está pintada de cor de laranja aos meus olhos) vê Ted Gunn discretamente repreendê-la pelo encontro mal-sucedido com Bateson, e veladamente a proibir de conduzir novas entrevistas.
Além desse percalço profissional, ela ainda precisa lidar com seus problemas no âmbito pessoal.
Wendy realmente dá pinta de querer levar sua relação com Kay a um novo patamar, mas ela parece querer dosar a intimidade advinda disso em seus próprios termos. Sua proposta para a namorada é mais uma demonstração da falta de jeito de Wendy para se comunicar em termos casuais (embora o lance dos "filhos de mães promíscuas" ainda fique com o troféu na comparação). Ela quer Kay em sua vida, mas aparentemente em doses pré estabelecidas que lhe sejam convenientes.
Esse sétimo episódio da temporada é superior ao anterior, mas ainda não recolocou a série em seus melhores momentos. Malefícios de estabelecer uma barra demasiado alta, eu suponho.
Um elemento interessante é a maneira como Mindhunter (eu não consigo chamar a série de Caçadores de Mentes, mesmo sendo a tradução literal...) evita um problema que sempre me pareceu estar à espreita do programa, transformar a série em um buffet de assassinos seriais oferecendo ideias que imediatamente levariam os três protagonistas à resolução de casos reais, quer os verdadeiros agentes da UCC que inspiraram a série tivessem tomado parte na coisa toda, ou não.
Não é difícil ver uma equipe de produção menos competente transformando essa série em um CSI da vida, e teria sido leviano colocar Holden e Bill no caso do estrangulador de Atlanta chegando à Georgia e resolvendo tudo rapidamente como se fossem messias da investigação criminal. Por sorte Mindhunter mantém os pés no chão, e coloca a Unidade de Ciência Comportamental em um papel de párias, e não de heroicos cavaleiros. Eles estão atrasados para as cenas de crimes, não recebem o apoio integral das autoridades locais, não conhecem a dinâmica social de uma cidade onde não vivem, eles cometem erros frequentes e são confrontados com a frustração resultante desses erros.
Essa humanidade dos protagonistas mantém o programa honesto, e mesmo nos momentos menos brilhantes da série, garantem que a audiência se sinta impelida a voltar para mais episódios. Faltam dois capítulos para o fim da temporada, e Holden e Bill precisam de resultados.

"-Acho que ninguém sabe lidar com isso. Não tem uma receita.
-Deveríamos criar a receita. Somos os especialistas. Como faremos isso se tudo precisa ser em três vias?"

segunda-feira, 26 de agosto de 2019

Resenha Série: Mindhunter, Temporada 2, episódio 6


BTK está de volta na cold opening desse episódio, e suas cópias xerox deixam claro que enterrar sua persona fetichista não resolveu seus problemas.
Falando em problemas, após o quinto episódio ser o melhor da temporada até aqui, esse sexto é possivelmente o pior.
A despeito de finalmente mover a trama para Atlanta e mostrar um interessante desdobramento para a linha narrativa de Wendy, o capítulo dirigido por Carl Franklin, que será o timoneiro da série até o final, é bastante moroso, e, após o show do capítulo anterior, é difícil não ficar com a impressão de que nada está acontecendo ao longo desses cinquenta e oito minutos, especialmente porque parece que as linhas narrativas principais se tornam mais paralelas do que nunca.
Se no capítulo anterior havia a presença de um sub-texto que ligava todos os personagens em cena na questão da identidade, aqui nós simplesmente os seguimos enquanto eles se envolvem em dramas que não se encontram ou se afetam. Não é ruim, e continua prendendo a atenção, mas após uma primeira metade de temporada tão coesa, não deixa de ser algo desapontador ver a série enveredar por um caminho que parece ter como único objetivo empurrar a trama pra frente.
O Departamento de Justiça resolve enviar o FBI para Atlanta á despeito da resistência da cidade em atrair atenção negativa da mídia, isso coloca Holden e Bill na estrada em um péssimo momento para Wendy, interessadíssima em manter o cronograma de entrevistas, e especialmente para o agente Tench, cuja falta é profundamente sentida por Nancy em casa já que ela e Brian estão sob intenso escrutínio do Estado, e enquanto Holden fica embasado na capital da Georgia e Bill fica entre Atlanta e a Virgínia cabe a Wendy e Gregg continuar o trabalho de campo á despeito de sua inexperiência.
Sob diversos aspectos a personagem de Anna Torv era meio que a ponta politicamente correta e inclusiva de Mindhunter.
Da mesma maneira que no final dos anos 90 a Globo volta e meia fazia novelas onde o único núcleo familiar funcional era uma família negra ou um casal gay, Wendy Carr, a cientista lésbica, era a pessoa de cabeça fria, competente e sábia que mantinha a estabilidade do UCC sendo o contraponto da incredulidade veterana de Bill e do comportamento por vezes excessivamente empolgado de Holden. Isso tornava a personagem um tanto quanto unidimensional e por vezes aborrecida de se acompanhar. Nos últimos episódios Wendy tem ganhado a oportunidade de ser aprofundada, ganhar uma personalidade mais humana, com falhas de caráter que podem torná-la uma personagem mais interessante.
Ela parece ter dificuldades em se relacionar, conforme sua conversa com Kai após o sexo no episódio anterior atesta (ela fala casualmente que entende a posição da bartender de não apresentá-la a seu filho por "estudar o comportamento dos filhos de mães promíscuas".) e genuinamente não liga para frivolidades como o teste de revista que a namorada tenta lhe aplicar enquanto está perdida em seus estudos. A exemplo de Holden e Bill, Wendy também pode desapontar a mulher em sua vida por causa do trabalho.
Mas não é apenas no campo pessoal que Wendy escorrega.
Após sentir a tensão do sucesso em sua entrevista com Henley, ela se atrapalha tentando estabelecer uma conexão com Paul Bateson (o técnico radiológico preso por matar um jornalista e suspeito não-condenado por uma série de assassinatos de homens homossexuais em Nova York). A despeito dos esforços de Wendy e Gregg, Bateson jamais se abre totalmente, e quando o detento encerra a entrevista unilateralmente, Wendy se flagra a questionar seus próprios métodos de abordagem.
Em Atlanta Holden não questiona sua abordagem nenhuma vez, e continua cometendo os mesmos erros que causaram sua expulsão da cidade pouco antes. Ele chega cheio de respostas e perfis às autoridades locais. Para sua sorte, dessa vez todos parecem estar com a corda suficientemente apertada no pescoço para dar algum crédito às suas ideias, em especial ao insight extraído de Kemper e Berkowitz a respeito de os assassinos voltarem à cena de seus crimes, o que leva à descoberta de três novos cadáveres, e a um suspeito em potencial que não se encaixa nem remotamente no perfil traçado por Holden e pode significar mais um percalço para a investigação.
E, claro, ninguém passa por mais percalços do que Bill.
O sujeito está se desdobrando o que pode e o que não pode entre suas tarefas de vender a UCC aos superiores do FBI junto com Ted Gunn, supervisionar as crises de estrelismo de Holden, investigar o caso junto com Barney e ajudar Nancy (que está paulatinamente se transformando na Skyler White dessa série) e não dá pra não pensar que, eventualmente, ele irá pagar um preço por essa tentativa de estar em vários lugares ao mesmo tempo.
Apesar dos tropeços narrativos do episódio, a perspectiva de ver a equipe (ou parte dela) trabalhando em um caso de verdade ao invés de ouvir reminiscências de assassinos encarcerados é bastante animadora. Com um suspeito no qual ninguém leva fé detido para interrogatório no próximo capítulo, as coisas se encaminham para o que pode ser uma bela sequência final de episódios que, esperamos, façam justiça à escrita consistente da primeira metade da temporada.

"O diretor quer ter certeza de que o FBI cause uma boa impressão."

O Teaser 2 de Star Wars: A Ascenção de Skywalker

Na D23 foi lançado o novo teaser de Star Wars: A Ascenção de Skywalker, último longa da trilogia de Star Wars que deve encerrar a saga dos Skywalker nessa galáxia bem, bem distante.
A prévia de pouco mais de dois minutos abre com a velha tática de nos mostrar cenas de filmes que amamos antes de nos trazer de volta ao pesadelo que Star Wars se tornou desde a aquisição da Disney ao som da narração de Jake Skywalker, entretanto, a última cena do teaser aventa o que poderia ser a expiação da trilogia, algo pelo qual eu havia ansiado antes do lançamento do Episódio VIII, e que eu, francamente, não ache que a Disney tenha colhões pra levar adiante:
Rey no lado sombrio.



