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segunda-feira, 14 de outubro de 2019

Resenha Filme: El Camino: Um Filme Breaking Bad


Eu não assisti Breaking Bad durante a exibição da série, que transcorreu entre os anos de 2008 e 2013, mas apenas em 2015.
Em um encontro fortuito com o amor da minha vida num ensolarado e frio sábado de tarde na rua João Alfredo em Porto Alegre, falando sobre seriados após me render tardiamente ao Netflix por conta de Demolidor, comentei que estava me preparando para ver Better Call Saul, e a morena cheirosa que era a minha interlocutora me disse que, antes de ver o spin-off sobre o advogado trambiqueiro, eu precisava ver Breaking Bad, e eu acolhi o conselho e, em cerca de um mês assisti a saga de Walter White e Jesse Pinkman no mundo do crime antes de ver um único capítulo das aventuras de Jimmy McGill e Mike Ehrmantraut.
Não preciso dizer que Breaking Bad se tornou uma de minhas séries favoritas em todos os tempos, que devorei temporadas inteiras em um dia, escolhi personagens a quem odiar (Skyler White, claro, Tuco Salamanca, Todd e toda a gangue de neonazistas...), e favoritos (Walter, é óbvio, Mike, Saul, Hank, que também merecia seu próprio programa...) por quem torcer, Jesse, porém, jamais foi um desses favoritos.
Eu jamais tive paciência com Jesse e suas constantes crises de consciência ou a maneira como ele, que era o criminoso original da dupla com Walter, parecia ser covarde demais para levar a ideia de um império adiante junto com Heisenberg, e era, na pior tradição da prostituta que se apaixona, tanto um traficante quanto um viciado, além de um delator... Tudo isso sempre me manteve algo apartado do personagem, e relativamente alheio à sofrência que eventualmente se tornou seu traço mais marcante...
Claro, minha impaciência com Jesse não significa que eu não tenha me compadecido do destino do personagem na temporada final da série e tampouco que eu não tenha ficado ansioso por El Camino assim que o longa foi oficialmente anunciado.
Na sexta à noite, moído de cansado, eu me sentei com algumas guloseimas na frente da TV à noite e assisti El Camino: Um Filme Breaking Bad.
O longa abre com um flashback, quando Jesse (Aaron Paul) e Mike (Jonathan Banks) conversavam sobre planos de aposentadoria à beira de um córrego, "Para onde você iria recomeçar se tivesse minha idade?", Jesse pergunta. "Alasca", Mike responde, quando um corte abrupto nos leva de volta para os momentos após Walter resgatar seu ex-protegido do cativeiro e ele escapar do complexo onde ficara aprisionado por meses no El Camino de Todd (Jesse Plemons).
A catarse da libertação, igual àquela que víramos em Felina, porém, dura pouco. Imediatamente Jesse precisa manobrar e se esconder na entrada de uma casa qualquer para se ocultar do comboio policial que se aproxima, atraído pelo caos provocado pelo último ato de desafio de Heisenberg.
Pelos próximos cento e vinte minutos, nós acompanhamos Jesse Pinkman em sua luta para realizar o sonho de chegar ao Alasca enquanto foge da polícia e de novos inimigos contando com a ajuda dos amigos que sobreviveram ao reinado de Walter White para fazê-lo, lutando para deixar Albuquerque para trás ao mesmo tempo em que é assombrado pelo trauma de seu período cativo.
El Camino: Um Filme Breaking Bad é ótimo.
Mas não se engane. Ele não é um filme para uma audiência mais ampla. O longa não leva ninguém pela mão e é, sim, feito para ser assistido logo após Felina (Ainda que, de alguma forma, seja bom que ele não tenha sido lançado seis meses após o fim da série, no que teria parecido um movimento meio barato dos envolvidos), e servir de epílogo ao seriado em geral, e a Jesse Pinkman em particular, talvez o personagem que mais sofreu as consequências dos próprios atos e vícios ao longo da série original, saindo da teia de manipulações de Walter e finalmente assumindo o volante do próprio destino e escolhendo seu próprio caminho (sacaram o título?).
O fato de Breaking Bad sempre ter sido um seriado extremamente cinematográfico faz com que a transição para o novo formato não seja traumática como poderia ser para conteúdo de outras séries. Vince Gilligan, o diretor e roteirista do longa, manja do riscado, e consegue contar sua história no formato de longa metragem com a mesma desenvoltura que vimos em Breaking Bad e Better Call Saul, dando-se ao luxo até de fazer pequenas extravagâncias visuais.
No que tange às atuações, o longa pertence a Aaron Paul, um ator que foi indicado ao Emmy cinco vezes durante Breaking Bad (com três vitórias, mais uma indicação ao Globo de Ouro) e que jamais encontrou outro papel que lhe oferecesse as mesmas oportunidades dramáticas que Jesse Pinkman. Ele está ótimo em El Camino, capturando todas as nuances do trauma que seu personagem sofreu durante seu período cativo, que revisitamos em diversos flashbacks, incluindo um bastante extenso com Todd (uma criação tão genial de Jesse Plemons que meu primeiro impulso segue sendo odiar o ator toda a vez que a cara bolachuda dele aparece em um filme), que é a mola propulsora da trama, além da carência de Jesse, que passou toda a duração do seriado procurando, sem sucesso, um modelo de comportamento, mas parece finalmente ter crescido além das roupas de adolescente, do bordão famoso e da sombra de seu ex-professor.
Uma das maneiras que El Camino escolhe para mostrar isso é através do paralelo entre Jesse e Walter. Enquanto Heisenberg terminou seu reinado de crime tão isolado que precisava ocultar a origem do dinheiro que deixara para a esposa e os filhos, forçado a pagar ou ameaçar estranhos para obter auxílio, Jesse imediatamente reencontra amigos que estão lá para a ajudá-lo não importa o risco, como Skinny (Charles Baker) e Badger (Matt Jones). Até Joe (Larry Hankin), o dono do ferro-velho parece disposto a ajudar Jesse apenas por simpatizar com ele de alguma forma. Enquanto o sofrimento e as consequências de ações mal pensadas levaram Walter de bom homem a criminoso, Jesse fez o caminho oposto, e El Camino é o trecho final de sua jornada, e que belo trecho.
Absolutamente obrigatório para fãs de Breaking Bad, um excelente pretexto para aqueles que ainda não viram a série começarem, El Camino está disponível no catálogo da Netflix desde sexta-feira.
Assista.

"-Alasca... Começar de novo. Começar do zero.
-É possível.
-Acertar as coisas.
-Não. Lamento, garoto. Isso é a única coisa que você jamais poderá fazer."

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