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segunda-feira, 20 de junho de 2011

Repelir


-Há coisas - Disse o Eusébio, sentado à mesa do bar. - Que tu nunca vai me ver fazer.
A Carlota ficou só olhando pra ele, com cara de quem diz, "tá, e daí?". O Eusébio, mesmo sem encorajamento verbal, continuou:
-Tu nunca vai me ver fumar um cigarro. Eu meio que me acostumei com o cheiro, pois quase todo mundo que eu conheço fuma, mas eu tenho asco da ideia de fumar. Aquele negócio esponjoso na boca, tirando fumaça daquele cilindro de papel... É horrível.
O Eusébio conjecturava enquanto mexia os dedos das mãos casualmente. Ele parecia querer pegar algo que flutuava no ar.
-Tu nunca vai me ver de porre, também. Eu não bebo. Não tenho nenhuma vontade de beber. Acho que não gosto de estados alterados de consciência. Eu também não gosto do sabor da maior parte das bebidas alcoólicas, então, meio que junta a fome e a vontade de comer.
A Carlota continuava olhando pra ele, embora tenha parado brevemente pra olhar o relógio. Ele seguiu:
-Tu nunca vai me ver comer cebola. Especialmente cebola crua. Cebola, é o inferno, não gosto nem do cheiro, nem da textura, nem do sabor, nada. Cebola, longe de mim. Também não gosto de fígado. Fígado é horrível, tenho horror de fígado. Tu também não vai me ver ouvindo música a todo o volume. Exceto, talvez, com fones de ouvido. Mas em casa, não. Nunca. Eu gosto de música, não de todas, mas gosto de várias músicas, mas sou meio egoísta com relação a isso, eu prefiro que as pessoas não ouçam minhas músicas.
A Carlota suspirou um "OK" com os lábios entreabertos, e olhou pra cima. O Eusébio continuou olhando pra ela.
-Chato, né? - Perguntou.
-Um pouco. -Ela assentiu.
-É... Eu sei. - Ele completou.
Continuaram sentados na mesma mesa, mas quando deu meia-noite, a Carlota olhou pro relógio com cara de espanto, e disse que precisava ir embora. O Eusébio se ofereceu pra levá-la, mas ela disse que não precisava. Ele disse que não ia pegar o número dela, pois se sentiria tentado a ligar, ela sorriu e não insistiu. Eles não voltaram a se ver.
Ás vezes, os opostos simplesmente não se atraem, apenas se desgastam.

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