Novamente dirigido por Jar Jar Abrams, Star Wars: Episódio IX - A Ascenção de Skywalker traz de volta Daisy Ridley, Oscar Isaac, John Boyega e Adam Driver, mais Mark Hammil, Billy Dee Williams, Ian McDiarmid e Carrie Fisher ressucitada através de cenas não utilizadas dos Episódio VII e VIII e computação gráfica.
O longa estréia em 20 de dezembro.

sexta-feira, 23 de agosto de 2019

Resenha Série: Mindhunter, Temporada 2, episódio 5


Chegando exatamente à metade, Mindhunter se espicha por uma hora e nove minutos de televisão de altíssima qualidade no que é o melhor episódio da temporada e um dos melhores da série, e não apenas porque Ted cumpre a promessa que fez a Holden quando os dois se conheceram, mas porque esse longo capítulo se inclina sobre a identidade de todos os seus personagens de uma maneira que a série ainda não havia se arriscado a fazer.
Eu adoro a primeira temporada de Mindhunter, e sob diversos aspectos, ainda agora, a considero sensivelmente superior, mas o único personagem com uma vida fora do FBI, então, era Holden e seus problemas com sua namorada eram mero pano de fundo para um programa que meio que fazia um quem-é-quem de assassinos seriais notórios e depois dava umas pinceladas de psicologia sobre a coisa toda. Era ótimo já que vinha de um especialista em assassinos seriais da sétima arte, quer dizer, quem mais tem Sev7n, Zodíaco e Millenium no cartel?
A segunda temporada, porém, parece muito mais interessada em expandir a vida de seus protagonistas, trazê-los à luz e desenvolver todos eles individualmente enquanto os conecta a seu trabalho.
Bill, Holden e Wendy são profissionais de ponta em seus respectivos campos, eles se preocupam com o processo no qual tomam parte e acreditam que o trabalho que realizam na UCC irá fazer a diferença, mas ao mesmo tempo são seres humanos carregando bagagens particulares com eles para cada entrevista ou cena de crime.
No episódio passado Wendy, a mais científica e metódica dos três foi incapaz de se manter pessoalmente afastada durante sua entrevista com Elmer Henley, nesse episódio, é a vez de Bill.
Após descobrir o envolvimento de Brian na morte do bebê estrangulado no episódio passado, o agente especial Tench tenta dividir seu tempo entre apoio à Nancy e seu papel no bureau como "os antolhos" de Holden, mas os limites entre seu lar e o trabalho começam a se tornar nebulosos. Ele e a esposa estão sob escrutínio do Estado para determinar se o filho adotivo do casal é um perigo para si mesmo e os outros e isso coloca Bill em uma posição complicada. Ele é o pai de um menino problemático, mas também é um agente do governo capaz de entender e respeitar os processos que revoltam Nancy. Ele precisa apoiar sua família ao mesmo tempo em que, mais do que ninguém, sabe que Brian precisa ser acompanhado com atenção por especialistas.
Isso leva a interessantes mudanças no comportamento de Bill no trabalho, como a maneira com que ele questiona a culpabilidade de Henley ao analisar a entrevista conduzida por Gregg e Wendy no capítulo anterior. "Podemos responsabilizar um adolescente pelas ações de um adulto?" ele pergunta, fazendo Holden encará-lo, incrédulo.
Henley fez tudo em seu poder para minimizar sua participação nos medonhos crimes de Dean "homem do doce" Corll, e Bill parece disposto a aquiescer nessa versão. Ele precisa acreditar que há uma diferença, outrossim, Brian é tão culpado quanto os guris mais velhos presentes naquele porão quando o bebê morreu.
Mas o momento que realmente tira o veterano do sério vem mais adiante, quando ele vai com Holden até a Califórnia para entrevistar Charlie Manson em pessoa (Damon Herriman, reprisando o papel de sua breve ponta em Era Uma Vez... Em Hollywood com mais tempo de tela e espaço para brilhar).
O sujeito que criou a pior versão de Helter Skelter deveria ser o grande momento de Holden, centrando sua abordagem em uma estratégia para entender como um ex-presidiário racista e desprezível foi capaz de convencer um grupo de jovens de classe-média a cometer crimes hediondos em seu nome. O problema é que conforme a conversa caminha a filosofa de maluco de Manson a respeito de como ele apenas abraçou os filhos desprezados de homens como Bill, somado à sua recusa veemente em assumir o papel de mentor dos crimes Tate-LaBianca simplesmente fazem o sangue de Tench ferver e ele perder as estribeiras.
Não ajuda o fato de que a análise de Wendy após Holden entrevistar Tex Watson (Christopher Backus) de certa forma, confirma o ponto de vista de Manson. Ele encontrou as pessoas certas, e simplesmente as ajudou a ser quem eram.
Isso leva Bill a seu limite.
Ele já era um marido e pai ausente por conta de seu trabalho na estrada, mas a tragédia envolvendo Brian parece ter um peso maior sobre ele porque é muito claro, desde a temporada passada, que ele não sabe se conectar com o piá retraído que ele e Nancy acolheram. Ele ainda é o bom soldado que comparece aos eventos do trabalho contando histórias para distrair os figurões do bureau, mas ele está a dois passos do colapso, e palmas para Holt McCallany por sua atuação na temporada.
Não é apenas Bill que tem sua carapaça devidamente removida nesse episódio.
A entrevista com Henley também deixou marcas em Wendy, especialmente após ela ser parabenizada mais de uma vez por "inventar a história da sapatão" para se conectar com o criminoso.
Isso a lembra de quanto de sua vida ela tem mantido em segredo, e sua relação com Kay, que é, de diversas maneiras, seu exato oposto, largando tudo para se tornar bartender e morar em um apartamento horroroso para poder ser quem é, aparentemente a está fazendo questionar sua posição de viver praticamente uma vida dupla, especialmente após a festa na casa do diretor-assistente Gunn, onde ela é confrontada com todo o sexismo corporativo do mundo tendo que literalmente se esconder de um superior particularmente escamoso, o que leva a um belo momento de camaradagem entre ela e Bill.
Dirigido por Andrew Dominik, o mesmo do capítulo anterior, o quinto episódio freia as investigações dos assassinatos em Atlanta para um pouco de introspecção. Todos os personagens são confrontados pela questão do que significa ser o seu autêntico "eu". Bill coloca uma máscara de tiozão divertido no trabalho imaginando se o verdadeiro eu de Brian é um assassino em série em potencial. Wendy, de certa forma, inveja a autenticidade da vida simples de Kai, Ed Kemper despreza Manson por não ser um assassino autêntico, enquanto Holden talvez seja autêntico demais para "fazer a social" com os superiores. Até mesmo o assassino BTK entra na onda, enterrando seus apetrechos fetichistas no pátio de casa...
Eu adoro o showroom de matadores famigerados e a conversa psicológica da temporada passada, mas um drama criminal de época questionando o comportamento humano com perguntas que os personagens não conseguem responder tem um tremendo apelo.
E se não é exatamente a tua praia, não tema, o final sugere que o estrangulador de Atlanta está de volta no próximo capítulo.

"Cada noite, enquanto você dorme, eu destruo o mundo."

