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quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Feliz, Sim, Mas Não Exagera


Estavam os dois sentados na praça. Haviam acabado de almoçar cada um uma empada de frango e dividiam uma Pepsi um litro e meio no gargalo feito dois adolescentes. Ela segurando o celular, ria das imagens que haviam trocado nas últimas semanas.
-Adorei essa do cachorro que comeu o batom... - Ela disse.
-Fofíssimo, né? "Foi o gato". Muito bom... - Ele confirmou.
-E o Papa? - Ela perguntou, -De dilofossauro, cuspindo na cara do Newman?
-O Chicão - Ele riu, tratando Francisco, o sumo-pontífice da igreja católica com uma intimidade ímpar e fazendo-a rir.
-"Chicão"? - Ela perguntou.
-É. - Ele confirmou. -O Chicão é o cara. Hoje em dia, se eu fosse ter uma religião, seria católico só por causa do Chicão. Um papa nunca foi tão pop. Nem nos mais ardentes sonhos do Humberto Gessinger.
-Olha só... - Ela disse, erguendo as sobrancelhas quase invisíveis e empostando a voz com sua nota de "nossa, estou impressionada". - O senhor ateu-amo-a-razão-e-a-ciência, tudo sem espaço dividido por traços, considerando a hipótese de se converter...
Ele deu de ombros franzindo o cenho:
-Eu sempre disse que estou aberto ao conceito de religião, só jamais encontrei uma que me cativasse, ou me desse razões para acreditar. O Chicão não vai conseguir, sozinho, me converter, por isso coloquei no condicional: "Se eu fosse ter uma religião", porque eu não vou, seria católico, apenas isso.
-E porque o Chicão? O que ele faz que o Bento XVI não fazia? - Ela quis saber.
-Pra começar ele não tem cara de malvado. O Bento parecia o imperador Palpatine.
Ela riu de novo. Ele seguiu:
-Mas eu gosto do Chicão. Ele é progressista, aberto, vive no mesmo mundo que nós. Não trata a vida da gente como estágio probatório. Ele trata a vida como vida. Fala com líderes mundiais com demandas palpáveis. É um líder religioso sem aquela venda burra do "O mundo é o que cabe dentro desse templo, e o resto tá tudo errado". Pôxa, é um papa que abriu as portas do Céu, com cê maiúsculo, pros ateus, pros homossexuais, pros crentes de outras religiões... Como é que eu vou dizer que esse papa não é o cara? Que ele não "ruleia"?
Ela o estava encarando, dessa vez, com uma admiração muito mais genuína. Mas semi-cerrou os olhos azuis brevemente e começou a falar pausadamente:
-Eu não tô te entendendo, sabe... Se tu é ateu, tu não acredita em Céu, então o que é que te importa o papa abrir as portas do Céu pros ateus?
-Eu não sou o dono da verdade. Vai que eu tô errado e existe tudo isso?
Os dois gargalharam, mas ele seguiu:
-Não, sério... Eu também não sou homossexual, nem professo outras religiões, nem acredito em Céu, vida após a morte e essa pataquada toda... Mas sabe... O Chicão personifica o que eu acho que uma religião deveria ser. É acolhedor, humilde, conciliador... É um humanista. Ele não tá lá apontando o dedo pra todo mundo dizendo que o quê todos estão fazendo tá errado e vão todos pro inferno, muah. ah, ah, ah! Não... Ele tá lá acolhendo o máximo de pessoas... Salvando almas, aumentando o rebanho. E por mais que eu não acredite em Céu, e despreze o catolicismo tanto quanto qualquer outra religião, não posso deixar de admirar o cara por ser um verdadeiro humanista.
Ela se encostou no ombro dele dizendo:
-Nossa... Nunca pensei que fosse ouvir nada nem remotamente parecido com isso vindo de ti...
Passou-lhe os dedos finos pelo cabelo emaranhado em um coque no alto da cabeça dele.
-Quê tu tá fazendo, guria? - Ele perguntou, se remexendo.
-Procurando cabelos brancos - Ela disse. -Tu deve estar amolecendo com a idade...
Ele riu agarrando-a pelos pulsos e a sentando de volta ao seu lado.
-Pára de bobagem. Não tô amolecendo com a idade. Só... Sei lá. Gosto quando gente me surpreende. Gosto quando não agem de maneira escrota. E estou... Não sei... Acho que feliz...
Ela franziu o cenho:
-Por que? O que aconteceu?
-Ah, nada. Nada comigo... Tô feliz por alguém que eu amo muito. E que me pareceu estar realmente feliz nesses últimos dias.
Ela sorriu pra ele e pousou-lhe a mão delicada sobre a dele no banco de pedra. Ele segurou a mão dela e beijou:
-Não, alemoa. Sério. Tô feliz, mesmo. Não é melancolia digerida. É felicidade genuína.
Ela beijou a mão dele, também. E se apoiou nele, os dois sentados no banco olhando as grossas árvores da praça. Ela sussurrou-lhe ao pé do ouvido.
-Acho que o senhor perdeu o crachá de misantropo...
Ele passou o braço por trás do pescoço dela e disse, antes de estalar-lhe um beijo na têmpora:
-Me dá o frasco do juízo final que eu te mostro se minha inscrição não continua valendo.
Os dois riram.

Rapidinhas do Capita


O MPAA, órgão que classifica a indicação etária dos filmes norte-americanos já assistiu Batman vs. Superman: A Origem da Justiça e classificou o longa como PG-13, ou, para maiores de 13 anos.
O longa foi classificado para essa faixa-etária por conta de "intensas sequências de violência, ação e alguma sensualidade".
Considerando que essa é a classificação tradicional de todos os filmes de super-heróis, do divertido Homem-Formiga ao soturno Batman: O Cavaleiro das Trevas, confesso que fiquei pensando no que seria essa "alguma sensualidade".
Meu amigo Mac, do blog Novo Clarim provavelmente diria que esperava um flashback de um momento tórrido entre o homem-morcego e o menino prodígio, ou que à certa altura da pancadaria Batman e Superman começassem a dar uns amassos, mas eu não sou tão Marvete, nem tão anti-DC.
Suponho que a tal classificação tenha a ver com alguma silhueta da Mulher-Ma(g)ravilha Gal Gadot sem roupa saindo da água ou algo que o valha.
De qualquer forma, continuo a espera do longa que sai no ano que vem, dirigido por Zack Snyder, o mesmo de O Homem de Aço e estrelado por Ben Affleck, Henry Cavill, Gal Gadot e Jesse Eisenberg.

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"E a crise?" perguntou o Amadeu.
"Qual delas?" quis saber o Leandro.
E esse é o retrato do país onde vivemos.
Temos uma crise em cada setor, política, economia, saúde, segurança, e, claro, a mais grave de todas, educação.
Pois o único modo de resolver as demais, seria investindo na última, e essa encontra dois obstáculos:
Um, os políticos não têm interesse em investir em educação, afinal, povo burro é mais fácil de manobrar.
Dois, o povo é burro e não se ressente da falta de educação, pelo contrário, a ergue como bandeira, cheio de um orgulho desprovido de lastro.
Não precisamos nos preocupar, não importa quantas crises existam e quantas outras ainda venham a existir, enquanto o povo tiver orgulho em ostentar a bandeira da ignorância, as coisas vão continuar irremediavelmente iguais.

