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segunda-feira, 7 de outubro de 2019

Resenha Filme: Rocketman


Do ano passado pra cá as salas de cinema foram inundadas por longas que se galgavam na música de heróis do rock'n roll para narrar sua história, começando com o (talvez excessivamente) laureado Bohemian Rhapsody, cinebiografia de Freddie Mercury que levou quatro oscars pra casa na cerimônia de fevereiro, passando por Yesterday, cuja premissa perguntava como seria um mundo sem as canções dos Beatles e A Música da Minha Vida, que embalava a jornada de crescimento de seu protagonista com canções de Bruce Springsteen, antes dos dois últimos, porém, houve outra cinebiografia que eu acabei não indo assistir nos cinemas: Este Rocketman, contando a história de Elton John, que estreou em maio, e que eu não lembro ao certo por que não fui ver.
Sem nada para assistir em um domingo particularmente tristonho, após não ter conseguido dar um pulo na locadora no sábado, resolvi vasculhar o catálogo de aluguel digital do Google Play em busca de uma opção, e optei por fazer justiça a sir Elton por ter-lhe sonegado minha audiência na sala escura meses antes.
Rocketman abre com Elton John (Taron Egerton) chegando à uma sessão de terapia em grupo em uma clínica de desintoxicação usando em sua totalidade um de seus extravagantes trajes de palco, e assumindo imediatamente que é um alcoólatra viciado em cocaína, em sexo e um comprador compulsivo que também tem problemas com maconha, pílulas e controle de raiva.
Dali nós somos imediatamente levados pela mão até a infância de Reginald Dwight (primeiro Matthew Illesley, depois Kit Connor), um jovem prodígio do piano criado por uma avó amorosa (Gemma Jones, da franquia Bridget Jones), uma mãe promíscua (Bryce Dallas Howard, a mulher de Hollywood que mais intercala entre gostosa e gorducha) e um pai ausente (Steven Mackintosh) que ao longo dos anos vai descobrindo na música uma maneira de deixar de ser quem nasceu para ser e se tornar quem quer ser.
Vemos como ele inicia sua carreira musical tocando piano na banda de apoio de um grupo de soul norte-americano em turnê pela grã-bretanha, o desenvolvimento de seu nome artístico (parcialmente roubado de um colega de banda, parcialmente emprestado de John Lennon), e como ele finalmente dá o primeiro passo rumo ao sucesso quando, no final dos anos 1960, conhece Bernie Taupin (um ótimo Jamie Bell) com quem formaria uma longeva e prolífica parceria que renderia os maiores sucessos de sua carreira, e cujas letras o levariam a Los Angeles, onde na boate Troubadour, ele faria a apresentação que o colocaria no mapa do estrelato, além de fazê-lo cruzar o caminho de John Reid (o Rob Stark Richard Madden), que eventualmente se tornaria seu empresário e um abusivo parceiro que estaria ao seu lado quando ele de fato mergulhasse de cabeça em uma vida de excessos que se estenderia pelos anos vindouros.
É difícil não comparar Rocketman com Bohemian Rhapsody. Além de os dois filmes serem a respeito de músicos britânicos extremamente talentosos, extravagantes, homossexuais que criaram hits mais ou menos na mesma época e que se reinventaram para deixar sua existência mundana para trás e se tornarem ícones, os dois longas tem a mão do diretor Dexter Fletcher (que antes de dirigir Rocketman completou Bohemian Rhapsody após a demissão de Bryan Singer) e seguem algo como uma cartilha de filmes biográficos que, se de nenhuma forma estragam a diversão de quem assiste, certamente tornam a coisa toda um pouco previsível.
Nesse sentido, Rocketman leva uma vantagem que é a maneira onírica como o roteiro de Lee Hall integra as canções à narrativa, dando ao filme uma cara de musical das antigas, com os personagens de repente começando a cantar em meio às cenas. Um expediente que funciona melhor em alguns momentos do que em outros. A cena com a família disfuncional do pequeno Reggie Dwight cantando na casa onde o jovem cresceu não é das mais inspiradas, entretanto o momento em que Bernie Taupin se despede de Elton cantando Goodbye Yellow Brick Road é realmente tocante e toda a montagem que vai da tentativa de suicídio na piscina ao palco durante Rocketman é sensacional.
A despeito do envolvimento direto de Elton John (ou talvez por causa dele) Rocketman é bem menos pia do que outras cinebiografias. O longa é frequentemente mais desbocado e aberto no que tange aos vícios e predileções de seu protagonista (a cena de sexo entre Egerton e Madden, que nada tem de pornográfica, por exemplo, fez o longa ser banido dos cinemas de alguns países), o que oferece ao filme um nível de autenticidade maior do que o que estamos habituados a ver em outros retratos de biografados vivos, mas não o impede de cair em algumas armadilhas recorrentes do gênero. Há um excesso de exposição para as resoluções do longa, a necessidade de explicar à audiência o que estamos vendo (como a sugestão de que muito da extravagância de Elton John são uma manifestação da vontade de ser notado por seus pais ausentes, e seu abuso de substâncias uma forma de lidar com a ausência de amor verdadeiro em sua vida, o que, sim, é bastante plausível, mas é quase esfregado na cara da audiência).
E, a exemplo de Bohemian Rhapsody, muito da potência do longa está tanto em sua partitura de hits, quanto na presença de seu protagonista.
Taron Egerton crava os dentes na criação de um retrato vivo e emocional de Elton John, interpretando com garbo e sutileza uma pessoa de verdade e não o pavão de lantejoulas que víamos no palco. Ele exprime com galhardia uma série de pensamentos e sentimentos de maneira muito mais comedida do que o script do longa faz, além de cantar as próprias canções sem jamais precisar imitar o biografado.
Grande parte do que funciona em Rocketman é graças aos esforços de Egerton e sua dedicação ao papel, além de sua química com Jamie Bell e Richard Madden, esse tripé de atores mantém a cabeça do longa fora d'água em seus momentos menos inspirados, e o eleva mais alto em suas melhores sequências.
Rocketman ainda valeria uma espiada nem que fosse pela playlist cheia de clássicos de Elton John que são impossíveis de não cantarolar junto (pra mim é Tiny Dancer, que sempre me faz lembrar de uma pequena morena que eu nunca vi dançar), mas há mais na cinebiografia do que apenas isso. Uma bela direção, produção caprichada, alguns bons números musicais, e atuações acima da média de um elenco que ainda inclui Charlie Rowe, Tate Donovan e Stephen Graham que garantem que Rocketman esteja do lado certo das cinebiografias em geral, nas cabeças das cinebiografias musicais em particular.
Definitivamente vale os R$9,90 da locação digital.

"-Eu tenho o álbum número um nos EUA, de novo, estou prestes a embarcar na turnê mais rentável da história do rock, sou pessoalmente responsável por 5% de todas as vendas de discos do planeta inteiro e tenho o maior adereço de cabeça conhecido pelo Homem, então, sim. Eu acho que estou bem!"

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