quinta-feira, 22 de agosto de 2019

Resenha Série: Mindhunter, Temporada 2, episódio 4


Pela primeira vez sem sem uma alusão ao assassino BTK em seu início, o quarto episódio de Mindhunter não deixa de ter uma cold opening arrepiante, o alívio quando descobrimos que (spoiler?) tudo não passava de um experimento prático de Holden para confirmar seu perfil de que o matador de Atlanta é um homem negro (e, por tabela, comprovar que Gregg não leva o menor jeito para sequestrador).
Após ter prometido às mães de Atlanta que iria se empenhar na resolução dos homicídios, Holden tenta vender a ideia de que há um assassino em série na capital da Georgia a seus colegas da UCC, ainda que não haja base de informação para ir além de "homem negro, entre vinte e cinco e trinta anos", Ted Gunn está disposto a ouvir os apelas do rapaz e enviá-lo para a Georgia assim que um pedido de resgate surge, transformando a coisa toda em um caso federal sob jurisdição do FBI.
Mas, a despeito de alguns interessantes revelações sobre a periferia do caso de Atlanta, esse episódio não é de Holden, ou mesmo Bill, mas de Wendy.
A doutora Carr é uma acadêmica de quatro costados, que, desde o momento em que se juntou à UCC se concentrou no estudo por trás da missão. Wendy quer compilar entrevistas e colher dados que possam ilustrar as similaridades comportamentais desses indivíduos com personalidades extremas da maneira mais científica e publicável possível, donde a constante tensão entre o empirismo pelo qual ela anseia, com as entrevistas sendo conduzidas de maneira tão metódica quanto possível, e os instintos de Holden, capaz de começar a conversar com os assassinos em termos chulos como "as putinhas que estavam pedindo" por ser mais comprometido com a ideia de resolver os casos que porventura o intrigam, do que com a disciplina do estudo.
Por mais que Wendy queira, nas palavras de Ted Gunn, "fazer a diferença", ela ainda deseja fazê-lo no campo das ideias, através de dados coletados com parcimônia de maneira coesa, transformar Quantico na meca dos crimes ativos ao invés dos arquivados, para ela, não é ponto de honra.
Mas, nesse capítulo, após ficar novamente frustrada com a maneira como o estudo é deixado em segundo planos conforme novos casos surgem ou os interesses da Unidade de Ciência Comportamental parecem mudar de acordo com os interesses de Holden, a doutora Carr tem a oportunidade de estar do outro lado do balcão, e perceber que o pensamento acadêmico só leva uma pessoa até certo ponto quando aplicado na prática.
Com Bill e Holden em Atlanta, Gregg e Wendy tomam para si a tarefa de viajar até Huntsville e entrevistar Elmer Wayne Henley Jr. (Robert Aramayo, o Ned Stark jovem de Game of Thrones), o rapaz que ajudou Dean "homem do doce" Corll a sequestrar vinte e oito jovens e adolescentes que seriam violentados, torturados e assassinados entre 1970 e 1973 em Houston, no Texas.
A onda de crimes de Corll chegou ao fim apenas quando Elmer o matou a tiros após anos o auxiliando.
Quando Wendy e Gregg chegam à penitenciária de Huntsville a cientista deixa que o agente do FBI conduza a entrevista, mas as maneira mecânica como o desajeitado federal vomita as perguntas do questionário não impressionam Henley nem um pouco.
E cabe a Wendy usar, não método e parcimônia para salvar a entrevista, mas seus instintos.
Ela não demora a entender como funcionou a associação entre Henley e Corll, com o adolescente vendo o assassino serial como uma figura de autoridade de cuja a aprovação ele passou a precisar a ponto de tornar-se capaz de se dissociar totalmente dos medonhos crimes que ajudava o sujeito a cometer.
E Wendy é capaz de perceber como essa distorcida noção de parceria funcionava pois, como ela conta durante seu encontro com Kay no boliche, ela própria já havia estado em uma relação onde a aprovação de uma pessoa mais velha era a coisa pela qual ela mais almejava.
A exemplo de Holden, Wendy encontra um ponto de identificação com o criminoso de forma a fazê-lo se abrir, e se a doutora Carr que faz umas caras muito sérias de trás de sua escrivaninha em Quantico provavelmente iria repudiar esse comportamento, a Wendy que joga boliche de pés descalços com a nova namorada parece ter encontrado uma nova fonte de desafio e satisfação para si.
E essa conexão que prendeu Wendy a um relacionamento abusivo com uma mulher a quem ela admirava, e que prendeu Elmer a um estuprador assassino sádico continua a reverberar pelo episódio quando descobrimos um fato terrível sobre Brian, o filho de Bill no final do episódio.
Primeiro episódio da temporada que não é dirigido por David Fincher, esse quarto capítulo não fica devendo em termos de direção (Palmas para Andrew Dominik), segurando a peteca. Há alguns elementos discutíveis na linha narrativa de Bill, eu admito, mas isso é com os roteiristas. De resto, a natureza sombria da série, com algumas ótimas cenas e trilha sonora agourenta segue funcionando muito bem, obrigado.

"Ás vezes é reconfortante saber que já fez a pior coisa que poderia fazer na vida."

quarta-feira, 21 de agosto de 2019

Resenha Série: Mindhunter, Temporada 2, episódio 3


O terceiro episódio da temporada de Mindhunter divide o trio protagonista em linhas narrativas paralelas.
Os detalhes do homicídio na casa que Nancy Tench estava vendendo vêm à tona, e não é difícil entender por que ela fica tão devastada ao saber de (alguns) detalhes do caso.
Bill, o agente calejado, habituado à convivência com crimes e criminosos violentos, se vê na obrigação de se conectar ao pânico da esposa, dos vizinhos e até mesmo da polícia local, que não estão equipados para encarar os horrores que são seu pão com manteiga. É bacana ver Bill ganhar profundidade nessa temporada. Ainda que sua participação nesse episódio seja relativamente curta, nós o vemos assumir o papel de âncora de sanidade da comunidade onde vive. A maneira como ele aquiesce em ver a cena do crime, ou como durante a reunião na igreja, ele compreende a hesitação do detetive encarregado do caso em oferecer detalhes do assassinato é a clareza de um sujeito experiente o bastante para saber que esse povo todo iria despirocar se descobrisse exatamente o que ocorreu.
Com sua vizinhança suburbana apavorada com a possibilidade de um culto satânico agindo na região, Bill acaba arrumando uma desculpa para ficar com a esposa e o filho em casa, e isso coloca Holden na estrada por conta própria.
Sua ida à Georgia, é para entrevistar dois assassinos em série locais.
O primeiro é William Pierce Jr. (Michael Filipowich), condenado por nove homicídios, incluindo a filha de um senador. Pierce alega falar sete idiomas, e ainda assim, seu inglês é dolorosamente pobre (os relatórios a respeito do verdadeiro Pierce lhe conferiam um QI que mal ultrapassava 70, ou seja, menos que o Forrest Gump do cinema), e chega a ser engraçado vê-lo se comunicar em um discurso repleto de paronímias, ainda que algumas se percam na tradução. Ele se recusa a reconhecer os crimes que confessou a polícia, e, sem a presença de Jim Barney (Albert Jones), agente do FBI local, que convence o assassino a falar usando um divertido estratagema, é provável que a entrevista terminasse antes mesmo de começar.
O segundo, William Henry Hence (Corey Allen), é o único assassino serial negro na listada UCC, condenado por assassinar duas prostitutas negras a pancadas e atropelar repetidas vezes uma mulher branca (o que o tornou o primeiro assassino em série do estudo a romper a barreira racial).
Ambos os assassinos da Georgia são homens mentalmente lentos, que criaram histórias tão elaboradas quanto confusas e repletas de furos para tentar se safar das acusações. O angu de esquisitices das tentativas de Hence de encobrir seus crimes são particularmente difíceis de acreditar, chegando a inventar um grupo supremacista branco enviando cartas que poderiam terminar com o "eh di verdade essi bilête" dos memes, e, se a audiência encontrar problemas para a companhar os relatos dos dois homens, provavelmente é de propósito para que nós sejamos capazes de nos sentir como Holden.
O agente especial não pode estar mais entediado do que está durante as conversas com Pierce e Hence. Há uma piada de fundo ao longo do episódio inteiro, no qual a audiência é levada a crer que o agente especial está no limiar de uma crise de pânico. Bill não viaja junto com ele para vigiá-lo, seu voo da Virgínia para a Georgia tem turbulência e custa a aterrissar, Pierce se recusa a falar com ele, mas nada disso tira Holden do prumo.
Nem mesmo quando ele é convencido pela bela atendente do hotel, Tania (Sierra McClain) a acompanhá-la em um encontro que não termina como ele esperava, Holden parece perfeitamente à vontade. E isso nos leva ao momento em que Wendy o repreende por suas entrevistas claramente desinteressadas, o que revela que o agente especial Ford brilha ao conversar com homens complexos e articulados, capazes de narrar em detalhes seus fetiches e pensamentos e seu passado e a emoção de cometer crimes... Quando ele é confrontado com imbecis unidimensionais incapazes de sequer contar suas histórias, ele nem mesmo liga para o que está acontecendo.
Mas a grande virada nesse episódio é que Mindhunter finalmente toca nos assassinatos de Atlanta, a série de crimes que se estendeu durante anos na cidade e que vinha sendo alardeada como um dos pontos centrais da temporada durante seu desenvolvimento.
Holden é atraído ao seu primeiro contato com os crimes sem saber ao certo de que se trata, e aí a contribuição de Jim Barney, que havia tentado o emprego que acabou com Gregg, demonstra que ele será um personagem importante no decorrer da temporada, já que tem papel fundamental, tanto em guiar Holden em sua navegação pelas forças da lei da Georgia, quanto em ajudá-lo a enxergar as divisões subjetivas na cidade em pleno crescimento que teme que a presença de um assassino serial afugente investidores enquanto lida com o fato de que a eleição de um prefeito negro causou uma debandada de famílias brancas para os subúrbios.
Adicione a isso a desconfiança entre as famílias das vítimas e a polícia além das tensões raciais históricas do sul dos EUA e o caso inteiro é uma panela de pressão para a série abordar, mas que começa com o pé direito quando Holden enxerga um claro padrão conectando os crimes e é rapidamente desencorajado por um investigador local que aponta a quantidade de mortes de crianças por ano na cidade é de oito a dez, e que, para encontrar conexões, mais corpos terão que aparecer...
Novamente dirigido por David Fincher, o terceiro capítulo da temporada é bem menos tenso do que a aula de suspense do segundo episódio, mas faz um excelente trabalho em estabelecer o cenário para o que deve ser a grande investigação da temporada, além de dar o pontapé inicial ao que possivelmente será o novo relacionamento de Wendy.