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Abro a página de imagens engraçadas da rede social obscura da qual faço parte e me deparo com o pau do Stênio Garcia.
O octogenário ator, abraçado à esposa (e sem porte de arma, que a mulher é um canhão), ostenta, diante do espelho, o tico em posição de três horas pra selfie que "caiu na net".
"OK", penso. "Chega de internet por hoje.".

sábado, 26 de setembro de 2015

Resenha Cinema: Evereste


Ponto culminante da Terra, o monte Everest, localizado na cordilheira do Himalaia, entre a China e o Nepal, se ergue a impressionantes 8848 metros.
Ainda que seja a mais alta montanha da Terra, com um pico que encontra-se na altitude de cruzeiro do voo comercial de um Boeing 747, em um ambiente onde a temperatura é de quase vinte graus abaixo de zero, o vento alcança velocidades de quase treze metros por segundo, e a pressão do ar é de apenas um terço da encontrada ao nível do mar, o Evereste não é a montanha mais mortal do planeta.
Enquanto o famigerado monte K2, com seus 8611 metros já ceifou a vida de 49 escaladores em 164 ascensões, e o Nanga Parbat matou mais de um terço dos alpinistas que tentaram subir até o seu pico a 8125 metros, o Annapurna, de "meros" 8091 metros é a montanha mais letal do planeta, com um assustador índice que chegou a 50,5% de fatalidades.
Na lista das montanhas mais mortais da Terra, o majestoso Everest ocupa uma colocação modesta, com um índice de fatalidades de menos de 2,05%.
Não parece muito até percebermos a quantidade de ascensões:
Mais de 10 mil expedições já tentaram alcançar o cume do mundo. Dessas, quase três mil foram bem sucedidas, e o número de mortes é de 207.
A quantidade absurda de ascensões desde 1985, quando começou a comercialização da montanha através de uma expedição de David Brashears que incluía o milionário Richard Bass, um escalador amador que tinha pouco mais de quatro anos de experiência em montanhismo explica o "baixo" índice de fatalidades do Everest.
No início dos anos noventa, inúmeras companhias ofereciam expedições guiadas ao ponto culminante do planeta, uma dessas empresas, a Adventure Consultants, era chefiada pelo experiente Rob Hall, que ao longo de seus anos de experiência levou mais de 40 pessoas ao cume do Everest.
O filme Evereste, do diretor escandinavo Baltasar Kormákur, é justamente sobre Rob Hall, e a trágica expedição que ele liderou ao topo do Everest em 10 de maio de 1996.
Na fita acompanhamos Hall (Jason Clarke) desde a despedida de sua esposa Jan (Keira Knightley), até sua chegada ao Nepal onde encontraria o grupo de escaladores que incluía a montanhista japonesa Yasuko Namba (Naoko Mori), o médico texano Beck Weathers (Josh Brolin), o carpinteiro/carteiro/escalador Doug Hansen (John Hawkes), e o jornalista Jon Krakauer (Michael Kelly), passando pela aclimatação do grupo ao ambiente inóspito, até o ataque ao cume em si, quando o grupo é dividido pela condição climática incrivelmente hostil e açoitado por uma violenta tempestade que deixa membros da equipe isolados além de qualquer chance de resgate.
Kormákur, dirigindo o roteiro de William Nicholson e Stephen Beaufoy segue a cartilha do filme catástrofe de grupo, apresentando os personagens por etapas, dando à audiência razões para se importar com eles ou achá-los antipáticos e preparando o terreno para a hora em que tudo inevitavelmente vai para o inferno.
Não fosse uma história real, baseada nos livros No Ar Rarefeito, de Krakauer, e A Escalada, de Anatoly Boukreev, poder-se-ia considerar Evereste excessivamente formuláico, abusando de bom-mocismo dos heróis, e jogando sujeira nos "vilões". Mas essa impressão se desvanece à medida em que entendemos que o verdadeiro vilão do longa é a montanha, e ela não dá espaço a atos de heroísmo.
A forma como o diretor a filma, com as rochas negras no contraste com o branco da neve e do gelo, a torna quase malvada. O mesmo vale para as nuvens escuras de tempestade vomitando relâmpagos.
O diretor usa com sabedoria o recurso visual, fazendo a audiência sentir frio e falta de ar junto com os personagens na tela, amparado por uma espetacular coleção de imagens grandiosas em um 3-D usado com parcimônia e elegância que deve funcionar muito bem em uma tela I-MAX gigante (e não nessa nanica de Porto Alegre).
Infelizmente, isso não chega a ser inovador, e nem tampouco diferencia Evereste de outros longas de tragédia.
Os personagens interpretados por um belo elenco, que ainda inclui Jake Gyllenhaal, Robin Wright, Emily Watson, a linda Elizabeth Debicki, Martin Henderson e Sam Worthington não é mais senão acessório para a desgraça, verdadeira estrela do longa.
O filme cuja tagline é "Jamais solte" deveria ser "jamais escale o Everest".
Ainda assim, como entretenimento, o longa se sustenta, e garante um par de horas bastante tensas na sala escura.
Vale o ingresso em 3-D.

"-A última palavra, sempre pertence à montanha."

