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segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Resenha DVD: O Homem nas Trevas


Eu geralmente tenho os dois pés atrás com filmes de horror/suspense de baixo orçamento que fazem fortunas em bilheteria e se tornam fenômenos.
Atividade Paranormal, Uma Noite de Crime, e outros subprodutos do gênero que fazem uma receita mais do que decente para um orçamento modestíssimo são o tipo de coisa que eu nem consigo assistir por inteiro. Uma hora e meia de má atuação, parte técnica pobre e sustos baratos estão longe do patamar do que eu considero minimamente atraente em termos de cinema.
Esses filmes sempre encontrarão seu público porque... Francamente, olhe o público do cinema hoje em dia. Pra um bando de apedeutas incapaz de passar duas horas em silêncio sem parar de mexer no telefone, um produto fragmentado e parcialmente digerido é a epítome do deleite.
Poder ver um filme conversando com os amigos no whats app e postando fotos no instagram e ainda entender tudo o que está rolando deve ser a glória pra um acéfalo desprovido de capacidade de imersão ou concentração.
É por essas e outras que eu não estava particularmente interessado em O Homem nas Trevas, longa do diretor Fede Alvarez, retomando a parceria com o produtor Sam Raimi do remake de A Morte do Demônio.
O filme, porém, além de vasto sucesso de bilheteria, também recebeu críticas elogiosas. Tinha mais elenco do que a média das fitas de terror descartáveis de sempre, trazendo Dylan Minette, de Os Suspeitos e Goosebumps: Monstros e Arrepios, a gatinha Jane Levy, colaboradora de Alvarez na refilmagem de A Morte do Demônio, e Stephen Lang, o coronel Miles Quaritch de Avatar.
Foi em parte por isso que eu resolvi dar uma chance ao filme no preguiçoso e calorento primeiro final de semana de 2017.
No filme conhecemos Alex (Minette), um jovem cujo pai tem uma empresa de segurança que garante acesso a chaves de casas nos subúrbios de Detroit.
Junto com os amigos Money (Daniel Zovatto) e Rocky (Levy),Alex comete pequenos furtos nas residências em busca de eletrônicos, jóias e relógios caros que possam ser vendidos rendendo algum dinheiro.
O esquema é bem-sucedido, mas apenas até certo ponto.
Rocky tem uma irmã pequena a quem deseja tirar de casa e da influência da mãe alcoólatra e abusiva. Ela e Money planejam viajar para a Califórnia e viver lá, mas, para isso, precisam de muito mais do que têm conseguido.
A chance desse golpe surge quando Money recebe uma dica:
Um solitário veterano da Guerra do Golfo teria recebido uma polpuda indenização pela morte da filha após um atropelamento anos antes.
Esse dinheiro estaria guardado na casa do homem, um sobrado dilapidado na parte pobre de Detroit, numa casa sem vizinhos próximos. A melhor parte?
O sujeito em questão (Lang) é cego.
Bastaria entrar na casa, pegar trezentos mil dólares, dinheiro que mudaria para sempre a vida dos três e sair.
Se inicialmente Alex não está de acordo com a ideia (ele sabe a diferença entre furtar meia dúzia de bugigangas da casa de famílias endinheiradas e roubar uma vultuosa soma em dinheiro vivo da casa de um cego), seu amor platônico por Rocky logo faz com que ele mude de ideia e tome parte no plano. Uma decisão que se torna mais questionável, e perigosa, à medida em que descobrimos que os três jovens subestimaram sua pretensa vítima.
O Homem nas Trevas surpreende e funciona.
Fede Alvarez e o diretor de fotografia Pedro Luque fazem um excepcional trabalho na hora de definir a geografia da ação.
Um fator fundamental do cinema que frequentemente é escanteado por realizadores menos espertos que tremelicam a câmera e usam cortes rápidos para induzir a sustos fáceis, saber onde a ação acontece oferece um senso de urgência que faz maravilhas por um filme.
Pense em Mad Max: Estrada da Fúria, ou no primeiro Invocação do Mal, nenhum dos dois filmes, especialmente o segundo, seria o que é sem o apurado senso de localização dos personagens na hora da ação.
Alvarez e Luque sabem disso, e estabelecem rapidamente a distribuição dos cômodos da casa do Homem Cego para que, quando Money, Alex e Rocky estejam lá dentro, nós saibamos exatamente pra onde eles estão indo, e para que quando eles se vejam presos no labirinto de estantes do porão, nós também fiquemos enclausurados e confusos.
Ajuda o filme o fato de Jane Levy ser uma atriz competente tanto para demonstrar terror e tenacidade em igual medida, e Stephen Lang ser um intérprete de fundamento, capaz de oferecer camadas de personagem e ameaça física em igual medida.
Claro, esses dois personagens são os que mais recebem material para trabalhar do roteiro de Alvarez e Rodo Sayagues Mendez.
Ainda que seja rápido e rasteiro, nós conhecemos as motivações de Rocky e, mais adiante, as do Homem Cego para suas ações.
Ter espichado um bocadinho a econômica metragem do filme (88 minutos) e oferecido a mesma deferência a Alex e Money poderia ter beneficiado o longa ao nos oferecer alguma razão para nos importarmos com os dois personagens e deixá-los com menos cara de acessório.
Talvez, até mesmo substituir um pouco da busca por choque do terceiro ato por mais desenvolvimento de personagens pudesse ter servido melhor ao longa, já que, conforme o filme se encaminha para o seu final, muito da tensão claustrofóbica do início se perca, ainda assim, O Homem nas Trevas se sustenta, garantindo que a audiência continue presa ao filme, que, como conto moral, opondo duas pessoas cujas decisões reprováveis colocaram como inimigos definitivos em uma parte isolada de uma cidade moribunda, funcionava melhor do que como filme de horror tradicional.
Ainda assim, o talento de Fede Alvarez, Jane Levy e Stephen Lang mantém a coisa funcionando, e a audiência na ponta da cadeira até o fim do longa.
Ótima pedida aos amantes de cinema sem paciência pra terrores/suspenses fáceis, obrigatório para os fãs do gênero.
Certamente vale a locação.

"-É meio ferrado roubar de um cara cego, não é?
-Só porque ele é cego não significa que ele é um santo, mano."

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