"Guarde suas promessas, agente Ford."

terça-feira, 20 de agosto de 2019

Resenha Série: Mindhunter, Temporada 2, episódio 2


Após a estreia da segunda temporada de Mindhunter deixar claro pra onde a série quer andar nesse novo ano, é hora de colocar o pé na estrada.
À essa altura já ficou claro que o personagem que temos acompanhado incidentalmente nas cold openings dos episódios é Dennis Rader, o assassino BTK, e sua história começa a se ligar à dos nossos protagonistas quando passamos a primeira metade do episódio acompanhando Bill enquanto ele viaja a Wichita, Kansas, para oferecer algum insight ao detetive Drowatzky, que investiga os crimes do assassino em série que já começam a esfriar.
Ele visita a casa das primeiras vitimas do infame matador, a família Otero, um crime absolutamente fora do perfil usual de assassinos em série, que ocorreu com a casa ocupada por duas crianças, pai, mãe e cachorro...
Bill visita a residência dos Otero para obter um contexto tridimensional às fotos da cena, e se David Fincher não cria em Mindhunter um mundo estilizado como o de Sev7n, ele certamente manja o suficiente de seu ofício para transformar uma casa vazia ameaçadora em plena luz do dia apenas com dicas visuais sutis como a grama alta ao redor da casa, a comparação dos espaços vazios com as fotos que Bill carrega consigo, e a narrativa de como cada uma daquelas pessoas foi amarrada, torturada e assassinada.
E esse ainda não é o melhor momento de Fincher na condução da missão solo do agente especial Tench no Kansas. Isso fica para um pouco mais adiante, quando Bill entrevista Kevin, sobrevivente de um ataque do BTK que ceifou a vida de sua irmã.
Kevin foi baleado na cabeça três vezes, mal conseguiu sobreviver ao incidente, e além de ter que conviver com todas as lesões físicas do ataque do assassino serial, precisa suportar a culpa de não ter sido capaz de proteger a irmã e o pânico de que o assassino eventualmente volte atrás dele.
A despeito do pavor que o faz aceitar a conversa apenas em um local isolado, em um carro civil, sem que os detetives olhem para seu rosto, o jovem oferece um relato bastante rico dos acontecimentos que levaram à morte de sua irmã, com Bill mostrando-se bastante aclimatado aos parâmetros comportamentais que se tornaram um dos fundamentos da UCC.
O relato do rapaz é pesado, e Bill apenas a ouve com breves apartes ou perguntas. A narrativa de Kevin é a parte importante da cena, mas David Fincher também adiciona à tensão aqui. A câmera jamais foca o rosto de Kevin. A trilha sobe e desce durante o relato. Os olhos de Bill ficam marejados. O ruído do trem pode ser ouvido ao fundo...
Quando Bill volta pra casa, ele testa as portas de sua casa, e acorda Nancy para saber se ela havia deixado a porta dos fundos aberta.
Fincher entende demais do riscado.
A segunda metade do capítulo não diminui o ritmo em termos de poderio narrativo.
Após um breve interlúdio em Quantico, com Holden e Bill formulando um perfil (quase certeiro) para BTK e concluírem que ele está estudando e imitando outros assassinos em série famosos, eles resolvem mudar sua programação e entrevistar uma das fontes de inspiração do matador de Kansas, David Berkowitz, o Filho de Sam.
Antes disso, há tempo para uma pequena rusga de natureza profissional na UCC.
A doutora Carr não gosta da ideia de que metodologia científica que ela tenta estabelecer no programa seja colocada de lado em nome da aplicação prática das descobertas da equipe em casos em andamento. Ao priorizarem a entrevista com Berkowitz, Bill e Holden deixam ao menos outras duas entrevistas de lado, e Wendy não está nada satisfeita, o que pode render desdobramentos no futuro...
Antes disso, porém, há tempo para ela e Bill tomarem um drinque e confirmarem que estão ambos cientes do colapso nervoso de Ford, e combinarem que devem ficar de olho no agente para garantir a sobrevida do programa, e para Wendy flertar novamente com a bela bartender do bar dos fuzileiros (Lauren Glazier).
E então, mais um grande momento do capítulo quando temos a primeira entrevista da dupla titular com um assassino celebridade nessa temporada. David Berkowitz (Oliver Cooper, de Californication, caracterizado à perfeição), encarcerado em Attica.
A sequência da entrevista é ótima, mas antes mesmo de os agentes chegarem à prisão, Holden já havia começado a dissecar o comportamento do criminoso ao entender que mesmo seus assassinatos tidos como espontâneos, não eram livres de planejamento.
As entrevistas anteriores de Ford e Tench os deixaram relaxados e calejados para para dissecar o comportamento do interlocutor sem nenhum resquício de intimidação ou hesitação, e eles não demoram a enxergar os fatos através da mitologia que Berkowitz criou para si próprio.
Uma das grandes contribuições do autoproclamado Filho de Sam, porém, é a confirmação de que ele retornava à cena de seus crimes, um comportamento que, provavelmente, é partilhado por seus pares.
E, fechando o capítulo na mesma nota sombria com que havia iniciado, descobrimos que, como Ford havia feito na temporada passada, Bill Tench está começando a trazer seu trabalho pra casa...
Outra tremenda aula de direção de David Fincher, após amarrar as pontas soltas da temporada passada, o segundo episódio coloca a série nos trilhos para as linhas narrativas de deseja seguir com grande competência, a segunda temporada da série de fato começa aqui, e que belo começo.

“Ás vezes eu rolava na terra onde elas haviam morrido, só para sentir.”

segunda-feira, 19 de agosto de 2019

Resenha Série: Mindhunter, Temporada 2, episódio 1


Acho que foi lá pela metade de 2018 que, após receber a recomendação de meu irmão, resolvi tentar assistir Mindhunter enquanto as temporadas de minhas séries habituais já haviam terminado, ainda não haviam começado, ou estavam em seus malditos hiatos...
Lembro de ter visto o primeiro episódio e encarreirar em outros três, e ter parado, não porque quisesse, mas porque precisava acordar para o trabalho na manhã seguinte.
Foi com algum alívio que descobri que a primeira temporada da série fora lançada em 2017, o que garantia que eu não precisaria esperar mais de um ano até ver como a história dos membros da Unidade de Ciência Comportamental do FBI iria continuar após o final do décimo episódio, com Gregg Smith (Joe Tuttle) tendo entregue a verdadeira transcrição da conversa com Speck ao Escritório de Responsabilidade Profissional, e Holden Ford (Jonathan Groff) tendo um colapso nervoso nos braços de Ed Kemper (Cameron Britton) enquanto possivelmente havia um assassino em série em potencial vivendo nos arredores do condomínio de Wendy Carr (Anna Torv).
Muito do que ficou no ar como linha narrativa em potencial no apagar das luzes do décimo episódio da primeira temporada é solenemente varrido para debaixo do tapete na largada do segundo ano.
Há um novo chefe supervisionando a UCC.
O diretor-assistente Shepard (Cotter Smith) está se aposentando, e seu posto será assumido por Ted Gunn (Michael Cerveris). Gunn parece um entusiasta das metodologias conduzidas pela UCC, e de saída explica a Bill Tench (Holt McCallany) que está mais do que disposto a conseguir tudo o que a unidade precisar para que o FBI deixe de ser um depósito de casos frios e Quantico se torne a primeira alternativa quando o assunto for criminologia. E, quando Ted Gunn diz "tudo", ele inclui aí dar um jeito de o caso envolvendo a entrevista de Speck ser arquivado.
Antes disso, porém, o novo chefe quer falar com o garoto de ouro da unidade, mas Holden está internado em uma ala psiquiátrica na Califórnia sob pesada sedação após seu colapso na penitenciária.
Nada que Bill não possa resolver após voar meio país para resgatar seu parceiro que recebe uma receita para ansiolíticos e permissão para retornar aos seus afazeres.
Nem mesmo há mais nenhuma menção ao sumiço do gato alimentado por Wendy (ele deve ter morrido de causas naturais ou sido adotado por uma vizinha), tudo para garantir que a segunda temporada da série comece sem maiores nós atados com os eventos do episódio anterior e as novas tramas possam andar.
Holden está em uma posição de fragilidade nova.
Suas crises de pânico o tornam vulnerável de maneiras que sua vaidade intelectual ou o ciúme de sua ex-namorada não eram capazes de fazer, enquanto deixam claro que ele não tem a quem recorrer quando as coisas dão errado, exceto a seus colegas no FBI que não são exatamente seus amigos, mas basicamente pessoas incumbidas de vigiá-lo.
Wendy parece disposta a colocar suas reservas pessoais de lado porque realmente acredita no trabalho que a Unidade está fazendo com os perfis. Além do mais, após deixar Boston e a sombra da ex-namorada, ela não tem mais praticamente nenhuma vida social (apesar de seu flerte no bar de fuzileiros onde vai com Holden indicar que isso pode mudar no futuro próximo).
Bill, por sua vez, parece tanto acreditar no trabalho da UCC quanto não saber o que fazer em sua vida doméstica.
O sujeito que trabalha sessenta e cinco horas em uma semana não o faz meramente por amor ao ofício, mas porque é claramente doloroso pra ele viver em uma casa com um filho com quem é incapaz de se conectar tomando partido em ocasiões sociais onde sua esposa (Stacey Roca) passa o tempo todo o censurando por mencionar seu trabalho para as visitas.
Dirigido com a competência habitual por David Fincher em pessoa, o primeiro episódio de Mindhunter esbanja estilo desde sua primeira cena, a tensa "cold opening" que mostra a esposa do personagem ainda sem nome que temos acompanhado desde a temporada passada (Sonny Valicenti) sendo flagrado pela esposa em uma sessão de masturbação extremamente elaborada numa sequência que só não é mais desconfortável do que o discurso de Ford na festa de despedida de Shepard.
O início da nova temporada parece ansioso por iniciar uma nova linha narrativa, e não perde tempo em resolver praticamente todos os conflitos que ficaram pendurados no ano anterior para fazê-lo, tudo com o apuro técnico, as grandes atuações e o roteiro de gente grande que caracterizaram a primeira temporada.
Ótimo começo.