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Três Dias de Pavor


Ela entrou na loja. Coroa loira, seus cinquenta anos, mas muito bem vividos, obrigada.
Cabelão platinado escorrido até o meio das costas. Jaqueta de couro vermelha, blusa preta de gola rolê, bolsa daquela marca do D e do G um de cara pro outro, calças jeans mais justas que as vaias da torcida do Inter após o jogo com o Figueirense e botas de couro marrom de salto fino de quinze centímetros.
Ainda assim, ele era mais alto. Rá.
Parou perto dela após abrir a porta. "Posso ajudar?", "pode, procuro calça-bermuda.". Ele assentiu. A levou até o setor das calças-bermuda. Mostrou alguns modelos. Ela, rescindindo um perfume delicioso, olhou os modelos e escolheu dois. "Posso provar?", "claro que pode".
A conduziu até os provadores. Não pôde deixar de achar a situação surreal. Não fazia nenhum sentido aquela coroa obviamente endinheirada, uma tremenda burguesa, comprando calças-bermuda. "Eu sei que tu deve estar achando um sarro uma perua que nem eu comprando calça-bermuda." Ela disse. "Capaz" ele respondeu, temendo os possíveis poderes mentais latentes da mulher. Mostrou-lhe o provador. Ela entrou. "Qualquer coisa, só chamar".
Ele foi cuidar da vida.
Não deu dois minutos, "Moço! Moço?".
Foi até o provador.
A mulher, fechara a porta do provador e trancara por dentro. A umidade da semana de chuva incessante cobrava seu preço. A madeira, inchada, lacrara-se de tal forma nos batentes, que a porta não abria, deixando-a presa lá dentro.
"Minutinho", disse ele. "Afaste-se da porta". Já vira aquilo acontecer na porta do banheiro. Volta e meia a madeira estufada com a umidade impedia que a porta fosse aberta por dentro, e mesmo por fora, apenas com a força das mãos e o movimento da maçaneta. Saltaria a mulher com um golpe de ombro bem aplicado na porta, simples.
Agarrou a maçaneta, tomou um breve impulso, e bateu com o ombro na porta junto ao batente. O estalo de uma rolha sendo cuspida de uma garrafa de champanhe se fez ouvir quando a porta abriu.
Ele olhou para dentro sorrindo, preparando-se para explicar como aquilo era normal, mas deparou-se com algo anormal.
A mulher estava parada de pé no meio do provador usando apenas a sua blusa e calcinhas.
Calcinhas de renda vermelho-escuras.
Ele provavelmente ficou da cor das calcinhas da mulher, desculpou-se e fechou a porta com cuidado.
Após mais alguns minutos, a mulher o chamou novamente.
Mais cuidadoso, ele parou junto à porta.
"Pois não?", "Pode entrar, moço. Estou vestida".
Entrou.
A mulher estava parada usando uma das calças que ele entregara para ela experimentar. Uma calça bonita, modelo especificamente feminino, mais adequada às curvas do corpo de uma mulher.
"O zíper prendeu. É defeito?" ela perguntou. "Não" ele respondeu. "O cursor só deve ter pego na aba que protege o zíper.", ele explicou. Era uma ocorrência comum em calças daquele tipo e sacos de dormir. "É só puxar a aba de tecido de dentro do cursor." ele sugeriu. "Puxa pra mim." Ela disse, imperativa.
Ele ficou olhando pra ela brevemente, sem saber se tinha entendido. Deu um passo pra frente, e curvou-se levemente para alcançar o zíper no meio da coxa direita da mulher.
"Mais baixo." Ela disse. "Quê?" ele respondeu. "Mais baixo. Assim."
Ela o empurrou pela cabeça e pelo ombro para baixo, fazendo-o ajoelhar, o segurou pelo ombro com uma das mãos enquanto abria as calças com a outra. Baixou a peça até o meio do quadril, e então repetiu o gesto com a roupa de baixo, deixando o monte de Vênus diante dele, estarrecido, de joelhos no chão, incapaz de reagir. "Eu vi que tu queria" disse, maliciosa. Quase perversa.
Ela então, o agarrou pelo cabelo, e puxou seu rosto de encontro à própria penugem, e mexeu o quadril, fazendo com que seu púbis dançasse do queixo até o nariz dele, e então de volta, quando parou com suas partes íntimas junto aos lábios dele e rebolou um par de vezes. "Me lambe", disse como quem não dá margem à resposta senão obediência.
E ele obedeceu, tomado de excitação e desconcertamento.
A lambeu, a princípio de maneira incerta, hesitante, mas então com mais e mais ímpeto, até puxar-lhe a coxa musculosa sobre o próprio ombro de modo a poder acessá-la com mais facilidade, entreaberta e molhada, e agarrar-lhe com decisão, cravando-lhe os dedos nas nádegas firmes. Após apenas alguns minutos, dez, talvez doze, ele a sentiu enrijecer-se inteira, a perna sobre seu ombro espremer-lhe como um alicate enquanto suas unhas se cravaram em seu couro cabeludo desmanchando-lhe o penteado, e então suspirar profundamente.
Ele parou, olhando pra ela, que encarava o teto com um meio sorriso nos lábios vermelhos. Levantou-se em silêncio, e saiu do provador.
Após alguns momentos, ela também saiu. "Vou levar essa.", disse com naturalidade, mostrando-lhe a calça-bermuda verde-botânico.
Ele fez a nota fiscal, empacotou a peça, e entregou-lhe agradecendo pela preferência.
"Tu tem masculina, também?", perguntou. "Sim.", ele respondeu, ressabiado. "Agora eu não tô com tempo pra ver, mas sábado eu passo aqui com meu marido pra ele experimentar.".
Agradeceu e saiu.
Ele se despediu e voltou pra dentro da loja. Três dias de pavor se passaram, de pesadelos e falta de apetite, e ele está em pânico pensando o que diabos será que vai acontecer no sábado. Talvez ele falte o trabalho.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

A Demo de FIFA 16


A demonstração de FIFA caiu na PSN (e foi pênalti pro Corinthians) já tem um bom tempo, mas a pesada demonstração do game da EA demorou a baixar (fato catalizado pela minha impaciência pra jogar videogame nesses últimos dias), e apenas na quinta-feira passada eu comecei a jogar a "provinha" da versão 2016 da franquia.
Em uma Demo onde se pode fazer partidas exibição com Real Madrid, Barcelona, Internazionale de Milão, Manchester City, Chelsea, Borussia Dortmund, Borussia Monchengladbach, Seattle Sounders, Paris Saint-Germain e River Plate, mais as seleções femininas de Estados Unidos e Alemanha.
Quando se começa a jogar (a demo já abre com um Real Madrid x Barça, antes mesmo de te deixar escolher qualquer coisa), a impressão inicial é de que estamos jogando o FIFA 15, mas essa impressão não vai muito longe. Logo de cara se nota que a velocidade do jogo diminuiu drasticamente.
Não existe mais aquela barbada de fazer Bale e Ronaldo correrem desesperadamente pela ponta, entrarem pela lateral da área e escolherem se cruzam pro Benzema ou surpreendem o goleiro com uma finalização sem ângulo.
FIFA 16 parece um jogo bem mais cadenciado, onde trabalhar a bola e cozinhar o adversário é tão importante quanto ser capaz de fazer uma arrancada em velocidade.
Parte dessa necessidade de pensar o jogo se deve aos novos movimentos das defesas. Os zagueiros, laterais e volantes foram imbuídos com um novo arsenal de possibilidades e uma nova inteligência artificial que os torna muito mais espertos na hora do confronto com os virtuoses.
O novo sistema de recuperação chega a ser irritante nas primeiras partidas, com zagueiros que se recusam a ficar pra trás após sofrerem um drible, coberturas atentas, e cortes de passes feitos com displicência e até linhas de impedimento ensaiadas pra deixar aquele atacante mais afoito na banheira.
Os goleiros, que já haviam recebido um tapa maneiro na versão anterior, também se tornaram mais elásticos e vivos, inclusive jogando mais adiantados pra interceptarem aquela bola esticada em profundidade.
Os atacantes e meias, por sua vez, foram presentados com a possibilidade de fazer dribles sem tocar na bola, gerando aquelas fintas estilo "vai que eu fico". Além disso, a movimentação dos avantes sem a bola melhorou. Os jogadores não ficam tão escondidos atrás da zaga, se movimentando em espaços vazios para receber a pelota em condições de marcar.
Os gráficos seguem muito bons, com torcidas, uniformes, estádios, gramados e feições de jogadores "conversando entre si", a grande novidade da edição, o futebol feminino, que permite aos nerds tetudos de plantão experimentar a ideia de ter Heather Mitts, Hope Solo e Alex Morgan em suas mãos, não chega a empolgar. Ainda que as meninas tenham sido renderizadas direitinho, ficando inclusive com movimentação diferenciada dos marmanjos digitais, a verdade é que pouca gente liga pro futebol feminino (lamento, mas é fato. Assim como ninguém liga pra concursos de beleza masculinos), e um mini-torneio entre oito seleções na versão final do game não vai fazer lá grande diferença pra mudar isso, ainda que as delicadas modelos digitais sejam bem agradáveis aos olhos e estrelem uma versão consideravelmente diferente do game masculino, com nítidas alterações em fundamentos como força, velocidade, resistência e controle de bola.
Como de praxe, a série não parece ter investido em grandes mudanças, até porque, em time que está ganhando, não se mexe, e não há porque reinventar a roda.
Enquanto o game não sai em sua versão integral, a impressão que dá é que FIFA seguirá firme na tentativa de apenas aparar arestas, mantendo uma fórmula que já se provou consagrada.

