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terça-feira, 20 de novembro de 2012

Minotauro


Flertavam descaradamente. Ele a achava muito atraente, e ela de fato era. Além de ter um rosto muito bonito, com uma dessas belezas menos óbvias, era bem feita. Bem construída, bem proporcionada. Tinha aquele tipo de corpo feminino que mesmo quando engorda uns quilinhos coloca peso nos lugares certos, e passa de "muito bonita" a uma longa fase de "gostosona" antes de virar "uma gordinha".
Ela, mesmo sendo bonita e bem constituída lhe dava abertura. Talvez o achasse um bom sujeito. Isso o preocupava um pouco. A maioria das mulheres parecia demonstrar atração por ele unicamente por isso. Por ele ser a epítome do bom sujeito. Aquele camarada confiável com quem a mulher sabe que não vai ter muito trabalho na vida. No início, quando deu-se conta, ele ficou muito aborrecido, mas acabou resignando-se ao perceber que era melhor ter essa única qualidade do que não ter atrativo algum para o sexo oposto, enfim.
O lance é que ela e ele flertavam, e ele gostava daquilo. O flerte era provavelmente a fase mais divertida de uma relação na opinião dele, e embora ele quisesse, de fato, ter uma relação de longo prazo, duradoura, repleta de confiança, amor e compreensão com uma moça que fosse lesada o suficiente pra querer o mesmo com ele, a única coisa de que ele sentiria falta na solteirice, seria da perspectiva do flerte.
O flerte dele e dela consistia em conversar sempre que tinham oportunidade, sobre qualquer assunto, sempre tentando parecer ao menos um pouco espirituoso, muitas vezes olhando nos olhos. De vez em quando fingindo ter perdido o fio da meada imerso na escuridão dos profundos olhos castanhos dela. Um toque, de fingido acaso, com a mão espalmada nas costas dela quando ia lhe mostrar algo na sua mesa, e um abraço suave, de um braço só, mas com o peito colado ao corpo dela na despedida... Tudo corria tão bem, em um ritmo tão natural, que ele já se perguntava se ela não seria aquela pessoa... A pessoa que o ensinaria a amar. Que faria dele, finalmente um homem completo.
Foi justamente numa daquelas conversas casuais junto à copiadora que aconteceu. Conversavam, quando ela comentou:
-Ai, tenho que ir cedo pra casa dar uma limpada porque a minha faxineira está com labirintite.
Ele sorriu dizendo:
-Que, como todos sabem, é uma inflamação causada por germes transmitidos pelo minotauro.
Ela não riu. Disse, muito séria que não tinha entendido. Ele explicou:
-O minotauro, da lenda de Teseu, vivia em um labirinto, e tal...
-E o que é que tem isso a ver com a faxineira?
Ele desistiu, sugeriu que ela deixasse pra lá, e ela deixou.
Quando acabou o expediente se despediram com um aceno à distância. Ele não sabia se estava sendo rigoroso demais, mas a verdade é que jamais poderia amar uma mulher que não entendesse aquela referência.

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