"Creio que os grandes feitos são realizados entre o método e a loucura, doutora Carr."

sexta-feira, 16 de agosto de 2019

Resenha Cinema: Era Uma Vez... Em Hollywood


Parece justo dizer que Quentin Tarantino é, à essa altura do campeonato, um dos cineastas fundamentais do cinemão contemporâneo (pelo menos), não? Por mais que ainda haja aqueles que torçam o nariz para o diretor que jamais frequentou um curso de cinema, mas frequentou cinemas como poucos de seus pares na indústria parecem ter feito, Tarantino conseguiu em sua carreira de pouco menos de trinta anos, tornar-se uma legenda.
Ontem, quando fui divertidamente admoestado pelo amor da minha vida por matar aula para ir ao cinema, repliquei "Mas é um filme do Tarantino!", na certeza inabalável de que essa sentença, por si só, carregaria suficiente justificativa para não dar o ar da graça na faculdade.
Afinal, o diretor nascido em Knoxville, Tennessee que criou uma assinatura autoral ímpar que mistura longos diálogos, linhas narrativas paralelas, referências quase enciclopédicas ao cinema em geral, à Hollywood em particular, explosões de violência e, por vezes, muito mais do que isso conseguiu se tornar um evento para cinéfilos inveterados.
Especialmente após ele ter afirmado que encerraria sua carreira no cinema com seu décimo filme (ele conta os dois volumes de Kill Bill como um único filme, e não entram na conta segmentos dirigidos por ele em longas estilo antologia como Grindhouse e Grande Hotel), colocando seus fãs, entre os quais me incluo, em uma contagem regressiva que vem, se não me falha a memória, desde Bastardos Inglórios, e que com esse Era Uma Vez... Em Hollywood, chega a seu penúltimo lançamento.
A maior parte de Era Uma Vez... Em Hollywood ocorre durante o fim do inverno de 1969, quando conhecemos Rick Dalton (Leonardo DiCaprio) e Cliff Booth (Brad Pitt).
Rick é um astro decadente de TV. Durante a década de 1950 ele teve seu próprio programa de faroeste, Bounty Law, que acabou colocando a perder quando tentou construir uma carreira de cinema. Agora, ele vive basicamente de participações em seriados onde interpreta vilões para alavancar heróis mais jovens, conforme lhe explica o agente Marvin Schwarz (Al Pacino), que acredita no potencial de Rick, mas quer vê-lo se reinventar longe da Hollywood que não o vê mais como um mocinho, mas em Roma, onde ele poderá voltar a ser a estrela que já foi protagonizando faroestes espaguete.
Rick não está muito seguro da proposta, Rick, na verdade, não está muito seguro de nada exceto que ele está envelhecendo, Hollywood não se tornará mais gentil com ele nos anos vindouros e ele precisa tomar uma decisão.
Cliff, por sua vez é um sujeito muito mais relaxado que Rick.
Também trabalhando na indústria do cinema, mas como dublê de Rick, Cliff mora em um trailer atrás de um drive-in com sua cachorra, a pit bull Brandy, conforme os trabalhos na indústria rareiam, Cliff tem se dedicado a ser chofer de Rick, parecer maneiro enquanto flerta com mulheres, geralmente à distância, e fazer pequenos reparos na casa do amigo enquanto ele trabalha.
A casa de Rick, por sinal, fica ao lado da residência onde Sharon Tate (Margot Robbie, terrivelmente linda. Radiante de tão linda), esposa de Roman Polansky (Rafal Zawierucha) vive, e o casal mais quente daquele inverno Hollywoodiano são apenas duas das personalidades reais que povoam essa versão de Hollywood idealizada por Tarantino onde também vemos gente como Steve McQueen (Damien Lewis), James Stacy (Timothy Olyphant), Jay Sebring (Emile Hirsch) e Bruce Lee (Mike Moh), além, claro, de Charles Manson (Damon Herriman)...
As histórias de Rick, Cliff e Sharon correm em paralelo até inevitavelmente se cruzarem na noite de nove de agosto de 1969, e isso é tudo o que eu vou dizer a respeito.
Era Uma Vez... Em Hollywood é um festival de sub-texto desde seu título, que referencia tanto os faroestes espaguete de Sergio Leone que servem de pano de fundo à trama central do filme, como Era Uma Vez no Oeste e Era Uma Vez a Revolução, quanto a maneira como Tarantino revisa a História (com H maiúsculo ) daquele verão que, de muitas formas pôs fim ao sonho hippie, para idealizar a estória que deseja contar.
Porque praticamente tudo no Nono Longa de Quentin Tarantino é uma estória.
Desde o brilhante design de produção, criado à perfeição para emular, não a verdadeira Hollywood de 1969, mas Hollywood que o cinema mostrava na época, passando pela genial trilha sonora, e até mesmo a maneira como os personagens reais são retratados no filme, Era Uma Vez... Em Hollywood é uma elegia à uma época em especial. Uma época que Tarantino provavelmente gostaria de ter vivido, pois ao longo das duas horas e quarenta e cinco minutos de projeção, em meio à todas as características dos longas do diretor, o companheirismo entre homens descolados, a enciclopédia de notas de rodapé de cultura pop, os pés femininos, a eventual explosão de ultra-violência e a esperteza dos diálogos, é difícil não divisar um elemento de melancolia, como se o longa tentasse alcançar alguma coisa que ainda pode ser vista, mas que já não está mais lá.
Talvez seja uma impressão causada pela presença constante de Sharon Tate, cujo destino trágico a maior parte das pessoas com algum interesse por cinema sabe ao menos por cima, e que é usada pelo cineasta menos como uma personagem e mais como um sentimento.
Margot Robbie interpreta a atriz como uma encarnação de otimismo e ingenuidade. A cena onde ela entra de fininho no cinema para assistir Arma Secreta contra Matt Helm, longa estrelado por ela, e abre um luminoso sorriso cada vez que a audiência reage à sua atuação é a epítome dessa abordagem, e todo o longa parece ser Tarantino tentando salvar a Hollywood de antigamente à sua maneira numa demonstração de que o sujeito que já foi o enfant terrible do cinemão norte-americano, não apenas amadureceu, mas já chegou àquela idade de olhar pra trás com nostalgia.
Dalton é a prova disso.
O personagem de DiCaprio é, de diversas maneiras, o avatar de Tarantino na trama, reexaminando sua carreira e pensando no que está por vir, mas ainda sendo capaz de ficar animado por estar "a uma festa na piscina de estrelar o próximo filme do diretor da porra d'O Bebê de Rosemary" ainda que chore copiosamente ao ler um livro sobre um vaqueiro que perdeu o jeito, e o ator está simplesmente brilhante no papel.
O vencedor do Oscar por O Regresso (nem de longe seu melhor trabalho, nem de muito, muito longe seu melhor filme) imbui Rick Dalton com essa mistura de otimismo e melancolia temperada com seu carisma de astro Hollywoodiano das antigas que eventualmente emociona, mas na maior parte do tempo é usada para arrancar risadas da audiência. Igualmente genial está Brad Pitt, que volta a trabalhar com Tarantino após Bastardos Inglórios e ganha do cineasta uma chance de mostrar o quão talentoso ele pode ser quando recebe o material certo e entrega uma de suas melhores atuações recentes.
Eu consigo entender muito da controvérsia que vem surgindo como reação a Era Uma Vez... Em Hollywood. Se partes da celeuma são os desejos de igualdade que contam a quantidade de falas de Margot Robbie e outras personagens femininas no filme, ou a filha de Bruce Lee, incomodada com o retrato de seu pai no longa (eu entendo o lado dela, mas achei a brincadeira divertida...), ou mesmo do uso dos assassinatos de Tate, Sebrig,Folger, Frykowski e Parent como linha narrativa secundária (revista sob a mais tarantinesca das lentes), o nono longa de Quentin Tarantino é uma obra demasiado ambiciosa e repleta de camadas para ser julgada por um ou outro deslize subjetivo.
É o produto de um cineasta ambicioso trabalhando com colaboradores em perfeita sintonia com a sua visão, do elenco (que ainda conta com Kurt Russel, Margaret Qualley, Dakota Fanning, Zöe Bell, Julia Butters, Luke Perry, Bruce Dern, Austin Buttler, Lena Dunham, Maya Hawke, Clifton Collins Jr., Scoot McNairy) à equipe técnica com destaques para o design de produção de Barbara Ling e a fotografia de Robert Richardson.
Amando ou odiando Era Uma Vez... Em Hollywood, não se pode negar que cada uma das escolhas do filme foi parcimoniosa, e o produto final, é exatamente o que o seu diretor queria que fosse. É um dos longas mais maduros de Tarantino, e, sem ter visto uma segunda vez (ou terceira, ou quarta, ou quinta, ou décima, como fiz com outros de seus longas), acho que é um dos meus favoritos.
Amantes de cinema têm a obrigação moral de assistir Era Uma Vez... Em Hollywood no cinema. Se irão gostar, ou não, veremos depois.
Uma das grandes qualidades do cinema de Tarantino, além de não abrir concessões, sempre foi a de gerar divertidos debates.