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Resenha Cinema: Homem Irracional


Eu gosto de Woody Allen. Gosto mesmo. Sempre gostei. Me lembro de, criança, estar feliz da vida assistindo filmes como A Era do Rádio, e ser repreendido por minha mãe, que detestava os filmes de Allen, que me dizia "Vai ver um desenho, tira desse filme chato".
Mas eu gostava. Achava as comédias dele engraçadas, seus maneirismos divertidos, e até a clássica dublagem que Allen recebia no Brasil me entretinha.
Crescendo aprendi a admirar o cinismo e o escárnio embutido em seus filmes agridoces, e a curtir também os dramas de Woody Allen, e até defendê-lo quando o acusam em rodas de amigos, de ser chato, intelectualóide e maçante.
Cito filmes como o ótimo Tudo Pode Dar Certo, Meia-Noite em Paris, o divertido Magia ao Luar, o clássico absoluto Noivo Neurótico, Noiva Nervosa (ainda odeio esse título estúpido), Hannah e Suas Irmãs, Crimes e Pecados, A Era do Rádio, o pungente Blue Jasmine, o ótimo Match Point, e o melhor filme que Pedro Almodóvar não fez, Vicky Cristina Barcelona, e mais uma porção de seus bons e ótimos filmes... Sendo bem honesto, até seus filmes não tão bons me divertem.
Eu achei Scoop engraçado, me julguem.
Ontem mesmo, fui ao cinema, onde havia outras cinco testemunhas, pra ver o último filme do diretor, Homem Irracional, e, olha... Ainda que não vá me fazer mudar minha opinião sobre a filmografia de Allen, certamente me fez sair do cinema com a impressão de que acabara de ver o pior filme da carreira do diretor.
Homem Irracional apresenta o professor de filosofia Abe Lucas (Joaquin Phoenix), um homem amargurado, deprimido, um alcoólatra quase suicida que está chegando à uma universidade em Rhode Island para assumir uma cadeira de professor.
Abe é precedido pela sua reputação de ser... Bom, um sujeito amargurado e deprimido, e também de ter (e ser) um gênio difícil, se envolver com alunas, ter entrado em depressão quando um amigo foi decapitado no Iraque e ter tentado o suicídio quando sua esposa o trocou por outro homem, enfim, todos os clichês do gênio atormentado que se pode imaginar.
Assim que chega à universidade, Abe passa a atrair olhares de outros professores que o observam à distância falando sobre sua genialidade e alma atormentada. Uma professora que não o observa de tão longe é Rita (Parker Posey), que vê o homem soturno que parece movido a uísque como uma válvula de escape para seu casamento infeliz.
Outra pessoa que logo tem sua atenção atraída por Abe é Jill (Emma Stone). Jovem estudante, filha de um casal de professores do departamento de música, namorada de Roy (Jamie Blackley), um rapaz boa-pinta e apaixonado, Jill por alguma razão, também é fascinada pelo professor taciturno e brilhante que viajou por todas as zonas de conflito do mundo tentando fazer algum bem, e se não tarda para que ele e Rita engatem um caso, também não tarda para que ele e Jill se tornem bons amigos, ainda que, à medida em que se tornam mais próximos, os sentimentos da jovem se tornem mais profundos.
Abe, porém, resiste às investidas de Jill, fazendo todo o possível para se manter íntegro, ao menos até o dia em que, em um restaurante, ele e Jill ouvem a história partilhada pelos fregueses da mesa ao lado, a respeito de uma mãe amorosa que está na iminência de perder a guarda dos filhos para o marido escroto unicamente porque o advogado do sujeito é amigo do corrupto juiz da vara de família encarregado do caso.
Assim que ouve a história, Abe se torna obcecado com a ideia de matar o juiz, e assim, realizar um ato prático para o bem do mundo.
Conforme rumina o que seria um crime perfeito, Abe recupera a vontade de viver, a criatividade, e até a potência sexual, levando-o a crer de maneira irredutível, que a morte do tal juiz, é um bem que ele fará ao mundo, não importam as consequências.
O que poderia ser uma premissa Dostoyévskiana à exemplo de Crimes e Pecados e Match Point, esbarra em um dos piores roteiros de Allen em todos os tempos, com personagens rasos e caricatos que são impossíveis de se relacionar, e personagens com potencial para roubar a cena escanteados sem nenhuma cerimônia.
Joaquin Phoenix sua a camisa (apertada na barrigona) para tornar seu personagem alguma coisa mais do que uma caricatura, mas é impossível. A única coisa em que eu conseguia pensar, enquanto ele vomitava citações de Kierkegaard, Kant e Simone de Beauvoir, no insuportável personagem de Michael Sheen, em Meia-Noite em Paris, sendo elevado à condição de protagonista.
Mesmo com o talento de Phoenix e seu carisma, o personagem é
simplesmente aborrecido a maior parte do tempo, e o interesse de Jill por ele, é absolutamente infundado.
Porque uma moça jovem e bonita, por mais atraente que seja a ruína de um "gênio", se interessaria por um camarada depressivo de quase cinquenta anos, inchado feito um balão, constantemente bêbado e capaz de comportamento suicida e posteriormente de delírios homicidas, quando tem um namorado apaixonado e que foi galã de Se Eu Ficar?
Não é exatamente um romance crível. Emma Stone é outra que rebola dentro dos vestidinhos de Jill pra tornar a personagem algo mais que uma pateta de afeições deslocadas, mas tendo essa qualidade de missão impossível pela frente, nem Tom Cruise conseguiria.
Muito mais interessante era o caso de Abe com a subaproveitada Rita Richards de Parker Posey, apresentada como uma daquelas personagens coadjuvantes cheias de possibilidades, mas utilizada como um mero acessório na econômica trama.
É estranho ver Allen tropeçar tanto em um script, Homem Irracional é uma coleção tão grande de tropeços que dá a impressão de ter sido escrito por alguém querendo reproduzir Allen, mas esbanjando intelectualismos vazios e incapaz de humanizar seus personagens. Nem mesmo a bela fotografia de Daris Khondji e a trilha sonora embaladinha do The Ramsey Lewis Trio sustentam um filme embalado e naufragado no próprio pedantismo.
Melhor sorte na próxima vez, Woody.

"-Muito de filosofia é apenas masturbação verbal."

