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sexta-feira, 3 de março de 2017

Resenha Cinema: Logan


Hugh Jackman jamais deveria ter sido o Wolverine dos cinemas...
Nos quadrinhos, o Wolverine é um nanico canadense de 1,60m, com cara de furioso e roupas de caubói e em seus momentos de super-herói, veste um colante amarelo e azul que conta com uma máscara que tem o formato do seu cabelo.
Quem, em sã consciência, escalaria um galã australiano com quase um e noventa de simpatia para o papel?
Claro... A verdade é que Dougray Scott havia sido escolhido para ser o Wolverine no X-Men que Bryan Singer dirigiu no ano 2000, mas como o britânico se arrebentou gravando cenas de luta com Tom Cruise em missão: Impossível 2, a Fox precisou correr atrás de um substituto, e Jackman, após um ótimo teste de cena com Anna Paquin, ficou com o papel.
Por estranho que pareça, funcionou.
X-Men era um bom filme de origem e Jackman foi um bom Wolverine.
Ele também foi um bom Wolverine em X-2, um filme bem superior ao antecessor, e no problemático X-Men 3.
Jackman era um Wolverine tão bacana que resolveram que mesmo sem o resto do grupo, ele precisava estar no cinema.
E aí começaram os problemas.
Seu primeiro filme solo, X-Men Origens: Wolverine tinha todos os defeitos de X-Men 3 e mais alguns. Inchado, bobo, equivocado, o longa se salvava apenas pelo carisma do protagonista e pela acertada interpretação de Liev Schreiber como Dentes de Sabre.
Depois de uma ponta em X-Men: Primeira Classe, Jackman voltaria a tentar um filme solo do carcaju em Wolverine: Imortal, que prometia adaptar a história de Chris Claremont e Frank Miller Eu: Wolverine, e mostrar as ligações de Logan com o Japão, sua veia samurai e o conflito entre sua natureza bestial e a vontade de ser um bom homem.
Ficou na promessa.
Wolverine: Imortal foi uma porcaria menor do que X-Men Origens, mas ainda assim, um filme muito aquém do potencial do personagem e seu intérprete.
Eu já me perguntava se a despedida entre ator e personagem não deveria ter sido o ótimo X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido, quando anunciaram que Jackman encarnaria o personagem "Uma última vez".
O diretor do longa seria o mesmo James Mangold de Wolverine: Imortal, o que estava longe de ser uma grande notícia. Falar de se inspirar em Velho Logan para a história não queria dizer nada tendo em vista a forma como Eu: Wolverine e Arma X haviam sido desmontadas até o mais básico dos conceitos e transformadas em coisas completamente diferentes nos dois filmes anteriores.
Professor Xavier debilitado, futuro sem mutantes, e X-23...
O terceiro longa do Wolverine se parecia cada vez mais com uma repetição dos erros da série X no cinema ao longo dos últimos dezessete anos.
Mas aí surgiu o primeiro trailer, ao som de Johnny Cash, e a expectativa começou a mudar.
As prévias acenavam com o que parecia um bom filme, mas com a irregularidade do universo X da Fox, nunca se sabe.
Eu precisava ver com meus próprios olhos.
Ontem, estava no cinema, com ingressos comprados há mais de uma semana, pra conferir Logan.
No filme, corre o ano de 2029.
Os nascimentos de mutantes simplesmente cessaram conforme o gene X foi sendo paulatinamente removido da humanidade, a maioria dos mutantes que existiam morreu e os poucos que sobrevivem se mantém na clandestinidade, escondidos do mundo.
Um dos mutantes que se mantém nas sombras é James Howlett, também conhecido como Logan, ou o X-Man Wolverine.
Logan (Hugh Jackman) está vivendo na fronteira entre Estados Unidos e México, trabalhando como chofer de limusine. Ele tenta se manter nas sombras enquanto junta dinheiro e, com a ajuda do mutante Caliban (Stephen Merchant) toma conta do Professor Xavier (Patrick Stewart), que aos noventa anos de idade luta contra a degeneração de sua mente.
O fundador dos X-Men passa seus dias trancado em um galpão, dopado com medicamentos que impedem que ele sofra episódios convulsivos particularmente ameaçadores quando afetam o telepata mais poderoso do mundo, cujo cérebro é considerado pelo governo dos EUA uma arma de destruição em massa.
Logan tenta juntar dinheiro para comprar um barco e viver no mar com Charles, onde ele não será uma ameaça para as pessoas ao seu redor.
Infelizmente, para Logan, a violência parece persegui-lo.
Quando uma mulher chamada Gabriela (Elizabeth Rodriguez) surge pedindo ajuda, o primeiro instinto de Logan é ignorá-la, mas logo fica claro que ele não conseguirá.
A mulher pede que o mutante leve uma menina chamada Laura (Dafne Keen) até Dakota do Norte, na fronteira com o Canadá.
Um serviço pelo qual a mulher está disposta a pagar 50 mil dólares.