"-Ei, você é um bom amigo, Cliff.
-Eu me esforço..."

quinta-feira, 15 de agosto de 2019

Resenha Série: The Boys, Temporada 1, Episódio 8: You Found Me


You Found Me, o season finale de The Boys começa forte.
É a última hora (hora e seis minutos, na verdade) da série nesse ano e começa mostrando a que veio com uma incursão do Capitão Pátria a uma instalação ocupada por membros do Estado Islâmico que não têm absolutamente nenhuma chance contra o super-herói mais poderoso do mundo, mas que tinham consigo, o Composto-V...
Assim, conforme Madelyn Stillwell explica ao secretário de defesa dos EUA (Jim Beaver), os terroristas islâmicos do mundo, agora têm seus próprios super-heróis, como o Naqib que vimos no desfecho do episódio passado, e a única empresa que tem os meios de detê-los, é a Vought.
Sim. Os planos de Butcher e Raynor de expôr a Vought e seus produtos químicos fazedores de super-bebês vão permanecer em segredo tendo em vista a segurança nacional, o que significa que os rapazes estão Fodidos, com F maiúsculo.
Enquanto isso, Annie, após descobrir a verdade a respeito da origem de seus super-poderes, volta pra casa para confrontar sua mãe, o que leva a uma boa cena entre Erin Moriarty e Ann Cusack falando sobre o passado da jovem, e as verdadeiras razões que levaram seu pai a abandoná-las.
E enquanto Butcher e Hughie vão atrás de Mallory em busca de uma maneira de apunhalar o coração d'Os Sete uma última vez, a Vought faz sua própria investida contra os rapazes, capturando Frenchie, Leitinho e Kimiko.
E, eu sei, parece um bocado, mas isso ainda não é nem a primeira metade do capítulo.
Temos tempo para ver Trem-Bala sendo assombrado pela sua perna quebrada (cortesia de Kimiko, no capítulo passado), para mais um episódio das desventuras de Profundo em Sandusky, Ohio, para Hughie chegar à conclusão de que Butcher só liga para a sua vingança e tentar pedir ajuda a Annie para resgatar os rapazes capturados e para descobrirmos quem é, de fato, a grande mente por trás dos super-terroristas surgindo pelo mundo.
E aqui entra, novamente, o problema de ritmo do qual eu reclamei algumas vezes ao longo dessa primeira temporada. A segunda meia hora de You Found Me parece acontecer após um salto temporal que não existe na prática, e é provavelmente a noite do mesmo dia em que todo o resto aconteceu.
Seja como for, enquanto Madelyn Stillwell recebe do misterioso senhor Edgar (o Gus Fring em pessoa, Giancarlo Esposito) a notícia de que seu sucesso na condução d'Os Sete irá colocá-la no andar mais alto do prédio da Vought, Hughie se prepara para realizar uma tentativa desesperada de resgate de seus amigos, e Butcher põe em prática seu plano de vingança contra o Capitão Pátria.
A meia hora final de You Found Me, no caso, a meia hora final da temporada, poderia ter usado um pouco mais de ação, mas a verdade é que, novamente, a série resolve apostar em exposição.
Nós temos mais cenas de diálogos, e mais cenas de diálogos, e mais planos desvelados, e mais momentos entre os personagens, e se pararmos para pensar, algumas dessas informações são importantes, mas poderiam ter sido oferecidas à audiência em outras ocasiões nos capítulos anteriores, quando não estávamos nos momentos decisivos da temporada.
Há boas cenas, como a conversa entre Maeve e Luz das Estrelas, totalmente fora de lugar, assim como a revelação sobre a origem de Naqib, todas parecendo deslocadas.
Mas, ainda que muito longe de ser perfeito, You Found Me é um final de temporada sólido para The Boys, que, ainda bem, já foi renovada para um segundo ano pela Amazon, e eu digo isso menos por ter me apaixonado pela série (não é o caso), e mais por ela terminar com um cliffhanger que, apesar de não ser dos mais imprevisíveis, abre a possibilidade de termos um segundo ano muito diferente do primeiro, já que as motivações de muitos dos personagens, como Billy e Annie foram pro espaço, e personagens importantes do primeiro ano estão total e absolutamente fora do que vier pela frente.
A despeito de ter sido um tremendo sucesso para a Amazon, a primeira temporada de The Boys jamais encontrou a própria voz, a série trepidou entre gêneros e por vezes foi algo frustrante em sua execução, mas há espaço para melhora, personagens e atores interessantes, um grande vilão na interpretação que Antony Starr faz do Capitão Pátria, e personagens gostáveis como Annie e Hughie
Após oito horas de The Boys, fica a sensação de que a série poderia ser muito mais. Há potencial, veremos como ele será aproveitado no ano que vem (se não houver algum maldito hiato).

"-Por que eu te ajudaria?
-Porque a Vought está fazendo algo maligno. Porque é o seu trabalho. Porque você é uma super-heroína."