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Resenha DVD: Noite Sem Fim


À essa altura, todo mundo já deveria ter aprendido duas coisas:
Primeiro, não se meta com Liam Neeson.
O ator irlandês que se tornou action hero depois de cruzar o cabo da boa esperança é desses caras que podem te matar com uma mãozada na cara, e por Deus, se tu se meter na frente dele, ele o fará (eu disse isso fazendo a minha melhor imitação de Liam Neeson, e ela é bem razoável.).
A segunda é que Liam Neeson não faz dois filmes ruins em sequência. E olha que filme ruim com o Liam Neeson ainda são porcarias divertidíssimas como a série Busca Implacável. O lance é que, para cada vez que ele vira Bryan Mills e destrói algum país da Europa procurando a esposa ou a filha, ele aparece no cinema com um filme de orçamento e lançamento mais modesto que, via de regra, é excelente.
Quem não lembra de A Perseguição e Caçada Mortal? Dois excepcionais exemplares de cinema de macho com cérebro e coração como há muito tempo não se via?
Pois então, eu, assim como os malfeitores que não aprendem a não se meter com Neeson, cometi um "veri siriãs misteic" (Essa também foi imitando a voz e o sotaque do Liam Neeson), e deixei passar esse Noite Sem Fim quando passou no cinema.
Azar meu, que só consegui alugar o filme ontem, e perceber quão sério havia sido meu erro.
No longa de Jaume Collet-Serra (Mesmo diretor de Sem Escalas e Desconhecido), Liam Neeson é Jimmy Conlon.
Jimmy é um ex-matador da máfia irlandesa de Nova York. No passado, ele chegou a ser chamado de "O Coveiro", e tem ao menos dezesseis mortes atribuídas a seu nome, embora jamais tenha sido preso devido ao apoio de Shawm Maquire (Ed Harris), chefão do crime organizado e amigo de longa data de Jimmy.
Conlon já foi grande, temido e respeitado, mas envelheceu, perdeu o respeito, e foi soterrado pelos anos de amargura, uísque e culpa.
Jimmy deixou de ser O Coveiro para se tornar um bebum que dorme e acorda no mesmo pub, servindo apenas de chacota para os bandidos mais jovens e durões enquanto mendiga um dinheiro para consertar o aquecedor de sua casa e é forçado pelo filho de Shaw, Danny (Boyd Holbrook, que esteve com Neeson em Caçada Mortal), a ser o Papai Noel da festa de natal na residência dos Maguire com resultados constrangedores.
Assim como seu amigo Shaw, Jimmy também tem um filho, mas enquanto Danny Maguire faz de tudo para ganhar o respeito do pai através do crime, incluindo tentar acrescentar heroína entre as "commodities" negociadas pelo pai, Michael Conlon (Joel Kinnaman, do atroz RoboCop de José Padilha) se mantém o mais distante possível de seu pai.
Michael trabalha como motorista de limousines em Manhattan e faz serviço voluntário em um ginásio de boxe com órfãos. É um bom homem, com uma bela esposa, Gabriela (Genesis Rodriguez), duas filhas, e um terceiro rebento a caminho.
Quando Shaw se nega a contrabandear a heroína, os traficantes albaneses que estavam negociando com Danny se sentem ofendidos, e resolvem ir à casa do rapaz para um acerto de contas. Eles vão, numa limousine conduzida por Michael, e quando a negociação não anda conforme os albaneses esperavam, Michael se vê na mira de Danny, e posteriormente de Shaw, e sua única chance de sobrevivência é Jimmy. O pai com quem ele não fala há anos.
É excelente.
O longa jamais tenta reinventar a roda, e nem precisa. As histórias de máfia irlandesa que nos fazem realmente acreditar que todo o descendente de irlandês norte-americano é tira ou bandido (E que em Boston não faz diferença ser um ou outro) podem ser um tremendo clichê, mas um clichê está longe de ser necessariamente ruim. Especialmente quando há um elenco acima da média trabalhando para que a história funcione, e o roteiro de Brad Ingelsby dá a todos os personagens, dimensão e verossimilhança.
Tome Neeson, por exemplo. Ali em cima eu brincava com seus papéis de exército de um homem só, nada a ver com o Jimmy Conlon. Jimmy não é "ativado" como uma máquina assassina de repente. Ele é um homem de mais de cinquenta anos, com a malandragem da rua, conhecedor dos atalhos, que vai pegando no tranco conforme aquece como um motor a álcool. Mais do que isso, suas motivações são claras, suas lealdades palpáveis. Ele é muito mais do que um bandido em busca de redenção, é apenas um sujeito mau tentando fazer o que é certo porque, que diabos, não há mais nada a fazer.
Da mesma forma Joel Kinnaman consegue criar verdadeira empatia em seu Michael, um papel com um potencial do caralho pra ser chato de doer. O bom moço que odeia o pai que foi embora quando ele era criança poderia ser um daqueles personagens intragáveis, mas o ator sueco consegue dar lastro ao comportamento ranheta do personagem, e torná-lo relacionável para a audiência.
Ed Harris é outro capítulo à parte. O veterano ator consegue transformar o vilão do filme em alguém afável, agradável, um pai duro, mas justo, de quem é difícil não gostar (a cena entre ele e Liam Neeson num restaurante na metade do filme, é excepcional, daquelas que, sozinhas, já fazem ver o filme valer a pena.). Aliás, "heróis" e "vilões" são rótulos complicados em Noite Sem Fim, já que todos os personagens, à exceção de Pryce, o matador de aluguel vivido por Common, têm mais de um lado, mais de uma camada.
Contando com um trabalho de edição soberbo de Craig McKay e boa fotografia de Martin Ruhe, mais um ótimo elenco que ainda inclui Bruce McGill, Vincent D'Onofrio, Holt McCallany e uma ponta de Nick Nolte, Noite Sem Fim é mais um exemplar da filmografia cada vez mais interessante de Liam Neeson, e de seu talento e carisma.
Vale demais a locação.

"-Quando cruzarmos aquela linha, o faremos juntos."

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Quadrinhos: Demolidor 8


Na mesma semana em que li que a aclamada fase do Demolidor sob a pena de Mark Waid chega ao fim nos EUA, me deparo na banca com o oitavo volume do gibi do Diabo da Guarda da Cozinha do Inferno.
Eu vou repassar apenas brevemente que Demolidor, por Mark Waid e Chris Samnee é, de longe um dos melhores quadrinhos de super-herói nas bancas, se não for o melhor, e que a abordagem mais leve e divertida do Demo na fase atual, ainda que seja o extremo oposto de momentos marcantes do herói sob a incensada batuta de caras como Frank Miller, Kevin Smith e Brian Bendis, não fica devendo nada em termos de qualidade e inventividade ao devolver o Demolidor ao domínio dos super-heróis em detrimento do reino dos vigilantes soturnos e amargurados.
O volume 8 da série trimestral compila as edições 5, 6 e 7 do gibi Daredevil original, mais as edições 4 e 5 de Daredevil - Dark Knights e o especial Daredevil 1.50., de abril do ano passado, comemorando o cinquentenário do personagem.
A primeira história da edição, escrita por Waid e desenhada por Samnee, mostra como foi que Matt forjou a morte de Foggy após tornar sua identidade pública, um plano feito meio no improviso contando com a ajuda de Hank Pym, o Homem-Formiga, e uma nova versão do vilão conhecido como Sapo.
Contada do ponto de vista de Foggy, a história curtinha é um testemunho tocante da amizade dos dois advogados.
A história seguinte, Pecado Original, dividida em duas partes, é escrita por Waid e desenhada por Javier Rodriguez. Ela mostra o Demolidor lidando com memórias de seu pai desenterradas de seu subconsciente após um confronto com o vilão Orbe.
As memórias fazem Matt questionar seu amor e admiração por seu pai, Jack Murdock, que poderia ser um marido abusivo, o que explicaria a fuga de sua mãe quando ele ainda era um bebê.
Decidido a checar a veracidade de suas memórias, Matt resolve procurar por sua mãe, a freira irmã Maggie, apenas para descobrir que ela foi presa após um protesto contra uma fábrica de armas químicas.
O que Maggie e Matt não sabiam, é que a fábrica era uma instalação Wakandana, e que agora, as freiras responsáveis pelo protesto, serão extraditadas à nação do Pantera Negra, agora controlada pela irmã do herói, Shuri, enredando o vigilante cego em uma delicada trama que se estende do trono da avançada nação africana até os mais altos escalões do exército dos EUA.
Apesar de os desenhos de Javier Rodriguez não estarem no patamar da arte de Samnee, a história é boa, e o passado trágico de Matt sempre rende um tempero adicional.
Na sequência, outra história em duas partes, escrita e desenhada por David Lapham coloca o Demolidor, ainda em Nova York durante seu período como aconselhador legal, ás voltas com um capanga da máfia chamado Rochelle sendo acusado pela morte de uma intendente municipal.
O caso aparentemente simples se complica conforme o capo Milo Cantafore, um diminuto vilão conhecido como Pulgão, e até o bandido chamado Shocker se envolvem no caso, ao mesmo tempo em que os Vingadores enfrentam um monstro gigante que invade a cidade.
Essa história não está no nível das aventuras engendradas por Waid, ainda assim, é uma boa aventura policial estrelada pelo Demolidor.
Na sequência, duas histórias do especial Daredevil 1.50, a primeira, O Rei de Vermelho, escrita por Waid e desenhada por Samnee, mostra um Matt Murdock de 50 anos de idade, ex-prefeito de São Francisco, vigilante aposentado e pai de um filho extremamente frágil e assustadiço, vendo-se ás voltas com uma conspiração que cega 76 por cento da população da cidade, incluindo o filho do herói, numa tentativa de arrastá-lo de volta à ação.
Com um ritmo ligeirinho bem super-heroico, e sem dar muitas pistas do futuro (Como porquê o Demolidor virou prefeito de São Francisco, ou quem é a mãe de Jonathan Franklin Murdoch?), mas deixando claro porque o Demolidor é o homem sem medo.
Fechando a edição, a curtinha O Último Desejo e Testamento de Mike Murdoch, mostrando uma filmagem de Matt interpretando seu "irmão gêmeo", Mike, alter ego do alter ego do herói em uma de suas desesperadas tentativas de manter sua identidade secreta.
Com um ritmo levinho e cômico, Mike desfila os desejos de Matt para Foggy, ele próprio, e Karen Page, chegando à beirar uma nota quase melancólica, mas ao mesmo tempo, esperançosa, por Kurt e Karl Kesel.
140 páginas, lombada quadrada que fica uma boniteza na estante, capa cartão, miolo IWC, por módicos R$ 18,90, mais barato que um almoço naquele buffet executivo cheio de salada azeda.
Vale horrores a pena.