Precisando do dinheiro, Logan aceita o trabalho, mas não tarda a descobrir que Laura e Gabriela estão sendo perseguidas por forças soturnas.
Um grupo de mercenários caçadores de mutantes chamados Os Carniceiros, liderados por Donald Pierce (Boyd Holbrook) está no encalço da menina, o que joga Logan, Xavier e Laura em uma perigosa viagem através dos EUA rumo a um lugar chamado Éden, que pode nem sequer existir. Uma jornada à qual o trio talvez não seja capaz de sobreviver.
Eu estou me segurando pra não dizer que Logan é o melhor filme de super-herói já feito, o que soaria leviano, ou mero reflexo de empolgação. Deixem-me então dizer apenas que, independente de gênero ou origem, Logan, é um excelente filme.
Ponto.
O roteiro de Michael Green, Scott Frank e do próprio James Mangold deixa a pirotecnia de lado para se focar nos personagens, que são caracterizados por suas personalidades e não por suas habilidades.
Wolverine e Professor Xavier são pessoas públicas nesse mundo, seus nomes e histórias têm peso, há até gibis contando suas aventuras, mas seus poderes não são mais o que já foram.
O grande vilão de Logan não é Donald Pierce, o doutor Zander Rice de Richard E. Grant ou X-24, mas o tempo.
Tanto Logan quanto Charles sabem que estão nas últimas. Xavier não pode mais confiar em sua mente, tornando-se um perigo para aqueles que ama, e Wolverine perdeu demais. Seus amigos, seus amores, mesmo suas habilidades.
Seu fator de cura não responde mais como antes, suas garras não ejetam com a mesma presteza, seu faro já não é mais tão apurado.
Ele se entregou ao álcool e à rotina e guarda uma bala de adamantium pra eventualidade de cansar dessa merda toda.
Hugh Jackman, em uma soberba interpretação, não vive Wolverine como um super-herói, mas como um homem complicado e calejado no crepúsculo de uma vida de perdas.
Outro que está sensacional é Patrick Stewart, seu Professor Xavier de noventa anos lutando contra a demência senil para tentar manter uma fagulha da luz que norteou a raça mutante por anos é de partir o coração.
A novata Dafne Keen também está ótima como Laura, a X-23, tanto em seu modo bicho-do-mato de interagir com o mundo quanto nas cenas de ação.
Por sinal, por mais que a crítica especializada possa perder horas analisando Logan do ponto de vista filosófico e técnico enquanto desconstrução do gênero de super-heróis, o filme não deixa nada a desejar no tocante à ação.
Finalmente nós vemos a verdadeira brutalidade do Wolverine em sua glória sangrenta e furibunda. Mangold não poupa no sangue, e filma suas cenas de luta enfatizando a coreografia e não na edição ou no CGI para entregar ação visceral em cada confronto. O grande barato, aqui, é que a ação existe para servir aos personagens, pontuar seu caminho, construir suas relações e refletir suas personalidades de uma maneira tão profunda quanto O Cavaleiro das Trevas de Christopher Nolan fez em 2008.
Se o segundo filme da Trilogia das Trevas de Batman é O Poderoso Chefão dos filmes de super-herói, Logan é Os Imperdoáveis.
Wolverine, por sinal, é um personagem que guarda uma clara semelhança com os pistoleiros do western, e em Logan, que presta claras homenagens ao gênero em geral, e a Os Brutos Também Amam em particular, ele abraça o tema recorrente do ex-pistoleiro que tenta levar uma vida ordinária mas é arrancado da aposentadoria para uma última cavalgada.
Além dos westerns clássicos, Logan traz à mente filmes como Filhos da Esperança e Mad Max, mas sem jamais esquecer quem é, e de onde veio, independente de se sustentar sozinho.
A exemplo do Superman de 1978, do Cavaleiro das Trevas e do próprio X-Men, Logan ousa, dá um passo além, e aumenta o grau de exigência para filmes baseados em quadrinhos ao mostrar a profundidade que o gênero pode alcançar com a abordagem correta.
Não me entenda errado, eu ainda estou ansioso para ver Guardiões da Galáxia: Volume 2, Liga da Justiça e Homem-Aranha: Volta ao Lar e X-Men: Supernova, mas a desconstrução do gênero oferecida pela última cavalgada do Wolverine é tão profunda que é provável que precisemos de mais do que piadinhas, grandes efeitos visuais e tomadas épicas de super-heróis lutando lado a lado para reconstruir.
Sendo o primeiro filme baseado em quadrinhos capaz de me emocionar, não pela empolgação de um guri que lia gibi na infância, mas sim na posição de adulto que ama cinema, é difícil pra mim não colocar Logan em um pedestal, então deixe-me apenas te sugerir que assista ao filme.
No cinema.
Na pior das hipóteses, a despedida de Hugh Jackman do personagem que o lançou ao estrelado merece essa deferência.

"-Não seja o que fizeram de ti."

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