quarta-feira, 14 de agosto de 2019

Resenha Série: The Boys, Temporada 1, Episódio 7: The Self-Preservation Society


O penúltimo episódio dessa temporada de The Boys começa nos mostrando um pouco mais do passado de Billy Butcher: Como o sujeito que mais odeia Os Sete na face da Terra chegou lá.
Sua esposa, Becca, trabalhava no marketing da Vought. Podemos vê-la ao lado de seu marido em uma festa de natal da firma oito anos atrás socializando com executivos e super-heróis, incluindo o Capitão-Pátria em pessoa.
Sabendo o que soubemos no capítulo passado, é difícil não ficar um pouco enojado com o encontro dos dois na festa, ou dar um pouco de razão a Billy no que tange a seu ódio pelo maior super-herói do mundo.
Desse flashback, que reforça a posição de Butcher somos jogados ao presente quando Hughie e Annie finalmente ficam juntos. Eu mantenho que, esses dois personagens são provavelmente a maior razão para eu ter terminado de assistir a série.
Infelizmente há um grande elefante em todas as salas onde Hughie e Annie estão:
O fato de que ele a está usando como instrumento de vingança contra Os Sete...
E esse elefante fica evidente quando o Capitão Pátria, após ter recebido os rapazes de bandeja no episódio passado, cortesia de Mesmer (justificando a minha vontade de enchê-lo de bofetões), descobrir quem é quem no grupo que está tentando desmantelar Os Sete, incluindo Hughie e Billy, de quem o super-herói finalmente se lembra.
Isso coloca os rapazes e Luz-Estrela em uma tremenda saia justa, especialmente Hughie, que, com sua identidade subitamente tornada domínio d'Os Sete, precisa encarar o Trem-Bala que não parece ter nenhum problema em colocar um alvo no peito do pai do rapaz (a última aparição de Simon Pegg no papel nessa temporada) e da família de Leitinho para se vingar pelo que foi obrigado a fazer com Lâmina, enquanto a mais nova membro d'Os Sete é ameaçada sem nenhum pudor por Capitão Pátria, que está crente que ela é uma espiã trabalhando para o grupo de Billy Butcher.
E isso é apenas o começo.
Após descobrir a identidade de seus algozes, o Capitão Pátria resolve revisitar seu passado e suas origens, levando a audiência a descobrir que os graves problemas mentais do super-herói não são desconhecidos para todo mundo. O doutor Jonah Vongelbaum (John Doman) um dos responsáveis por trazer o Capitão Pátria ao mundo, certamente sabe o quão ferrado da cabeça o líder d'Os Sete realmente é, e as coisas medonhas que ele é capaz de fazer.
Igualmente capaz de fazer coisas medonhas é Billy Butcher, conforme nós descobrimos quando ele sai no encalço de Mesmer.
E ainda há tempo para acompanharmos mais alguns capítulos das desventuras de Profundo em Sandusky, Ohio, seja sendo sexualmente atacado por uma fã com preferências bastante extravagantes, seja falhando novamente em suas tentativas de salvar vida marinha; para que Luz-Estrela e Maeve se abram uma com a outra; para conhecermos Grace Mallory (Laila Robins), a responsável por unir os rapazes pela primeira vez, e cujos netos foram carbonizados por Facho de Luz após Frenchie falhar em seguí-lo; e, finalmente, para descobrirmos que o FBI não tem uma carta na manga tão poderosa quanto imaginava contra a Vought...
O penúltimo episódio da temporada é meio uma história de origem para Billy e meio o pior dia da vida de Luz-Estrela.
Apesar de ser um episódio sólido no que tange ao andamento da trama e atuações, dando espaço para alguns membros do elenco realmente trabalharem (incluindo surpresas como Jessie T. Usher, com uma boa cena ao confrontar Hughie quanto à morte da namorada) e preparar o terreno para uma grande confrontação no capítulo final, The Self-Preservation Society é carregado das mais frustrantes características da série em seus episódios iniciais, do script pouco inspirado às inconsistências de tom que os roteiristas parecem não conseguir evitar ao traduzir os delírios de violência anti-heroica de Ennis dos quadrinhos à TV (algo que, por sinal, fez com que eu não visse mais do que dois capítulos de Preacher, também um quadrinho de Ennis adaptado por Seth Rogen e Evan Goldberg...), ainda assim, The Boys me manteve ligado até aqui, então, veremos se a série termina em uma de suas notas mais altas, ou mais baixas...

"-Mas ele é um super-herói...
-Você ficaria chocado se soubesse o que eles são capazes de fazer..."

terça-feira, 13 de agosto de 2019

Resenha Série: The Boys, Temporada 1, Episódio 6: The Innocents


Após termos um vislumbre do tamanho da conspiração engendrada pela Vought para transformar bebês em super-humanos os enchendo de Composto-V desde a maternidade os rapazes começam a pensar no que fazer com essa informação que mostra, não apenas que a maior empresa dos EUA está colocando crianças em risco, mas também que a sua história a respeito de os super-heróis serem escolhidos por Deus é uma fraude.
Antes de dar o próximo passo na guerra contra os super, porém, Billy precisa ter uma conversa com Hughie.
O líder da equipe anti-super-heróis não está satisfeito com a proximidade entre o novato e Luz-Estrela, e percebe que, o que deveria ser um meio para um fim, está se tornando mais do que isso.
A conversa entre os dois leva a um bem-vindo momento para sabermos mais sobre Butcher, que até aqui era pouco mais do que uma pilha de raiva e tiradas sarcásticas. O background do sujeito justifica plenamente seu ódio pel'Os Sete em geral, por Capitão Pátria em particular.
A esposa de Billy, Rebecca, desapareceu sem deixar rastros há oito anos, após ser violentada pelo super-herói mais poderoso do mundo.
Para Billy, todos os super são o inimigo, e enquanto Hughie parece estar começando, aos poucos, a superar a perda de Robin por conta de sua proximidade com Annie/Luz-Estrela, Butcher não é capaz de aceitar a perda de Becca. Mais do que isso, ele não acredita que deva, pois seria o mesmo que aceitar um sistema corrupto e falido que permite que criaturas super-poderosas a serviço de uma mega-corporação andem pelas ruas colocando vidas em perigo de maneiras impossíveis.
Isso nos leva a uma cena cheia de humor negro em um grupo de apoio para pessoas transformadas em "dano colateral" pela ação de super-heróis (indo de uma mulher que ficou paralisada após ser salva de forma meio desajeitada por um super a um sujeito que teve uma amputação tenebrosa durante uma aventura sexual com uma heroína), e então ao banco da praça que vimos Billy vigiando de seu apartamento no flashback em The Female of the Species. O último lugar onde Becca Butcher foi vista com vida, e lá, Karl Urban finalmente tem a oportunidade de demonstrar um pouco mais do que palavrões e caras de maluco, e entregar um pouco de drama ao pedir que Hughie jamais esqueça quem é o inimigo.
Mas isso não é tudo o que está acontecendo.
A revelação de Luz-Estrela na Eu Creio Expo deu o que falar, e, novamente, Madelyn Stillwell não conseguiu ler a situação que se desfraldava diante dela já que o apoio à jovem super-heroína alcançou as alturas após seu discurso no evento religioso. Sua revelação sobre ter sido assediada na chegada a'Os Sete inclusive respingou feio em Profundo, e, somado à sua desastrada tentativa de resgate do golfinho, acabou causando seu remanejo para Ohio em meio ás gravações do reality show "Supers na América", que deve servir como propaganda para ajudar a aumentar a aceitação dos super-heróis nas forças armadas.
É nesse segmento que temos um vislumbre das verdadeiras origens do Capitão Pátria, criado isolado em uma sala azulejada sem nenhum contato humano, o que explica, em grande parte, a sua gravíssima patologia mental.
E, enquanto Hughie e Billy tentam acertar os ponteiros, Frenchie convence Leitinho a ajudá-lo a contatar Mesmer.
Na adolescência um super-herói capaz de ler a mente das pessoas ao fazer contato físico, Mesmer cresceu e ganhou a cara de Haley Joel-Osment (que, assim como Rodrigo Maia e o Sam Tarly de Game of Thrones tem aquelas caras que não dá pra evitar de querer dar um bofetão), e se tornou um fracassado que ganha a vida assinando boxes em DVD da sua antiga série de TV em convenções frequentadas por figuras aleatórias como o velocista de segunda linha Onda de Choque, Tara Reid e Billy Zane...
A ideia de Frenchie funciona, e, através de Mesmer, eles descobrem, não apenas que a moça se chama Kumiko, mas que ela tem uma história de vida trágica, tendo sido sequestrada ainda na infância por um grupo terrorista que treinou ela e o irmão para se tornarem parte das tropas e que sua transformação em super não foi mero acaso, mas parte de um esforço deliberado para criar super-terroristas.
De posse dessa informação Billy busca a ajuda de Raynor no FBI, mas descobre que os rapazes estão por sua conta, uma posição bastante desconfortável já que eles podem ter confiado na pessoa errada...
The Innocents foi um bom episódio de The Boys (meu favorito ainda é Good for the Soul, mas este ficou em um segundo lugar bem próximo). Finalmente a equipe de produção parou de acenar e sugerir motivações e backgrounds para realmente nos mostrar porque essas pessoas são quem são.
Uma das maiores provas de força desse capítulo é a performance de Urban e de Antony Starr, que está fazendo de Capitão Pátria um dos maiores psicopatas da TV recente.
Além deles, há um comentário esperto a respeito da manipulação da imagem, e escalar Haley Joel Osment como o herói-mirim que hoje está na pior é uma sacada de meta-linguagem que, por mais óbvia que possa parecer (Birdman que o diga), merece crédito.
The Innocents teve um equilíbrio entre personagens, humor e trama que teria sido muito bem vindo desde o início da série, mas que, se for mantido nos próximos dois episódios, pode me deixar quase ansioso pela segunda temporada.