"As coisas estão sombrias? E daí? Você tá acostumado ao escuro! Nunca deixe que isso te detenha! Que te retarde! Ria! Ame! Viva! Seja destemido!"

Resenha Cinema: Nocaute


Jake Gyllenhaal sempre foi um ator promissor, e um escolhedor de projetos corajoso. Intercalando produções independentes com filmes de estúdio, ficou claro que o irmão da Maggie Gyllenhaal leva mais jeito quando foge do mainstream.
Talvez por isso fosse estranho ver Gyllenhaal no trailer desse Nocaute (Southpaw, no original), um drama esportivo de boxe que tinha "convencional" escrito em cada frame da prévia que andava pelos cinemas recentemente.
O longa metragem sobre o boxeador que caía em desgraça e precisava lutar para reencontrar seu lugar ao sol tinha cara de filme duvidoso quando o projeto esteve ligado ao rapper Eminem, e era quase uma sequência de 8 Mile, foi sendo refinado. Ganhou roteiro de Kurt Sutter (De Sons of Anarchy), direção de Antoine Fuqua, e, com a saída de Eminem, Bradley Cooper, Ryan Gosling e Jeremy Renner chegaram a ser cogitados para o papel que acabou nas mãos de Gylllenhaal, que foi quem deu vida ao protagonista Billy Hope no longa.
Hope é um boxeador de mais de trinta anos. Campeão dos pesos médios, levando ao máximo o jargão norte-americano da Grande Esperança Branca (Great White Hope), Billy nasceu no sistema legal de Nova York. Cresceu em orfanatos, passou pela prisão, mas conseguiu se tornar um pugilista milionário com mais de 40 defesas de cinturão, uma linda esposa que conheceu no abrigo juvenil, Maureen (Uma surpreendentemente gostosa Rachel McAdams), e uma filha a quem ama, Leila (A estreante Oona Laurence). Mansões, carros, fama e fortuna.
Porém, Billy já alcançou uma certa idade. Quando o conhecemos ele está penando um pouco para vencer sua 43° defesa defesa do título.
Conhecido pelo estilo agressivo, por usar o rosto para bloquear os socos dos inimigos, Billy é o tipo de sujeito que, quanto mais apanha, mais forte bate, e vem funcionando. Ele vence a luta por nocaute no décimo assalto, mas o pesado castigo físico que ele sofre, leva Maureen a chamar-lhe a atenção, e dizer com todas as letras que se ele continuar naquele ritmo, vai acabar sofrendo com sequelas irreversíveis das surras sucessivas a que se submete.
Billy está disposto a seguir o conselho da esposa, mas um novo lutador quer sua chance no ringue contra Billy.
O colombiano Miguel "Mágico" Escobar (Miguel Gomez) está disposto a tudo para chegar ao cinturão, e isso inclui provocar Billy publicamente, invadir eventos e até mesmo ofender sua esposa.
Após um evento beneficente, Miguel e Billy têm uma altercação que escala para um tiroteio, e Maureen acaba assassinada.
A morte da esposa joga Billy em uma profunda depressão, com o dinheiro escasseando, ele é manipulado por seu empresário Jordan Mains (Curtis 50 Cent Jckson) a aceitar um contrato para três lutas contrariando a vontade de Maureen. Deprimido, ele é derrotado em uma luta contra um oponente fraco, agride o árbitro, e perde sua licença. Pra piorar, as multas e processos comem o dinheiro que ainda lhe resta, e prestes a perder até a casa onde vive, Billy começa a apresentar comportamento auto-destrutivo, culminando com uma tentativa de suicídio.
Diante de tal quadro, Billy é apartado de sua filha, que é recolhida a um abrigo juvenil, enquanto ele tenta lidar com o luto, e recolocar sua vida nos eixos.
O caminho para alcançar isso, pode ser o treinador Tick Wills (Forrest Whitaker), mas isso, apenas se Billy estiver disposto a trabalhar duro, se reencontrar e trilhar o árduo caminho da redenção.
Como eu disse lá em cima, Nocaute tem "convencional" escrito em cada frame. Não é preciso ser um gênio para perceber de antemão cada um dos detalhes do roteiro de Kurt Sutter, mas se existem milhares de dramas de boxe, não é à toa.
A fórmula é re-re-repetida porque funciona, e Nocaute não é diferente. Sempre há espaço no coração da audiência para mais uma história de redenção (Eu sei que há no meu), e Nocaute tem um trunfo que a maioria dos demais dramas de pugilismo não tem:
Jake Gyllenhaal.
O ator transforma o longa em um acessório para o seu talento, enchendo Billy Hope de nuances.
Das enfurecidas caretas para a câmera enquanto baba sangue no ringue, aos olhos baixos e voz hesitante quando conversa com a assistente social responsável por sua filha, ao jeito descontraído como comenta sobre o olho "nublado" de Tick no bar, Hope é um personagem extremamente profundo, uma pessoa de verdade muito além da caricatura do comportamento explosivo e do pai amoroso.
Se isso poderia ser um problema já que apenas Whitaker consegue alcançar o ritmo de Gyllenhaal, Fuqua tem a sorte de o roteiro ser inteiramente focado no pugilista, deixando o holofote sobre o cara que mais tem a oferecer, até porque, se a história de Billy é redondinha, as tramas paralelas são pouco menos que acessórios (A assistente social de Naomie Harris e o jovem com problemas em casa Hoppy de Skylan Brooks são tão superficiais que se fossem trocados por manequins a audiência provavelmente nem perceberia).
No final das contas, Nocaute poderia ser apenas mais um filme de pugilismo nota seis, mas graças ao talento de um protagonista extremamente corajoso, consegue alçar voos consideravelmente mais altos.
Assista no cinema.

"-Eu não posso perder minha filha. Eu vou te dar tudo o que eu tenho."

terça-feira, 8 de setembro de 2015

As Decisões Corretas


Estavam sentados no sofá assistindo vídeos aleatórios no Youtube. Ela estava com os cambitos jogados por cima dele, que estava tão afundado no sofá xadrez que tinha quase certeza de que sua bunda pendia no ar, e apenas a sua lombar ocupava o assento.
Tinham ido de coisas específicas, como "Kevin Spacey Impressions" e "Shit Owen Wilson Says", até lances absolutamente aleatórios como "Seleção de 'fails' da semana", e acabaram sendo pegos por um daqueles vídeos de ONGs onde uma sequência de imagens mostra todo o tipo de crueldade com animais, dos massacres de toninhas em águas rasas na Escandinávia até pessoas matando cães e guaxinins a pancadas em uma série de cortes rápidos e nauseabundos.
Acabaram vendo o vídeo todo, três minutos e meio de horror que terminaram com um alentoso "Ainda dá tempo de salvar o mundo" ou algo que o valha.
Ele, desagradado, sentindo-se fisicamente doente por conta do vídeo, se endireitou no sofá.
Ela tentou tirar as pernas do colo dele, mas ele a deteve:
-Pode deixar, só tô me ajeitando...
Continuaram em silêncio, assistindo a um vídeo de tombos e encontrões que, àquela altura, não pareceu tão engraçado. Quando terminou, ela começou a se remexer para usar o teclado, mas ele falou:
-Deixa eu te propôr um cenário, tá?
Ela, puxando as pernas do colo dele e fazendo posição de lótus em cima do sofá, de frente pra ele, assentiu curiosa:
-Tá...
Ele se endireitou e começou a falar, gesticulando bastante:
-Tu tá andando na rua, é começo da noite, oito, oito e pouco, tu tá chegando do mercado, e um estranho chega, ele vem correndo na rua direção, usando calças sociais creme, sapatos pretos, uma camisa branca e um jaleco por cima. Ele carrega um frasco de vidro e tem uma grande mancha de sangue nas costas, cambaleia na tua direção, e caindo sobre um joelho, ele te entrega o frasco...
-O que tem no frasco? - Ela interrompeu.
-Aparentemente nada - Ele respondeu. -Mas o cientista te entrega esse frasco de vidro hermeticamente fechado, um ovo de vidro translúcido, sem tampa, aberturas ou emendas visíveis, e te diz pra não deixar quebrar.
-Hum... - Ela fez, franzindo as sobrancelhas.
-Ele, caindo, voz embargada pelo sangue que sobe da garganta, diz num estertor de morte que se perde num gorgolejo sangrento "Não deixa que isso se quebre! Pode matar toda a humanidade", e cai morto o chão, uma mancha de sangue crescendo sob o corpo inerte do sujeito. - Ele completou, fazendo o gesto de separar as mãos para ilustrar a mancha de sangue crescente.
-Credo... - Ela disse, olhando pra ele.
-Pois é. Tu, com aquele ovo de vidro frágil e leve nas mãos, corre pra casa...
-Pra casa? - Ela o interrompeu, surpresa.
-É... Ou tu iria entregar isso pra polícia? - Ele inquiriu incrédulo.
-Ué... Claro que eu entregaria pra polícia. - Ela assentiu com naturalidade. -Acabaram de matar um cientista por causa disso, imagina o que fariam com uma coitada duma dentista.
-Tá, tá, tá... - Ele fez um gesto de "pára" com a mão espalmada pra frente. -Tu tenta chegar à delegacia pra entregar, mas o Sartori parcelou os salários do funcionalismo e a delegacia tá fechada, policiais em greve. Não tem ninguém lá, só um escrivão estricnado que te diz pra usar a delegacia on-line.
-Puta merda... Tá... Então eu acho que levo pra casa... - Ela concordou, a contragosto.
-OK, tu chega em casa, liga a TV, põe na Globonews e ouve a notícia de que um vírus sintético perigosíssimo sumiu de um laboratório. Que em contato com a atmosfera, essa arma biológica devastadora tem potencial pra matar, em menos de 48 horas, 75% da população da Terra, e, em um curto período, uma semana, duas, pode extinguir a vida humana. - Ele concluiu, sombrio.
Ela ficou olhando pra ele. Os olhos esbugalhados... Ele se inclinou pra frente e perguntou:
-O quê tu faz?
-O que eu faço? - Ela perguntou. -Meu Deus, eu nem sei, primeiro eu rezo, bastante, depois enrolo esse negócio em todo o plástico bolha que eu puder comprar, dois edredons e dois travesseiros, escondo tudo no fundo do meu armário e ligo pra polícia federal pra avisar do que aconteceu. - Concluiu com naturalidade.
Ele fez um "hm" curto e se recostou no sofá de novo, pegando o notebook da mesinha de centro e o posicionando no colo. Ela ficou olhando pra ele.
-Falhei no teu teste, né? - Perguntou.
Ele riu:
-Não. Não era um teste. Não tem resposta certa. É apenas a tua percepção da situação. Sem certo ou errado.
Ele continuou mexendo no computador, mas ela não desistiu:
-E qual é o teu ângulo? O que é que tu faria? A mesma situação. O cara cai morto e te deixa com o ovo de vidro da morte nas mãos. O que tu faz?
Ele largou o notebook, e sorriu:
-Eu iria com ele pra casa. Esconderia ele em algum lugar, ligaria a TV num canal de notícias ou iria pra internet pesquisar o que era.
-OK, tu descobre que é aquele vírus sintético, que mata a raça humana inteira em uma semana, o que tu faz?
Ele ficou olhando pra ela por longos segundos, direto no fundo dos olhos azuis dela.
-O que tu acha que eu faria? - Ele perguntou.
-Tu quebrava o frasco. - Ela respondeu. -Num local público. Com muita gente. Na festa da Metrô. Num comício de político, numa manifestação estudantil, numa votação da câmara estadual, numa passeata do CEPERs...
Ele sorriu.
-Pra quê? - Ela perguntou, francamente perturbada.
-Pra salvar o mundo. - Ele respondeu com naturalidade.
-Matando todo mundo? - Ela quis saber, pontuando cada palavra com as mãos para ilustrar o que considerava um paradoxo irônico.
-Salvar o mundo, não a humanidade. - Ele corrigiu. -O único jeito de salvar o mundo, é acabando com a humanidade. Pensa comigo... Assiste um noticiário do início ao fim, e me diz, se tu vê salvação pra raça humana e pro mundo no mesmo cenário dentro de um espaço de tempo hábil e realista?
Ela baixou os olhos e virou o rosto como quem não aceita a ideia.
-Não... Não sei se eu concordo contigo. Aliás, não concordamos na maior parte das "grandes questões". Essa vai se juntar à religião, política e futebol. Eu não acho que exterminar toda a raça humana seja a única solução pra salvar o planeta...
-E qual é a tua solução? - Ele perguntou, desafiador.
-Tu tá amargurado, né? - Ela perguntou desgostosa.
-Eu sou amargurado. - Ele riu, sarcástico.
-Tá. - Ela disse. -Eu tenho um cenário pra te propôr. Tu quebrou o frasco, as pessoas do mundo vão durar apenas mais duas semanas, e tu tem 48 horas antes de ter uma morte horrível...
-Não, não, não. - Ele corrigiu. -O vírus causa uma morte muito serena. Ele apenas desliga o sistema nervoso central. Vai ser como pegar no sono e não acordar, sem sentir absolutamente nada...
-Tá... Tri conveniente... Enfim. Tu tem quarenta e oito horas antes de morrer. O que tu faz nessas 48 horas?
Ele pensou um pouco. Cenho franzido.
-Acho... Bom... Todo mundo vai viver apenas por mais 48 horas... Eu não sairia por aí fazendo emendas... Acho que todos estariam ocupados se preparando pro fim. Não seria fácil fazer tudo o que eu gostaria...
-E o quê tu gostaria de fazer? - Ela perguntou.
-Eu gostaria de encontrar todas as pessoas que fizeram parte da minha vida e agradecer a elas. Antigos amigos... Colegas, professores... Me desculpar por deixar que o contato se perdesse, por não ter estado por perto quando eles precisaram... Gostaria de ir até as mulheres que eu amei, e reiterar que, enquanto eu estive com elas, as amei verdadeira e profundamente. E que jamais passei um dia ao lado delas, sem achar que passaria todos, e que lamento se atrasei a vida delas por causa disso. Tiraria alguns dias para passar com a minha família imediata, meus amigos mais próximos... Passearia bastante com o meu cachorro, e faria os preparativos que fossem possíveis pra ele continuar vivendo depois que eu morresse... Um estoque de pacotes de ração abertos perto de um lago ou piscina. - Ele riu. -Sei lá... Não me desculparia por ter matado toda a raça humana com um vírus sintético. Eles provavelmente não entenderiam meus motivos, especialmente quando nenhum deles é diretamente responsável pelos males do mundo, então... Acho que guardaria minha responsabilidade pelo extermínio da humanidade em segredo ao menos em um primeiro momento...
-Tá aí meu ponto. - Disse ela, indignada. -Tu sabe que a maioria das pessoas não é responsável diretamente pelos problemas do mundo, e ainda assim, mataria indiscriminadamente toda a humanidade! Pessoas inocentes, pessoas boas, e até pessoas que tu ama e que te amam. Ou amavam, enfim...
-É... - Ele concordou. -Mas não ser diretamente responsável não te torna menos responsável de maneira indireta. Se eu pudesse apenas exterminar os vilões, seria sensacional. Melhor ainda seri se eu pudesse fazê-los deixar de serem vilões. Esse seria o cenário ideal. Mas esse cenário não lida com cenários ideais, ele lida com cenários difíceis, alemoa. Impossivelmente difíceis. Salvar a Terra às custas de todos os que tu ama? Não é uma escolha difícil? Não tira teu prazer em salvar o mundo? Não torna a balança extremamente desfavorável? É um momento em que fazer a coisa moralmente certa, é cruzar os braços e deixar tudo seguir seu caminho rumo ao inferno em que a raça humana está transformando a Terra, e agir em nome do planeta, é se tornar o maior genocida da História.
-Eu já não gostava desse teu cenário antes de tu definir ele. Agora gosto menos ainda. - Ela disse. -Ele é horrível. - Concluiu cruzando os braços.
-Eu sei. - Ele concordou. -Mas até aí... Tomar as decisões corretas geralmente é horrivelmente doloroso, não concorda?