"-De onde eu estava vendo parecia que você estava com a língua enfiada na garganta do inimigo."

segunda-feira, 12 de agosto de 2019

Resenha Série: The Boys, Temporada 1, Episódio 5: Good for the Soul


Good for the Soul, quinto episódio da primeira temporada de The Boys é, de longe, o melhor episódio da série até aqui, e não apenas porque eu finalmente fui capaz de me identificar com Billy Butcher enquanto ele trocava ideia com ministros religiosos pela Eu Creio Expo, mas porque a série parece finalmente ter encontrado algo que queria dizer ao invés de simplesmente tentar ser cabulosa.
Mas antes de chegarmos ao ponto alto do capítulo, passamos por Havana, Cuba.
É lá onde Lâmina está escondida por Trem-Bala após seu negócio com o Composto-V ter sido descoberto pelos rapazes de Billy Butcher, e onde a heroína de segunda classe finalmente admite ter contado a respeito dos segredos do velocista azul a alguns sujeitos.
Trem-Bala dá a impressão de realmente ficar magoado com Lâmina, e o fim do relacionamento dos dois parece afetá-lo de verdade, e, sem ter lido os quadrinhos, eu não sei se isso é uma falha de escrita de Garth Ennis ou dos roteiristas da adaptação, mas eu continuo sem saber se o comportamento de Trem-Bala (e de Profundo) são tentativas de humanizar esses personagens, ou de mostrá-los como mentalmente instáveis.
Seja como for, nós logo descobrimos que o evento em Havana não foi uma iniciativa de Trem-Bala, mas do Capitão-Pátria.
O líder d'Os Sete segue sendo um dos personagens mais interessantes da série, e o trabalho de Antony Starr acerta na mosca na hora de tornar o personagem tão asqueroso quanto ameaçador.
A forma como ele parabeniza Trem-Bala pelo trabalho bem feito ao mesmo tempo em que o adverte que sempre estará de olho é um tremendo cartão de visita pra um vilão dos mais pérfidos.
Enquanto os super-heróis (que são os vilões) se mobilizam, os criminosos (que que são os mocinhos) fazem o mesmo.
Frenchie segue tentando se conectar com a garota feroz resgatada pelo grupo no capítulo anterior enquanto Hughie, Leitinho e Billy vão à Eu Creio Expo, uma grotesca feira religiosa (e alguma não é?) frequentada por super-heróis vistos como enviados de Deus liderados por Ezekiel (Shaun Benson), um homem-elástico/pastor evangélico com delírios messiânicos e penteado do Supla, ou seja, todas as piores coisas que alguém poderia ser.
Com esse circo de horrores como pano de fundo nós temos alguns dos melhores diálogos entre os membros da equipe até aqui. Ainda que seja algo conveniente que cada um dos personagens esteja em um espectro da fé (Leitinho é crente, Hughie um tipo de deísta e Billy um ateu convicto), isso leva a algumas boas tiradas e ajuda a audiência a entender como funciona a fé no universo da série, e não. Não é muito diferente do nosso universo, com algumas figuras execráveis se aproveitando do medo, da culpa e da ignorância dos inocentes para vender um determinado tipo de mentalidade.
Mas esse não é o motivo narrativo para a presença dos rapazes na feira.
Eles estão lá para que Hughie use a sua conexão com Luz-Estrela para conseguir acesso a Ezekiel, cuja caridade Abraço Samaritano tem sido usada para contrabandear o Composto-V.
Assim que Hughie conseguir fazer isso, ele deve chantagear Ezekiel com um vídeo de sexo gay (aquele que nós vimos no primeiro episódio, na boate onde os supers dão vazão à toda a sua promiscuidade), e descobrir com que finalidade o composto tem sido transportado, e pra onde.
Enquanto o novato do grupo tenta cumprir sua missão, com o surgimento de um obstáculo inesperado na forma do Capitão Patriota, que participa da feira fazendo um grande discurso de ódio a respeito de como os estrangeiros querem destruir a América e ele foi enviado por Deus para proteger a humanidade, com direito a um daqueles versos bíblicos que provam que Deus é um tremendo escroto, Luz-Estrela é a dona do grande momento do episódio.
Exposta à toda a falácia que os ministros presentes no local a obrigam a vomitar incessantemente contra diversidade religiosa, sexo pré-marital e preconceito contra homossexuais ela encontra seu limite ao subir ao palco e não suportar o texto que lhe foi imposto pela Vought.
E as coisas nem param por aí nesse quinto capítulo.
Ainda temos os respingos da fúria de Annie/Luz-Estrela em Profundo, algum desenvolvimento de personagem para Billy, o resultado da investigação de Hughie levando a um tiroteio na maternidade, e uma luta entre a Fêmea e Black Noir que, apesar de não ser particularmente bem coreografada, revela a extensão dos poderes da jovem, além de uma inquietante demonstração da profundidade da relação entre Capitão Patriota e Stillwell com direito à explicação de porque o super-herói está sempre olhando de cara feia para o bebê de sua chefe.
O episódio mais longo da série até o momento, Good for the Soul é o que tem o melhor ritmo (à exceção da incursão de Billy à casa da cunhada), e sim, o texto não é lá uma grande maravilha e por vezes soa absolutamente superficial, ainda assim o programa finalmente tenta ser mais do que um retrato de como Garth Ennis odeia super-heróis e adora ver uns caras de preto os surrando ao se dirigir a algum comentário social e político. O discurso de medo, obscurantismo e bravata vazia do Capitão Patriota na feira só não parece ter sido feito por um certo presidente sul-americano porque é demasiado bem articulado e não termina com "América acima de tudo, Deus acima de todos".
Vamos torcer para que The Boys continue ladeira acima nessa segunda metade da temporada.

"-Você nasceu pra isso, garoto. Você é um tipo de Rain Man em sacanear os outros.
-Isso não é um elogio..."

sábado, 10 de agosto de 2019

Mas Não é Só Por Isso


Ela é linda.
Mas não é só por isso que eu a amo.
Eu a amo, não apenas por sua beleza, mas por todas elas.
A maneira como a beleza dela é dessas bonitezas de muitos matizes. Como luzes coloridas refletidas na superfície da água.
A forma como ela é linda quando se produz e se arruma e aplica rímel em quantidades generosas ao redor dos olhos, e estende as pestanas e colore os apetitosos lábios com cores quentes e úmidas como o verão de Porto Alegre em 2013...
A forma como ela é linda despertando de manhã, com remela nos olhos e um rastro de saliva seca no canto do lábio e o rosto amassado.
E a forma como ela é linda saindo do banho, com cabelos molhados e rosto lavado rescindindo o cheiro do xampu com o qual lavou os cabelos...
Porque ela é cheirosa.
Mas não é só por isso que eu a amo.
Eu a amo, não apenas por seu cheiro, mas por todos eles.
A maneira como ela exala e emana tantos cheiros diferentes em ocasiões diferentes e cada um deles me faz fechar os olhos.
A forma como ela sai do banho com cheiro de salão de beleza após aplicar um caríssimo xampu feito á base de uma macadâmia selvagem que só é colhida uma vez por ano, no equinócio de outono em um vale encravado no Himalaia entre a Annapurna e a Namga Parbat.
A forma como podemos encontrá-la após se exercitar e ela emana o cheiro doce de uma confeitaria, misturando-se baunilha, pudim e algodão-doce.
E a forma como, quando excitada, ela desprende o cheiro salgado do próprio tesão, e me faz não querer mais tirar minha boca de seu corpo...
Porque ela é gostosa.
Mas não é só por isso que eu a amo.
Eu a amo, não apenas pelo nosso sexo, mas por todos eles.
A maneira como o sexo com ela é sempre pleno, belo e cúmplice, ainda que quase nunca seja igual.
A forma como fazemos sexo urgente e resfolegante, ainda com sapatos nos pés, as calças penduradas nos tornozelos, vestidos enrolados na cintura, e calcinhas afastadas para o lado enquanto ela deita-se de costas dizendo "assim" ao som do meu cinto abrindo-se com grande alarido.
A forma como sorrimos um pro outro quando nos olhamos nos olhos durante o sexo feito sem pressa, com ambos nus, trocando beijos e carícias.
E a forma como ela faz piadas absurdas e gargalha nas horas mais impróprias de intimidade, em movimentos que traumatizariam um homem normal.
Porque ela ri muito.
Mas não é só por isso que eu a amo.
Eu a amo não apenas pelo som de sua risada, mas por cada sorriso dela.
A maneira como ela tem formas diferentes de sorrir e rir e são todas igualmente belas, maviosas e cristalinas.
A forma como ela gargalha divertida após ver muita graça em algo que eu nem sequer falei tentando fazer pilhéria, e como isso embarga a voz dela, acelerando-lhe o discurso por conta da falta de ar causada pelo acesso de riso e consegue a proeza de deixá-la ainda mais linda e iluminada.
A forma como ela tenta conter o riso conforme ele se infiltra em seu discurso e pro breves instantes isso empresta uma nota grave à sua voz.
E a forma como, ás vezes, ela sorri com tanta força que retesa os tendões do pescoço, me aquecendo a alma, e me lembrando do quanto eu a amo.
Porque eu amo.