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Resenha Cinema: O Agente da U.N.C.L.E.


Crise criativa de Hollywood e talicoisa... Missão: Impossível faz muita grana, e tudo mais... E com esses dois comentários re-re-repetidos nós sabemos porque existe O Agente da U.N.C.L.E., filme baseado em um seriado que, entre 1964 e 1968, colocou do mesmo lado os agentes da CIA Napoleon Solo, e da KGB, Illya Kuryakin, para enfrentar as forças do mal do pérfido consórcio THRUSH.
Levando-se em conta a quantidade de grana que Missão: Impossível faz nas bilheterias, é fácil entender as esperanças da Warner ao dar carta branca para o diretor Guy Ritchie, dos ótimos Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes, Snatch - Porcos e Diamantes, Rock'n Rolla e dos dois divertidíssimos Sherlock Holmes com Robert Downey Jr. e Jude Law.
Ritchie tem ótima mão para ação, já provou que sabe lidar com grandes orçamentos, com grandes estrelas, e que é mestre em criar relações que camaradagem genuínas entre homens sem cair no bromance forçado.
Quem melhor que o ex-marido da Madonna pra conduzir as aventuras de Solo e Kuryakin, então?
O Agente da U.N.C.L.E. se passa em 1963. O presidente Kennedy dá seus discursos contra os ideais comunistas da União Soviética, o mundo está polarizado entre capitalismo e socialismo, a Alemanha dividida entre Ocidental e Oriental e Berlim é separada pelo muro.
O agente da CIA Napoleon Solo (um bem-vestido Henry Cavill) chega ao outro lado da cortina de ferro com a missão de contatar a jovem Gaby (Alicia Vikander), tirá-la da Alemanha Oriental, e usá-la para descobrir o paradeiro de seu pai, o ex-cientista de foguetes favorito de Hitler, agora desaparecido, e de posse de uma nova e perigosa tecnologia.
Ao extrair a jovem de Berlim Oriental, porém, o caminho de Napoleon se cruza com o do agente especial da KGB Illya Kuryakin (Armie Hammer), um obstinado quase super-homem a serviço da União Soviética que por pouco não frustra a audaciosa escapada do agente Solo e Gaby por sobre o muro.
Após cumprir sua missão, Napoleon descobre através de seu chefe, o agente Sanders (Jared Harris), que o pai de Gaby pode ter desenvolvido uma forma extremamente barata e eficaz de enriquecer Urânio, tornando virtualmente qualquer bomba em um artefato nuclear. Descobre também, que ele pode estar sendo forçado a trabalhar para a família Vinciguerra, um grupo de prósperos fundamentalistas fascistas italianos que fizeram fortuna no ramo do transporte marítimo sem jamais abandonar os ideais de Mussolini, e que agora buscam sua própria bomba atômica. O que mais o agente Solo descobre, é que a invenção do pai de Gaby é perigosa demais, e que em um impensável esforço de cooperação, ele irá unir forças com o agente Kuryakin para, junto com Gaby, viajar disfarçado até Roma e encontrar o pai da jovem, e desmantelar os planos vilanescos dos Vinciguerra e salvar o mundo, sem que um mate o outro no processo.
O Agente da U.N.C.L.E. não é, nem de longe, capaz de competir com o hype de Missão: Impossível.
Ainda que tenha uma produção esmerada, boas cenas de ação, e aquele descarado flerte com a comédia que é caro ao trabalho de Ritchie (e muito bem vindo), faltou alguma coisa para o filme encontrar seu equilíbrio, e talvez possa ser carisma aos protagonistas.
Embora Cavill e Hammer sejam dois rapagões boa-pinta, sejam divertidos em diversos momentos do longa, além de levarem jeito pra ação e não serem atores atrozes de modo algum, também não é menos verdade que nenhum dos dois é lá uma estrela de primeiríssima grandeza em Hollywood, e até juntos, parecem ter dificuldade pra segurar um filme nas costas.
Mesmo que se esforcem, falta aos dois alguma química (e nem me refiro ao quase caso de amor entre os Holmes e Watson de Downey Jr. e Law, mas alguma coisa mais sarcástica como o que tinham o Turco (Jason Statham) e o Tommy (Stephen Graham) de Snatch), e não ajuda as alterações de background criadas por Ritchie e Lionel Ingram, que tornaram Solo um charmoso (e por vezes meio canastrão) ex-ladrão, e Kuryakin um psicótico com complexo de Édipo e rompantes de ira destrutiva.
Posto isso, cabe dizer, porém, que O Agente da U.N.C.L.E. não é um mau filme.
Se eu fosse de dar notas, daria ao longa uma sólida nota sete, que só não é mais alta devido aos problemas já mencionados, e à uma chata sequência de mini-flashbacks que cortam a ação em determinados momentos.
Ainda assim, o longa tem momentos realmente engraçados, cenas de ação que são, de fato, tensas, e, no geral, é muito divertido.
O elenco, que ainda conta com Hugh Grant, como o agente da inteligência britânica Weaverly, Sylvester Groth, como tio Uri, Luca Calvani como Alexander Vinciguerra, e a desgraçadamente linda Elizabeth Debicki como Victoria Vinciguerra, se segura, e no final das contas, o longa-metragem funciona a contento dentro do que é proposto, embora a ambientação anos sessenta se ressinta de um pouco mais de cor e "groovy", restrito à uma divertida cena entre Gaby e Illya no quarto do hotel.
Eu não posso negar que fiquei curioso pra saber o que acontece em Istambul.

"-Não é muito bom nessa coisa toda de sutileza, não é?"